Permanecia sentado no canto da cama. As costas escoradas na quina da parede, pernas encolhidas, cotovelos apoiados nos joelhos e as mãos unidas apoiando a cabeça... Os olhos fechados, respirando pesadamente. Tentava afastar as lembranças de sua mente, porém não parecia capaz disso.

As lembranças eram como fantasmas que vinham lhe assombrar, e a vontade de chorar lhe parecia cada vez maior, porém se recusava a fazê-lo... Não queria se entregar assim. Prometeu que não o faria. Pensava no que Jasmine diria, e assim se via cada vez mais envolvido por todas aquelas memórias.

"Ainda com o coração aprisionado, temendo tudo

Até onde eu devo ir?"

Pretendia passar a noite ali, sozinho em seus devaneios, porém um barulho alto vindo do quarto ao lado chamou sua atenção. Levantou a cabeça perguntando-se o que seria aquilo, e logo outro barulho. Levantou-se em um pulo e correu até o quarto do amigo, abrindo a porta de uma vez:

— Kamijo?! – sua voz acabou parecendo ainda mais alta por causa do horário, ecoando por todo o quarto.

Seus olhos caíram sobre os cacos de vidro espalhados pelo chão. Reconheceu logo os destroços do boneco que Kamijo ganhara de uma fã na França... Era algo que o loiro sempre levava consigo em todas as turnês. Olhou então para o vocalista que permanecia agachado com a cabeça baixa e uma das mãos sobre um porta-retrato quebrado:

— Hei... – chamou com uma voz manhosa se aproximando do outro e deixando a mão cair sobre seu ombro. – O que aconteceu?

Não houve resposta. Apenas pode ouvir o baixo choro do loiro que apertou com mais força o porta-retrato, fazendo com que os cacos de vidro cortassem sua mão. O moreno então levou a mão livre até o porta-retrato, que só então percebeu ser tão familiar... Sim, ele também estava naquela foto. Fora tirada em Yokohama, para onde foram a pedido de Jasmine poucos dias antes de sua partida. Eles a tinham tirado dentro do carro mesmo, já que a saúde do baixista não estava bem... Mesmo assim eles tinham se divertido juntos naquele dia:

— Não se machuque assim, Kamijo... – disse puxando seu braço. – O que o Jasmine vai pensar disso?

— Yuki... – o loiro sussurrou. – Se tivéssemos sido mais cuidadosos... Será que ele ainda estaria aqui?

“Não posso mais caminhar...”

— Mas ele está aqui. – respondeu com firmeza. – Você mesmo disse não foi?

— Sabe muito bem que não estou falando disso.

— E de que adianta pensar nisso agora?

Kamijo começou a chorar mais pesadamente deixando Yuki completamente perdido... O moreno nunca fora muito bom com as palavras e não sabia ao certo o que fazer, mas ver o outro daquele jeito o machucava:

— Não havia nada que pudéssemos fazer... E ficar aqui chorando não vai ajudar em nada.

Por fim Yuki se levantou puxando Kamijo consigo:

— Anda, vem lavar essa mão ou esse corte pode acabar infeccionando.

Kamijo fora praticamente arrastado pelo moreno, que o levou até a pia e lavou sua mão cuidadosamente. O loiro deu um leve puxão quando a água tocou o corte, provocando uma leve ardência, mas logo deixou que Yuki continuasse:

— Está doendo? – o moreno perguntou, doce como sempre era, e Kamijo apenas negou com a cabeça. O que ambos sabiam muito bem ser mentira. – Você devia tomar mais cuidado. Jasmine te daria uma bronca por isso.

— Ele vai me dar... – Kamijo sussurrou. – Assim que eu pegar no sono.

“Sonhe, pois nos sonhos nós podemos nos encontrar.”

— Mas não é bastante... Não é?

Yuki também conhecia bem aquele vazio. Por mais que acreditasse com todas as forças que o baixista sempre estaria ali com eles, isso nunca fora o suficiente pra sufocar a dor. Simplesmente saber que ele estava ali não bastava... Ele queria ver Jasmine... Queria tocá-lo, abraçá-lo e ouvi-lo dizer qualquer bobagem, e por mais que tentasse parecer forte para apoiar os colegas ele mesmo mal podia se manter erguido.

Lembrava-se das doces palavras de seu querido amigo...

“Se eu não fosse membro do Versailles, eu nunca teria tido a oportunidade de vir para a América. Muito obrigado por todo o apoio.”

Será que ele não percebera que eram eles que deveriam agradecer por ter uma pessoa tão incrível e um músico tão admirável ao seu lado? O baterista queria ser capaz de voltar no tempo pra dizer a ele o quanto ele era importante... Pra dizer que jamais haveria Versailles sem Jasmine You.

As lágrimas finalmente vieram e seus olhos se fecharam para sofrerem em silencio, como sempre fazia. Mas ele não estava sozinho... Sentiu os braços de Kamijo o envolvendo e deixou-se apoiar neles:

— Não... – o vocalista disse baixinho. – Não é o bastante, porque uma hora temos que acordar.

“Desaparecerá cruelmente mais uma vez.

Sim, como uma estrela cadente...”

Ficaram ali abraçados, consolando um ao outro, até que um alto ronco pode ser ouvido vindo do estômago de Kamijo. Yuki sorriu levemente daquilo afastando o abraço e segurando a mão do loiro:

— Só porque estamos deprimidos hoje não quer dizer que você tenha que passar fome...

Kamijo abaixou a cabeça, levemente corado, e seguiu Yuki até a cozinha, após esse enxugar as lágrimas de ambos os rostos. A grande surpresa de ambos foi encontrar Masashi no restaurante do hotel, sentado sozinho com um copo de wisky na mão:

— Masashi? – Yuki chamou um tanto confuso. – O que está fazendo aqui há essa hora?

— É que estão todos muito agitados hoje... – o baixista respondeu com um tímido sorriso deixando os outros dois meio sem graça.

— Desculpa. – Kamijo pediu se curvando rapidamente para o amigo lembrando-se do barulho que fizera quebrando suas coisas. – Eu te acordei?

— Ah, não se preocupe, eu já estava acordado.

— Por quê? – Yuki perguntou um tanto surpreso sentando-se ao lado de Masashi e sendo logo imitado por Kamijo.

— Eu só estava pensando... – Masashi parou um pouco analisando o rosto dos outros dois e por fim resolveu continuar. – No Jasmine-san.

— Ah... – Yuki desviou o olhar, levemente constrangido.

— Foi mal, Masashi. – Kamijo respondeu com um meio sorriso. – Nós não devíamos fazer um alvoroço tão grande por causa disso.

— Não é isso. – Masashi logo o cortou. – É só que... – ele parou sem ter certeza se devia continuar.

— O que foi, Sashi? – Yuki perguntou colocando a mão sobre as do baixista.

—É estranho... – Masashi sorriu com as bochechas levemente coradas, mas achou melhor se abrir logo com os amigos. – Pouco depois de eu entrar na banda como membro oficial eu sonhei com o Jasmine-san.

Yuki e Kamijo pareciam realmente surpresos com aquilo, mas não interromperam. Depois de analisar rapidamente suas reações o baixista continuou:

— Ele me pediu pra sempre apoiar vocês e então eu tenho tentado fazer isso... Mas agora eu não sei ao certo o que fazer... Não importa o que eu diga, isso não irá afastar a dor, não é?

Kamijo levou as mãos ao rosto chorando descontroladamente. Yuki o puxou para mais perto de si forçando-o a apoiar a cabeça em seu ombro enquanto tentava esconder suas próprias lagrimas abaixando a cabeça. Masashi por sua vez permanecia de cabeça baixa apertando as mãos sem saber ao certo o que fazer, mas querendo de alguma forma encontrar um jeito de aliviar quatro corações que lhe eram tão queridos:

— É melhor eu dar um jeito nisso. – Masashi disse um pouco mais alto do que pretendia, talvez para tentar afastar aquele clima de velório, e por mais que lágrimas ameaçassem escorrer por seu rosto, ainda sorria docemente. – Afinal de contas, ele deve estar na estrela do Versailles me observando agora e não quero decepcioná-lo.

“Aquela luz brilhante é você

As lágrimas envolvem o céu noturno.”

— Eu não sei bem o que fazer... Mas eu me lembro que vocês sempre falavam do quanto o Jasmine-san amava o céu, então, eu acho que ele deve estar lá olhando pra vocês agora, e ele vai ficar triste se todos estiverem chorando. – Masashi disparou a falar sem ter muita certeza do que estava fazendo. Só queria que de alguma forma aquelas lágrimas cessassem. – Por isso devíamos ir todos lá pra cima, pra ficarmos mais perto do céu, onde ele está. O Teru e o Hizaki já estão lá faz um tempo... O Jasmine-san deve estar esperando por vocês... Então... Por isso...

— Masashi! – Yuki chamou sua atenção fazendo-o parar seu enorme discurso que já estava perdendo o rumo.

Masashi sempre fora muito atrapalhado e falava demais quando estava nervoso, mas com certeza era o ser mais gentil da face da Terra. Yuki pensou que nesse aspecto ele era mesmo muito parecido com Jasmine... Sorriu então docemente para o baixista colocando a mão sobre a sua, um tanto agradecido por ele estar ali:

— Obrigado.

— Então vamos. – Kamijo disse já se levantando da mesa e enxugando as lágrimas. – Vamos até onde o Jasmine está.

— Coma alguma coisa antes, Kamijo... – Yuki lembrou meio bufando. – O Jasmine não vai achar bom se você aparecer morto de fome.

— Nesse caso eu vou na frente. – Masashi disse sorridente como sempre. – Tenho que arrumar umas coisas.

O baixista logo se foi deixando Kamijo e Yuki para trás, mas diferente de quando chegaram ali, ambos agora tinham algo grandioso dentro de si... Algo chamado esperança.

“Transformando-se na chave para o coração,

Abre a porta trancafiada.”