-Capítulo 2-
O último giro

Girava, girava e girava. Girava até se cansar, mas não enjoava. Nunca enjoava. Hinata, com apenas 8 anos de idade se mostrara uma determinada, porém uma desajeitada bailarina, e agora com quase 27 anos, treinava para o que seria a sua última dança no balé.

Sua ex-professora, a mestra Kuronei de nome internacional e musa de muitas dançarinas, estava inconformada por Hinata fazer isso. Perguntava a ela do porque de desistir do maior presente que sua finada mãe lhe deu: o balé.

A mãe de Hinata, morta devido a um parto difícil de sua segunda filha, era uma bailarina excepcional. Ela poderia ter sido grandiosa, mas não foi. Engravidou de Hinata e por isso desistiu do balé. E Hinata sentia-se culpada disso, mesmo que dizem não ser culpa dela. Mas aquele seria o dia que aquela culpa de extinguiria.

Kuronei perguntava por que Hinata iria fazer a mesma coisa que sua mãe sem pelo menos ter um ótimo motivo. Hinata dizia ter um: a multinacional Hyuuga precisava dela e de todo o seu tempo, e o balé não ajudaria.

-Mas Hinata... Não era o que você queria? Ser uma grande bailarina?-Disse Kuronei esperançosa. - Vai haver críticos de todos os lugares! Você vai ficar famosa! Como bailarina, claro... -Completou, refletindo sobre o fato da família de Hinata estar sempre em manchetes.

-Kuronei-Sensei...-Começou Hinata cansada, parando de rodar e pegando uma garrafa de água.

-Pare com isso, não sou mais sua sensei.-Disse Kuronei fazendo um movimento com a mão que se resume em "que isso".

-Para mim sempre será. -Sorriu a Hyuuga levemente, recebendo um em troca. Mas logo voltou para sua expressão seria e cansada. - Kuronei-Sensei, ser uma verdadeira bailarina era o sonho de minha mãe. Eu... Nunca levei jeito para isso. -Disse encabulada.

-Eu me lembro muito bem... -Disse Kuronei cruzando os braços e sorrido ao recordar de suas lembranças. - Você era totalmente desajeitada, não tinha postura e sempre errava os passos nas horas mais importantes. -Ambas riram levemente e Kuronei continuou. - Porém, você sempre foi muito esforçada... E olhe, depois de hoje você será uma verdadeira bailarina!-Se aproximando da ex-pulpíla e ajeitando seu cabelo. -Estou orgulhosa de você!

- Arigato, Kuronei-Sensei, sem você não teria chegado aqui. -Disse Hinata sorrindo, devia tanto aquela mulher que um simples obrigado não resumia sua gratidão.

-Sabe Hinata, depois que sua mãe morreu você passou a se esforçar mais. Pensei que era para poder apaziguar a dor, mas nunca cheguei à pergunta. Cheguei até pensar se era porque você realmente gostaria de ser uma bailarina, mas vejo que não é isso. -Então a mulher suspirou. -Se você nunca quis ser uma bailarina, porque chegou até aqui, o ponto mais alto?

-Para realizar o sonho de minha mãe... -Disse Hinata sorrindo levemente, um tanto tristonha ou melancólica, mas sorrindo. -Ela nunca terminou seu sonho por minha culpa... E por isso devo realizar isso a ela.

-Ah, Hinata... -Disse Kuronei acariciando o rosto da Hyuuga.- Você sempre foi muito doce. Mas você não tem culp...

-Eu sei... -Interrompeu a garota. - Mas isso vai me fazer sentir-me bem... -Kuronei suspirou em aceitação.

-É tão estranho... -Comentou a ex-sensei.- No dia do seu auge vai ser sua despedida. Chega a ser irônico. -Sorriu levemente, tristonha. Hinata também sorriu igualmente tristonha. Estava constrangida, despedidas sempre eram difíceis.

-E então... Como esta o bebê e o Asuma-Sensei?-Perguntou mudando de assunto. Logo a ex-sensei sorriu animada e começou a acariciar a barriga de 6 meses.

-Ótimo! O medico disse que minha gestação está mais do que ótima e diz que tenho muita sorte por ter uma família tão atenciosa!-Sorriu um pouco corada e sua ex-pulpila retribuiu.

Kuronei há um ano tinha conhecido um homem chamado Asuna, se apaixonaram e estavam o esperando o bebê nascer para finalmente juntar os trapos. Asuna parecia trabalhar no circo em que Hinata fora há alguns dias atrás. Aparentemente, depois de muitas voltas no mundo, o circo decidiu se fixarem Konoha, o que significava que ela poderia ver muitos espetáculos. Quando tivesse tempo, claro.

-O Asuna vai vir hoje?-Perguntou a morena. Tinha gostado do noivo pra ex-sensei, era divertido e gentil, pode notar o porquê dela gostar tanto dele.

-Hoje não, problemas no trabalho... -Fez um movimento qualquer. - Parece que um louco saiu do banheiro, começou a gritar e assustar algumas mulheres enquanto esperavam na fila do banheiro feminino. -Fez um movimento qualquer com a mão e suspirou cansada. - Elas estão furiosas, pensam que ele é do circo.

-Er... n-nossa q-que e-estranho, né?-Sorri de forma amarela, constrangida. -T-tem cada l-louco n-no mundo!-Tentou disfarçar, mas nem precisou, sua sensei tinha a cabeça perdida em algo.

-Voltando ao assunto, eu trouxe a filha do Asuma!-Disse abrindo um novo sorriso depois de balançar a cabeça para se esquecer dos problemas. - Acho que vocês vão se dar bem, ela trabalha no circo. Antigamente era dançarina, mas parece que agora está trabalhando nos roteiros.

-É a Tenten de tanto que você fala?-Perguntou curiosa, sorrindo.

-Sim! Quando disse que ia ver sua apresentação, ela quase engasgou de animação!-E começou a rir, sendo acompanhada pela Hyuuga.- Ela disse que tem que ver a tão famosa ex-aluna da Kuronei!-E fez um movimento qualquer com a mão. -Bom... Eu já vou. -Disse limpando uma lagrima.

-Ah... Mais já?-Disse num tom de desanimação, mas logo sorrindo.

-Sim... Minhas pernas dói, esse bebê é mais pesado do que imagina!-Disse rindo um pouco.

-Não entendo porque vocês não vêem logo o sexo do bebê, Kuronei-sensei...!-Disse Hinata acompanhando o riso da ex-sensei e cruzando os braços, divertida.

-O mistério é mais interessante que os fatos. -Fez um movimento qualquer com a mão e piscando. - Quero um menino, mas Asuma diz que é uma menina. Por isso decidimos que, se for menino ele escolhe o nome e se for menina eu escolho!

-É justo. -Comentou Hinata, fazendo um movimento positivo com a cabeça.

-Agora vou indo, se precisar de mim, estarei na primeira fileira. -E sorriu, indo para a porta.

-Certo!-Sorriu Hinata.-Arigato sensei.

E Kuronei, sorriu em despedida, abrindo a porta, mas parou e encarou a sua ex-pulpila com esperança.

-Hinata?-Recebeu um murmuro em resposta.-Tem certeza disso?

-Tenho. -Disse Hinata seria e determinada.

A sensei suspirou levemente e acenou para a Hyuuga, saindo do local com um sorriso, definitivamente conformada. E Hinata? Ela apenas tomou fôlego, colocou a garrafa de água no lugar e voltou a girar. Girava, girava e girava. Girava até cansar, mas nunca enjoava. Nunca.

-Divisoria-

Em todas as apresentações que fora de sua filha, ela nunca este tão parecida com sua mãe. Hinata era praticamente um clone dela, mas diferente da mulher, era muito insegura e fraca, nem chegando aos pés da mulher que fora sua esposa. Suspirou em alivio, finalmente Hinata havia aberto os olhos e pararia com aquela tolice! O balé lhe exigia certo tempo e isso a atrapalhava nos negócios da família. Tinha tantos projetos atrasados que Hiashi teve que adiar suas férias para auxiliar a filha e Neji, o vice-presidente. Hiashi estava velho demais para cuidar daquele império, queria suas férias em Bahamas!

Logo se concentrou no espetáculo, quando a música se tornou mais alta e abriu um clima para o suspense. Em um giro ou outro de Hinata, se lembrou de sua finada mulher. Se lembrou de o quão seu brilho diminuiu depois que Hinata nasceu e quanto foi difícil suportar a dor de sua perda. Afinal, ninguém supera a dor de um ente querido, apenas aprende a conviver com ela, essa eram as suas palavras. Olhava a filha saltar elegantemente e se orgulhou dela como nos poucos momentos de sua vida. Começou a se questionar o porquê dela finalmente abandonar o balé sendo que sempre gostou tanto dele. Logo pode ver sua mulher em seu último recital espelhada em sua filha. Ele não se permitia assumir, talvez por não querer se sentir culpado disso, mas sabia exatamente o motivo de usa mulher desistir de seus sonhos. E esse motivo era ele.

Ele via ambas dançando, lado a lado. O que momentos de magia faziam com a gente? Ele simplesmente não ligou, sempre que Hinata dançava, ele via sua esposa dançar e a saudade, de certo modo, parava de lhe sufocar tanto. Sentia que o peso sobre seus ombros irem embora e a culpa secreta por ela ter desistido de seus sonhos por ele ter sumido, criando asas e voando para bemmm longe. Ele não assumiria, ou melhor, nem sabia, mas iria sentir falta das danças de Hinata. Do dueto que sua esposa e filha faziam.

E elas giravam, giravam e giravam. E ele se perguntava se elas se enjoavam, pelo menos uma vez. E quando parecia que iram para, elas giravam, giravam e giravam. Até todo aquele sonho acabar. Quando acabou, teve certeza de que aquela seria a última vez que viria sua esposa dançar.

-"Desculpe meu amor."-Pensou Hiashi aplaudindo de pé. -"Mas é o melhor para nosso pequeno por do sol".

Neji, que até momento dormia, assustou-se com o barulho de palmas. Se ajeitou na cadeira preguiçoso e, ao ver seu rigoroso tio bater palmas de modo tão vivido, quase soltou um grito de pavor. Olhou-o, incrédulo, com mais atenção e pode ver olhos marejados, acompanhado de lagrimas. Pode notar a tristeza no olhar do tio, chegou a se beliscar pensando que ainda sonhava. Notando que estava acordado, não pode evitar de se arrepiar até o último fio de cabelo (agora hidratado e perfeitamente limpo após o terror no circo). Olhou para a prima ainda incrédulo, ela já não segurava as próprias lagrimas, apesar de sorrir. Ficou serio, se perguntou quem sentia mais com aquilo: seu Tio ou a própria bailarina? Neji suspirou e começou a aplaudir. Não se sentia bem estar dormindo no último recital da prima, mas estava tão acostumado que nem notou seus olhos se fecharem nos primeiros 5 minutos da peça. Na verdade, tinha a sensação que Hinata não poderia ficar longe daqueles palcos. Arrepiou-se de repente, como se uma voz irritante na sua cabeça berrasse que aquilo lhe causaria muitos problemas ainda.

-”Provavelmente mais trabalho extra!”-Pensou sarcástico consigo mesmo.

E Hinata via toda aquela multidão aplaudindo. Havia flash, havia assovios e alguns suspiros de admiração quando não suportou mais segurar suas lagrimas. Se perguntou o porquê estava fazendo aquilo apesar de saber muito bem.

Hinata sempre fora insegura e tímida. Sentia que seu pai a odiava e que ela era um fardo. Sentia-se culpada pelos sonhos destroçados da mãe e sabia que sua irmã a achava patética. E aquilo tudo sempre fora muito sufocante e talvez, saindo do balé, ela agradaria a quase todos. Sua 'divida' com sua mãe estava comprida, seu pai ficaria orgulhoso de sua decisão e aquela experiência a faria mais forte. Só não poderia fazer a irmã gostar mais dela, aquilo era a mesma coisa que ver seu pai chorando.

E, antes de notar as cortinas começarem a se fechar, acabou por se ver seu pai na platéia, parecia chorar para seu espanto. E aquele olhar parecia ser algo como 'eu tenho orgulho de você'. Mas antes que Hinata pudesse confirmar isso, as cortinas já haviam se fechado e ela andava automaticamente para o camarim. Balançou a cabeça, estava imaginando coisas devido à emoção. Logo a sensação de fantasia se foi se esvaziando até sobrarem seus problemas e responsabilidades. Tinha, em cerca de 20 minutos, uma reunião importante. Mais tarde teria que planejar novas campanhas de marketing e ainda tinha que ir a alguma abertura de caridade que estava patrocinando. Suspirou, vestiu seu terno por cima do tutu. Aquele seria um lonnnngo dia. Sentou-se na frente do enorme espelho afim de tirar a maquiagem, mas quando encarou-se, por algum motivo, só conseguia sentir uma enorme vontade de chorar de novo.

Hinata nem ao menos sabia disso, mas o balé era sua vida.