Acho que eu estava parcialmente acordada. Primeiro, por que eu podia ouvir vozes do lado de fora da barraca, mas ainda me sentia meio sonolenta e inconsciente. Segundo, eu comecei a me espreguiçar involuntariamente e senti leves pontadas atrás dos olhos, sinal que eu ficaria com uma bela dor de cabeça. Decidi me concentrar nas vozes e deixar a dor pra lá. Uma voz era de Brian, nem tão fina nem tão grossa, com um sotaque que só ele era capaz de ter. A outra voz era feminina, fina e talvez exageradamente doce, e eu não a reconhecia de nenhum lugar. Já a terceira voz, ah, aquela voz grossa e melódica que fazia meus joelhos tremer. Era Chad, aparentemente desinteressado pela conversa, prestando atenção em outra coisa. Levantei-me, ainda com os olhos fechados. Comecei a prestar atenção na conversa, a voz era de Chad.

– Sério Akemi, sinto muito, mas você sabe e sempre soube que eu não sinto nada por você. E quando digo nada quero dizer nada mesmo, absolutamente nada.

A voz de Chad estava inabalável, e ele ainda parecia entediado.

– Mas você tem que gostar dela! – disse uma voz com leve sotaque – Sabe, Akemi é perfeita pra você. Vocês são parecidos, gostam das mesmas coisas e estudam no mesmo lugar. Agora vai me dizer que você prefere correr atrás de uma garota comprometida e que não está nem aí pra você. – Espera aí, esse era Brian falando de mim? Meu coração saltou.

Saí da barraca como não quer nada da vida e encarei os três, um a um. Na verdade dei uma olhada rápida para Chad e isso não pode ser chamado de encarar... Enfim, finquei os olhos nos de Brian, comum misto de raiva e tristeza. E sabe o que foi mais legal? Ele não estava realmente nem aí pra mim, parece que me mandou um “foda-se” com o olhar, e logo depois saiu andando com Akemi. Senti meus olhos marejados e me virei, voltando para a barraca pra trocar de roupas. Antes que eu pudesse perceber ou impedir, Chad estava vindo comigo, com as mãos nos bolsos e cabeça baixa. Ele se sentou na cama e ficou me encarando.

– Qual é, não vai se despir só por que estou aqui? – ele disse, com um sorriso debochado. – Eu não me importo com essas coisas, sério, sou 100% gay.

Talvez – provavelmente – ele estivesse fazendo aquilo só pra me distrair, e tive que fingir que adiantou. Ri baixo e pedi pra ele sair da barraca com a maior educação que eu consegui.

– Alguém te convidou pra entrar aqui por um acaso senhor Chad? Não, então cai fora, quero ficar sozinha.

Ele riu e se levantou, indo em direção a saída ainda com o sorriso nos lábios. Chad estava lento demais e minhas lágrimas estavam quase saltando pra fora, então eu o empurrei para fora, segurando suas costas. Senti um volume estranho no centro das costas dele, mas decidi ignorar e tranquei a porta da barraca. Depois de trocar minha camisola por um vestido simples e um par de all star, acabei desabando ali mesmo. Nossa, como eu sou chorona. Mas... Por que Brian estava daquele jeito? Oras, ele era meu melhor amigo há muito tempo e não me abandonaria assim do nada. Continuei chorando sozinha por mais alguns minutos, até ouvir a barraca se abrindo, porcaria. Virei, na esperança de que fosse Brian louco pra me pedir desculpas, mas era Chad, pra variar.

– Você enche o saco sabia? – eu disse, jogando uma almofada nele.

– E eu sei que você adora isso, então vou continuar. – Ele se sentou do meu lado na cama e ficou me encarando, parecia uma estátua. Eu ainda devia estar com os olhos vermelhos e inchados, mas realmente estava pouco me fodendo pra isso. Chad sorria, e pela primeira vez aquele sorriso conseguiu me tranqüilizar. E então ele fez uma coisa inesperada: Segurou minha mão em um ato cordial e me deu um beijo.

– Uma coisa engraçada da vida é que, quando nossos amigos arrumam pessoas melhores, eles nos abandonam. – Chad disse, olhando nos meus olhos.

– É uma pena que isso não seja nada engraçado pra mim. Sério, eu adoraria estar rindo agora. Mas obrigada por tentar me ajudar. – Eu suspirei e puxei minha mão da dele, a colocando entre as pernas como eu sempre fazia para dormir. Chad tinha razão, todos os meus supostos amigos faziam isso. Mas Brian sempre fora tão diferente e... Especial, era difícil acreditar.

– Estamos sozinhos, no meio do nada e dentro de uma barraca, não queira perder essa oportunidade e seja simpática antes que eu vá embora. – ele disse, enquanto abusadamente se deitava do meu lado, segurando minha cintura. – Anneliese, às vezes as coisas não são como parecem.

Ele olhava nos meus olhos, e eu olhei para os dele. As duas esferas com aquela estranha e linda mistura de castanho e vermelho escarlate.

– O que quer dizer com isso?

– Brian pode estar precisando de algo que só Akemi pode dar – ele sorriu malicioso, e eu dei uma cotovelada nele, que nem pareceu doer. – O que eu estou querendo dizer é que, se Brian sempre foi seu amigo, ele volta. Sério, já aconteceu comigo. Todo mundo tem aqueles dias em que precisam se afastar de tudo e testar coisas novas, só pra ver como é.

Eu ri da tentativa dele de me acalmar falando um monte de abobrinhas, mas no fundo eu sabia que era verdade. Me aproximei de Chad e deitei minha cabeça no ombro dele, sentindo um cheirinho de menta que eu nunca havia percebido. Perfume de menta? Isso existe?

– É sabonete. – ele disse misterioso como sempre. – Mas também existe perfume de menta, mas esqueci o meu em casa.

– Você lê a minha mente ou eu estou ficando louca? – ele sorriu.

– Não, eu não posso ler sua mente. Tem milhares de coisas que eu não sei sobre você, e seria ótimo saber vindo dos seus lábios. – não consegui interpretar a frase o suficiente para saber se tinha um duplo sentido, mas logo em seguida me vi falando, discordando da afirmação de Brian.

– Eu não sou comprometida. 100% livre para relacionamentos.

Chad começou a gargalhar, e eu acabei rindo junto, sentindo seu ombro sacudir embaixo de mim. Ele acariciou meus cabelos, sem perder a pose de badboy e o sorriso metido que eu estava me acostumando.

– Já que a madame está 100% livre para relacionamentos, que tal dar uma volta com o badboy aqui?