Always a Chance - não é tarde Demais escrita por Lara Boger


Capítulo 3
Capítulo 3




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Observou-a: Kimberly estava ofegante e muito ansiosa.

Trini se Esforçava para manter-se serena no meio de tudo aquilo. Não podia perder o controle. Ficou em silêncio por poucos instantes até percebê-la mais calma, mais disposta a ouvir.

- Olha aqui... pensa bem no que vai fazer porque tem muito mais a perder. - pausa – Eu não estou te julgando. Eu não sou sabichona. E se realmente o que eu possa te falar não faz nenhuma diferença, não teria tocado nesse assunto ou falado do que fez, ou reagido dessa forma.

Continuou segurando o pulso da amiga. Não pretendia soltar enquanto não visse uma mudança no seu estado. Daquele jeito, ela seria capaz de fazer uma besteira.

- Não venha falar de coisas que não sabe, Kimberly. Muita coisa mudou. Posso não ter vivido aqueles grandes dilemas amorosos, dos livros ou dos filmes água com açúcar que adorava assistir. Você deve ter pensado por muito tempo que sou assexuada, mas eu não sou. Eu tive histórias, e relacionamentos... Não venha se fazer de vítima porque eu não caio nesse truque. Não estou aqui para aturar chiliques de uma menininha mimada!

Soltou-a e se afastou um pouco. Viu-a recuar e cair sentada na cama. O ódio que tinha visto anteriormente havia desaparecido dos olhos. Havia agora, na sua frente uma menina perdida. De certa forma, sabia como era isso.

- O que eu faço, Trini? Por favor... me diz o que eu posso fazer...? Eu estou tão confusa...

E começou a chorar.

Trini odiava ver pessoas chorando na sua frente mas aquele não era um caso para intervir tão rápido. Do mesmo modo que lutou para não reagir a todas as coisas que ouviu, deveria lutar para não abraçá-la e tentar fazer com que se acalmasse.

Lágrimas eram um dos métodos mais eficientes para desabafar. Sabia muito bem disso, fizera o mesmo muitas vezes quando se sentia sozinha: trancava-se no quarto e chorava sozinha, abraçada com o travesseiro. Depois seguia sua rotina como se nada tivesse acontecido.

Refletiu sobre a condição de Kimberly através de uma rápida leitura. No fundo já tinha sentido a mesma coisa no início das viagens. A diferença entre elas era talvez uma questão de maturidade: não deveria exigir de Kimberly o mesmo comportamento que exigia de si mesma.

Ao observá-la novamente, viu a sua amiga. A menina perdida que vira pouco tempo antes. Compreendia tudo aquilo: ela estava longe de casa, longe da família, dos amigos e do garoto que amava, vivendo numa dura rotina, num mundo hostil e cheio de regras. O sentimento de pena voltou, e novamente fez o esforço para reprimí-lo. Era o mais perigoso que poderia sentir fora o ódio ou a inveja. Era a oportunidade de sentir-se superior, coisa que muitas pessoas invejosas esperavam pacientemente. Ensinamento de seus pais que passou por  várias gerações antes deles. Não podia decepcionar seus antepassados, e trair essa postura, era como trair a si mesma, o que aprendeu por toda sua vida.

De seu lado, Kimberly parecia ter voltado a realidade. E ao cair em si sentiu enjôo. Percebeu o que quase havia feito. Em meio a todo aquele turbilhão sentiu nojo de si mesma. O choro aumentou: tornou-se compulsivo.

Trini a abraçou. Já era hora de se aproximar e ver o que realmente podia fazer. Tirar a amiga daquele estado seria algo muito complicado.

Para Kimberly, o mundo foi se apagando lentamente.

~*~*~*~*~*~*~*~*~*~*~*~*~*~*~*~*~*~*~*~*~*~*~*~*~*~*~*

De manhã, no hotel.

Trini estava usando o laptop na mesa de jantar de seu quarto. Em sua cama, Kimberly dormia placidamente. Esfregou os olhos tentando prestar mais atenção no que estava fazendo. Conversar com Josh, seu amigo de trabalho era bastante difícil. Ele costumava exigir sua atenção integral, o que era aconselhável devido ao seu senso irônico.

 

Kimberly abriu os olhos lentamente, como se estivesse despertando de um longo sono, voltando de uma dimensão alheia aos olhos dos outros, longe demais e que exigia uma viagem cansativa. Tinha tido um sonho muito estranho e desagradável: sonhou que havia brigado com sua melhor amiga. Queria acordar logo, entrar debaixo de uma ducha gelada antes que o treinador reclamasse que estava atrasada...

           

Assustou-se porque não reconheceu o colchão. Ao abrir os olhos, foi ainda pior por não reconhecer o lugar logo de primeira. Olhou para o lado e viu Trini, sentada mais adiante em frente a um laptop aparentemente absorta. “Não foi sonho” constatou, triste, e com a sensação de enjôo que voltara.

           

Não se mexeu. Tentou lembrar-se do desfecho da briga. Lembrou apenas de uma voz suave lhe dizendo palavras como: calma, tudo vai se resolver, tem solução. Palavras banais que todo mundo dizia quando via alguém nervoso, mas que tinham ajudado a acalmar-se. Tinha sido diferente de ouvir isso de qualquer um. Tinham sido ditas por alguém que confiava muito.

- Trini?

- Bom dia. – olhou para trás para ver melhor o rosto de Kimberly – Como se sente?

- Estranha... o que houve? Eu dormi aqui?

- Dormiu. Não estava muito bem. Não seria bom te deixar andando sozinha por aí. – respondeu, logo depois voltando ao que estava fazendo – Lembra de alguma coisa?

- Lembro, infelizmente.

- Infelizmente? Por que? - parou para olhá-la novamente.

- Porque eu fiz um monte de besteiras. Pelo menos é disso que eu me lembro. Falei um monte de coisas que não devia, e que me revira o estômago só de lembrar... – desviava o olhar, com vergonha de encarar sua amiga de frente - Eu levantei a mão pra você, Trini... logo pra você que é a minha melhor amiga... que segura as minhas barras... - gaguejou um pouco, fez esforço para continuar – Me perdoa... por favor, eu não queria... eu nunca...

- Esquece, Kim- levantou e sentou-se ao seu lado - Não se preocupe com isso. Não era você.

- Eu te machuquei? Eu fiz alguma coisa que possa ter te...

- Não. Não me fez nada.

- Olha, não sei como consegue aturar esse tipo de coisa. – enxugou algumas lágrimas que rolavam sutilmente pelo rosto. - Deveria ter me dado um bom tapa pra ver se me controlava...

- Isso não é remédio. Se adiantasse pra alguma coisa muito dos problemas do mundo teriam sido resolvidos.

- Eu queria ter a sua calma. Talvez a minha vida fosse muito mais fácil.

- Não queira ser outra pessoa. Sinceramente, nem sei como consigo... ela me ajuda na maior parte do tempo, mas tem momentos em que gostaria de ser mais impulsiva. - gesticulou um pouco, algo que não costumava fazer com frequência, como se quisesse dar algo a mais na sua frase.

- Impulsividade te faria bem, Trini, mas acabaria com a sua personalidade. Pra você é algo que funcionaria apenas de vez em quando, naqueles momentos em que dá uma louca e , PUFT! - estalou os dedos – Acontece.

- Digo o mesmo no seu caso. Se fosse calma, não seria mais Kimberly.

Momento de silêncio. As duas sorriram uma para a outra, num gesto de cumplicidade.

- Olha, quanto a aquele assunto, eu...

- Ei... espera um pouco. Se não quiser falar nisso, não fale. Pensa um pouco. Sei que é algo que provoca muito desconforto mesmo depois de tanto tempo...  Talvez seja melhor se distrair um pouco.

- É, acho que estou precisando. Quando não estou estudando ou treinando, é isso que vem na minha cabeça.

- Então vamos dar um jeito nos nossos problemas. Eu não viajei esse tempo todo pra ficar trancada num quarto de hotel.

- Hunnmm... não estou te reconhecendo, Trini. Anda muito saidinha pro meu gosto... - rindo – E o que pretende?

- Sei lá. Mal conheço a cidade. O que me sugere?

- Conheço menos a cidade do que você. Mal saio dos alojamentos e do ginásio. Quando muito vou pro colégio.

- Meu Deus... vamos sair daqui logo. Temos que fugir desse marasmo!

- Certo... certo... eu aceito a sua proposta. Eu só preciso dar um jeito em mim. Estou um caco!

- Enquanto faz isso, eu vou terminar de fazer uma coisa. Tudo bem?

- Como quiser.

Kimberly levantou e foi para o banheiro. Trini voltou para frente do laptop. Nesse tempo deu risadas, teclou mais um pouco, mas logo depois despediu-se de seu amigo. Aquilo tinha servido para dar um “colorido” a mais na sua conturbada primeira manhã de férias. Serviu para começar bem seu dia, que torcia para ser bem melhor que o anterior. Serviu também para esquecer por um momento do tormento que passara com Kimberly.

Levantou e foi para frente do espelho e começou a pentear o cabelo.

Não demorou muito para que ela saísse do banheiro. Parecia bem melhor do que vira horas antes.

- Posso te fazer uma pergunta?

- Pode.

- Estava conversando com alguém? - foi explicar a razão da pergunta antes que pudesse ser mal interpretada - É que você estava rindo tanto na frente do laptop...

- Estava sim. - respondeu, descontraída, sem parar com a escova - Respondi um email que um amigo me mandou... acabamos batendo um papo.

- E precisava dar tantas risadas?

- Se soubesse... você iria gostar se o conhecesse. É um verdadeiro palhaço. Me divirto muito quando estou com ele. Vem cá, vou te mostrar uma foto.

Kimberly se aproximou e viu a foto que Trini escolhera: nela os dois estavam juntos e sorridentes em frente a Torre de Pisa.

- Qual o nome dele?

- Joshua, mas ele prefere ser chamado de Josh

- Josh... hummm... ele é muito bonito... - pausa - Amigo mesmo?

De fato, Josh era bonito: moreno, cabelos negros e olhos castanhos com traços delicados. Do tipo de despertava a atenção de qualquer garota.

Trini deu uma risadinha misteriosa, que não queria dizer nem sim nem não. Mais uma coisa que conservara. Mas não era apenas pela pergunta: aquele tipo de conversa significava uma abertura. Algo importantíssimo depois do que presenciara tempos antes.

Kimberly ficou aliviada: Trini aparentemente não tinha ressentimentos. Parecia realmente ter perdoado.

- Sim. Amigo mesmo, pelo menos por enquanto.

- Então admite uma provável aproximação a mais?

- Pode ser que seja só amizade.

- Amizade colorida?

- Talvez. Passamos boa parte do tempo juntos. Conversamos muito, nos entendemos superbem... mas nada que não possa ser chamado de amizade colorida.

- Normalmente as coisas começam assim.

- É diferente... de certa forma é mais ou menos o que eu tinha com o Billy.

- O Billy tinha uma quedinha por você...

- Mas eu não era a garota certa pra ele. - pausa - Continuando: era a relação que eu tinha com o Billy, mas como se eu estivesse conversando com o Jason... será que entende o que eu quero dizer?

- É meio confuso de início... mas eu sempre achei que rolava uma química entre vocês dois... - pausa - E ele sempre foi meio protetor... meio paizão quando se tratava de você.

- É... eu lembro... o Josh tem muito dele. Pateta... protetor... mas como disse, esse tipo de amizade pode ser confundido com amor. Não quero confundir as coisas. - pausa - O Jason me considerava a irmãzinha caçula. Ele mesmo me falou no dia em que resolveu deixar a Conferência e voltar para Alameda. Mas Josh é um verdadeiro mistério. - outra pausa, mudando o tom para outro mais entusiasmado - Mas vamos parar com essa lenga-lenga... nós vamos sair ou não?

- Bom... eu não tenho outra roupa. Portanto estou pronta. Mas acho que não vai poder sair desse jeito.

- Ops! Isso é o de menos! Espera aí!

Kimberly, enquanto esperava a amiga, continuou olhando o retrato que ainda estava na tela do laptop. Deu um sorrisinho ao perceber que Trini balançara quando perguntou se era apenas amizade. Certamente não. No caso deles provavelmente havia muitos outros caminhos. Pensou no que ela dissera: a mesma proximidade que tinha com Billy, mas como se estivesse conversando com Jason. Aquilo não poderia dar em outra coisa: ambos, em algum momento confessaram sentir algo mais por ela, mesmo que durasse tempo suficiente para perceber que era apenas atração.

Trini não demorou a voltar. Estava vestindo uma calça jeans e uma blusa vermelha de manga comprida. Isso causou estranheza em Kimberly.

- O que foi? Por que está me olhando com essa cara?

- Não, desculpa mas é que... é estranho te ver sem usar nada em amarelo...

-Também é estranho te ver sem usar rosa. - pausa – De qualquer maneira, rosa é uma cor que fica bem em você. Eu fico pálida demais, infelizmente... e o pior que eu adoro amarelo...

- Mas em compensação você fica ótima de vermelho. - pausa – Poderosa!

            Risadas.

- Agora vamos! Temos um dia inteiro pela frente!

Saíram.

            Durante horas, Trini fez o possível para distrair Kimberly dos acontecimentos anteriores. Ela estava visivelmente desconfortável. Além do mais, queria se divertir. Eram suas férias, eram suas duas semanas.

            Foram ao cinema, ao parque, ao shopping ( para não perder o costume ) e a mais outros lugares. Acabaram devassando uma boa parte da cidade. E se divertiram muito, voltando realmente a ser as meninas que eram em Alameda dos Anjos.


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Notas finais do capítulo

E aí? Algum comentário? Eu sei que não tá lá essas coisas...



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