A Coletora escrita por GillyM


Capítulo 4
Quem sou eu?


Notas iniciais do capítulo

Capitulo ficou longo, mas foi necessário.
Boa leitura!!!



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/164741/chapter/4

*Roxy*

Eu fiquei estática ao observá-lo dirigindo aquele velho camaro, ele parecia se divertir com minha angustia. Eu não sabia o que havia acontecido comigo, nem mesmo sabia minha idade ou se já tive uma família um dia, mas algo me dizia que ele saberia dar todas as informações.

A velocidade já chegava a 180 Km/h, ele dirigia sem medo e acelerava ainda mais, até que ele saiu da estrada e entrou no deserto, seguiu em direção as rochas, e aumentou o volume da musica que tocava no radio velho preso ao painel do carro.

- Pode me chamar de Dea!

- Oi! – respondi intrigada.

Ele parecia ter menos de trinta anos, não era o que eu poderia chamar de bonito, mas tinha algo nele que me agradava. Seu cabelo era cor de mel, na altura dos ombros, os fios dançavam com o vento que entrava pela janela.

- Você tem medo de morrer? - Ele olhou fundo em meus olhos.

- Não.

- Tem certeza?

- Não.

Ele gargalhou e acelerou ainda mais, já estávamos beirando 200 km/h e as rochas estavam cada vez mais próximas.

- Pare! Vamos bater.

Gritei ao ver que ele não conseguiria frear o carro a tempo.

- Não vamos não.

Ele freou o carro pausadamente, e quando a velocidade diminui, ele freou bruscamente. O carro parou a poucos metros das rochas.

Sai do carro com as pernas bambas, e sentei-me no chão ao lado do carro. Levei as mãos à cabeça a espera que meu coração desacelerasse. Ele saiu vagarosamente do carro, aos risos, e se sentou ao meu lado.

- Se divertiu?

- Claro... Mas chega de diversões por hoje.

- Você já foi mais aventureira, Roxy.

- O que sabe sobre mim? Eu não me lembro de dizer meu nome.

- Você não disse. Não tenha pressa de saber. Que tal uma cerveja?

- Eu não tenho tempo para isso e você sabe disso.

- Você tem todo o tempo do mundo. Vamos lá... Tem um motel por perto, e você precisa muito de um banho. Você sabe que este uniforme está imundo, não é?

- Jura? Eu não tinha percebido.

Entrei no carro novamente, ainda muito apreensiva, mas precisava passar por aquilo se quisesse saber mais sobre mim.

Chegamos ao motel, ele ficou no carro enquanto eu pegava a chave na recepção do único quarto disponível. O recepcionista me olhava curioso, e alternava seu olhar para o carro, como se houvesse algo de estranho.

- O quarto é só para você? – Ele perguntou pausadamente.

- Não. Por quê?

- Nada.

Ele gaguejou.

Voltei para o carro.

- Pegou a chave do quarto dezessete?

- O que acha? Você já sabe mesmo.

- Então vá até lá. Tudo o que você precisa estará a tua espera.

Surpreendi-me ao entrar no quarto, havia roupas limpas, e sapatos novos também. Na poltrona ao lado da cama havia uma bolsa, na verdade se tratava de minha bolsa, e tudo que havia dentro dela me pertencia também.

Tomei banho e coloquei as novas roupas, um lindo vestido preto insinuante, mas de bom gosto. Os sapatos eram pretos com saltos agulhas, exatamente o numero que calçava. Quando estava pronta deixei o quarto, e entrei no carro novamente.

- Pronto. Vamos falar sobre o que interessa.

- Não tão rápido.

- O que mais?

Ele desviou o olhar para uma caminhonete que estava a estacionar ao lado do nosso, dele saiu um homem de meia idade, que caiu no chão assim que deixou o carro. Ele parecia ser vitima de um infarto ou algo parecido.

- Fique no carro.

- O que você vai fazer? – Perguntei desconfiada.

Ele ignorou minhas perguntas e se aproximou do homem caído. Olhei ao redor e não havia ninguém no estacionamento, fiquei a observar tudo de dentro do carro. O homem caído parecia sofrer de um infarto ou algo parecido. Curiosamente, ele me encarava e pedia por socorro, como se eu fosse a única a estar ali.

Quando Dea se aproximou, o homem se desesperou, começou a rezar e a pedir por clemência, ele já não parecia se importar mais com a dor que sentia no peito, apenas com a presença de Dea ao seu lado. Então percebi o que estava ocorrendo, ele sabia tudo sobre mim, pois ele era como eu.

- Agora nós podemos ir.

Ele disse quando voltou para o carro e deixou o corpo do homem caído no estacionamento. Durante todo o trajeto, ele ficou em silencio.

Quando chegamos a pequena cidade o relógio da praça principal marcava 12 horas, ele me levou a uma lanchonete e enquanto almoçávamos, falávamos da parte que interessava. Falávamos baixo, pois as pessoas ao nosso redor pareceu um pouco curiosas ao nosso respeito.

- Vou lhe dar o direito a três perguntas. Então as escolha bem.

- Quem sou eu? O por que faço as coisas que faço? E porque aquele vampiro está atrás de mim?

- Boas perguntas.

- Tive muito tempo para pensar nelas.

- O seu nome é Savannah Collins, mas prefiro seu nome de guerra, Roxy! É bem mais interessante e sua cara. Seus pais te deram para adoção assim que você nasceu, e eu a conheci quando você completou dezoito anos. Você era uma jovem normal, com muita habilidade para se meter em confusão, e também era corajosa e bonita. Por todas estas coisas eu escolhei você.

- Me escolheu para que?

- Sinto, mas você não fez esta pergunta.

Respirei fundo, aquelas regras das três perguntas não estava a me agradar.

- Você é um abrigo. Colhe almas. Não qualquer alma, é claro. Ceifadores são espíritos, anjos da morte, demônios... Não sei qual nome você prefere usar. Quando alguém morre, a alma se separa do corpo, o corpo vai para debaixo da terra, e a alma vai para algum lugar. Os ceifadores colhem estas almas e as mandam para os lugares onde elas pertencem, para o paraíso ou para o inferno. Nós temos o poder de tirar ou dar a alma às pessoas, ou seja, a vida.

Ele fazia mímicas irônicas ao explicar.

- Nós?

Perguntei incrédula.

- Qual é o teu problema? Acabei de dizer que ceifadores são espíritos. Você é um espírito?

- Não... Prossiga.

- Você sabe como nasce um vampiro?

- Sim, todo mundo sabe. Vampiros são humanos que quando mordidos por outros vampiros, morrem e se transformam em um deles.

- Sim, mas minha pergunta é... Os vampiros estão mortos ou vivos?

- Mortos é claro. Quer dizer... Vampiros são mortos vivos.

- Se a definição de morte é a separação da alma e o corpo, o que acontece com os vampiros?

Fiquei pensativa, realmente não sabia a resposta para aquela pergunta, e não sabia aonde tudo aquilo iria me levar.

- Eu não tenho o dia todo.

Ele disse impaciente.

- Bem... O corpo só morre quando a alma é separada dele, mas vampiros não estão exatamente mortos, e sabemos que a alma de um vampiro é amaldiçoada. Para ser amaldiçoada a alma tem que estar no mundo dos vivos.

- Exatamente. Vampiros são mortos vivos, isso significa que suas almas ainda estão neste mundo, separadas de seus corpos, é claro.

- A alma sempre quer voltar ao seu corpo, então porque as almas não voltam para os vampiros?

- Exatamente onde eu queria chegar. Você já imaginou o que aconteceria se um vampiro tivesse sua alma de volta?

- Não. Eles voltariam a viver?

- Pois é... Eu também não sei, isso nunca ocorreu antes, por isso elas não voltam, cuidamos disso.

- Como não voltam? Se elas ainda estão neste mundo?

- Nós a prendemos. As guardamos num local seguro, onde eles não podem encontrá-las, e de onde elas não podem sair.

- Onde? Que lugar seria bom para se esconder uma alma?

- Num corpo humano, é claro.

Ele riu.

- O vampiro é um ser eterno. Que humano viveria por toda a eternidade?

Perguntei curiosa, mas no mesmo momento entendi qual o propósito de toda aquela conversa.

- Sou eu, não sou? Eu sou o brigo, eu sou o esconderijo delas, estas vozes que não saem da minha cabeça são elas, não são? Você fez isso comigo?

- Fale baixo! - Ele pedia ao olhar para as pessoas ao redor – Você vai parecer maluca.

- Não! Por que achariam que sou louca? – Perguntei nervosa e me levantei – E por que estão me olhando? Parem de me olhar, cuidem de suas vidas.

Um casal que estava sentado na mesa ao lado se levantou e deixou a lanchonete.

- Senhorita... Está assustando os clientes. Você precisa de ajuda?

- Como assim precisa de ajuda?

Fiquei furiosa quando a garçonete perguntou.

- Podemos ligar para alguém, se não conseguir se acalmar. Você tem algum familiar por aqui?

A encarei enfurecida, e olhei em seguida ao Dea que se manteve sentado na mesa, com um sorriso debochado em seu rosto. Ele fez sinal para que eu me sentasse novamente.

- Desculpe-me.

Sentei-me novamente na mesa, as pessoas ficaram me olhando e cochichando entre si.

- Elas não estão te vendo aqui, não é?

- Sou um ceifador, um espírito. Você me vê, porque eu quero que você me veja.

Quando ele me explicou, lembrei-me dos fatos ocorridos, do homem infartado que me pedia socorro, do homem da recepção que me olhava curioso. Para eles, eu estava a falar sozinha, isso explicava os olhares na lanchonete.

Levantei-me e paguei a conta com o dinheiro que estava em minha bolsa, sai rapidamente da lanchonete e voltei para o carro, mas desta vez me sentei no banco do motorista. Dea apareceu rapidamente no banco de carona.

- Agora você entende?

Eu entendia a tudo que ele me dizia, mas não conseguia aceitar.

- Se eu vou viver por toda a eternidade, porque sou frágil como um humano?

- Bem... Como eu disse, eu posso decidir quando as pessoas iram morrer, entretanto, eu controlo sua alma e não seu corpo. Manter sua alma em seu corpo não é uma tarefa difícil, mas manter seu corpo intacto é. Por que você acha que sente tanta necessidade de se drogar?.

- V? Nem me lembro de quando comecei a usar isso.

- Eu sei. Você começou a usar desde que te escolhi para ser uma coletora.

- Coletora? É assim que me chama?

- Não posso dizer que são ceifadores. Sou eu que trouxe a alma dos vampiros até você. Você só coleta a alma de crianças, e nem as ajudam  a fazer a travessia.

- O que as crianças têm haver com isso?

- Já que vocês estão sendo usados por nós, arrumamos outra função para vocês. Os ceifadores também são responsáveis pela a harmonia entre os dois mundos. Quando alguém ruim morre, não por nossa vontade, alguém bom também tem que morrer, para manter o equilíbrio.

- Esta é minha função? Colher as almas delas?

- Almas de crianças são cheia de vida, ajuda a manter vocês sempre vivas e belas. Não se preocupe, assim que você as colhe, eu as tiro de vocês e as entrego no lugar no qual elas pertencem.

- Por que você mesmo não faz isso?

- Trabalho demais. Existem muitas almas para fazer a passagem.

- Então existe mais de mim por aí? Isso é horrível.

Perguntei incrédula com o que acabara de ouvir. E mantive meus olhos grudados no volante do carro.

- Sou o anjo da morte, não posso ser bonzinho. Eu tenho o poder de provocar grandes tragédias, mover objetos, tudo em favor da morte. Como posso ser bonzinho? Este é meu trabalho.

- Eu não quero! Não quero ser assim. Desfaça! Desfaça agora!

- Não posso, desculpe. Se eu matar você agora as almas ficaram livres e voltaram para seus corpos. Enquanto estes vampiros existirem, você também existirá.

Fiquei aterrorizada com as palavras dele.

- Preciso ficar sozinha. Vá embora.

Ele ignorou meu pedido e continuou a falar.

- Eu faço de tudo para mate-la viva, por isso eu a diferenciei dos humanos, sem poder sentir o cheiro de humano e sem ouvir o sangue pulsar em suas veias, os vampiros não conseguem te rastrear ou sentir sua presença.

- Para que tanto cuidado com vampiros, se os humanos podem me matar?

- Você é inteligente Roxy, por isso te escolhi. Você pode se virar com os humanos, entretanto, os vampiros podem te aniquilar rapidinho. Não poderia correr este risco.

Olhei para ele e pedi novamente para me deixar só.

- Não posso. Preciso responder a ultima pergunta. A mais importante.

Olhei para ele, esperando por algo que talvez não fosse gostar de ouvir.

- Tentei cuidar de tudo, mas o inesperado aconteceu... Vocês se encontraram, e de alguma forma, ele reparou em você.

- O vampiro desconhecido da noite passada?

- Sim. O seu vampiro misterioso chama-se Bill Comptom. Ele não sabe ainda, mas a atração que sente, não é por você, é pela a alma que o pertence.

- Eu estou com a alma dele? Impossível.

Pensei.

- Ele é vampiro há muito mais tempo que eu sou...

- Coletora! Sim, isso é verdade, mas é que antes de abrigar você, a alma dele estava em outra coletora, que infelizmente...

- Morreu?

- Sim, isso mesmo. Por sorte, capturei a alma dele antes que voltasse para seu corpo. Foi quando recrutei você.

- O que acontecerá quando ele descobrir?

Perguntei mesmo com medo de saber a resposta.

- Ele fará o que for para ter sua alma de volta. E o único jeito de isso acontecer é matar você.

- Este é o motivo de eu sentir tanto medo dele, e não dos outros – Conclui por mim mesmo.

- Foi uma forma que encontrei de manter o dois longe um do outro. Você teria medo, e a luz que as almas das crianças trazem a você, o manteria longe. Funcionou, até esta noite, quando ele te atacou.

- As almas das crianças o matem longe, por isso ele me atacou esta noite, faz cinco anos que não coleto nenhuma alma. Eu deveria saber... As criaturas frias são seres da escuridão, onde há luz, não há escuridão.

- Acho que não preciso explicar esta parte.

Ele debochou.

- Fique longe dele, pois ele sentiu a conexão entre vocês através do sangue que ele bebeu de suas veias. E agora que seus corpos estiveram conectados, você sentirá vontade de estar perto dele. Você sabe o que sou e o que você é, não irei mais me apresentar a você. Quando isso ocorrer, estarei trajando uma capa preta com capuz, e um cajado, para te levar comigo definitivamente.

- Espere!

Gritei antes que ele partisse.

- Você destruiu minha vida. Acho que tenho direito a uma quarta pergunta.

- Justo.

- Existem duas vozes em minha cabeça, que não me deixam em paz. Uma é a alma de Bill Comptom. E a outra? A quem pertence?

- Se você não quiser morrer, terá a sorte de nunca saber.

Ele desapareceu, e me deixou sozinha no carro.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Reviews????
Bjus