●๋•..●๋•

  O sexto objeto, finalmente! Agora, restava-lhe apenas um. Este, certamente, seria o mais custoso à obter, porém, persistente como era, Lucífer não desistiria tão fácil. 

  - Está quase na hora. - Constatou, ao perceber que a meia-noite se aproximava junto do poente. O entardecer se desfazia e a noite já caía. Que se danassem Alice e Sam Winchester. Já não precisava dos mesmos. Tinha um encontro marcado naquela madrugada: um novo confronto contra Miguel. 

●๋•..●๋•

  - Dean Winchester. O maior dos tolos... - O loiro sorria para sua imagem refletida no espelho, que retribuía o olhar triunfante lhe lançado com uma expressão aborrecida - Como eu poderia mandá-lo ao Inferno se Lucífer e seus demônios ainda o habitam? Acreditou mesmo que eu seria idiota o suficiente para deixar meu receptáculo original cair nas mãos de meu irmãozinho? - Sua incredulidade no jovem presente na pergunta retórica.

  - Tem razão: precisa ser muito burro pra ter medo de alguém como você. - Sorriu, nervoso. Era como se fosse um fantoche nas mãos dele: já não tinha controle sobre seu próprio corpo e, embora lutasse para recuperâ-lo, o "sim" que dissera o impedia que fizesse-o. Rangeu os dentes, frustrado consigo mesmo. Havia mesmo sido muito ingênuo: porém, a simples experiência de vivenciar os quatro meses que mais temeu durante sua existência, fez com que não ouvisse sua razão. O pavor, a dor... Nada se comparava às suas lembranças do Inferno. E Miguel usara aquilo em seu favor. Era sua fraqueza. Todo o tempo, preso no maldito Paraíso, recordando-se de momentos que gostaria de apagar de sua memória. Alice também estaria ali?

  - Estou farto de ouví-lo. - Com um movimento de mão, o "verdadeiro" Dean desapareceu, dando lugar ao reflexo real do arcanjo. Vislumbrava sua própria forma, sentindo-se inferior naquela casca. Tinha que admitir: vestir o receptáculo lhe designado era muito mais confortável do que contentar-se com um substituto, tal qual Adam o era. Este, encontrava-se morto mais uma vez. Seu corpo ainda jazia estirado na grama verde do lugar, com o olhar fixo no nada. "Cego", constatou Miguel. Levantou os olhos na mesma direção que o garoto e encarou o magnífico azul celeste do Céu, claro como sempre, sem nenhuma nuvem. "Não faz diferença: está morto. Como em breve, Lucífer também o estará." E assim sendo, partiu, indo de encontro ao mesmo, deixando o cadáver inerte pra trás.

●๋•..●๋•

  - O que você acha? - O mais velho o fitava atônito, aflito com as possíveis teorias que o outro teria.

  - Eu não sei, pensei que talvez Miguel a tivesse feito voltar no tempo, obrigando Alice a reviver todos esses momentos. - Sammy refletia mirando o quintal repleto de sucatas de automóveis. Estava quase anoitecendo - Mas depois, lembrei do dia em que Dean e eu fomos mortos por aqueles malucos, colegas de caçada do papai. No Céu vivemos nossas melhores recordações, então quem sabe ela não esteja no Éden...

  - Ou presa num lupso temporal. - Constatou o ruivo, apanhando uma bebida na geladeira - Pega! - Atirou a garrafa pra o rapaz, que agarrou-a no ar. O gosto de vodka barata era amargo, mas o Winchester não ligava. Na verdade, sua única preocupação relacionava-se em resgatar os dois irmãos. "Ótimo, agora também tenho uma irmãzinha..." Sorriu. Sua família era mesmo muito confusa...

  - É, quem sabe. - Suspirou - O mais estranho é que cada pensamento, todo e qualquer sentimento que ela tem, aparecem aqui! É como se ela estivesse escrevendo... - Desviara a atenção da janela para as mãos, que seguravam o caderno da menina - Bobby, eu não 'tô legal. Quer dizer, não é mais só a Alice. Meu irmão sumiu, e não faço ideia do que pode ter acontecido. 

  - Algum sinal do Cass?

  - Nenhum. 

  - E Lucífer? Ele tentou falar com você?

  - Não, não. Bom, pelo que Alice escreveu aqui, aparentemente ele anda muito ocupado...

  - Pobrezinho: planejar o Fim do Mundo deve estar acabando com o coitado. - Revirou os olhos em suas órbitas - E o que ele queria com a Alice?

  - Talvez pensou que ela pudesse dizer onde e como conseguir as últimas Trombetas.

  - Ainda acho que não devíamos nos preocupar com isso, pelo menos por enquanto. Lucífer precisa de todas, e a de Miguel ele não vai conseguir, não antes dos dois se matarem. A nossa preocupação agora é o arcanjo, ele tem Alice e Dean: o receptáculo e a autora do "Livro da Vida". Nunca pensei que diria isso, mas o Diabo não é tão ruim assim...

  - Não duvide! - A figura debilitada de um homem de meia-idade surgiu ao centro da cozinha. Imediatamente, Singer alcançou uma pistola e Sam levantou-se abruptamente da cadeira em que estava. Era Jofiel, que estava muito ferido. Ambos não o conheciam, por isso a presença deste lhes era demasiada estranha e suspeita - Não se preocupem: não estou aqui para causar mal à vocês.

  - Nem poderia. - Bobby o analisava minunciosamente, percebendo seus diversos machucados - Você é um anjo?

  - Sou Jofiel, o arcanjo da Sabedoria e Iluminação Divina. Venho servindo Miguel à muitas eras, no entanto, hoje percebo o quanto meu irmão se tornou devasso e corrompido. - Dizia aquilo com certo pêsar.

  - Entendi: foi ele que fez isso? - Sam apontou para o braço direito do mesmo, que sangrava muito. Um corte profundo havia sido feito, provavelmente uma espada de arcanjo.

  - Não. Esta é uma cortesia de outro de meus irmãos, Samuel. Sabem de quem se trata?

  - Sim, já ouvimos falar, mas ainda não tívemos o prazer.

  - E nem queriam. - Encarava o braço com uma careta de dor - Eu... posso sentar? - Pediu sem jeito. O caçula dos Winchesters prontamente estendeu-lhe a cadeira que mais cedo ocupava e, com certa dificuldade, o anjo acomodou-se nesta - Obrigada.

  - Certo, mas... de qual lado você está afinal? - Perguntou, hesitante.

  - Da justiça; vocês não? - Sorriu.

  - Nessa ele nos pegou. - O ruivo deu de ombros para o mais alto, que assentiu - E, o que esse tal de Samuel queria com você?

  - Ele levou minha Trombeta. - Cerrou os olhos - Lucífer já possui todas, à exceção da Primeira. Há muito tempo, ele era o anjo que conduzia os louvores ao Senhor no Éden. Orquestrava belíssimas canções e suas composições encantavam à todos nós. Depois de sua queda, ninguém jamais o ouviu tocando algo novamente.

  - Então, as trombetas...?

  - São os únicos instrumentos capazes de serem escutados por todo o Universo. Jamais foram anunciadas uma única vez sequer. Elas serviriam para que cada um dos Sete Generais, ao comando de Miguel, trocassem informações, avisando quando o inimigo estivesse próximo à toda guarnição. Agora meu irmão deseja usá-las contra nós.

  - E como, exatamente? 

  - São armas, Sam. A melodia anuncia o começo do Fim. Se uma delas soar... Será tarde demais! 

  - Então porque ele precisa reunir as Sete? - Singer parecia interessado.

  - Se apenas uma pode desencadear o Apocalipse... - Respirou profundamente por um instante antes de prosseguir - Imagine do que as Sete juntas são capazes. Não estranharam o fato dele não tentar obter o receptáculo uma única vez, como Miguel o fez? - As palavras pegaram o caçula de surpresa. Embora já soubesse, preferia continuar não acreditando. Engoliu em seco, após uma longa troca de olhares com o amigo de tantos anos - Se Lucífer conseguir a última, não precisará de um receptáculo. Terá poder o suficiente para derrotar Miguel e muito mais. Por isso ele está tão desesperado... Essas atrocidades, acreditem, não são de seu feitil. Mas ele já não escuta meus conselhos. Vocês tem que impedí-lo, enquanto ainda há tempo!

  - Precisamos agir depressa. - Concordou.

  - E o que quer de nós? - Sammy não entendia a razão do anjo estar lhes contando tudo aquilo. Como poderiam ser necessários?

  - Miguel tem o receptáculo, Lucífer as armas e vocês... Alice.

  - Chegou um pouco atrasado: Miguel também está com ela. 

  - Estão equívocados. - Disse indiferente.

  - Onde ela está?

  - Em lugar nenhum. - Sorriu.

●๋•..●๋•