Como Deixar de Ser Idiota em 30 Dias escrita por Lie-chan


Capítulo 10
Capítulo 10




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Como deixar de ser idiota em 30 dias.

 

Capítulo 10:

 

– Droga! – Falou Charlie de repente, quebrando o silêncio que se instalara desde que tínhamos saído da escola.

 

O restaurante que iríamos almoçar ficava a apenas dois quarteirões de onde estávamos. A comida não era muito boa, mas o preço é ótimo para quem almoça fora quase todo dia e não quer ter um arrombo financeiro. Sem falar da praticidade, pois ficava quase na esquina da minha casa.

 

– O que? – Perguntei reparando que ele havia parado de andar e olhava para o chão.

 

– Meu tênis! Essa merda de cadarço começou a desfiar! Porcaria! – Mesmo falando desse jeito, dava para ver que ele não estava com raiva, chateado talvez, pois continuava olhando para o chão de um jeito estranho.

 

Foi quando eu vi uma lágrima pingar. Ai. Meu. Deus. Nunca pensei que veria isso algum dia. O Charlie está chorando. Ele está chorando por causa de um tênis! Não era aquele choro estranho, com soluços no meio, que nem o que eu tive no banheiro mais cedo. Eram só algumas lágrimas solitárias escorrendo por seu rosto e caindo na calçada. Mas ainda eram lágrimas! Ainda era um choro! E era tão triste...

 

Entrei em desespero. Eu nunca fui a melhor pessoa no mundo quando o assunto é consolar. Eu sempre acabo falando besteira e estragando tudo mais ainda. Como eu vou fazer ele parar de chorar? Por que as pessoas não nascem com um manual embutido com instruções detalhadas para momentos assim? Isso vai para a minha lista de coisas a criar se eu virar um cientista renomado.

 

Certo, parando de sentimentalizar e passando para o lado racional: Ele está chorando por causa de um tênis.  O que tem de especial nesse tênis? É só um cadarço desfiado!

 

– Está... Tudo bem? – Perguntei por fim, não agüentando mais aquilo. É claro que a minha pergunta foi muito idiota, era obvio que ele não estava bem, mas acho que se existisse mesmo um manual, essa pergunta estaria nos procedimentos padrões.

 

– Está. – É, o caso é grave mesmo. Ele não se aproveitou da minha pergunta para fazer alguma piadinha irônica. Nunca pensei que um dia eu ficaria tão triste em não ver o sorriso cínico dele.

 

– Olha, você pode concertar usando um band-aid como durex e enrolando na ponta do cadarço, aí não vai continuar a desfiar. – Disse não sabendo mais o que fazer. Eu sei que a minha idéia é meio sem noção, mas eu tenho alma de pobre! E pobre que é pobre sempre dá um jeito para consertar quando não quer comprar novo.

 

Ele finalmente levantou a cabeça, enquanto usava a manga do uniforme para se secar e... Agora ele estava rindo?

 

– E porque band-aid e não durex de uma vez? – Agora ele realmente estava rindo. Não era um sorriso largo, mas o suficiente para formar covinhas. O que tem de tão engraçado? Só estou tentando ajudar...

 

– Porque a farmácia está aqui do lado, não são nem dez passos até lá, sendo que a papelaria precisa atravessara rua. – Nossa! A minha resposta explica tudo! Eu sei que não. Bem, pelo menos agora eu entendi qual foi a graça. Provavelmente ele estava imaginando qual seria a minha resposta. E agora acho que vou ter que rir de mim mesmo. Ou não.

 

– E por que você não quer atravessar a rua? – Certo, ele estava no seu direito em me perguntar. Mas porque ele não podia só rir da minha resposta e aceitá-la? As pessoas de hoje complicam muito as coisas...

 

– Porque aqui não tem faixa de pedestre e eu não quero morrer atropelado. – Na minha condição atual eu realmente não deveria ter falado isso, que é o que eu geralmente responderia. Deveria inventar uma desculpa qualquer e não me meter ainda mais no buraco que eu me enfiei. E eu tenho quase certeza que mais tarde eu vou tentar me matar por causa disso. Mas eu realmente não queria que ele voltasse a chorar. Se eu preciso dar uma pausa temporária na minha convicção e ser um pouco idiota para isso, acho que tudo bem.

 

– E daí? Aqui não passa quase nenhum carro. Se tivesse faixa ia ser desperdício de verba pública gastada na tinta. – Disse Charlie arqueando a sobrancelha, num claro sinal de que não acreditou muito no que ouviu. É, os meus motivos não são muito convincentes.

 

Ele ficou mais um tempo me olhando daquele jeito, mas não consegui responder. Sabia que se abrisse a boca só ia falar mais besteira e, de qualquer jeito, ele nem ia acreditar mesmo.

 

– Ah! – Passou um ônibus em alta velocidade e eu praticamente pulei em cima dele com o susto. Acho que até os astronautas devem ter escutado meu grito lá da lua. Devo ter saltado uns três metros no mínimo. E quando dei por mim, ele estava me abraçando. Bem forte.

 

Charlie me abraçando? O mundo deve estar entrando em colapso! Primeiro ele chora, agora ele abraça? Mas tanto faz o motivo, o fato é que ele me abraçou!

 

Claro que a cena era ridícula, eu estava tremendo mais do que uma britadeira e, mesmo depois de me acalmar, ainda estava com a cabeça escondida no peito dele, como se a qualquer momento fosse acontecer alguma coisa ruim e aquilo pudesse me proteger.

 

– O que aconteceu? – Ele perguntou depois de perceber que eu não ia o soltar tão cedo.

 

– O ônibus... Muito rápido... Eu me assustei... – Tentei me explicar, mas não consegui pronunciar nada com muita coesão. Não que eu ainda estivesse espantado, não sou tão idiota assim, mas algo me dizia que mesmo depois de me explicar eu ainda não teria motivos suficientes para ter feito aquilo.

 

– Eu não vou te achar mais idiota se você me falar. – Parece até que ele leu a minha mente. Será que o Charlie é um robô enviado de outra galáxia para observar a vida na Terra e por isso consegue perceber ondas telepáticas? Isso explicaria muita coisa sobre ele... – Nem tem como você parecer mais idiota do que já parece... – Acho que a ultima parte era só um comentário para si mesmo, já que soou como um murmúrio. Mas eu escutei. E ele sabe que eu escutei. E nem ligou para isso. É, Charlie será sempre Charlie, independentemente de ter me abraçado ou não.

 

– Eu... Quase já fui atropelado por aquele ônibus... – Não precisei dizer mais nada, ele me empurrou, desfazendo o abraço. Realmente, Charlie será sempre Charlie.

 

– Mudei de idéia. Agora eu te acho mais idiota. – Sorri. É, agora devo estar parecendo ainda mais idiota, depois de sorrir por ele me chamar de idiota. Bem, pelo menos é o que ele acha. Mas eu não sorri por ele me considerar mais idiota. Eu sorri porque agora não havia nenhum traço em seus olhos de que antes ele estava chorando.

 

– Seu insensível! Você não vê que eu estou tendo uma crise de estresse pós-traumático? – Eu tirei isso de algum seriado médico, na consigo me lembrar qual, mas acho que foi uma boa frase para o momento.

 

Claro que eu gostaria muito de dizer que todo o meu chilique foi um plano bem pensado para fazer o Charlie se sentir melhor. Mas acho que para minha meta de deixar de ser idiota funcionar, não devo mentir para mim mesmo. E mesmo que eu só quisesse inicialmente fazê-lo rir, quando aquele ônibus passou, eu realmente entrei em pânico.

 

Uma vez eu e Max estávamos andando no meio da rua depois do aniversário de uma prima dele que tinha sido lá perto. Eu não sou de beber, odeio álcool, até porque ainda sou menor de idade. Mas naquele dia um tio dele me ofereceu um copo de vodka e eu estava completamente bêbado. Max estava praticamente me arrastando para lavar-me em casa.

 

Era tarde, não era uma rua movimentada, achamos que estava tudo bem. Mas aí passou aquele ônibus.  Primeiro eu vi os faróis, depois ouvi a buzina, depois me senti sendo jogado no chão e o corpo do Max sobre o meu.

 

Foi por pouco. Muito pouco. E o desgraçado do motorista nem parou para ver se eu estava bem.

 

Depois daquilo eu nunca mais coloquei sequer um pé para fora da calçada naquela rua.

 

O Max acha isso exagero, afinal, naquele dia eu estava bêbado, era obvio que não ia ver o ônibus, mas depois de ver o mesmo ônibus passar tantas vezes com aquela velocidade, acho que eu só sou precavido. E nada me convence do contrário.

 

Nossa! Como eu fui dramático contando isso! Mas acho que se não fosse dramático não daria para sentir a minha aflição ou algo do tipo...

 

Continua...


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Notas finais do capítulo

Hum... Eu meio que travei com esse capítulo... Minha mãe acabou de terminar com o namorado e aqui na minha casa ta aquele clima de "o amor verdadeiro não existe"... Aí fica mei difícil escrever comédia... Bem, eu tentei... Ah! Esse finalzinho acabou ficando muito dramático... Mas espero que o capítulo tenha ficado bom... Credo, quanto "..."! Vou tentar continuar logo, okay? Não esquecendo que reviews me deixam faliz e felicidade ajuda a escrever!