005 - Alice

[Alice]

O vento que soprava na imensidão daquele campo gramado era, no mínimo, perfeito. Meu cabelo voava junto com o vento. Estávamos cobertos pela única arvore do lugar. O céu sempre completamente azul, com nuvens surrealmente belas. Daniel me abraçava forte, como se eu fosse a coisa mais importante para ele. Aquilo me arrepiou, mas ao mesmo tempo me incomodou. Olhei atentamente para seu rosto e ele me beijou. Não retribui o beijo, havia algo de falso em seus olhos. Me soltei de seus braços e o fitei. O céu começou a ficar nublado e o vento parou abruptamente.

– Isso é um sonho, não é?

Ele concordou com a cabeça e sorriu. Um sorriso estranhamente grande. Seus olhos também mudaram, pareciam olhos de felino, olhos traiçoeiros. Ele se transformou, de modo gutural, em um enorme gato roxo. O calafrio que se seguiu a isso me fez trincar os dentes. Reconheci o gato-risonho de Alice no país das Maravilhas. “Hum, que irônico” pensei, com sarcasmo. Por via das duvidas, dei dois passos para trás, o chão já não era mais coberto por grama e sim areia e plantas mortas.

– Esse sonho. Ele é resultado de meus poderes, certo?

O gato concordou com a cabeça. Seu sorriso me amedrontava. No segundo seguinte não estávamos mais no campo árido, estávamos n’O Abrigo. No laboratório de Gui. Guilherme e Daniel conversavam sobre algo que eu não conseguia ouvir. Os dois pareciam extremamente cansados, mas algo me dizia que eram os verdadeiros Guilherme e Daniel. Esses provavelmente não se transformariam em criaturas bizarras de historias infantis. Percebi que Dan estava impressionado com o assunto. Muito impressionado. Gui falou algo e Daniel reagiu em um salto. Dessa vez eu pude ouvir.

– Não! Alice ainda está viva. Ela vai acordar, eu sei que vai, mesmo os médicos dizendo o contrario. De qualquer maneira, os poderes dela são dela. . . . Me desculpe. Acho que vou ficar só com a primeira opção.

E em seguida veio a voz de Gui.

– Daniel. Pensa melhor. Você não tem chance contra ele. Não sozinho pelo menos.

Só então eu percebi o que estava acontecendo. Talvez fosse tudo mais uma loucura do país das maravilhas, mas eu duvidava muito. Daniel realmente pretendia enfrentar o tal Eric sozinho. O terror alcançou minhas pernas, cães famintos. Quase cai de joelhos no chão. Virei para o gato-risonho e o segurei pelos ombros.

– Por favor, por favor. Faça algo. Me ajude.

Ele apenas continuou com aquele sorriso medonho e disse:

– Faça você. – Seus olhos felinos se tornaram maiores e ele se aproximou de meu rosto. – Comece por acordar!

Ele sumiu, exatamente como ele fazia na historia. E eu segui o conselho dele.

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