O Aprendiz de Mago escrita por TaediBear


Capítulo 4
No qual Leo invoca seu espírito doméstico


Notas iniciais do capítulo

Espero que gostem do último capítulo do Aprendiz de Mago :3
Boa leitura!



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Matteo sentiu-se muito melhor depois de comer pão, ovos e bacon. De alguma forma, ele não sentia mais nenhum cansaço da caminhada pela Floresta das Lágrimas; pelo contrário, parecia que ele já estava sentado naquela mesma cadeira por horas. Sentia-se feliz, contente, todas as possíveis emoções boas invadiram seu corpo em um turbilhão. Ele levantou-se de uma vez, assustando o mago à sua frente e seu amigo ao seu lado. Sorria.

– Eu... – houve uma pausa. Os olhos verdes de Leo e os azuis de Noir observavam o garoto, que respirou o mais fundo que pôde. – Eu queria agradecer a vocês pelo que fizeram por mim e dizer que espero me dar muito bem com os dois.

Leo abriu um sorriso gentil, suas sardas ficaram ainda mais visíveis, já que suas bochechas enrubesceram levemente. O mago bufou e voltou a comer seus ovos. Com a boca cheia da massa do pão, ele disse alguma coisa – na verdade, grunhiu -, os meninos não puderam entender absolutamente nada e olharam atônitos para o homem.

– Não limpa a casa, fala de boca cheia. Você não era o mago mais respeitado de onde veio, certo? – replicou Leo, com um sorriso vitorioso na face.

Ele havia gostado de importunar aquele homem.

– Cale-se, fedelho – e Noir parecia ter se acostumado a esse fato. – Eu disse: “não se esqueça de falar com sua mãe, pirralho”.

Os olhos de Matteo arregalaram-se no mesmo instante: ele havia se esquecido completamente de sua mãe. Rapidamente, ele acenou com a cabeça para Noir e foi em direção à porta, despedindo-se. Leo foi atrás a fim de ir com seu novo amigo à casa onde ele crescera.

– O que vai dizer à sua mãe? – indagou quando já estavam um pouco mais distantes do Castelo Invisível. – Quero dizer, ele não é o mago mais responsável da região nem parece ser muito confiável. Além disso, o castelo dele fica na parte mais longínqua da Floresta das Lágrimas – ele dizia, fazendo gestos largos para expressar o quanto tudo aquilo poderia afetar a mãe de Matteo. – Você acha que ela vai deixar?

Matteo pareceu pensar por um momento. Realmente, aquela situação não era uma das melhores; mas o que ele podia fazer? Não havia outra alternativa. Não teria mais chance com os Magos Reais, muito menos queria tornar-se um simples encadernador. Ele queria ser um mago e fazer cadernos apenas para anotar feitiços e desenhar os mais belos seres da floresta, desde as pequenas fadas aos enormes gigantes que viviam nas Terras Longínquas.

– Se ela não deixar – ele respondeu após alguns momentos -, eu fujo de casa.

Estava decidido a enfrentar qualquer coisa.


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A Srª Legrant estava sentada à mesa, os braços cruzados em frente ao peito. Matteo e Leo estavam à sua frente, cada um em uma cadeira. O olhar de Matteo era desafiador, assim como o dela. Leo assistia surpreso à discussão dos dois.

– Você sabe se esse mago é confiável, Matteo? – ela perguntou mais uma vez. Leo havia perdido a conta de quantas vezes ela fizera a mesma pergunta.

– Ele é confiável, sim. O castelo dele é muito bem protegido por um feitiço de invisibilidade e ele tem um quarto a mais, onde eu posso ficar.

– Mas ele não tem nenhuma ligação com a família real, como vou saber se você está realmente bem? É muito longe daqui, eu vou sentir saudades, meu bem – ela disparava as palavras uma atrás da outra. Em pouco tempo, estava soluçando e grandes lágrimas caíam de seus olhos até a mesa.

Leo assustou-se em ver aquela mulher - tão forte e desafiante momentos atrás – desabar em um choro alto e doloroso. Matteo ergueu-se, um sorriso cândido nos lábios finos. Aproximou-se de sua mãe e abraçou-a desajeitadamente, já que ela se recusava a retirar as mãos do rosto. O garoto acariciou os cabelos lisos e compridos dela e sussurrou-lhe:

– Eu prometo mandar notícias minhas por magia, vir lhe visitar de vez em quando. Não chore. Vamos, eu vou ficar bem – ele puxou os pulsos da mulher com força e encarou-lhe os olhos verdes. – Quando eu me tornar um verdadeiro mago, lançarei fogos de artifício ao céu, que formaram o seu nome. A senhora saberá quando acontecer e ficará orgulhosa de mim.

A Srª Legrant fungou e agarrou o corpo do garoto, apertando-lhe num abraço forte.

– Eu já sinto muito orgulho de você, meu filho. O melhor garoto do Reino de Bronze inteiro – ela soluçou um pouco mais alto. – Vou deixar a janela aberta sempre para facilitar quando você me mandar um aviso.

Os dois riram, choraram e se abraçaram muito mais, despedindo-se entre soluços e afagos. Ao fim da tarde, Matteo e Leo voltavam à Floresta das Lágrimas.


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Naquela noite, Matteo dormiu em um quarto apertado, livros de todos os tamanhos cercando-o, ninando-o, enquanto ele olhava fixamente para o teto branco. Aquele não era seu quarto, era muito diferente. A cama era pequena demais, mal cabia seu corpo; havia uma janela ao lado dela, e o vento frio da Floresta das Lágrimas adentrava por ela.

Ele podia ouvir, em algum canto da casa, Noir dormir ruidosamente, e aquilo, de alguma forma, dava-lhe uma sensação de paz, pois sabia que, ao acordar na manhã seguinte, seria um aprendiz de um mago negro e, também, que daquela vez seria diferente. Os barulhos da Floresta das Lágrimas também o acalmavam; o murmurar do Rio Lacrimoso tão distante, mas também tão próximo, o tilintar das fadas que faziam ninhos pela casa do mago, as palavras incompreensíveis aos ouvidos humanos das Árvores Sussurrantes, tudo acolhia Matteo, como se criasse uma zona de conforto especialmente para ele.

Aos poucos, foi fechando os olhos, sentindo as pálpebras pesarem-lhe. Em algum momento, ele caiu num sono profundo, marcado por sonhos sobre palavras ágeis, livros e magia.



– Matteo. Matteo! – uma voz o chamava distante. Conhecida e insistente, ela penetrava seu subconsciente e, paulatinamente, o trazia de volta à realidade. – Matteo!

Dessa vez, o garoto abriu os orbes da cor de esmeralda e focou quatro olhos castanhos sobre si. Havia duas pessoas ali, idênticas, mas o estranho era que elas eram desfocadas, como se não existissem. Matteo piscou e piscou mais uma vez, até descobrir que na verdade era apenas uma pessoa: Leo olhava-o de cima, uma expressão cansada no rosto.

– Dorminhoco! Sabe que horas são? – indagou o garoto, irritado.

Matteo olhou pela janela. Bem, pelo menos ainda era de manhã.

– São nove horas! – disse Leo, ainda mais irritado. – Está na hora de acordar e começar a trabalhar. Como quer se tornar um mago se só quer ficar dormindo?

Nove horas? Mas isso não era cedo? Quando morava com sua mãe, costumava acordar às onze horas, e se ela o chamasse.

Preguiçosamente, ele jogou os pés para fora da cama e tocou o chão de madeira frio da casa. Seus lábios partiram-se em um bocejo. Leo já havia descido – Matteo ouvira quando ele bateu a porta e pisou firme nos degraus da escada. O garoto levantou-se e vestiu a primeira roupa que encontrou em sua mala.

Ele andou até o andar inferior, sonolento, ainda tentando recuperar-se do tentador sonho que tivera sobre a floresta. Leo estava à mesa, lendo uma carta. Matteo sentou-se à sua frente.

– Ora – exclamou Leo. – O dorminhoco já tem sua primeira tarefa.

Matteo puxou a carta da mão do outro e leu-a enquanto bocejava. Estava escrito:

“Pirralho, aqui está sua primeira tarefa. Quero que a complete antes do almoço, se conseguir levantar da cama. Vá até a Floresta das Lágrimas e consiga algumas venenomoras. Não pegue nem pouco nem muito, pois elas estragam. Noir”.

Matteo olhou para Leo, para a carta e depois para Leo novamente, aparentemente confuso. Aproximou-se do outro garoto e mostrou o papel a ele. Leo disse que já havia lido.

– Você entendeu o que tenho que fazer? – indagou, à espera de uma resposta positiva.

– Claro. Você tem que colher venenomoras – disse o óbvio.

– Ah, claro – Matteo falou, sem jeito. – Leo, o que são venenomoras?

O garoto olhou para ele estupefato. O que eram venenomoras? Que tipo de pessoa era ele que nem mesmo conhecia as frutas venenosas da Floresta das Lágrimas? Como ele havia chegado até aquele ponto em que se encontraram na floresta sem nem mesmo saber o que ele poderia ou não comer?

– São... São frutas venenosas, parecidas com amoras – respondeu, sem saber se deveria perguntar-lhe todas as dúvidas que lhe vieram à cabeça ou simplesmente esquecer.

Matteo fez um som de “aah” longo, a fim de mostrar ao seu amigo que finalmente havia entendido o que devia fazer. Como era um garoto da cidade, Matteo não conhecia metade das plantas e animais fantásticos da Floresta das Lágrimas, o máximo que ele conhecia eram as pixies e as fadas, sobre as quais lera em alguns livros. Todavia, como pouquíssimas pessoas se aventuravam pela floresta, boa parte de suas maravilhas era desconhecida.

– Não se preocupe. Eu posso te ajudar na primeira tarefa – na verdade, Leo era o mais preocupado, pois, se Matteo não sabia nem o que era uma venenomora, imagine o que poderia acontecer com ele.

Após um café da manhã apressado, os dois aprendizes deixaram o Castelo Invisível em direção a uma das áreas centrais da floresta. O Rio Lacrimoso estava tão próximo a eles que conseguiam ouvir o canto das ninfas aquáticas que viviam nele. Não muito longe, eles avistaram um arbusto baixo, mas enorme, carregado de frutinhas pequenas, amontoadas e negras, como amoras. Matteo puxou um cacho.

– Essas são as venenomoras? – perguntou, observando cautelosamente a fruta, tentando distingui-la das verdadeiras amoras.

– Depende – Leo respondeu e puxou-a da mão do garoto. – Se a molharmos e ela soltar um líquido negro e viscoso são venenomoras; se não, vai ser um complemento para o seu café da manhã.

Matteo sorriu e puxou mais um cacho do arbusto. Puseram-nos em uma pequena cesta que o aprendiz havia encontrado na casa de seu mestre e saíram em direção ao Rio Lacrimoso.

O rio localizava-se ao centro da Floresta das Lágrimas e possuía esse nome por causa de uma lenda. Contava-se que, no início, não havia águas correntes na floresta. No entanto, quando o povo mudou-se para a região e o primeiro rei foi nomeado, uma prisão ao norte foi construída, o Castelo dos Espinhos. As famílias dos prisioneiros eram proibidas de ir àquele lugar e o máximo que podiam caminhar era até a metade da floresta. Das lágrimas das esposas solitárias, das mães desoladas e das filhas abandonadas, nasceu um rio triste e sofrido, o Rio Lacrimoso.

Matteo e Leo conheciam a história e, quando aproximaram-se do local, fizeram silêncio em respeito às lágrimas do povo. Contudo, no instante em que eles baixaram as cabeças e fecharam os olhos, um urro foi ouvido a uma curta distância; não era dor ou sofrimento, mas um grito de guerra.

Leo, mais rápido, girou nos calcanhares e viu-se encarando um trog enorme. Os olhos amarelados e saltados observavam os dois em fúria, a boca que ia de um lado da sua cara de sapo até o outro abriu-se e outro urro deixou-a, saliva saltou de sua boca e atingiu os rostos dos garotos.

Em poucos segundos, os aprendizes estavam correndo e a besta com sua clava de madeira cheia de espinhos acima da cabeça dava passos pesados atrás deles.

– Leo, você não conhece nenhum feitiço que nos ajude em um momento desses? – gritou Matteo em desespero, os olhos suplicando pela confirmação do garoto.

– Acho... Acho que sim – Leo respondeu –, mas eu nunca o usei na prática.

– Que essa seja a primeira vez!

Então, Leo deu dois passos mais largos à frente e parou poucos metros mais adiante que Matteo. O aprendiz respirou fundo a fim de acalmar-se e começou a pronunciar as palavras ágeis dos magos. A boca movia-se rápido, e o feitiço fluía mais veloz que a corrida do trog em direção a eles. E, após um estalar de dedos, um rugido preencheu a falsa paz da floresta. Em frente a eles, havia um leão maior que qualquer outro.

Matteo virou-se para Leo a tempo de ver um medalhão materializar-se nas mãos do garoto. Aquele animal era o espírito doméstico de Leo.

A clava do trog baixou-se em direção ao leão, mas não chegou a atingi-lo. A besta cravou os dentes na arma e jogou para fora do alcance do monstro. A fera rugiu novamente; o trog urrou. Leo correu em direção ao seu espírito e pulou em suas costas, o medalhão seguro em sua mão direita, as palavras rápidas deixando seus lábios.

Houve um clarão, e Matteo fechou os olhos. Depois, não havia leão nem trog. Os aprendizes trocaram olhares.

– Você... Você conseguiu... – Matteo murmurou enquanto um sorriso lentamente roubava-lhe os lábios. – Você conseguiu!

– Finalmente! Eu consegui invocar um espírito doméstico finalmente! – o outro garoto exclamou contente. Ele dava pulos altos enquanto comemorava.

Os dois riram, comemoraram e pularam até pouco antes do almoço, quando voltaram para o Castelo Invisível com um carregamento nem muito grande nem muito pequeno de venenomoras. Noir estava sentado à mesa, mexendo com líquidos coloridos e algumas raízes peludas. Matteo jogou-se na cadeira à frente dele.

– Ei, mestre, você acha que eu ainda vou demorar muito para conseguir invocar um espírito doméstico? – indagou com um sorriso largo no rosto enquanto colocava a cesta de venenomoras sobre a mesa de madeira.

– Quem sabe – o mago murmurou sem ouvir realmente a pergunta de seu aprendiz. Seus olhos de azul único estavam concentrados somente nos ingredientes à sua frente. – Pegue um pouco de liquácido para mim.

Matteo olhou para a estante para a qual Noir havia apontado e assustou-se com a quantidade de frascos que havia ali. Voltou-se para o mestre.

– O que é liquácido?

Noir meneou com a mão e uma garrafinha cheia até a borda de um líquido verde-limão flutuou até onde ele estava.

– Isso é liquácido – respondeu. – É o que resulta da mistura de gotas de limão com água e ácido retirado de algumas raízes das Árvores Secas. Se não sabe nem o que são os ingredientes para as poções, como quer se tornar um mago, pirralho?

Matteo observou atentamente a sala ao seu redor, os livros, as poções, os ingredientes e, principalmente, o mago. Sorriu.

– Não sei, mas vou me esforçar – respondeu simplesmente.

Noir não demonstrou nenhuma emoção, apenas abaixou sua cabeça novamente para os líquidos coloridos. Matteo podia não ser o melhor aprendiz de mago, mas, pelo menos, parecia ser um bom garoto.



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Notas finais do capítulo

Quanto tempo eu não apareço, haha. Peço desculpas primeiro, por nunca mais ter postado nada. Minha conta estava com alguns problemas, mas eu já resolvi tudo. Agora, algum review, opinião ou crítica construtiva?
Obrigada por ler.
Até a próxima história do Povo Colorido: A Flautista e O Dançarino! ♥
Takoyaki ~ Bolinho de Polvo!



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