Metamorfose escrita por Mia Elle


Capítulo 14
Capítulo XIII


Notas iniciais do capítulo

Hey, obrigada vocês que estão comentando, e me desculpem pela demora na atualização.



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“There was little we could say, and even less we could do
To stop the ice from getting thinner under me and you.”

- The Ice Is Getting Thinner – Death Cab For Cutie

Frank abriu a porta da casa para o pai – a chave dele já não funcionava, visto que a fechadura fora trocada após ele deixar a casa. Decidira que seria melhor se ele acompanhasse o homem até dentro de casa, pois não sabia como sua mãe estava. A tia deveria ter estado com ela até pouco tempo atrás, mas a essas horas já havia voltado para sua própria casa. O homem seguiu-o até o segundo andar, onde se dirigiram ao antigo quarto do casal. Após acender a luz – e ouvir um baixo resmungo – Frank constatou que a mãe estava na cama, provavelmente dormindo. Ainda.

- Mãe? – chamou, recebendo outro resmungo como resposta. Caminhou em direção a cama e sentou-se na beirada da cama, puxando as cobertas de cima da mulher – Mãe, eu trouxe alguém que gostaria de ver você.

Meio lentamente, ela se apoiou sobre os cotovelos, erguendo os olhos para ver quem era. Assim que focalizou o marido, pareceu nem sequer respirar. Os dois permaneceram se encarando durante algum tempo, sem nem piscarem os olhos, até que Frank levantasse-se de seu lugar.

- Bem, eu vou deixar vocês conversarem – e atravessou o quarto rapidamente, dando um leve empurrão no pai assim que passou por ele.

Esperava, sinceramente, que os dois se resolvessem de alguma forma. Se não fossem voltar com o relacionamento, que ao menos decidissem assim, para que Linda pudesse voltar a viver. Desceu os degraus da escada de dois em dois degraus, dirigindo-se ao lado de fora para falar com Gerard. Esperava que o mais velho não tivesse ido embora, visto que gostaria de agradecer a ele por ter o acompanhado até o hotel. E perguntar o que ele tanto queria falar com ele. Mas algo lhe dizia que o mais velho não estaria mais ali, visto que vivia fugindo das conversas dos dois, ainda que as procurasse depois. Parecia que gostaria de dizer alguma coisa, mas não conseguia.

Então qual não foi a surpresa do pequeno ao constatar que o carro de Gerard continuava estacionado embaixo da árvore do outro lado da rua. Atravessou a rua rapidamente, inclinando-se sobre a janela do motorista – que Gerard abrira – para falar com o garoto.

- Eles estão conversando – disse.

- Que bom.

- Escute, queria dizer obrigado por, sabe? Me acompanhar e tal. Se você não estivesse comigo eu estou certo de que acabaria não fazendo nada.

Gerard assentiu. Estava nervoso. Queria arrancar o carro e se arrependia profundamente de já não ter feito isso. Sentia que Frank lhe faria aquela maldita pergunta a qualquer momento.

- Mas então, o que queria falar comigo?

Droga.

- Bem, uh. Está tarde, a gente se fala depois – e girou a chave na ignição, acelerando o automóvel em seguida.

Frank teve de ser rápido para sair do caminho do carro. Ficou observando-o sumir na esquina e se perguntando por que Gerard tinha de ser tão misterioso às vezes. O que ele não daria pra saber o porquê de tudo isso. Dando nos ombros, tateou o bolso da calça, pegando um cigarro e acendendo em seguida. Queria dar mais tempo para que os pais conversassem, e fumar era um bom modo de passar o tempo.

Depois que o cigarro acabou, ele foi jogado na calçada e amassado com a ponta do tênis. Então Frank, achando que já havia dado tempo suficiente – e se não, bastava ir para seu quarto – abriu com cuidado a porta da frente, observando que a casa estava silenciosa. Bem, ao menos eles não estavam discutindo aos gritos. Subiu as escadas, cuidando para não fazer barulho. Não queria atrapalhá-los. Mas ao mesmo tempo, não deixava de estar curioso sobre o que eles haviam decidido. Queria ver a mãe bem, mas também queria estar o mais longe possível do pai, pois sabia que as pessoas não mudavam assim, de uma hora para outra. Ele continuaria sendo o maior canalha de todos, ainda que fingisse não ser. E esse fingimento acabaria logo: dois ou três meses, talvez.

Devagar, passou pela porta de seu quarto e foi até o quarto dos dois, que tinha a porta aberta. Parou no batente da porta. Eles conversavam em tom de voz normal. Linda estava sentada na cama, com cara de quem havia chorado um tanto, e Frank segurava suas mãos. Eles tinham se resolvido, enfim.

Dando um suspiro exasperado, e alto demais, ele começou a virar as costas, pensando nas conseqüências daquilo.

- Frank – ouviu a voz da mãe, virou-se rapidamente em resposta ao chamado – não ouvimos você entrar. Venha cá, sim?

O pequeno acenou com a cabeça, caminhando em direção aos pais. Parou na parede paralela a cama da mãe, escondendo as mãos nas costas. Deixou seu peso apoiar-se na parede e fez sinal para que eles falassem.

- Querido – a mãe começou, virando-se levemente na cama para observar o menino, soltando, assim, as mãos do marido – eu e seu pai estávamos conversando.

Frank sentia-se extremamente feliz por saber que agora ela estava falando como uma pessoa normal. A melhora era palpável: ela parecia até ter ganhado cor. O menino estava certo ao pensar que o motivo de tudo aquilo era o pai. Depois de uma pausa, ela prosseguiu:

- Primeiro, nós queríamos agradecer a você. Por que se você não tivesse falado por mim aquele dia, ou hoje, novamente, nós nunca teríamos tido essa conversa – ela sorriu quase que imperceptivelmente e lançou um olhar para o marido, como se pedisse para que este continuasse a falar.

O homem pigarreou.

- Bem, conversamos muito, e decidimos que eu voltarei a viver nessa casa – ele disse, um certo tom de orgulho em sua voz grossa, como a do filho – mas filho, tem algumas coisas que eu gostaria de falar com você.

Ótimo. Provavelmente mais uma conversa sobre como gostar de garotos pode ser abominável. Frank ergueu as sobrancelhas, desconfiado, porém fez sinal para que o pai prosseguisse.

- Bem, naquela noite... – ele fez uma pausa, como se não quisesse falar sobre o assunto – você disse algumas coisas sobre... você.

- Sobre eu gostar de outros meninos – Frank o cortou – sim.

- Então estava falando sério? – seu tom foi um tanto assustado, de modo a fazer o pequeno rir.

- Sim pai, estava falando sério. Tão sério quanto o senhor quando disse que, por esse motivo, tem vergonha de ser meu pai – concluiu.

O homem permaneceu em silêncio, encarando Frank com uma certa raiva no olhar, o que fez com que Linda interferisse na conversa.

- Escute, filho, eu conversei com seu pai. Disse que já sabia de tudo e que nós já havíamos conversado sobre isso – ela fez uma pausa, encarando o marido – disse que eu não via absolutamente problema nenhum com isso, e que eu continuava a te amar da mesma forma. Disse que ele devia fazer o mesmo.

O homem levantou os olhos para a mulher. Frank ergueu as sobrancelhas, um tanto desconfiado, algo ali lhe dizia que não ia sair tudo tão bem quanto ele desejava.

- Bem, eu, de certa forma, concordo com a sua mãe – o pai disse, meio desconcertado, erguendo os olhos para o filho – mas pretendo impor algumas restrições aqui. Não quero garotos nessa casa, não quero você nesses bares e boates.

Frank gargalhou.

- Se fossem garotas, você provavelmente gostaria de conhecer todas “olhem, amigos, meu filho é realmente um pegador, ele já comeu a vila inteira” – ele imitou a voz do pai ao dizer isso, depois riu mais um pouco – e se não se tratasse de boates gays, provavelmente estaria tudo ok.

O homem ergueu uma das sobrancelhas.

- Sem dúvidas.

Frank deixou o queixo cair. Achava que ele não admitiria isso. Dando nos ombros, respondeu:

- Então você, basicamente, me pede para que eu me torne heterossexual, e isso, sinto-lhe informar, não vai acontecer – fez uma pausa, ficando de pé novamente – eu sou gay. Gosto de garotos. Você não pode me mudar. Ponto.

Dizendo isso, virou as costas, pretendendo voltar ao seu quarto. Pelo jeito estava chegando a hora que ele deveria deixar essa casa. Ignorando os gritos de seu pai – algo como: “não sobre o meu teto” – ele bateu a porta do quarto. Exasperado, jogou-se na cama. Ficou a encarar o teto, pensando em Gerard, novamente. Não conseguia tirá-lo de sua cabeça. Julian, sem dúvidas, teria sido capaz de fazê-lo esquecer o maior, se este não ficasse dando motivos para Frank pensar nele.

Sabe, ele realmente gostava de Julian. Era um cara muito legal, eles tinham muitas coisas em comum. Porém Gerard sempre seria seu ponto fraco. Se Julian tivesse aparecido na época em que ele e Gerard nem se falavam, seria perfeito. Mas não, o outro aparecera bem agora, quando Gerard parecia ter mudado tanto. E, embora fizesse algumas coisas erradas ainda, ele parecia estar se esforçando para ser amigo de Frank. Ou mais do que isso.

E era isso que o incomodava. Enquanto o mais velho ficasse dando a entender estar interessado em Frank, seria impossível que ele o esquecesse. E nessa, ele provavelmente acabaria jogando Julian, que era um cara realmente legal e parecia gostar dele, fora. Balançou negativamente a cabeça. Ele não podia fazer isso, mas também não podia evitar. Ele se sentia bem com Julian, mas não conseguia parar de pensar como seria se fosse Gerard. Com medo de machucar o outro demais, decidiu que terminaria com este. Não sabia se era a coisa certa a fazer, mas era o que sentia vontade de fazer agora.

Como se por telepatia, o celular de Frank começou a tocar naquele momento. Enfiou as mãos no bolso da blusa, para ler o Julian Chamando no visor. Se sentindo meio estranho, atendeu.

- Alô.

- Hey, Frankie – ele disse, bastante animado – está tudo ok?

- Não muito – confessou, virando-se na cama para ficar mais confortável.

- Algo com aquele cara? – Julian perguntou, o tom de sua voz ficou preocupado instantaneamente – o que ele queria, afinal?

- Não sei, ele não disse – respondeu – mas não, não é nada com ele. É só meu pai. Ele e minha mãe resolveram voltar, e agora ele quer me proibir de ser... eu.

- Eu sabia que você não devia ter dito nada a ele – disse, com tom de quem diz “eu avisei”.

- Não é por isso, uma hora ele teria de saber, não é? Mas não sei que eu faço quanto a ele agora – confessou.

- Bem, se quiser conversar sobre isso, podíamos sair qualquer dia – convidou, novamente.

- Por mim está ok – respondeu prontamente, pensando que se fosse terminar com ele, era melhor que fosse pessoalmente.

- Quando, então? Amanhã talvez?

Frank ofegou. Amanhã era muito perto, ele precisava se preparar, nunca fora realmente bom em terminar relacionamentos.

- Hm, amanhã e sábado eu terei que trabalhar na Saint Martin. Domingo, talvez?

Julian concordou e, depois de marcarem hora e local, desligaram o telefone. O pequeno ainda sentia-se mal. Julian estava realmente preocupado com ele, mas ele não podia evitar, não podia machucá-lo mais. Levantou-se da cama a fim de tomar um banho.

Assim que o carro de Gerard virou a esquina da casa de Frank, a autocondenação começou. Ele sentia-se idiota por não conseguir dar o braço a torcer para Frank. Ele estava certo do que sentia, mas seu grande e gordo orgulho se aliara a vergonha agora, e ele simplesmente não podia dizer a verdade e trair a si mesmo. Mas isso fazia com que ele se sentisse lixo. Será que valia a pena mentir para os outros, e, conseqüentemente para si mesmo, apenas por orgulho, se isso o fazia sofrer, na verdade? Bem, é claro que não valia a pena, mas convencer a si mesmo disso era realmente difícil, de modo que a cabeça de Gerard voltou a ser a mesma bagunça que era a poucos dias atrás, porém agora por outro motivo.

Dirigiu quase sem ver o caminho, mas ainda assim não se deixou descuidar. Estacionou o carro e subiu os degraus da garagem ainda sem prestar atenção no que fazia e só foi acordar dos sues devaneios quando esbarrou em alguma coisa. Ergueu os olhos, assustado, para dar de cara com o irmão, um copo de suco vazio na mão, e seu antigo conteúdo manchando a camiseta de laranjado.

- Desculpe, Mikey, não te vi – disse, prontamente, não sabendo ao certo a reação que o irmão teria.

Michael apenas passou de leve a mão pela camiseta, fazendo uma careta. Depois pousou o copo na mesa, tirando a vestimenta encharcada.

- É claro que não me viu, estava pensando naquele garoto de novo – disse como quem fala algo óbvio – agora vamos, pegue um pano limpo na lavanderia antes que a mamãe veja essa bagunça.

- Eu não estava pensando em Frank! – respondeu, visto que nem ao menos ouvira as ultimas palavras do irmão.

Michael não respondeu. Apenas ergueu uma das sobrancelhas e disse:

- Se não quer limpar o chão, então vá buscar outra camiseta para mim. Estou com frio – pontuou.

Gerard suspirou, sabia que era inútil tentar discutir com o mais novo, até por que ele estava mesmo certo. Ele estava mesmo pensando em Frank. Droga, como ele fazia isso? Por que ele não herdara esse gene que dava o dom de saber o porquê de tudo? As coisas seriam bem mais simples desse modo. Acenou com a cabeça e foi até o andar de cima buscar uma camiseta limpa para o irmão. O quarto de Michael estava uma nojeira – como sempre. Os quartos dos garotos eram os únicos lugares da casa que Donna já desistira de manter milimetricamente limpos e arrumados, por que era impossível, já que eles conseguiam criar um lixão no recinto em cinco minutos.

Quando voltou ao térreo, o irmão estava terminando de limpar o líquido do chão. Esperou um instante até que ele se pusesse de pé para poder entregar a camiseta a ele.

- Obrigado – Michael disse, virando as costas para a lavanderia, segurando a camiseta em uma mão e o pano sujo em outra. Gerard ficou observando-o ir, mas ele parou a dois passos da porta, como se tivesse lembrado alguma coisa.

Virou-se rapidamente em direção a Gerard e puxou o ar para dizer alguma coisa. Lá vem.

- Olha, Ger, eu acho que você devia ser menos teimoso e orgulhoso. Você pode estar perdendo a sua chance de ser feliz, sabe – disse, sem se mexer muito no lugar.

- Do que está falando? – Gerard indagou, fazendo-se de desentendido, ainda que soubesse muito bem do que Mikey falava.

O irmão o encarou sem expressão nenhuma por um momento antes de lhe virar as costas e voltar ao que estava fazendo.


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Notas finais do capítulo

Atualizo assim que possível.
Estamos chegando ao final da fic, apenas mais 4 capítulos por vir.