Três dias.

Os três dias mais sombris de toda a minha vida.

Nem quando Roger confiscou meus jogos por fugir do orfanato (tá que eu os recuperei pouco tempo depois, entrando escondido na sala dele), nem quando Mello quase destruiu o quarto com tudo dentro (inclusive eu) quando perdeu para Near em uma competição, nem quando nós dois acabamos perdidos na cidade por um dia inteiro e uns caras tentaram nos assaltar.

Não, esses três últimos dias foram bem piores.

– Mello? Você vai pra aula? - perguntei, vendo ele ainda deitado na cama.

Eu sinceramente esperava que ele dissesse que não. Era meio cansativo ficar o tempo todo preocupado com a possibilidade do Mello acabar deixando um corpo jogado pelo caminho onde passávamos, sabe?

Mas ele não disse nada, apenas levantou e foi para o banheiro, batendo a porta com uma força desnecessária.

Acho que isso era um sim.

Eu não sei o que aconteceu, mas agora Mello se recusava a quebrar o castigo.

O meu abajur não acendia mais, a porta do guardarroupa pendia nem sei presa em quê ainda, estava faltando uma gaveta no criadomudo do Mello (que eu tenho quase certeza que foi lançada pela janela na noite passada), e o espelho do banheiro estava rachado depois do Mello ter jogado o frasco de shampoo nele.

Resumindo: metade do nosso quarto estava destruído, mas o castigo ele se recusava a quebrar.

Eu só queria saber o quê é que tinha acontecido pra isso!

Ele não demorou para sair do banheiro e nós saímos do quarto logo em seguida, sem pronunciar uma palavra sequer.

Os últimos dias tinha sido assim, basicamente. Em silêncio.

Se bem que eu acho que assim era um pouco mais seguro. Para mim, lógico.

Sério, aquilo parecia cena de filme. As pessoas se afastavam conforme nós passávamos e toda a conversa cessou quando nós entramos na sala de aula. Toda mesmo, não tinha nem um cochicho sequer.

E um viva ao instinto de sobrevivência!

– Matt, posso falar com você por um instante? - ouvi uma voz dizer atrás de mim, mas eu nem precisei me virar para ver quem era.

Eu já conseguia reconhecer muito bem aquela voz irritantemente calma.

– Tem certeza, Corliss? - perguntei com um sorrisinho cínico para o monitor de olhos verdes, indicando Mello com o olhar.

– Só por um instante - ele falou, olhando para Mello por um instante também e voltando seu olhar para mim logo em seguida.

Suspirei e saí da sala junto com ele, torcendo muito para Mello ainda estar sentado quieto de cara feia, quando eu voltasse; e para a sala ainda estar branca também, sem nenhuma "misteriosa" mancha vermelha.

– Mello está aguentando bem, não está? - Corliss perguntou assim que estávamos no corredor.

Bem? Bem??

Eu posso bater nesse cara?

Fiz menção de voltar para dentro da sala, não iria nem me dar ao trabalho de responder àquela pergunta estúpida, mas ele colocou sua mão em meu ombro, me impedindo de andar.

Cara, ele era forte.

– Eu não quero saber dos detalhes de sua relação com Mello, nem com Near, mas... - Near? Por que ele estava falando do Near agora também?! Ele apertou mais forte o meu ombro - Tome cuidado, está bem?

Por que será que eu não sentia preocupação alguma naquela frase?

Talvez seja por causa do seu olhar que me causou um leve arrepio, ou talvez seu sorriso que se mantinha perigosamente calmo, ou quem sabe o fato de que agora o meu ombro estava começando a ficar realmente dolorido.

Afastei a mão dele de mim e lhe dei as costas, indo em direção à sala, mas não sem antes falar em alto e bom som - Pode deixar, "monitor".

Ai, que vontade de meter um soco na cara dele. E olha que eu não sou violento! Se tem uma coisa da qual eu posso me orgulhar, além da incrível habilidade em jogos e certos tipos de tecnologia, é da minha imensa paciência. Eu divido o quarto com o Mello, afinal.

Mas tentar manter o Mello sob controle já consumia muito da minha energia para eu desperdiçá-la com esse monitor idiota.