Sobrado Azul escrita por Chiisana Hana


Capítulo 10
Capítulo X




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/11765/chapter/10

Os personagens de Saint Seiya pertencem ao tio Kurumada e é ele quem enche os bolsinhos. Todos os outros personagens são criações minhas, eu não ganho nenhum centavo com eles, mas morro de ciúmes.

SOBRADO AZUL

Chiisana Hana

Beta-reader: Nina Neviani

Capítulo X

– Vamos, Shu? – Shiryu chama a namorada quando o expediente chega ao fim. Ela ainda está brincando com a filha da juíza na sala de audiências.

– Claro, meu amor – ela concorda, e começa a arrumar a mesa.

Ele observa a namorada guardar os desenhos de Emmeline na mochila cor-de-rosa da garota. Por alguns instantes vislumbra um futuro um tanto distante, com Shunrei cuidando dos filhos que certamente terão. "Três filhos", ele pensa. "Vai ser bom ter uma família grande."

– Então, Emme, a tia Shu já vai – Shunrei diz, pegando a menina no colo.

– Já, tia? – ela pergunta, mexendo no cabelo de Shunrei.

– Já. A tia tem que ir pra casa!

– Nós também já vamos, Emme – Hilda diz, entrando na sala. A menina corre até a mãe, que a pega nos braços.

– E quando é que vou ver a tia de novo, mamãe?

– Ah, Emme, não sei...

– É que a tia veio aqui por acaso – Shiryu explica.

– Ahhhh! Que pena! Eu gostei tanto!

– Você também veio por acaso, Emme! – Hilda diz. – Agora dê tchau para Shunrei e Shiryu.

– Tá bom. Tchau, tia! Tchau, tio! – ela diz, agitando os bracinhos.

– Até amanhã, doutora – despede-se Shiryu. Shunrei murmura um "tchau" e sorri.

– Até. Boa noite para vocês.

De mãos dadas, Shiryu e Shunrei caminham até o estacionamento do fórum. Enquanto andam, eles conversam sobre Emmeline.

– Ela gostou de você – Shiryu diz.

– É, também gostei dela. É esperta, carismática, você precisava vê-la contando histórias. E eu adoro criança!

– Estou vendo. A doutora está sem babá... – Shiryu diz, deixando claras suas segundas intenções.

– O que quer dizer? Que eu poderia ser babá da Emme?

– É, acho que pode ser uma boa idéia. Se quiser, eu falo com a doutora amanhã.

– Ah, não, Shi, vou ficar com vergonha!

– Vergonha? Não é nada demais. Ela precisa de uma babá, você precisa de um emprego.

– Eu sei, Shi, mas vai parecer que você me trouxe aqui só para isso.

– Bom, vai, mas não foi isso. Você veio por causa do incidente...

– Mas só nós sabemos disso. O pessoal vai falar.

– Que falem. Não devemos satisfações a ninguém. Além do mais, Emme gostou de você. Isso já é um excelente começo.

– É. Mas vamos deixar para lá. Se ela realmente achar que eu sou uma boa opção, ela vai perguntar por mim, não acha?

– Hum... vamos ver.

–S -A -

Edifício da Fundação Kido.

– Ei, cara, vem cá! – Seiya chama um colega enquanto tira fotocópias de alguns documentos.

– Fala.

– Você sabe onde trabalha a Shaina Mene-qualquer-coisa?

– Shaina Meneghetti?

– É.

– É a diretora de finanças.

– Eu sei. E onde ela trabalha?

– Na Diretoria de Finanças, não? Décimo quarto andar.

– Aqui mesmo? Como eu nunca a vi antes?

– Você entra pelo elevador de empregados, ela entra pelo da diretoria.

– Aaaaaah, faz sentido! Preciso dar um recado a ela, sabe? A Saori mandou.

– Não seria mais fácil a senhorita Kido telefonar? – desconfia o colega.

– É... mas sabe mulher como é complicada, né? – Seiya tenta despistar.

– Sei... – o sujeito responde, ainda mais desconfiado.

Seiya passa o resto da tarde pensando no décimo quarto andar, e quase ao final do expediente, ele finalmente resolve subir. Ali, uma secretária muito gorda e de ar severo arruma a mesa da recepção.

– Ehr... eu queria falar com a senhorita Meneghetti – Seiya se aproxima da mulher e diz.

– Marcou hora? – ela pergunta, sem sequer levantar o olhar dos papéis que arrumava.

– Não.

– Então quer que eu marque para quando? – ela abre uma agenda.

– É da parte da senhorita Kido. Um recado dela.

– Trouxe por escrito? Em papel timbrado? Assinado por ela?

– Não! Ela é minha namorada! – Seiya protesta, e a mulher finalmente ergue o olhar.

– Sua namorada? – a mulher olha para Seiya, examinando-o da cabeça aos pés, e depois ironiza: – Sei...

– Que foi?

– Você não tem cara de namorado da dona da grande Fundação Kido. E eu acho que já vi você lá pelos corredores de baixo, onde ficam os funcionários "menores".

– Eu sou namorado dela, sua preconceituosa! – Seiya protesta. – Só porque eu sou auxiliar administrativo você...

– Auxiliar administrativo ou office boy? – ela interrompe. – Você tem cara de boy.

– Algo assim.

– Tá, tá. Quer marcar hora ou não?

– Ah, deixa pra lá – ele diz e volta ao elevador. Assim que ele aperta o botão, Shaina sai de sua sala. Ele volta-se para olhá-la.

– Mitsuko, eu já estou indo. Preciso resolver umas coisas – ela diz à secretária.

– Sim, senhora. Pode deixar que eu cuido de tudo – a secretária diz, enquanto Shaina se afasta. – Ah, senhora, aquele moleq... digo, aquele moço quer falar com a senhora.

Shaina para e olha para ele.

– O namorado da senhorita Kido?

– Então é namorado mesmo? Oh! Que lástima! – lamenta-se a secretária.

– Eu vou lá falar com ele. Até amanhã, Mitsuko.

– Até, senhora. Tenha uma excelente noite – ela diz a Shaina, e deixa-se cair pesadamente na cadeira. "Oh, meu Deus, então esse estrupício é mesmo namorado da patroa. Cavei minha sepultura!", ela pensa. "Será que não é melhor eu pedir demissão antes de ser demitida?"

Shaina aproxima-se de Seiya que, sem disfarçar, olha o decote dela.

– Então, o que deseja? – ela pergunta.

– Ehr... eu... eu... trouxe um recado da Saori – diz, sentindo-se embriagar pelo perfume que ela usa.

– Pois não, pode dizer.

– Bom, ela mandou dizer que... que... eu... eu esqueci! Veja só que tonto!

– Estou vendo.

– Se eu lembrar, deixo o recado com a carrancuda.

– Carrancuda? Coitada da Mitsuko.

– Coitada nada. Mas parece que ela só é carrancuda com os outros, né? Porque com você ela foi um amor.

– Talvez seja para evitar que eu me aborreça com bobagens. Bom, se não lembra o recado, então com licença. Tenho um compromisso em uma hora – ela diz assim que as portas do elevador da diretoria se abrem. Ao entrar nele, Shaina balança levemente a cabeça para o lado e para o outro, fazendo seu perfume vir numa onda mais forte até Seiya. O elevador social também chega e ele entra. Apenas mexendo os lábios, sem deixar sair o som, diz:

– Uau! Que perfume é este? Parece o cheiro do paraíso!

–S -A -

Orfanato Filhos das Estrelas.

Eiri está sentada no banco do pátio, onde costuma esperar Hyoga todas as tardes. Quando ele aparece, ela corre até o namorado.

– Oi, meu amor! – ele abraça e beija a namorada, e logo em seguida começa a falar sem parar. – Eiri, aconteceu uma coisa tão estranha hoje!

– Fala do Shiryu socando o Jabu no meio do restaurante universitário? – ela pergunta, batendo o punho fechado contra a palma da outra mão.

– Não. Mas como sabe disso?

– As notícias correm! Correm não, voam! Seiya acabou de passar aqui e contar tudo com riqueza de detalhes! E ainda pintou um dente de preto para mostrar às crianças como o Jabu ficou.

– Aquele Seiya gosta de uma fofoca!

– Verdade! Mas se não é isso, o que aconteceu?

– Foi uma coisa lá no estágio. Vamos mudar de escritório e eu tive que mexer nas cópias de uns processos antigos. Então achei um arquivo de um sujeito que procura um garoto com o sobrenome igual ao meu.

– Hum... Amor, Yukida não é um sobrenome raro.

– Eu sei, mas escuta só: ele é meio russo, meio japonês, é da mesma região da minha mãe, e o processo era uma investigação de paternidade.

– E?

– Ele pode ser meu pai!

– Oga, não quero desanimá-lo, mas o que isso tem realmente a ver com você? É só uma coincidência.

– Tem tudo a ver comigo! O garotinho, bom, era garotinho na época, agora não é mais. O rapaz que ele procura teria a minha idade e nasceu no mesmo dia que eu. Não é coincidência demais?

– Mas se já há um processo, não significa que ele já achou o rapaz?

– Sim, havia um rapaz, um rapaz que esteve num outro orfanato na mesma época em que eu vivia aqui, mas os exames comprovaram que ele não é o filho do homem e o processo foi arquivado.

– E o que você pretende fazer?

– Pretendo procurar o homem! Quero conversar com ele! Quero dizer que eu posso ser o filho que ele procura!

– Meu anjinho, vá com calma. Fico com medo de você acabar se machucando com essa história.

– Minha intuição diz que sou filho dele. E, com base nos dados do processo, meu chefe acha a mesma coisa. Aqui estão o endereço e o telefone dele. Com sorte ainda são os mesmos. O processo não é tão antigo.

– Você vai telefonar?

– Não. Eu vou lá.

– Vai para a Rússia?

– Sim. Só um fim de semana, três dias, no máximo.

– Oga! Só por causa da suspeita de ser filho desse homem?

– É. Ele pode ser meu pai!

– Não acha que ele devia ter procurado mais? Digo, passou-se tanto tempo. Se ele não continuou procurando, pode ser que já tenha encontrado esse filho em outro lugar.

– Não, Eiri. Tenho certeza que sou eu.

– Oga, isso tudo está muito confuso.

– Não está, não! Eu sinto que ele é meu pai, Eiri. Preciso ir vê-lo para ter certeza.

– Está bem, se você quer assim, então vá.

– Isso! Você tem que me dar força!

– Claro, meu anjinho, claro – ela concorda, não muito segura disso. Ainda acha que não é uma boa ideia essa viagem.

– Agora tenho que ir! – ele diz e a beija. – Preciso terminar umas coisas. Amanhã passo aqui antes de partir.

– Certo, meu amor.

Eiri e Hyoga despedem-se com outro beijo e ele vai embora. Ela continua na porta do orfanato, olhando-o se afastar. Quando já não dá mais para vê-lo, ela entra. Minu está arrumando a mesa para o jantar.

– Está com uma cara estranha, Eiri. O que foi? – Minu pergunta.

– O Hyoga – ela responde, meio aérea, e puxa uma cadeira.

– O que ele fez?

– Nada. Mas está empolgado com uma história aí. Achou um sujeito que pode ser o pai dele.

– E não é ótimo? Todos os órfãos sonham em encontrar parentes! Não estou entendendo essa sua cara. Devia estar feliz.

– Eu sei que devia. Mas tenho um mau pressentimento com relação a isso.

– Ah, está com ciúmes! Vai ter que dividir a atenção do Hyoga com o pai dele!

– Para, sua boba! Não é ciúme! – Eiri ri e, com a mão direita, faz um gesto para Minu chegar mais perto. – E você? Tem visto o Ikki?

Minu senta-se ao lado de Eiri.

– Não. Nunca mais vi. Deve estar atracado com aquela tal de Pandora.

– Ih, relaxa, que isso aí não vai pra frente não.

– Você acha?

– Tenho certeza. Não dou um mês para esse rolo acabar.

– Tomara. Se bem que isso não quer dizer que eu terei uma chance.

– Ai, santo pessimismo!

– Bom, vamos ver se o jantar já está pronto e parar de pensar em homens!

– Vamos!

As duas levantam-se da mesa. Antes de se afastarem, uma das garotinhas do orfanato se aproxima, puxa a saia de Minu e pergunta:

– Tia, o que é "atracado"?

–S -A -

No sobrado, Shiryu e Shunrei jantam uma sopa que acabaram de fazer, quando Hyoga entra pela porta da cozinha, serve-se e senta-se com eles. Seus olhos brilhantes intrigam o casal, mas antes mesmo que perguntem algo, ele já começa a contar.

– Vou viajar para a Rússia na sexta! – ele diz, empolgado.

– Assim do nada? No começo do trimestre? – Shiryu pergunta.

– Vou ficar lá só no fim de semana. Volto na segunda. Terça no máximo. Apenas um ou dois dias de aula perdidos.

– A troco de quê? – Shiryu pergunta.

– Preciso verificar uma coisa. Sabe, há uma grande possibilidade de eu conhecer meu pai nessa viagem.

– Como é? – surpreende-se Shiryu. – Você nunca teve idéia de quem era seu pai.

– É uma longa história.

– Pode começar a contar – instiga Shiryu.

Hyoga explica a Shiryu e Shunrei tudo sobre o processo que o levou a pensar que o tal homem poderia ser seu pai. O casal ouve atentamente e depois Shiryu manifesta-se:

– Bom, é uma loucura isso. Mas quem disse que a vida não pode ter dessas coisas? Eu não duvido de nada.

– Pois é. Sinto que voltarei com boas notícias. Seria meu único parente vivo, o pai que eu nunca conheci! Estou muito empolgado!

– Estou vendo! Espero que dê tudo certo, Hyoga – Shiryu diz, sinceramente.

– Nós dois vamos torcer por isso – Shunrei completa.

– Obrigado. Mas e vocês, como estão?

– Tudo bem – eles respondem juntos.

– Sente-se bem depois de arrancar um dente do Jabu, Shiryu?

– Arranquei? – ele ri.

– Sim! Deixou o Jabu com um vão na boca.

– Bem feito. Quem mandou mexer com a minha namorada?

– Ainda mais sem motivo, né?

– Pois é. Totalmente sem motivo, Hyoga. Só pelo prazer de me tirar do sério.

– Exato. O Jabu faz dessas coisas.

– Uma pena que faça. Faz mal aos outros e a ele mesmo. Que felicidade pode ter uma pessoa assim?

– Nenhuma, Shiryu. Nenhuma. Bom, vou subir para estudar um pouco. Tenho uns processos para analisar e preciso terminar tudo hoje, já que amanhã estarei de viagem!

– Vai lá, Hyoga. Bom estudo.

– Obrigado. Bom namoro!

Shiryu e Shunrei entreolham-se e riem. Terminam de tomar a sopa e depois ela lava os pratos, ele os enxuga. Quando terminam de ajeitar a cozinha, vão para o quartinho dela.

– Uns beijinhos antes de retomar os estudos – ele diz, sentando-se na cama. Ela senta em seu colo.

– Ai, eu fico é com vontade de ficar só nos beijinhos e esquecer todo o resto.

– E acha que eu também não fico?

– Ainda bem que sim!

– Mas se não estudar, como é que um dia eu vou ter grana pra comprar uma casinha pra nós dois?

– É verdade. Também tenho que estudar se algum dia quiser ter algo.

– Isso. Mas com a casinha, deixe que eu me preocupe.

Ela ri entusiasmada.

– Já está pensando em casa, é?

– E não? Preciso comprar uma casa. Um dia vamos nos casar, não vamos?

– Espero que sim.

– Então... são só uns beijjinhos e de volta aos livros, para garantir a casinha no futuro!

– Claro!

– E esqueça o que aconteceu hoje. Nada de ficar pensando no que o Jabu disse. Tudo que eu faço por você, faço sinceramente e porque a amo.

– Eu não duvido disso, Shi.

O telefone toca. Shiryu corre para atender, e logo retorna ao quarto de Shunrei com o aparelho nas mãos.

– É a doutora Hilda. Quer falar com você – ele diz, piscando o olho.

– Comigo? Nossa – ela sussurra e pega o fone. – Boa noite.

– Boa noite, Shunrei. É a Hilda.

– Olá. Como vai a senhora?

– Tudo bem. E você?

– Estou bem também.

– Sabe, eu estava pensando cá com meus botões... você e Emmeline deram-se tão bem que eu fiquei com uma idéia na cabeça, sabe? Você passou a tarde lá no fórum, então suponho que não trabalhe. Então, será que você não gostaria de me ajudar a cuidar dela?

– Eu adoraria, senhora!

– Ótimo. Será que você poderia vir aqui em casa para conversarmos melhor?

– Quando?

– O mais rápido possível. Se puder vir agora, para mim está bem.

– Posso sim.

– Então venha. Vou ficar aguardando.

– Irei, sim. Senhora, o endereço?

– Ah, Shiryu sabe. Ele já veio aqui para algumas reuniõezinhas.

– Certo.

– Obrigada, senhora.

– De nada.

Shunrei desliga o telefone e dá pulinhos de alegria. Shiryu abraça-a e os dois pulam juntos.

– Ah, que maravilha! Um emprego! Finalmente! – ela grita.

– Que bom, meu amor! Que bom!

– Tenho que ir lá agora. Você me leva?

– Vamos! É só o tempo de eu trocar de roupa!

– Eu também vou me trocar.

Os dois trocam de roupa rapidamente e saem de carro, rumo ao apartamento onde Hilda mora, uma cobertura de dois pavimentos, no bairro com o metro quadrado mais caro cidade.

– Uau! Tem cada prédio aqui! Cada casa! Meu Deus! – admira-se Shunrei.

– Aqui é o setor dos milionários.– Shiryu explica. – Seguindo adiante chegamos à casa de Saori, no setor dos bilionários – ele completa, frisando a última palavra.

– Uau! Mas dá para ficar milionário sendo juiz?

– Não – ele ri. – É que a doutora Hilda já era muito rica antes de ser juíza. Parece que é descendente de reis. Seria princesa ou rainha no país dela, algo assim.

– Princesa!? Nossa!

– É. E o marido dela é um advogado muito famoso. Parece que a família não queria o casamento porque ele não é nobre. Se não me engano ele era um guarda do palácio ou algo assim. Mas ela não se fez de rogada. Abriu mão do trono e casou-se com ele. Então, mudaram-se para Tóquio e ele virou advogado e ela juíza. Um parente próximo, acho que tio dela, assumiu o reinado do país. Mas ela já comentou que a irmã mais nova é quem vai reinar no futuro.

– Que história digna de uma novela!

– Pois é. Chegamos.

Shiryu e Shunrei anunciam-se no interfone e prontamente a porta de acesso ao edifício abre-se para eles. Sobem até o último andar do prédio e assim que tocam a campainha, uma governanta com cara de poucos amigos abre a porta.

– A senhora está esperando na sala – ela diz.

– Obrigada – Shunrei agradece e entra, seguida por Shiryu. Ao vê-la, Emmeline salta do colo da mãe e corre até ela.

– Tia!

– Olá, Emme! Boa noite, senhora.

– Boa noite – ela sorri de volta. – Sentem-se, por favor.

Os três conversam rapidamente, e logo o assunto que levara o casal até Hilda entra em pauta.

– Bom, como pode ver, temos uma governanta, a Henriette. Ela é uma boa governanta, mas não tem tempo nem paciência para ficar com a pequena. Além dela, temos um motorista, uma cozinheira e outra empregada, que está de férias. E tínhamos a babá de Emme, que se casou e está de mudança para a Austrália. Seu trabalho vai ser ficar com a pequena durante a tarde, ajudá-la na lição, dar banho nela, dar o lanche, essas coisas. Volto do trabalho ao anoitecer, às vezes um pouco mais tarde, e só quando eu chegar é que você poderá ir embora. Se for preciso, o motorista irá levá-la e buscá-la.

– Sim, senhora.

– Se possível, não me chame de senhora. Faz com que eu me sinta velha. Eu peço para os outros empregados me chamarem só pelo nome, mas eles me chamam de "dona Hilda". Então, se quiser, pode me chamar assim também.

– Claro, dona Hilda.

– A tia vai cuidar de mim, mamãe? – pergunta a menina, outra vez no colo da mãe, tomando uma mamadeira.

– É, sim, querida. Você não gostou dela?

– Eu adorei!

– Então pronto. Ela vai ser sua nova babá.

– Obaaa! Tia, vamos brincar muito.

– Vamos, sim, Emme!

– Criança não sabe mentir. Quando gosta, gosta mesmo. Por isso me empolguei com essa "interação" de vocês. Além do mais, ser namorada do Shiryu já é uma carta de referência. Ele é um excelente rapaz.

– Obrigado – ele diz, envergonhando-se com o elogio.

– Obrigada também. Eu estava procurando emprego há alguns meses, mas estava difícil encontrar. Ainda mais porque estudo de manhã.

– Imagino. Emme estará na escola de manhã. Eu preferiria uma babá que ficasse o dia inteiro, mas nesse caso, como você estuda, vou abrir uma exceção. Quando você pode começar?

– Amanhã está bom?

– É uma sexta-feira, mas se você quiser começar, tudo bem.

– Pode ser.

– Certo. Então começamos amanhã. É até melhor, estamos no comecinho do mês. Aí você receberá o salário completo. Prefere receber por quinzena ou por mês?

– Por mês.

– Papai! – Emmeline grita, ao ver a porta se abrir. Ela corre até o pai, que acaba de chegar do trabalho. Shunrei observa o homem discretamente. É alto, tem o tórax largo, provavelmente musculoso, o que ajuda a confirmar o que Shiryu dissera: em sua terrra, ele era um soldado. Os cabelos muito claros estão impecavelmente cortados e a barba, como se tivesse sido feita há pouco. Os olhos, de um azul cerúleo, denotam seriedade e, ao mesmo tempo, um coração generoso.

– Boa noite – ele cumprimenta a todos e pega a filha no colo, girando-a no ar. – Olá, minha princesa! Minhas princesas, melhor dizendo.

– Olá, Sieg – Hilda diz e recebe um beijo. – O Shiryu você já conhece. Sieg, esta é Shunrei, namorada de Shiryu e nova babá da Emme.

– Ah! Olá! Seja bem-vinda!

– Obrigada – ela agradece timidamente, enquanto ele se senta no sofá com a filha no colo.

– Fico feliz. Emme precisa de alguém para ficar com ela.

– Pois é – Hilda concorda, e pega a filha no colo. – Bom, rapazes, conversem à vontade, pois as moças vão subir. Venha, Shunrei. Vou lhe mostrar o quarto de Emmeline e o resto da casa.

– Certo, dona Hilda.

– Então, Shiryu, sua namorada vai trabalhar conosco? – Siegfried pergunta.

– Sim. Tivemos um problema hoje e acabou não dando tempo de deixá-la em casa antes de ir para o trabalho. Aí levei-a comigo para o fórum. Emmeline estava lá, elas se conheceram e agora estamos aqui acertando os detalhes para ela começar o trabalho.

– Que bom. Tenho certeza de que elas vão se dar muito bem. Mas disse que tiveram um problema. Desculpe a curiosidade, mas do que se trata?

– Bom, eu briguei no restaurante universitário – admite Shiryu. Envergonha-se do que fez, mas de nada adiantaria mentir. – Não costumo perder o controle, mas um conhecido nosso ofendeu a Shunrei, eu acabei dando uns bons sopapos nele.

– O que é que não fazemos por amor? Mas, pelo pouco que o conheço, deve ter sido algo bem grave para tirá-lo do sério.

– É, ele fez insinuações infundadas sobre o fato de ela estar morando lá em casa e de estar sem emprego.

– Bom, agora ela já está empregada.

– É. Foi uma sorte Emme estar lá. Não vão se arrepender. Ela vai cuidar muito bem da sua filha.

– Não a conheço, mas já gostei dela. Pareceu-me uma boa moça.

– Ela é sim.

– E os estudos, como vão? Ainda sonha com a defensoria pública?

– Está tudo bem. E eu ainda sonho, sim.

Os dois continuam a conversa, até que Hilda, Emmeline e Shunrei retornam à sala, interrompendo-os. O casal se despede dos novos patrões de Shunrei e vai embora. No carro, comemoram o trabalho.

– Agora as coisas vão entrar nos eixos, Shi! Estou com muita esperança!

– E eu estou adorando vê-la feliz. Eu lhe daria tudo que precisasse, mas sei que você só ficaria realmente confortável quando pudesse se manter sozinha.

– Isso mesmo.

–S -A -

Dia seguinte. Saída da universidade.

– Então, pessoal, até segunda – Hyoga despede-se dos amigos.

– Até, Hyoga. Boa sorte, mas vá com calma, com equilíbrio, seja racional – Shiryu diz.

– Obrigado, Shiryu. Sabe, meu chefe me disse a mesma coisa: "Seja racional". Vou tentar ser. Shunrei, boa sorte no primeiro dia de trabalho.

– Obrigada, Hyoga! Boa sorte pra você também.

– Tchau, Shun! – Hyoga abraça o amigo.

– Tchau! Que dê tudo certo! Que ele seja mesmo seu pai!

– Obrigado, Shun. Também desejo isso.

– Tomara que o velho seja rico! – Seiya diz, dando um tapinha nas costas de Hyoga.

– Só pensa em dar o golpe, né, Seiya? – Hyoga retruca.

– Eu? Imagina, Hyoga! Mas é melhor que ele seja rico do que pobretão, não?

– Melhor que ele seja meu pai.

– Vai lá, pato, mas segura a onda – Ikki diz.

– Valeu, Ikki.

Hyoga entra num táxi e segue até o orfanato, onde se despede de Eiri. De lá, segue para o aeroporto.

Shun vai para casa com o irmão. Seiya, por sua vez, vai procurar a namorada. Enquanto isso, Shiryu leva Shunrei até a casa de Hilda para o primeiro dia de trabalho.

–S -A -

Vladivostok, Rússia.

Hyoga acaba de desembarcar no aeroporto. Com o endereço do suposto pai em mãos, ele toma um táxi e pede para o motorista levá-lo até lá. Espanta-se ao perceber que ainda fala e entende russo muito bem. Quando criança, no orfanato, costumava escrever em russo para manter a língua bem viva na memória. Depois que cresceu, já não tinha mais tempo para exercitar-se como antes e começou a achar que estava esquecendo sua língua materna, mas agora percebera que não.

As ruas parecem-lhe estranhamente familiares. Ele fecha os olhos e respira profundamente. Por alguns momentos, revê em sua mente imagens de quando era criança, revê a mãe que caminha a seu lado num calçadão de tijolinhos cinzentos, com canteiros de flores no meio.

– Chegamos – o taxista anuncia depois de alguns minutos e para o carro. Hyoga sai de seu devaneio, paga a corrida e desce. Olha fixamente para a casa diante de si. Uma casa enorme, de arquitetura antiga, muito bem conservada, com dois pavimentos. Um cachorro que cochila na porta ergue a cabeça para fitar o visitante, mas logo a abaixa outra vez e volta a seu cochilo. Hyoga aproxima-se da porta e toca a campainha. Ele ouve passos pesados aproximando-se. A porta é aberta.

– Boa noite. Eu gostaria de falar com o senhor Yukida – ele diz ao velho que abrira a porta.

– Quem é você? – o velho pergunta ríspido.

– Eu sou o Hyoga. Alexei Hyoga Yukida.

O velhote arregala os olhos à menção do nome e faz com que Hyoga entre na casa. Sentado na poltrona da sala está um homem. Aparenta ter pouco mais de quarenta anos, tem os cabelos escuros, já com os primeiros fios brancos aparecendo, e os olhos rasgados. Ele olha para o rapaz parado à sua frente, que olha curioso de volta. O velho que atendera à porta aproxima-se dele e cochicha alguma coisa em seu ouvido. O homem então se levanta da poltrona e observa o rapaz com atenção.

– Sente-se – ele diz, sem tirar os olhos escuros de cima de Hyoga.

– Obrigado – o rapaz responde.

– O que o traz aqui?

– É uma longa história, mas eu vou resumir tudo a uma só frase: acho que sou seu filho.

Continua...


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Esse capítulo era para ser totalmente de outro jeito. Eu já tinha digitado uma parte imensa do Ikki depois de uma passagem de tempo, mas resolvi deixar isso para o próximo capítulo.Minha betinha querida, amada e idolatrada sugeriu que eu acrescentasse uma descriçãozinha do Siegfried, eu acatei a sugestão e está lá na cena dele o pedacinho que, não é por nada não, eu amei. O que seria de mim sem minha beta-reader e best friend??? Brigadinnnnnn!É isso!Até a próxima!BeijooooosChii



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Sobrado Azul" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.