A Vilã Morre No Final . escrita por Liz03


Capítulo 18
18) Faça escoras antes de quebrar a parede




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Abri os olhos, imagens turvas começaram a dançar na minha visão. Tentei estreitar as pálpebras vi um conjunto de quatro olhos, que poderiam ser de qualquer um, qualquer um mesmo, mas a cor de cada um deles era um verde já conhecido. Capitã Cortez. Certo, eu fui procurá-la na piscina e me lembro de até ter falado com ela, mas o resto das lembranças parecem só mais uma nuvem cinzenta num céu nublado. Refiz a cena na minha cabeça, em um determinado ponto as recordações apenas não vinham. Forcei a visão mais um pouco e aí percebi que uma dor latejante pulsava na minha cabeça, principalmente de um lado. Os olhos verdes ganharam um rosto, era realmente ela. Emiliane Cortez mexeu a boca, acho até que disse alguma coisa, mas uma pontada na têmpora não me permitiu ouvir nada, nem pensar, nem tentar lembrar mais nada, simplesmente fui vencido, os olhos se fecharam sem meu consentimento, apaguei.

Abri os olhos de novo, respirei fundo, a dor ainda estava lá.Tentei sentar, as mãos dela me detiveram e me impediram de prosseguir com o movimento. Ela disse que eu tivesse calma, que ficaria tudo bem. Como ficaria tudo bem se eu não sei nem onde estou? E nem como fui parar ali?Tentei sentar mais uma vez, dessa vez com mais ímpeto.

Ouvi um paciente “tudo bem”, e  pude sentar, até tive ajuda. Eu sabia o que queria perguntar mas as palavras não se juntavam, eu sabia que elas existiam e estavam bem ali na minha cabeça, mas até chegar na minha boca se perdiam.

- O que...? – Foi o melhor que eu consegui

- Você foi falar comigo na piscina, lembra? – Balancei a cabeça – Tivemos um...desentendimento e você foi atrás de mim na água – Ela suspirou – Você segurou meu braço , eu perdi o controle e acertei sua cabeça, aí você apagou e eu trouxe você pra cá

A nuvem saiu de frente do Sol, agora a sequência de atos fazia sentido, as lembranças se clarearam. Pus a mão na cabeça e constatei o resultado da pancada.

- Err..Desculpe, foi uma idiotice , vou fazer um curativo agora que você acordou – Ela foi até um armário e pegou uma malinha, sentou no lado da cama, tirou um líquido meio vermelho meio marrom – E se você quiser eu vou lá e falo com sua namorada, explico a situação

Ela estava aceitando explicar tudo? Uau, o que não é um remorso, ein?! Ela encharcou o algodão com o líquido.

- Isso vai arder um pouco – Levou o algodão até o ferimento

- AI! – Afastei minha cabeça

- Também não arde tanto assim

- Arde sim

- Desculpe

O que? Assim fácil? Ela estava agindo de uma maneira muito diferente, se não fosse a Capitã Cortez eu seria capaz de enxergar até uma certa doçura. Ela ficou um tempo olhando para o algodão na própria mão.

- Eu...

Respirou fundo. Fechou os olhos para abri-los rapidamente.

-...na verdade...

Mais uma pausa para encarar  o algodão.

-...eu não sou assim – Ela apontou para o meu machucado

Ei, ei, ei o que é aquilo escorrendo do canto do olho dela? É uma lágrima?  Eu senti vontade de esganar essa mulher quase sempre nos últimos dias, mas agora eu sentia pena. Segurei o rosto dela com a minha mão e tirei aquela lágrima dali com o polegar (afinal nem combinava uma lágrima no rosto dela).

- Tudo bem – Eu disse enquanto ela levantava uns olhos espantados para me encarar – Na verdade nem doeu muito, acho que todo aquele tempo no saco de pancadas não está surtindo muito efeito em você – Sorri para acrescentar sinceridade ao meu depoimento

Emiliane segurou minha mão e tirou a dali. Ficou um tempo olhando para meu polegar que ela ainda segurava. Os lábios dela se contraíram num canto, formando um sorriso sem graça.Cortez se levantou e pôs a malinha de primeiros socorros de volta no armário.

- Você está com fome?

Eu tive que pensar para responder essa perguntar, tinha ignorado meu estômago até agora, mas não é que eu estava com fome? Acenei que sim com a cabeça.

- Vou pegar algo para você comer – Ela pegou a chave do carro que estava numa mesinha – Não mexa em nada – Dizendo isso ela fechou a porta e foi embora

Mas no que eu poderia mexer? A mesinha só tinha uma luminária e uma barra de chocolates, a cômoda do lado da cama tinha um copo com água, o armério ela trancou. Eu não sou mal educado, mas só de ela ter dito para não mexer eu tive vontade de futucar. Tentei abrir a gaveta da cômoda, trancada. O que eu estou fazendo? Voltei a ficar sentado na cama.

Olhei para os lados...Quem sabe a gaveta da escrivaninha? Pus as pernas para fora da cama para ver se era seguro tentar levantar. Tomei impulso com as mãos segurando o colchão , uma certa tontura veio, mas eu já estava preparado, rapidamente cheguei até a escrivaninha. A gaveta estava aberta! Vamos ver...Apenas um livro, forcei um pouco a visão. Um exemplar de “A sombra do vento”. Eu também estava lendo esse livro, ela tem bom gosto literário. Nunca pensei que uma mulher como ela leria um livro tão meigo e doce, o pior que meiga e doce era exatamente o que ela estava sendo. Sim, a culpa era dela que me acertou em cheio, aliás isso de não estar doendo foi por educação que eu disse porque a dor parece que vai rachar minha cabeça  ao meio.  Mas esse “flash” não me enganava, não é um desenho gracioso no fim da folha que subtrai uma página inteira de coisas ruins. Me esgueirei até o banheiro, quando ela disse para não mexer em nada, fazer xixi vale?

 Abri a porta, levantei a tampa. Coloquei uma mão na parede para me apoiar caso a tontura voltasse.  Hum...acho que eu bebi muita água da piscina. O que será que deu nessa mulher? Uma hora ela estava insuportavelmente irritante, desagradável, aí ela dá um soco na sua cabeça, fica arrependida e começa a lhe tratar bem? Espera um segundo. Escorreu uma lágrima do olho dela, uma gota de água salgada que expressa sentimento escorreu daquele olho verde maldito! Pelo menos ela aceitou e falar com a Luiza. Mulher dos infernos!

- Existe uma coisa chamada porta e ela pode ser aberta , mas também fechada

Me virei espantado, ela estava encostada na porta que eu esqueci de fechar, a vergonha foi tanta que toda vontade de fazer xixi que ainda restava simplesmente sumiu.

- E-e-eu...desculpe, é-é-é q-q-que

- Tá, tá bom, eu comprei um sanduíche pra você

- Será que você pode dar licença para eu fechar a calça?

- Deixa de frescura Daris! Vamos logo, depois você cai, bate a cabeça e morre, e ai?

- Eu não vou me virar com você aí olhando – Eu disse numa voz que exprimia todo meu desespero

- Não se preocupe, pode se virar que nada aí vai me surpreender, garanto

Se eu já estava vermelho agora fiquei escarlate! Atenção, se você é uma garota nunca diga isso para um cara que está usando o seu banheiro, provavelmente ele vai querer descer pelo ralo. Abotoei a calça ainda de costas, tirar a mão da parede me rendeu uma acrobacia em tanto para não cair. Ela me segurou pelo braço.

- Vamos!

Emiliane me indicou a cadeira da escrivaninha, sentei com menos suavidade do que planejei. Tinha um sanduíche, batatas fritas e refrigerante.

- Pode comer

Peguei o sanduíche e mordi de uma maneira que me fez parecer um indigente faminto, olhei de soslaio ela estava mordendo a barra de chocolate. Tentei puxar assunto.

- Quer? – Levantei um pouco o sanduíche mordido

Ela fez que não com a cabeça.

- Então você vai explicar tudo para a Luiza?

- Sim

- Obrigado

Ela revirou os olhos.  Certo, a conversa não fluiu muito, vamos tentar fazer algumas perguntas.

- Por que você entrou pro exército?

- Porque eu quis – Resposta crua e direta, sem mais.

- Hum... E o que você faz quando não está aqui no batalhão?

Ela refletiu por um momento.

- Leio, ouço música, vejo filmes, o que uma pessoa normal faz – Ela pegou uma batatinha e mordeu.

- Ah....- Limpei a boca com o guardanapo – Você tem religião?

- Não

- É que vai ter uma quermesse na igreja que a minha mãe vai, eu não sou muito ligado a essas coisas, mas é que a Luiza vai tá lá e se você pudesse ir...

- Certo

- Mas também é divertido, tem umas barraquinhas, você pode até participar se quiser...

- Eu vou, falo com a sua namorada e vou embora

Balancei a cabeça. Nem tentei explicar que a Luiza não era minha namorada, não ainda. Quando acabei de comer voltei para o dormitório, já podia andar sozinho. Ela disse que se eu não estivesse me sentindo bem pela manhã não precisava ir, que ela daria um jeito. Mas não iria ser necessário, até a dor de cabeça já estava melhor. Tolói já estava no quarto, perguntou o que tinha acontecido porque eu estava com um curativo enorme na cabeça, gaguejei até conseguir inventar alguma coisa. “Eu caí na piscina e bati a cabeça na borda”, saiu de um jeito bem convincente. Eu optei pela mentira, não me orgulho disso, mas será que era melhor dizer que a Capitã Cortez tinha me socado? Porque aí eu ia ter que dizer que ela me bateu porque eu entrei na piscina, e eu entrei na piscina porque ela não concordou comigo, não concordou em contar para a minha namorada a verdade, a verdade é que ela tinha me beijado e não o contrário. Acho que “eu caí na piscina e bati a cabeça na borda”, pareceu mais aceitável e até mais realista.

Não agüentei conversar muito, o sono veio logo. Eu tive um sonho, e vou chamar de sonho e não de pesadelo, porque o meu “eu-incosciente” estava bem felizinho, o que não me impediu de acordar atormentado. Deixe que eu lhe digo mais o menos o que acontecia.

Lá estava eu sentado no banco de uma praça deserta, algumas folhas secas passavam levadas pelo vento,  eu me lembro de tudo como se visse a cena e não como se estivesse lá, então um Tomás bem impaciente tamborilava com os dedos no joelhos. E mudava de posição a cada 5 segundos, e olhava para o céu e voltava a olhar para o chão, olhava para a árvore do lado direito e para um poste do lado esquerdo, e mais uma vez para o céu. Até que ela chegou. Ele/eu  estava lá olhando para o chão e ela se sentou beijando sua bochecha. E depois ficaram(ficamos) lá sentados, conversavam sussurrando um no ouvido do outro. Eu estava olhando de longe mas as coisas pareciam ser ditas no meu ouvido. “Eu estava com tanta saudade” ela disse na orelha dele e o arrepio veio nas minhas costas. Eu/ele disse que não agüentava mais esperar. Ela passou a mão na testa dele, eu senti o toque suave. E aí eu a vi, Emiliane Cortez, de novo e de novo. Ele se aproximou e mordeu com carinho o lábio dela, ela investiu num beijo demorado. Eu já podia sentir o beijo, e quando nos separamos Luiza me olhava onde antes Cortez estava, eu pensei que  ela estaria brava, mas Luiza continuou me abraçando. E disse baixinho para que só eu ouvisse que estava com saudade.

Acordei  confuso mais cedo do que o necessário. Umas gotas de suor pingaram da minha testa. Limpei o rosto com a camisa.  Sentei na cama . Entrei no banheiro tirei a roupa, me encarei um pouco no espelho, o curativo chamava atenção. Mas que sonho maluco. Acho que a oscilação de humor da Capitã Cortez confundiu meu inconsciente. Deixei a água gelada cair sobre mim, dei uns pulinhos para enganar o frio. Vesti a farda, ainda era cedo, Tolói nem tinha acordado, o café nem devia estar sendo servido, então resolvi caminhar pelo batalhão. 


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Notas finais do capítulo

Oi gente,e aí como foi esse capítulo? Eu ía juntar com o próximo mas ficaria enooooorme,logo preferi dividir mesmo. Vocês tem comentado muito pouco ultimamente, a fic está mais chata ultimamente? Podem falar, tipo, críticas são bem vindas o/
Bjao