Anne Bergerac: As Portas Da Contradição escrita por Ana Barbieri


Capítulo 10
Capítulo 10




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Capítulo 10

 Corri para o meu quarto e me agarrei ao primeiro livro de Edgar Allan Poe que vi. Não posso negar que me senti estranha quando pela primeira vez na vida, fui tratada com carinho por Sherlock Holmes. Talvez Watson tenha razão e ele me ame... O que me importa? Eu não o amo. Nunca me importei quando ele brigou comigo, quando me tratava com autoritarismo. Na verdade, sempre foi divertido brincar com a paciência dele... deixá-lo nervoso... Pelo amor de Deus Anne! O que você quer dizer com isso?!

           _ Nos acompanha até o bordel? – perguntou Holmes do lado de fora. Vesti as roupas dele e saí. – Aceito isso como um sim. – eu ri.

           Já está escurecendo, não creio que irão haver muitas pessoas por lá. Será mais fácil assim, só não queria perder a hora do chá. As ruas estão começando a encher, começos de noite são sempre agradáveis, contudo, parece que nesses bairros mais afastados, certas coisas que deveriam ocorrer mais tarde... começam mais cedo. O bordel já estava aberto e alguns cavalheiros estavam a postos para conseguir as melhores prostitutas. Bem, só o que me importa agora é conseguir aquela lista.

           _ Os dois ficam aqui. Será mais fácil se eu entrar sozinho...

           _ Mais fácil para ela se jogar em cima de você outra vez. Não vou deixar.

           _ Anne... eu já disse que sei me cuidar muito bem...

           _ E eu já disse que vou com você. Nada do que me disser, mudará isso. – e saí da carruagem. Senti a mão dele apertando meu braço, me virei e o encarei. Puxei meu braço de volta e continuei caminhando.

           _ Mas como é teimosa...

           _ Que bom que deixamos isso claro. – e entrei. Lá estava ela, recepcionando os cavalheiros. – Boa noite senhorita Craiven. – ela se assustou tanto que segurei a vontade de rir.

           _ Ah, boa... Sr.Holmes! Mas, que surpresa... Aconteceu alguma coisa? – cínica, dissimulada e uma grande... ah, esqueçam. Só quero saber como vamos contornar essa situação, não será sutil apenas dizer que queremos ver a lista de clientes de Gautier.

           _ Não, apenas gostaria de olhar a lista de clientes da senhorita Gautier. Ainda se encontra aqui? – nossa... e ele disse mesmo.

           _ O que?... Não estou entendendo... Do que adiantaria?

           _ Acho que não cabe a você dizer o que adianta ou o que não adianta neste caso, senhorita. – contestei. Se ela não quer parar na cadeia porque simplesmente não cala a boca e entrega a maldita lista.

           _ E eu acredito que estava falando com o Sr.Holmes. – ora sua...

           _ A senhorita Bergerac é minha amiga e companheira neste caso senhorita Craiven e eu quero que ela seja tratada com o devido respeito. – ele está mesmo me defendendo?

           _ Ah, sim... amiga. Bem, acho que terei de decepcionar o senhor e sua “amiga”, não poderei ajudar.

           _ Creio que não gostaria de passar o resto da vida atrás de uma cela minha cara. – Charlotte se virou e o encarou. – Sim, creio que não. Acredite-me, será bem mais fácil para você... se me der logo a lista. – eu nunca o vi falar tão sedosamente com uma mulher. E porque a primeira com quem ele fala assim é uma prostituta? Eu não mereço ser tratada com cortesia também? Ora mas o que é isso? Ciúme de novo Anne?... Inferno.

           _ Está bem. Pegue. Mas acredite em mim senhor Holmes... me arrependi totalmente do que fiz. É claro que sempre quis a fama que Roxanne conquistou, mas... só depois da morte dela que percebi o quanto gostava dela. – por mais que eu esteja me forçando para não acreditar nesta historinha da carochinha, não posso deixar de concordar que o tom dela é um tanto sincero. Por um momento, sinto me apiedar desta moça.

            _ Porque simplesmente não diz quem foi?

            _ Estou sendo ameaçada... já me arrisquei demais falando com vocês. Por favor, vão logo. – saímos dali e voltamos até o cabriolé.

            _ Aquela sua pergunta me deixou um tanto surpresa Sherlock. – ele me olhou de soslaio indagador. É claro que ele não entendeu o que eu queria dizer. – Pedindo para que ela entregasse o assassino. Até parece que você não gosta de dar este tipo de desafio ao seu cérebro. É para isso que você vive eu suponho.

            _ Acho que estou perdendo o jeito. Antes era capaz de desvendar um caso assim em horas. Há quanto tempo estamos nisso? – eu sorri. Como é divertido vê-lo nervoso.

            _ Não mais que alguns dias. Acho que estou atrapalhando. Sua constante vontade de me salvar, o deixa atordoado.

            _ Ou talvez seja a sua incapacidade de manter-se a salvo e de me obedecer. – e como sempre a culpa tem que ser minha. Chegamos ao cabriolé onde Watson nos aguardava. Pareceu surpreendido, enquanto Holmes lhe contava o ocorrido, que tenhamos conseguido com tanta facilidade a informação que queríamos.

           Assim que chegamos a Baker Street, nos jogamos em cima da mesa de jantar e começamos a analisar a lista de clientes de Gautier. Não tenho vergonha em dizer que a lista era grande. Afinal, toda jovem prostituta que “nasce” em Londres, costuma ser mais apreciada antes que perca o brilho. Havia vários duques, condes e lords.

           _ Stanpleton. – não acredito. Eu estava certa no final das contas. Ele não amava a esposa, ele não era de confiança, ele era o homem com o olhar mais frio e suspeito que eu já vi em toda minha vida. Contudo, porque mataria sua amante?

           _ Tem certeza? Pode ser apenas coincidência, um equivoco. – Watson pareceu concordar com o que eu estava dizendo. Mesmo que a lista termine com assinaturas de Lord Stanpleton, não podemos afirmar que tenha sido ele sem provas fundamentadas.

           _ A lista termina com assinaturas dele Anne. Não houve outros que tiveram contato com a senhorita Gautier. Como pode não ter sido ele?

           _ Tenho consciência de que a lista termina com ele. Contudo, não temos provas de que tenha sido realmente ele. Por que um homem mataria sua amante? – Holmes continuou a me fitar, pensando. Eu soltei um risinho abafado. Voltamos à estaca a zero... estávamos tão perto. – Bem, eu vou subir para o meu quarto. Precisando gritem.

           Por que alguém mataria sua amante? Só chegamos a descobrir como ele havia matado, não a razão. Me joguei na cama e fiquei pensando. Ao lado da cama, uma cômoda abarrotada de fotografias. Dentre elas, uma foto de meus pais comigo em casa. Às vezes me esqueço de como eles eram, individualmente. Sempre fui mais parecida com meu pai psicologicamente e fisicamente com minha mãe... tirando os olhos, iguais aos de meu pai. Será que ele saberia responder a esta pergunta? Inteligente do jeito que era, acho que sim.

          Mas agora a verdade transparece não é? Stanpleton mandou me matar e ele também foi o responsável pela morte dos meus pais. Engraçado que parece fazer sentido, não sei por quê... Na verdade acho que sei sim. Uma noite antes do assassinato de meus pais, escutei-os conversando e meu parecia falar de algo relacionado à medicina, uma doença talvez, enquanto eu ouvia minha mãe suspirar e pronunciar alguma coisa. Se eu não estiver equivocada, acho que foi “Pobre Amélia Stanpleton”... Lady Stanpleton. Meus pais estavam investigando sobre ele, mas o que? Acho que só existe uma pessoa capaz de responder...

             _ HOLMES! – ouvi um vidro quebrar no andar de baixo e passos largos pelas escadas. Segundos depois, Sherlock Holmes adentra meu quarto na mesma gentileza de sempre. Estava tentando parecer calmo, o que me fez rir por alguns minutos. Por acaso ele pensou que havia um assassino aqui?

             _ O que foi?

             _ Posso saber o que você e meus pais estavam investigando, precisamente, quando eles foram mortos? – ele me olhou confuso. Surpreso. Ótimo, é tão incrível assim eu somar dois mais dois? Céus! Como eu... odeio esse homem. – Vai falar ou não? Caso não tenha notado, não dispomos de todo o tempo do mundo aqui.

             _ Deve se lembrar daqueles assassinatos em massa há três anos. Várias mulheres sendo mortas e o culpado não foi encontrado. Seu pai se sentia cada vez mais frustrado com isso e decidiu pedir a minha ajuda. Me relatou tudo o que sabia sobre o caso. Eu sugeri que começássemos a verificar os salões de Londres e foi o que fizemos. Sua mãe ajudou muito nesse ponto.

             _ Como?

             _ Quando eu digo que o sexo feminino me deixa desconfiado não é brincadeira. Sua mãe começou a se infiltrar nos salões, passou-se por uma prostituta e acabou ressaltando uma lista de suspeitos. – a visão da minha mãe na cama com outros homens foi... assustadora. Não era a toa que ela e meu pai começaram a brigar muito desde então.

             _ E então?

             _ Começamos a investigar, até que seu pai disse ter finalmente conseguido a chave que precisava. Começou a se interessar por medicina e vivia fazendo perguntas ao Watson sobre doenças. Depois disso, dispensou minha ajuda, agradecendo muito. Não me revelou quem era o culpado. Lembro-me muito bem que veio até mim aquela noite em que foi morto, pedindo-me que se alguma coisa acontecesse com ele ou com Susana, para eu garantir que você ficaria bem. Claro, você se lembrou de mim primeiro.

             _ Ele sabia que ia morrer?!

             _ Acho mais provável que ele soubesse onde estava pisando. Enquanto falava, parecia ressaltar muito bem que você estaria em maus lençóis com a morte dele... vulnerável. Parecia conhecer muito bem o assassino. – bem, meu pai tinha vários conhecidos de todas as classes sociais. E se conhecesse Lord Stanpleton? Porque temeria por mim? Interessado por medicina... o que tudo isso quer dizer?

             _ Holmes... aquela caixinha preta que vimos à cabeceira de Lady Stanpleton... será que há Bela Donna nela? – o medo percorreu minha espinha. Ele queria matar a mulher, por quê? Por que ele mataria a amante? Por que ele queria me matar? – Devemos ir até a mansão Stanpleton, esta noite. Vamos avisar Lestrade.

             _ Watson e eu. Você fica.

             _ Aquele homem matou meus pais. Aquele homem foi à causa de várias discussões em série entre meus pais. Quero ouvir a verdade, por mais vil que seja, da boca dele. Quero olhar nos olhos dele quando disser por que me quer morta. – estou ardendo em chamas. Um ódio reprimido durante meses e anos, tentando entender a morte de meus pais, aflorou em mim e não será apagado por pouco. Se for mesmo verdade... eu mesma vou terminar com a vida de Lord Stanpleton.


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Notas finais do capítulo

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