Spirit Bound Por Dimitri Belikov escrita por shadowangel


Capítulo 17
Capítulo 17


Notas iniciais do capítulo

Dimitri...
Tão chato e tão lindo... rs



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/201480/chapter/17

Não demorou muito tempo, depois que Lissa saiu, um guardião bateu com as chaves nas grades, chamando minha atenção para ele.

“Trouxe roupas e materiais para sua higiene pessoal. Você deverá tomar um banho agora, pois logo mais uma equipe médica lhe examinará.” Ele disse duramente. Antes que eu me aproximasse das grades, ele soltou dentro da cela o que tinha trazido. Eu me abaixei e peguei uma calça jeans e uma camisa de malha com mangas compridas. Também havia uma pequena bolsa com sabonete, escova e pasta de dente, pente e elásticos para o cabelo, dentre outros objetos. Em outras ocasiões eu teria sorrido internamente daquilo, mas agora, somente a amargura me restava. Fui até o pequeno banheiro que tinha na cela e pela primeira vez me observei no espelho. Talvez por segurança, não era um espelho como este que conhecemos, feito de vidro que pode ser quebrado, mas era feito de um material que refletia minha imagem com perfeição. Há tempos eu não me via. Quando era um Strigoi, não tinha minha imagem refletida em nada. Passei minha mão pelo meu rosto e senti minha barba crescendo, algo que também não acontecia, quando eu era um Strigoi. Procurei na bolsa algo para me barbear, mas era obvio que ninguém confiava em mim o suficiente para me dar lâminas para o quê quer que fosse.

Eu era completamente dhampir, minha pele, meus olhos. Minha aparência desgastada, tudo condizia com meu atual estado. Nada daquele mostro tinha ficado em mim. Nada. Apenas a dor das ações dele. Sentindo um nó se formar na minha garganta, entrei em baixo do chuveiro e tomei um demorado banho, como se pudesse limpar o sangue de todas as pessoas que matei. Eu mal tinha terminado de me aprontar, quando ouvi vozes altas no corredor da cela. Muitas vozes, indicando que havia muitas pessoas ali.

Permaneci apreensivo, o fato de terem me trazido com vida até a Corte não queria dizer que eu permaneceria assim por muito tempo. Eu conhecia bem os guardiões e sabia que quando se tratava da segurança dos Morois eles poderiam ser bastante eficientes. E se eles julgassem que eu era perigoso, em nome dessa segurança, eu poderia estar morto a qualquer momento.

Sem dar qualquer palavra ou explicação, dois guardiões abriram a cela e entraram com pesadas correntes que tinham algemas nas pontas e colocaram em mim. Quando se certificaram que eu estava bem preso, autorizaram a entrada de quatro Morois, com batas brancas, provavelmente eram os médicos que falaram.

Eles entraram cautelosamente, sem esconder o medo em seus olhos. Três homens e uma mulher me olharam por longos minutos. Eu permaneci quieto, olhando para as algemas que prendiam minhas mãos. Sinceramente, poucas vezes eu me senti tão humilhado.

“Posso lhe examinar?” Foi a mulher a primeira a quebrar o silêncio. Eu apenas acenei com a cabeça, mesmo sem saber o que seria esse ‘examinar’.

Ela se aproximou e retirou de dentro do bolso uma pequena lanterna. Tocou com cuidado no meu queixo, levantando meu rosto, de forma que ela pudesse me olhar nos olhos. Ela passou a luz da lanterna pelas minhas íris várias e várias vezes. Depois fez alguns exames de reflexo e outros bem comuns. Também pediu para ver meus dentes.

“Bem, ele me parece um perfeito damphir.” Ela concluiu. “Pressão arterial, temperatura, batimentos cardíacos, reflexos. Nada fora do normal. Pelo menos fisicamente, ele é um dhampir.”

Os outros médicos vieram e repetiram os exames. Várias e várias vezes. Eu me sentia cansado, as algemas me incomodavam, mas em momento algum eu reclamei. Obedeci a cada comando deles. Muitas perguntas eram feitas por eles. Perguntas repetitivas, como se eles esperassem que eu caísse em uma espécie de contradição. Queriam saber se eu tinha sono, fome, se me incomodava com a claridade, se sentia vontade de beber sangue... Quando tudo acabou, pude ouvir a conversa entre eles e os guardiões. Realmente todos os quatro médicos tinham chegado a mesma conclusão. Eu não era um Strigoi.

“É uma coisa inexplicável.” Um deles disse. “Vocês têm certeza de que ele era mesmo um Strigoi? Ele não tem nada de Strigoi nele.”

“É nós sabemos.” Um dos guardiões respondeu. “Ele parece mesmo com o Belikov que conhecíamos. Em sua aparência e em suas ações, apesar de estar acuado. Não está sequer agressivo. Mesmo assim, ainda é cedo para chegarmos a qualquer conclusão. Outra equipe de alquimistas especializados em Strigois está a caminho.”

“Alquimistas?” a médica perguntou.

“Sim, não conseguimos deixá-los fora disso. Aquela batalha no armazém causou um grande dano. Tivemos que acioná-los.”

Ouvir sobre a batalha que eu havia planejado naquele armazém fez meu estômago se revirar. Andei até a cama e me encolhi ali, como se eu pudesse fazer aquela dor que queimava dentro de mim passar. Eu apertei meus ouvidos, sem querer ouvir mais nada daquela conversa e me perdi nos meus pensamentos tenebrosos. As horas passavam demoradamente e cada minutos era terrível. As lembranças passavam como filme na minha mente. A de Rose era a pior delas. Quando eu lembro de seu olhar amoroso, quando a mantive presa na Sibéria, de quando a persegui naquela floresta, daquela ponte... Ela sempre foi movida por uma incrível e invencível paixão e eu a retribui desejando a sua morte. Eu realmente não merecia tanto amor. Ela não merecia tanto ódio.

“Dimitri.” A voz doce de Lissa ecoou pela cela silenciosa. Novamente, toda sensação de desespero se dissipou e uma profunda paz se instalou ali. Tentando absorver aquela tranquilidade, virei vagarosamente para ver Lissa parada no corredor de fora da cela. Seus cabelos loiros e grandes olhos verdes a faziam parecer como um verdadeiro anjo. Mais que isso, a pessoa que havia me libertado daquela terrível vida que eu levava.

“Vasilisa. Você voltou.” Eu disse enquanto tentava me aproximar dela. Rapidamente, os guardiões que a escoltavam começaram a formar um escudo protetor à sua volta, como se eu fosse um perigo completo.

“Afastem-se!” Ela falou autoritariamente. “Nos deem algum espaço! Afastem-se, eu falo sério!”

Lentamente, os guardiões começaram a se afastar, dando espaço suficiente para que pudéssemos conversar, mas não foram longe o bastante, mantendo uma distância ainda segura.

“Claro que eu voltei. Como você está? Eles estão...” Ela olhou perigosamente para os guardiões no corredor. “Eles estão lhe tratando bem?”

Eu dei de ombros. “Bem. Ninguém está me machucando. Apenas muitas perguntas. Só tantas perguntas. E meus olhos. Eles continuam querendo examinar meus olhos.” Eu me sentia cansado só em repetir todos os procedimentos pelos quais eu havia passado desde que havia sido restaurado.

“Mas como você se sente? Em sua mente? Em seu coração?”

Eu me forcei a tirar os olhos dela e encarar a parede branda da cela. Meus sentimentos ainda eram confusos e dolorosos.

“Isso é... é difícil de descrever. É como se eu tivesse acordado de um sonho. Um pesadelo. Como se eu estivesse assistindo outra pessoa agir usando o meu corpo – como se eu estivesse em um filme ou peça. Mas não era outra pessoa. Era eu. Tudo isso era eu, e agora aqui estou eu, e o mundo todo mudou. Eu sinto como se estivesse reaprendendo tudo.”

“Isso vai passar. Você irá se acostumar, quando você voltar ao que era antes.”

“Eles não pensam assim.” Falei, inclinando a cabeça para o lados dos guardiões.

“Eles pensarão,” ela disse determinadamente. “Nós só precisamos de mais tempo.” Um momento de silêncio surgiu, e Lissa olhou para mim hesitante. “Rose... quer ver você.”

Ouvir o nome de Rose era como se várias facas afiadas entrasse em mim. Eu senti como se meu sangue esfriasse e esquentasse ao mesmo tempo. Meu coração disparou. Ao mesmo tempo, toda culpa me invadiu novamente. Aquela batalha interior começou a se travar entre o amor que eu sentia por ela e o remorso pelo que eu tinha feito. Eu não podia me permitir isso. Eu não podia amá-la. Ela não tinha que conviver com alguém como eu. Com alguém que a desejou tanto mal.

“Não. Qualquer um menos ela. Eu não posso vê-la. Não a deixa vir aqui. POR FAVOR.”

Lissa engoliu seco e baixou bastante a voz, de forma que somente eu e ela podíamos ouvir essa parte da conversa. “Mas... ela ama você. Ela está preocupada com você. O que aconteceu... Sabe tudo que aconteceu para que nós fossemos capazes de salvar você? Bem, uma grande parte disso foi por causa dela.”

Eu deveria saber melhor. Rose era a rainha dos planos mirabolantes, não era de se estranhar que fosse responsável por isso também. Senti um breve orgulho por ela em mim, mas me freei. Não podia deixar isso crescer em mim. Não podia.

“Você me salvou.” Disse rapidamente.

“Eu apenas encaixei a peça final. O resto... bem, Rose fez, hum, muito mais que isso.”

Saber que Rose tinha se dedicado a me salvar e que, muito provavelmente, tinha arriscado a própria vida nisso fazia aquele meu conflito crescer. Eu me sentia indigno e não merecedor, eu não podia me deixar levar por isso. O que eu sentia por ela era algo doce e puro. Algo que eu não era. Algo que não podia vir de mim. Lutando contra tudo aquilo que queria se sobressair a qualquer escuridão, andei até o lado da cela e encostei contra a parede. Eu fechei meus olhos tentando acalmar minha respiração ofegante e controlar todo aquele sentimento.

“Qualquer um menos ela,” repeti. “Não depois do que eu fiz para ela. Eu fiz muitas coisas... coisas horríveis.” Eu virou as palmas das suas mãos para cima e as encarei por um momento. Era como se o sangue quente das pessoas que eu matei ainda passasse pelos meus dedos. Isso era terrível. “O que eu fiz com ela foi o pior de tudo – especialmente porque era ela. Ela veio para me salvar daquele estado, e eu...” Eu balancei negativamente a cabeça. Lembrar de tudo era doloroso demais, principalmente porque eu ainda gostava dela. “Eu fiz coisa horríveis com ela. Coisas horríveis com outros. Eu não posso encará-la depois daquilo. O que eu fiz foi imperdoável.”

“Não foi,” Lissa disse urgentemente. “Não era você. Não realmente. Ela irá lhe perdoar.”

“Não. Não há perdão para mim – não depois do que eu fiz. Eu não a mereço, não mereço nem mesmo estar perto dela. A única coisa que eu posso fazer...” Eu andei de volta para perto de Lissa, sentindo o desespero me tomar e cai de joelhos diante dela. “A única coisa que eu posso fazer – a única redenção que posso tentar ter – é pagar a você por ter me salvo.” Isso parecia realmente razoável e assim, poderia me remir desse arrependimento.

“Dimitri, eu já disse a você-“

“Eu senti aquele poder. Naquele momento, eu senti você trazendo minha alma de volta. Eu senti você me curando. Este é um débito que eu nunca poderei retribuir, mas eu prometo que irei passar o resto da minha vida tentando.”

“Eu não quero isso. Não há nada a retribuir.”

“Há tudo a se retribuir. Eu lhe devo minha vida – minha alma. Esse é o único jeito que eu posso me aproximar de algum dia me redimir por todas as coisas que eu fiz. Isso ainda não é o suficiente... mas é tudo o que eu posso fazer.” Eu juntei minhas mãos. “Eu juro, o que você precisar, qualquer coisa – se isso estiver em meu poder – eu farei. Eu irei servir e proteger você o resto da minha vida. Eu farei o que você pedir. Você tem minha lealdade para sempre.”

Eu sentia que esse era um caminho. O único caminho que me restava. A gratidão era melhor que a culpa.

“Você irá ver Rose?”

Rose, de novo. “Qualquer coisa menos isso.”

“Dimitri.”

“Por favor. Eu faria qualquer outra coisa por você, mas se eu a ver... isso irá machucar muito.” Senti um tom de desespero sair da minha voz.

Lissa apenas acenou e saiu, assim que um dos guardiões disse que o tempo havia acabado. Eu permaneci de joelhos vendo-a se afastar, sem conseguir organizar meus sentimentos e meus pensamentos. A paz que tinha invadido a cela se foi e havia escuridão novamente. Mais do que qualquer outra hora, a imagem de Rose me assombrou, como uma coisa boa e ruim, ao mesmo tempo.




Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!