Quando cheguei à escola, as meninas e o Lucas já estavam lá, exceto a Mille. Hoje é o aniversário dela de dezessete anos, então resolvemos chegar mais cedo para preparar uma surpresa.             

_Eu estava rezando o terço para você chegar cedo, Lua, e parece que funcionou. - Falou Lie enquanto eu abaraçava as meninas.             

_Também, só um milagre mesmo para ela chegar na hora.- Completou Juli.             

_Ou o aniversário de uma de vocês. - Eu disse a Juli enquanto a abraçava.             

_Ô! Vamos parar de blá blá blá e colocar a mão na massa? Daqui a pouco a Mille chega e vocês ainda estão com a cara para cima. - Exclamou Mel do alto da escada. Ela estava pendurando um cacho de bolas com o Lucas.           

 Enquanto Juli começava a discutir com a Mel, eu coloquei minha mochila na carteira e fui pendurar as bexigas de bola de futebol com a Lie. Uma idéia dela. Ela sempre arquiteta as festas de aniversário.           

Tínhamos pedido ao diretor, e a professora de português, que iria dar a primeira aula, para nos ceder a sala. Eles deixaram na hora, principalmente o diretor, já que o pai da Lie é a pessoa que mais doa dinheiro para a escola. Apesar de ele ser dono de um shopping, ainda acho que ele tem uma árvore de dinheiro em casa. Nunca vi uma menina para gastar tanto quanto a Lie! Ela nunca deixa a gente pagar nada quando saímos juntas, e nunca repete uma peça de roupa.              

Eu não gosto muito quando ela paga as coisas para nós, por causa do ciúme dela. Vai que depois ela fica pensando que somos propriedade exclusiva? Lembro quando as meninas arranjaram os namorados. Ela até ameaçou entrar em depressão, dizendo que íamos abandoná-la, mas ai ela começou a namorar e o ciúme dela conosco diminuiu. Deve ter sido transferido para o namorado.             

Em poucos minutos, toda a sala estava decoradas com bolas, bexigas e fitas azuis e pretas, que são as cores preferidas da Mille. Os salgados e doces já estavam na mesa, e Juli até já tinha brigado com a Mel e o Lucas, por estarem roubando alguns. O bolo também já estava lá, decorado com 'Parabéns Mille', azul e branco. A galera que estuda com a gente também ajudou bastante na decoração.             

Já estávamos todos prontos, cada um no seu lugar na sala, quando o Lucas veio avisar que ela estava chegando.              

Quando a Mille entrou na sala, deu um salto enorme quando começamos a cantar o famoso single de quem fica mais velho. Mille não chorou, ela é muito durona para isso. Nunca vi ela chorar. Mas fora isso a festa teve tudo o que tinha direito.             

_Galera, eu amei a surpresa e tudo que vocês fazem por mim, mas hoje tem prova de física, não é? - Disse Mille depois de toda a farra.             

_É mesmo! Já tinha caído no esquecimento! Jovens displincentes... - Falei para eles bancando a autoritária. Não levo o menor jeito.             

Arrumamos a bagunça da festa no fim da primeira aula e o resto das aulas seguiu normalmente, até chegar à ultima, que era a prova de física.             

A professora Cátia entrou na sala bem rapidinho. Ela é baixinha, gordinha e morena, parece que saiu de desenho animado. Parecia estar de bom humor hoje. Enquanto ela entrava, Diego, um menino do nariz grande que estuda com a gente chamou a Mel e disse:           

 _Ei Mel, é a última aula e a professora parece estar de bom humor, vamos cantar um último parabéns pra Mille antes da prova? - Ele ta com a cabeça onde? E se a professora não gostar? Olhei pra Mel e ela olhou pra mim falando um 'relaxa' com os olhos.             

_Ta bom. Acho que ela não vai reclamar... - E lá vamos nós outra vez.             

Antes da professora Cátia se sentar, o Diego começou a cantar parabéns seguido pela Mel e depois pela classe inteira. Mille ficou bem surpresa e a Lie e eu só conseguíamos olhar para a cara da professoara o tempo todo. Ela não esboçou nenhuma expressão até o bendito single acabar, mas quando terminou ela olhou pro rosto de cada aluno.             

_Já acabaram?- Agora ela esboçava uma expressão. A mesma da Rainha-Vermelha em Alice no País das maravilhas quando diz 'cortem as cabeças!'.             

Ninguém falou nada. Todo mundo estava pasmo com a reação dela. Então ela andou de volta pra porta de saída dizendo:             

_Todo mundo levou ZERO e SUSPENSÃO da minha aula! E TODOS vão ter uma conversa com o diretor! Que sala IMPOSSÍVEL!-  Gritou ela já do lado de fora da sala.            

Em uma coisa eu concordo com ela. A nossa sala é mesmo impossível. Todos os professores diziam isso. Mas era só um parabéns! Que reação exagerada a dela.             

Olhei pra Mel  com cara de 'eu te disse', mas a única coisa que ela fazia era rir.           

_ Grande idéia Diego! Só podia sair da sua cabeça!- Escutei Lie brigando com Diego.            

_Foi só um parabéns! Ela que é louca! - Enquanto eles brigavam eu olhei pra sala. Ninguém falava nada, mas tinha muita gente olhando pra mim e pras meninas com cara de raiva. Olhei pra Mille e ela também tinha percebido. Então ela se levantou.           

_Galera nem vem com essa cara de raiva pra o nosso lado porque todo mundo contribuiu para essa façanha ta! Não foi só a gente!- Enquanto ela falava as pessoas abaixavam o rosto. Alguém dos nerds sussurrou um 'culpa dela' lá atrás então eu comecei a gritar.           

_ Pelo amor de Deus é só um aniversário! A reação dela que foi exagerada, vocês sabem como são gente velha! E de qualquer forma já era! Não dá pra voltar atrás! Mel, vai lá na sala do diretor explicar pra ele o que aconteceu, pode ser que ele tire a suspensão. - Mel se levantou e foi fazer seu papel de presidente de sala junto com a Lie.           

Todo mundo estava no corredor esperando a Mel chegar e dizer o que aconteceu. Eu estava nem aí, como sempre fico, mas parecia que a Juli e as nerds iriam pirar. Acho que é porque elas nunca tinham tirado nota menor que sete. Eu já tinha experiência nisso. Mille estava calada como sempre  junto com o resto da turma.              

Eu estava conversando com Lucas sobre ter que trazer os pais na escola quando a Mel a Lie chegaram. Todo mundo voou em cima delas perguntando a mesma coisa:             

_E então?- Mille perguntou junto com o resto da república. Mel se sentou ao nosso lado e falou:             

_Eu e Lie explicamos tudo ao diretor, desde a festa. E ele também achou que a reação da professora foi exagerada e pediu para chamar ela. Então nós conversamos com ela, dissemos que era o aniversário da Mille, pedimos pra ela relaxar um pouco e enfim ela entendeu, tirou a suspensão, pediu desculpas e disse que iria remarcar a prova. - Quando ela terminou de falar parecia que algumas pessoas iriam comprar fogos de artifício. O alívio de todos foi visível.           

_ Claro que o diretor iria ficar do nosso lado, imagina se ele iria querer problemas com o pai da Lie? - Disse eu pra descontrair.           

_Nós fomos dispensados. Então? Vamo da uma volta? - Lie disse pra gente. Eu sabia que ela queria ir ao shopping agradar ao consumismo.           

 Concordamos em ir ao shopping. Somente a Mille e o Lucas não foram porque tinham curso, então fomos Lie, Mel, Juli e eu.              

Lie e Mel comprarão algumas roupas depois fomos almoçar. Lie conheceu um garoto loiro que parecia de  revista mas não se interessou. Quando deu 4:00 Lie e Juli foram pra casa e Mel e eu voltamos para a escola para o treino de futsal.             

Chegamos antes de todo mundo porque o treino de futsal é às cinco horas. Enquanto a gente trocava de roupa Mille chegou, e alguns minutos depois todas as meninas e o treinador tinham chegado.               O treino seguiu tranquilo, só a Mel que levou um tombo quando foi agarrar mas fora isso tudo bem.               

Cheguei em casa minha mãe tinha deixado um recado na geladeira:           

"Fui no hospital com sua tia porque a pressão dela aumentou. Provavelmente vou passar a noite com ela. Tem comida na geladeira. Amo você."             

Que bom. Sozinha em casa. Eu não me importo de dormir sozinha, mas seria mais legal se eu chamasse alguém pra ir dormir comigo. Então liguei pra mãe da Mel e pedi para ela deixá-la dormir aqui em casa. Ela topou e disse que deixaria a Mel aqui em meia hora. 

              Provavelmente foi a tia Luzia que ficou doente. É sempre ela que tem esses problemas e sempre minha mãe que à leva para o hospital. por isso eu já estou acostumada.             

Fui tomar banho enquanto esperava a Mel chegar. Coloquei meu pijama de ontem e quando eu saí do banheiro, o carro da mãe dela buzinou. Ela deu todas aquelas instruções de mamãe, tipo não abra a prota pra ninguém, e depois foi embora. É engraçado você escutar essas intruções da mãe da Mel, Tereza. Porque ela parece mais irresponsável que nós.           

_Então vamos bagunçar? - Eu sabia que ela viria com essa idéia na cabeça.           

_Você leva um tombo no treino e ainda tem pique pra bagunçar? - perguntei a ela enquanto ela fazia cara de indiferente. - Infelizmente não eu to muito cansada. Você já jantou?           

_Eu estava prestes a isso quando você ligou pra mainha. - Eram nove horas e a gente ainda não tinha comido.           

_Então você deu sorte porque minha mãe deixou pizza e eu sei que você ama.           

Coloquei a pizza no microoondas pra esquentar enquanto a Mel foi trocar de roupa. Comemos e depois fomos pra sala pra passar algumas músicas. Eu adoro a voz da Mel. É grave e enérgica. Tocamos algumas músicas, assistimos televisão até que deu meia noite e fomos dormir.          
              
11ª noite- 16 de março, sexta-feira

                 Abri meus olhos e estava no meio do quarto dele, como esta acontecendo ultimamente. Pensei na minha total mudança de pensamento sobre ele depois que o conheci melhor. É incrivel como você julga um livro pela capa. Então me lembrei que a Mel estava dormindo comigo lá no meu quarto. Ai meu Deus! Será que ela vai dar minha falta e fazer o maior escândalo?  Esse pensamento sumiu completamente da minha mente junto com todos os outros quando eu olhei pra o Naten e percebi que tinha alguma coisa errada.               

 Ele estava sentado na cama, dessa vez de pijama. Mas tinha acontecido alguma coisa, porque ele estava cabisbaixo e muito triste. Ver ele desse jeito me deu vontade de chorar.               

Corri pra perto dele e levantei o rosto dele para olhá-lo nos olhos. Parecia que ele tinha chorado. Abracei-o imediatamente com a maior força que pude, e ele me abraçou também, como se tivesse medo de me perder. Peguei o laptop que estava do lado dele e digitei. 

 _Naten o que aconteceu? Parece que você chorou horas.             

_É tão bom você estar aqui comigo agora. Ali, a minha mãe sofreu um acidente ontem à tarde. O carro dela bateu em outro carro e ela bateu a cabeça no volante e desmaiou. Eu queria muito vê-la mas me mandaram de volta pra casa e disseram que iria ficar tudo bem com ela. Ali, ela é a única pessoa que eu tenho no mundo todo. Se eu perdê-la, não sei o que vai acontecer comi - As lágrimas já caíam de novo do rosto dele quando eu tirei o laptop de sua mão.               

 _Hey,vai ficar tudo bem com ela, você vai ver. Não se preocupa, eu to aqui com você agora, está bem? Você também tem a mim e eu sempre vou estar com você não se preocupe.                

 Ele já começara a chorar outra vez quando eu o puxei e o acomodei nos meus braços. Ele  pegou minha mão direita a apertou o mais forte que podia enquanto eu o abraçava. De repente me deu vontade de chorar também. Eu podia sentir a dor dele. Me lembrei da minha dor quando perdi o meu pai em um acidente. De forma alguma eu queria que ele sentisse aquela dor. O abracei mais forte quando pensei isso.             

 Eu queria poder dizer várias coisas a ele, que tudo ia ficar bem, mas não adiantaria, até porque nenhuma palavra conseguia sair da minha boca. A única coisa que eu podia fazer era estar ali com ele, confortá-lo. Quando eu estava penteando o cabelo dele pra trás com os dedos, ele falou com a voz entrecortada :             

_Ali, you sing for me, please? - Entendi perfeitamente o que ele tinha dito, mas ainda sim fiquei sem responder nada.              

Como eu iria cantar para ele se nem conseguia falar? Naten repetiu o 'por favor' e não tinha como negar isso a ele. Enxuguei as lágrimas, me concentrei ao máximo para que minha voz saísse então comecei a cantar. Cantei quase sussurrando  The only exception, a primeira música que pensei naquele momento.              

Enquanto eu cantava para ele, percebi que na medida em que eu cantava ele ia se acalmando, até que quando eu terminei a música Naten estava adormecido.              

Fiquei alguns minutos com ele ali, em meus braços. Era estranho pensar nisso agora. Eu pensava que pessoas famosas tinham as pessoas que eles quisessem ao redor deles. Outra coisa que eu me enganara. A tristeza do Naten me fez perceber que ele estava sozinho mesmo. Acho que a fama só te trás dinheiro e popularidade.

Mas nas horas difíceis? Quem realmente vai estar do seu lado?

Foi nesse momento que percebi que ele realmente precisava de mim, e agradeci a Deus por ter esse dom e isso ter feito eu conhecer o naten. Não por mim, mas por ele. Finalmente eu tinha entendido o quanto era dificil pra ele.         

 Também prestei atenção nos estranhos sentimentos que passavam por mim quando eu estava ali com ele. Bem-estar, proteção, alívio, várias emoções boas que eu nunca sentia com outra pessoa.             Abri o laptop para ver a hora e percebi que dali a alguns minutos eu iria embora. Soltei a mão que ele segurava e o acomodei na cama, colocando a cabeça dele no travesseiro e puxando o cobertor para agasalhá-lho. Quando ele já estava deitado, eu contornei a cama e me abaixei e encostei minha cabeça na cama de modo que meu rosto ficasse na mesma altura e a alguns centímetros do dele. Quando fiz isso, ele abriu um pouco os olhos então eu o beijei na testa. Ele entendeu que eu iria embora então fechou os olhos de novo.           

Ali, com o rosto à centímetros do dele, percebi todas as emoções e sentimentos estranhos que passavam por mim quando eu estava com ele. Eu tinha me apaixonado por ele, pelo menino que à alguns dias era notavelmente detestável pra mim. Agora eu estava ali com esse sentimento totalmente desconhecido e sem saber o que fazer, porque eu só podia vê-lo uma hora por noite por causa de uma coisa inacreditável. E se essa coisa acabasse? As lágrimas ja caíam de novo enquanto eu me dava conta de que amava um garoto que ao mesmo tempo eu odiava.

A ironia disso chegava até a ser engraçada, mas eu não conseguia rir. E se eu não voltasse mais amanhã? E se eu nunca mais voltar e esses momentos e esse sentimento forem esquecidos?  Fechei meus olhos e deixei que o peso tomasse conta da minha mente enquanto me levava de volta.