Sinto o suor descendo lentamente por minha face fria. Não estou certa de que vou sobreviver a essa noite, mas mesmo que isso não aconteça, não cairei sem lutar!

Engulo em seco minha saliva. Sinto meu corpo todo tremer, minhas pernas quase não sustentam meu peso.

Ouço os ruídos vindo de fora de meu quarto. Ficam cada vez mais altos, fazendo com que eu me apavore ainda mais. De repente o ruido se afasta, até que eu não consiga escutar mais nada.

Ainda estou tremendo quando decido abaixar a arma e ir até o corredor para verificar o que estava acontecendo. Ouço um grito que vem do alto, provavelmente do telhado do dormitório. 

Subo rapidamente as escadas e, ao abrir a porta que dá acesso à cobertura, vejo uma cena terrível.

Uma garota está caída, provavelmente está ferida. Vou rapidamente ver se ela está bem quando vejo a criatura monstruosa que está me encarando nesse momento. 

- Cuidado! - A garota me empurra quando a criatura tenta desferir-me um golpe. 

Vejo quando ela pega uma arma que estava no coldre em sua perna, aponta para sua testa. Ela está tremendo muito.

- Não consigo... Por que eu não consigo!?

A criatura a golpeia mais uma vez fazendo com que a garota ficasse inconsciente. E, vira-se para mim. Começa a vir em minha direção!

Ainda estou segurando a arma com a mão direita. Mas nesse momento eu não estou tremendo. Não sinto medo ou qualquer outra coisa. 

Sinto me possuída por algo incrivelmente forte. Levando a arma até minha cabeça, na altura da têmpora, puxo decididamente o gatilho. Ouço um estrondo e sinto como se eu não estivesse dentro de meu corpo, como se eu estivesse flutuando ali perto, assistindo a tudo aquilo.

Sinto, de alguma maneira estranha, minha alma se esvaindo lentamente de meu corpo. Mas o que vejo é algo realmente impressionante... E assustador!

Dos resíduos de luz que saem da têmpora oposta ao disparo começa a se formar uma criatura estranha. Tem a forma humana mas, certamente, não é humana.

A estranha criatura vira-se para mim, faz uma reverencia e, com um único golpe poderoso, destrói o monstro que estava prestes a me atacar. 

Nesse momento ouço um ruído horrível, ensurdecedor, vindo da beira do telhado. Viro-me para olhar e o que vejo me deixa paralisada. É um monstro, como aquele que fora destruído, porém muito maior! E vinha rapidamente em minha direção.

Nesse momento a criatura que acabara de me ajudar começa a gritar, eu olho e vejo ele se debatendo, como se estivesse sentindo dor. Algo começa a sair de dentro dele. É uma cena horrível de se ver. Uma imensa criatura negra sai de dentro dele, me olha bem nos olhos e, em um movimento muito rápido, agarra o monstro que se aproximava de mim.

Ele o parte em pedaços em questão de segundos. Depois desaparece diante de meus olhos. 

Ainda estava fora de mim quando isso tudo aconteceu. Senti meu corpo caindo. A minha mente não estava clara e minha visão começou a escurecer.

'- Onde estou? O que aconteceu?

Estou em um lugar claro, branco. Meus olhos doem e eu os fecho. Ouço uma voz masculina. 

- Preciso que você preste muita atenção, Josei.

Tento novamente abrir os olhos para encontrar o dono da voz, mas não consigo. A claridade me obriga a fechar os olhos novamente.

- Quem está aí?

- Você é uma pessoa muito especial, Josei. De sua vida depende milhares de outras vidas. Então me ouça com muita atenção.

Estou com medo, não sei onde estou. Queria poder ver...

- Não fuja do seu destino, Josei. Aceite quem você é e enfrente todas as dificuldades que encontrar em seu caminho.

- Mas... Quem é você?

- Josei, você precisa confiar na sua força interior. Precisa aceitar o seu destino e precisa ser forte.

Sinto um forte vento em meu rosto. '

Abro os olhos e noto que estou deitada em uma cama. Acho que parece ser um hospital, pois tudo é branco e claro. Também ouço sons de aparelhos do meu lado.

- Olá! Vejo que já acordou! Que bom!

Vejo o rosto sorridente da garota do telhado.

- Meu nome é Yukari Takeba, estou alojada no quarto de frente ao seu.

- Hã. Oi, Yukari. - Ainda meio tonta.

- Não sei como te agradecer naquele dia. Se não fosse você, eu...

Nesse momento a garota baixa o rosto. Tem uma expressão tão triste.

- Não se preocupe... - Tentei alegra-la um pouco.

- Mas você foi incrível! - Mudando radicalmente a face. - Você foi lá e... Bang! Incrível!

Fiquei sem graça. E ainda não estava entendendo o que estava acontecendo ali.

- Takeba! - Ouço uma voz feminina que vem da porta do quarto. - Posso lhe falar por um instante aqui fora?

Olha para a porta e vejo uma moça alta, de longos cabelos ruivos. Parecia ser mais velha que nós.

- Até mais! Ah, qual é o seu nome?

- Sou Josei. Josei Shujinko.

- Até mais, Josei! - Já saindo do quarto.

Não estava entendendo o que estava acontecendo. Eu tinha acabado de chegar a cidade  a poucos dias para estudar em um dos melhores colégios da região. Estava naquele alojamento a dois dias.

Aquela noite tudo ficou muito confuso. Ouvia aqueles sons estranhos vindos do corredor. Ouvi também correria e gritaria. Não tive coragem para sair do meu quarto. Encontrei aquela pistola na gaveta da escrivaninha em meu quarto. E por algum motivo estranho, tinha aquele impulso de aportar a arma para a minha própria cabeça e...

Ouço a porta do quarto do hospital abrir, olho e entra a moça ruiva.

- Olá. Desculpe entrar assim. Meu nome é Mitsuru Kirijo. Estou no último ano no Gekkoukan High School. Administro o dormitório onde você está.

- Hã... Muito prazer. Eu sou...

- Josei Shujinko, se hospedou anteontem no dormitório, não é mesmo?

- Sim, isso...

- Logo o médico lhe dará alta. Levaremos você de volta ao dormitório. Temos muito o que conversar.

Disse isso já virando-se para sair do quarto.

- Ah, mais uma coisa. Todas suas dúvidas serão discutidas no alojamento, para que você entenda melhor tudo o que aconteceu na última noite. Não se preocupe.

Estranho. Não estava preocupada. Sinto que toda aquela situação da noite anterior era estranhamente familiar para mim.

'- Aceite quem você é e aceite o seu destino!'

Essa voz de novo? De onde vem?

Olho ao redor e não vejo nada. Só as paredes brancas do quarto do hospital.

- E quem eu sou? - Falei baixinho como se esperasse uma resposta.