Os Outros escrita por Sochim


Capítulo 35
Agridoce (editar)


Notas iniciais do capítulo

Olá, vocês. Eu havia prometido que nesse ano tiraria essa fic do limbo. Tem demorado mais do que eu planejei, mas até que a coisa está andando bem :)

Desculpem-me por demorar demais, mas eu preciso fazer com que o final dessa fic faça jus aos leitores que esperam tanto, e continuam acompanhando. Aos que chegaram agora, e até aos que não apareceram mais. Enfim, quero que valha a pena para vocês.

Escrever essa fic é uma das maiores alegrias da minha vida e sinto que devo isso a vocês.

^___^



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/10638/chapter/35

Eu não pensei que rever a fachada chata da Escola Secundária de Konoha fosse mexer com meus nervos dessa maneira, mas agora sou obrigado a admitir que subestimei a importância que esse lugar tem na minha vida. Eu achei que poderia passar a eternidade sem pensar nessa escola, ignorando coisas que eu tento mas não consigo esquecer. No entanto, lá estava eu, parado diante dele, sabendo que lá dentro estavam as únicas pessoas que têm algum poder sobre meu futuro, para o bem ou para o mau.

Não tenho muito orgulho de quem sou, mas se há algo para me orgulhar é de nunca ter sido um covarde. Reuni toda minha coragem e qualquer resquício de determinação que ainda houvesse em mim e segui em frente, em direção às grandes portas de madeira que me aguardavam. Em todos aqueles anos nunca consegui afastar a sensação de que, assim que eu passava por aquelas portas, o mundo todo se fechava para mim, me trancando naquele lugar onde eventualmente eu encontraria meu fim… ou meu fim me encontraria. A sensação de ter sido empurrado contra um armário na frente de dezenas de colegas ainda desconhecidos, nunca me abandonou.

Eu me lembro como se fosse ontem, de olhar nos olhos de Jiroubou, aquele grandalhão com feições duras e antipáticas, que eu não conhecia e sabia que nunca tinha feito nada que o ofendesse, mesmo assim, fui subjugado e ameaçado, humilhado e jogado para escanteio… Não é algo que você esquece ou ignora, algo que te faz desejar estar em um lugar que te traz tantas lembranças amargas.

Porém também há o sabor doce das lembranças com meus amigos. Shino discutindo comigo sobre minha péssima gramática, Tenten me ameaçando de morte por qualquer motivo banal. Lee sendo Lee. Chouji e Shikamaru me deixando tonto com tantas referências a quadrinhos e mangas que eu nunca tinha lido. Kiba passando de algoz a melhor amigo numa prova incontestável de que as pessoas são, sim, capazes de mudar e perdoar. E Hinata, a personificação da calmaria após a tempestade, sólida apesar da aparente fragilidade.

Foi nessas coisas que me concentrei enquanto atravessava a entrada e me deparava com o corredor já cheio de aluno àquela hora. Eu nunca tinha chegado tão cedo ao colégio, sempre me atrasando, mesmo quando estava na República de Iruka, ainda que tivesse Shino e os outros para me apressar. Mesmo hoje, eu não teria chegado tão cedo se não fosse pelo pedido de Tsunade – praticamente uma intimação, para não dizer condição para me aceitar de volta ao colégio – para que eu fosse ao escritório dela antes das aulas começarem. Eu e Jiraya tínhamos conversado sobre esse pedido dela no caminho para Konoha. Ele defendeu que Tsunade apenas queria que saber como eu estava, pois me conhecia desde que eu era um garotinho e se preocupava com minha segurança (eu sabia que Jiraya estava prestes a dizer saúde mental, mas ignorei.) Também não acreditava que Tsunade se preocupasse com minha segurança, ou com a segurança dos outros garotos que sofriam bullying dentro daquelas paredes, debaixo do nariz dela, mas mais uma vez preferi manter esse pensamento para mim. Jiraya era muito sensível quando o assunto era Tsunade. Eles eram um assunto inacabado.

Cheguei na secretaria do colégio sem dificuldades e sem reconhecer muitos alunos. Rostos pouco expressivos e que nada significavam para mim. Shizune estava conversando com o inspetor de alunos Yamato, com um sorriso bobo de lado, que me fez lembrar Iruka e Ayame na recepção do hospital. Casais apaixonados eram lindos mesmo, só que não.

— Bom dia. – cumprimentei logo, interrompendo a cantada barata que ele estava jogando para cima de Shizune e na qual ela provavelmente cairia. – A diretora pediu para que eu viesse falar com ela assim que chegasse. – Informei, nada disposto a perder mais tempo naquilo do que o necessário.

— Naruto? – Ela pareceu surpresa, mas se recompôs logo. Eu pude ver no seu olhar um pesar e soube, no mesmo instante, que ela estava se lembrando da última vez que me viu. Ignorei o solavanco que aquela lembrança causou no meu peito e estômago, começando a reconhecer as sensações amargas que estar naquele colégio me causavam. – Como você está? – Ela perguntou, deixando-me decepcionado. Houve um tempo em que eu conseguia que as pessoas vissem no meu rosto como eu me sentia, assim, não precisava responder perguntas como aquela. O que eu poderia dizer? Feliz estava longe de ser verdade, mas me sentia ainda um pouco anestesiado, embora grande parte da tristeza já estivesse trancada lá no fundo.

Dei de ombros, uma resposta mais adequada ao meu estado anestesiado do que qualquer palavra que eu pudesse encontrar.

Shizune sorriu fraquinho e pela primeira vez tive medo do que me aguardava naquele dia. Dezenas de sorrisinhos tristes, mas pretensiosamente contentes, como se me ver fosse uma mistura de sentimentos e lembranças, tanto quanto voltar a Konoha estava sendo para mim. Aquele dia seria uma provação para meus nervos. Eu sabia disso quando fui dormir na noite anterior, quando fiquei revirando na cama de madrugada, quando levantei de manhã cedo, no caminho para o colégio, na entrada e nos corredores, e agora confirmava minha suspeitas com o sorrisinho de Shizune. Uma ótima maneira de começar meu dia.

Uma ótima maneira de começar minha missão…

Quando me livrei das tentativas de Shizune de ser sensível e simpática, não estava preparado para encarar Tsunade. Não que alguma vez estivesse, mas era estranho voltar àquele escritório. Foi ali que soube do novo derrame que tinha afetado meu pai, de suas chances praticamente nulas de recuperação. Iruka e Kiba estavam lá, sustentando-me em pé apenas por estarem lá. Agora, a situação era completamente diferente, o pior já tinha passado, mas a pressão no meu peito era palpável e angustiante trazendo-me mais e mais lembranças, fazendo-me, pela primeira vez em muito tempo, desejar ter uma rota de fuga, correr e desaparecer. O que eu estava fazendo? O que eu queria provar com tudo aquilo?

O olhar que Tsunade lançou-me teve o poder de me manter preso no lugar e de afugentar meus pensamentos por um instante. Ela apontou para a cadeira em frente a sua mesa e se sentou, esperando pacientemente até que eu fizesse o mesmo.

— Olá Naruto. É bom vê-lo novamente. – Ela começou quando eu me sentei obediente. – Como você está?

Era a mesma pergunta que Shizune tinha feito há poucos minutos, mas seu tom de voz e seu olhar produziram uma sensação oposta, ao passo que não tive coragem de deixar a pergunta sem uma resposta um pouco mais objetiva, embora não exatamente menos vaga.

— Bem. – Nem triste, nem feliz, menos anestesiado talvez, mas com certeza mais para bem do que para mau. Era a melhor resposta que eu poderia dar, nada muito além daquilo seria verdade.

Se Tsunade ficou satisfeita ou não com minha resposta, não demonstrou, mas como ela poderia medir a verdade na minha afirmação? Tudo o que ela poderia fazer era confiar que eu soubesse o que estava falando ou que estivesse disposto a encarar as consequências de uma mentira. Mas com esse tipo de expectativa eu já estava lidando desde que falei para Jiraya que queria voltar. Ele também esperava que, de uma hora para outra, eu hesitaria e cederia, falharia e voltaria para o fundo do poço. Nada do que eu dissesse o convenceria de que eu estava realmente pronto para o que vinha pela frente e, para ser franco, nem eu mesmo sabia da extensão que minha decisão tomaria, de quantas lembranças e quanta dor se colocariam no meu caminho. Porém, pensar sobre isso e me amedrontar diante de uma possibilidade não ajudaria em absolutamente nada. Eu estava sendo movido pelo que eu sabia que precisava fazer. Pronto ou não, eu precisava encarar aquilo.

— Você falou com seus amigos nesses meses em que esteve fora? – Tsunade perguntou de repente. Por algum motivo, achei a pergunta retórica, como se ela soubesse a resposta…

— Não. – Eu estava tentando não pensar naquilo. Não teria resposta caso ela me perguntasse o porquê. Eu não teria resposta caso eles me perguntassem o porquê de eu ter preferido sumir. Eu não sabia.

— O colégio passou por algumas mudanças desde que você saiu. Aumentamos o número de inspetores de alunos, colocamos câmeras nos corredores e nas salas de aula e em alguns pontos estratégicos do prédio.

— Finalmente. – Deixei a palavra escorregar para fora da minha garganta e escapar pela boca com certa dose de raiva. Sempre havia me perguntado quando Tsunade tomaria alguma providência. Quando as vítimas de bullying no colégio deixassem de ser minoria, talvez?

Ela continuou impassível. Vi ali uma confissão de culpa, mas não disse nada.

— No entanto, ainda temos problemas com alguns garotos. É como se a situação apenas tivesse sido transferido para outro lugar. Estamos estudando uma maneira de controlar o que acontece fora das grades da escola, mas como você pode imaginar, não é um trabalho fácil controlar o que os alunos fazem fora daqui.

Um arrepio subiu pela minha espinha, pegando-me despreparado. Eu esperava um discurso condescendente sobre me dar apoio para superar minhas tristezas e dificuldades, algo que eu praticamente pude ler nos olhos de Shizune, e que recusaria na mesma hora. Mas um aviso velado como aquele, era novidade.

Agora não era mais só com o colégio que eu precisaria me preocupar. Quando estivesse andando na rua, fazendo compras no mercado, chegando na minha própria casa… Eu entendia porque Tsunade estava me dizendo aquilo. Eu havia sido vítima dos Populares e dos Impopulares, o que era um evento relativamente raro no colégio. Geralmente, a vítima de um dos grupos era “adotada” pelo outro, como facções criminosas tentando conseguir seguidores, transformando seus protegidos em membros gratos e obedientes.

Casos como eu e Os Outros, eram vistos como anomalia.

Eu sabia o que levou Sasuke e Gaara a me excluir, o medo de que nosso passado juntos fosse descoberto, de que as velhas feridas fossem expostas a centenas de estudantes que não tinham nada a ver com aquilo. E, de certa forma, eu concordava com eles. Tinha os mesmos motivos e medos de que as pessoas descobrissem. Era algo que só dizia respeito a nós.

Mas o que Shino, Tenten, Shikamaru, Chouji ou Lee tinham feito para ofender os dois lados? Eu não sabia e com certeza Tsunade estava longe de saber, embora eu reconheça que era um avanço ela perceber a diferença entre o nosso caso e o das outras vítimas.

O aviso de Tsunade se instalou no fundo da minha mente e eu soube que não poderia me esquecer dele nem por um momento. Estava pisando em um território mais perigoso agora do que jamais havia sido. Porém, ainda sentia que tinha mais alguma coisa naquelas palavras do que eu consegui captar.

Eu poderia dizer “não estou preocupado com isso”, o que não seria totalmente uma mentira, pois eu tinha mesmo coisas mais importantes para fazer. Preferi usar uma resposta mais neutra, algo que a deixasse satisfeita.

— Eu entendi. Eu vou tomar cuidado. Não quero me meter em confusão.

Funcionou, Tsunade sorriu brevemente e mudou o rumo da conversa na frase seguinte.

— Vamos falar sobre suas notas. Eu entendo que você estivesse com a mente ocupada com outras questões no semestre passado, mas se não fizer alguma coisas para melhorar suas notas, vai acabar repetindo o ano. – Ela falou com calma, mais confortável com aquele assunto do que com o anterior. Eu me sentia exatamente da mesma forma.

O resto da minha conversa com a diretora pode ser resumido em três palavras: grupos de estudo. Eu precisava melhorar minhas notas em física, química, biologia, inglês e matemática se quisesse ter alguma chance de passar de ano. Eu talvez desse conta de inglês e matemática se me esforçasse um pouco mais, mas as outras três matérias estavam em um nível intelectual muito além daquele que eu poderia alcançar. Eu sei, pensamentos negativos não são úteis diante de desafios, mas fingir ser o que você não é, no meu caso, inteligente, também não dá muitos bons resultados.

Assim que sai do escritório de Tsunade, senti meu estômago se revirar de ansiedade. Estava chegando a hora de encontrar meus amigos e descobrir o quanto aquele tempo separados tinha nos afetado. Voltei para o corredor agora lotado de alunos que iam e vinham, feliz por me sentir anônimo no meio da multidão de rostos vagamente conhecidos. Atravessei os corredores, evitando os pequenos grupos de conversa, preferindo não olhar para eles, com receio de encontrar no meio deles, as pessoas realmente responsáveis pela minha volta. Cada segundo passado dentro do colégio era um teste para minha determinação. Estava ali há menos de uma hora e já tinha pensado vezes demais em dar a meia volta e ir embora. Ficar era uma prova de resistência e coragem. E ninguém melhor do que eu sabe o quanto eu preciso disso nesse momento.

A caminho da sala do jornal, senti meu celular vibrar no bolso do casaco e quando olhei, havia uma mensagem de Jiraya me lembrando de ir à sala de Tsunade. Comecei a digitar uma mensagem, quando senti meu pé bater em algo que estava largado no chão. Perdi o equilíbrio e quase caí, mas consegui me recuperar a tempo. Quando olhei para o chão, vi que tinha tropeçado em uma mochila lilás largada de qualquer jeito no meio do caminho. Alguém se aproximou para pega-la e, quando olhei para cima, uma garota de longos cabelos loiros e olhos azuis sorria para mim, sem graça.

— Foi mal. Você está bem?

Respondi apenas com um meneio de cabeça, tentando me lembrar se alguma vez a tinha visto nos corredores. Eu tinha certeza que não, e era provável que fosse uma aluna nova, considerando o tempo que fiquei longe, mas mesmo assim seu rosto era familiar. Devo tê-la encarado de um jeito estranho mais tempo do que deveria, porque ela arqueou a sobrancelha e torceu a boca visivelmente incomodada.

— Você é novo aqui? – Ela perguntou, de repente, primeiro me arrancando da tentativa de lembrar de onde a conhecia, depois quase me fazendo rir quando pensei na pergunta.

— Não. Quero dizer, na última vez em que estive aqui não tinha câmeras nos corredores e tenho certeza de que você não era daqui, mas não sou novo no colégio.

Ela sorriu pra mim. Era bonita, uma beleza óbvia e enjoativa, mas eu não estava com ela tempo suficiente para enjoar.

— Qual o seu nome então, novato-não-novato?

— Naruto.

Disse meu nome e apreciei a visão de seu sorriso diminuir até sumir completamente. Alguns teriam se insultado com aquilo. Eu me diverti.

O Naruto Uzumaki?

Nesse momento, perguntei-me de onde ela me conhecia. Parecia familiarizada com meu sobrenome tanto quanto eu com seu rosto.

— É a primeira vez que alguém coloca um artigo na frente do meu nome, mas sim, o próprio.

— Disseram que você tinha saído, ido embora para a capital.

— Eu fui.

— E por que voltou?

— Eu precisei voltar.

Ela ficou quieta por um instante, depois inclinou a cabeça, com um sorriso sem graça.

— Desculpe, Naruto, mas eu preciso ir agora.

— Você ainda não me disse seu nome. – Emendei curioso demais para esperar uma segunda oportunidade.

— Ino Yamanaka.

Yamanaka. Eu ainda não lembrava de onde a conhecia, mas aquele rosto e aquele nome decididamente não eram estranhos para mim.

— A gente se vê por ai. – Ela disse, dando um passo para trás.

— Imagino que sim. Até lá então.

— Até mais.

A Ino Yamanaka se afastou de mim o mais rápido que pode, desviando com agilidade dos outros alunos, enquanto eu fiquei parado onde estava, ainda achando graça do que tinha acontecido ali. Algo me dizia que, em breve, eu ia descobrir o que ela quis dizer com aquele artigo na frente do meu nome… o que era um mistério tanto quanto tentar descobrir de onde, afinal, eu a conhecia.

O sinal tocou logo em seguida, obrigando-me a seguir direto para a sala de aula. Parte da minha conversa com Tsunade se converteu em garantias da minha parte de que ia me esforçar para aumentar as notas e chegar atrasado na primeira aula não era a melhor maneira de provar minhas boas intenções… ou pelo menos, era cedo demais para mostrar que minhas notas eram as menores das minhas preocupações.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Antes que alguns entrem em pânico, não há e não haverá NaruIno nessa fic. Calma, muuuuita calma nessa hora.

Próximo capítulo, reencontro. =D