As férias não poderiam ter passado mais rápido. É sempre assim, quando queremos que as coisas demorem mais um pouco, elas acabam sem que a gente perceba. Não vou perder o meu tempo dizendo o quanto acho isso injusto. Mesmo porquê, se eu fosse dar o devido espaço a todas as coisas que eu acho injustas, não faria mais nada na minha vida. O que seria um tremendo desperdício. Não que eu seja assim, tão ocupado, mas realmente não posso ficar filosofando a tarde toda.

Enfim, as férias acabaram e hoje foi o primeiro dia de aula na Escola Secundária de Konoha. Não há novidades. Há, sim, alunos novos, como sempre há. Mas os que pareciam mais interessantes já foram corrompidos. Uma pena. Uma pena mesmo. Pena, que eu não tenho pena deles. E porque teria? Ninguém tem pena de mim também…

Toda vez que eu acordo, sabendo que tenho que ir para a escola, me passa um pensamento nada agradável na cabeça.

— "Lá vamos nós, Naruto. Vamos bancar o idiota! Vamos ser humilhados pela turma do Sasuke de manhã e, depois do almoço, podemos apanhar do Gaara e dos amigos deles! Que tal?"

Aqui na República estava uma confusão pela manhã. Até hoje, éramos apenas eu, o Lee, a Tenten e o Shino. Uma garota no meio de tantos meninos não é muito aconselhável, mas acho que temos mais medo dela do que ela de nós.

O Lee é cem por cento certinho. Nem se Tenten quisesse ele daria em cima dela. Mesmo porque, ele é afim da Sakura (claro que é, todos são.)

O Shino é esquisitão. Não faz nada. Não fala nada. Nem olha na nossa cara.

E eu… Bem, sou o mais normal daqui. Eu sou louco para muitas coisas, menos para dar em cima da Tenten.

Eu gosto de viver na República. O Iruka controla a gente com mãos de ferro, mas dá para levá-lo numa boa, enquanto ele não souber o que a gente apronta durante a noite. Aliás, o Iruka está ficando louco com a expectativa de novos moradores na República. Ele está fazendo um mistério irritante quanto aos nomes dos novatos. Disse que será uma surpresa. São sete horas da noite agora e eles ainda não chegaram.

Essa manhã eu levantei da cama, tomei um banho, escovei os dentes, tomei café da manhã e escovei os dentes de novo. Fui para a escola sozinho, já que o Shino sempre sai mais cedo, a Tenten e o Lee saem no horário certo e eu sempre atrasado.

Eles não me acordam porque sabem que essa definitivamente não é uma boa ideia. Primeiro, porque eu não vou acordar. Segundo porque eu vou descontar todo meu mau humor neles.

O Iruka é quem me acorda, mas eu não posso mandar o meu responsável à merda, posso?

Quando cheguei na escola, tudo estava exatamente como eu tinha deixado da última vez. Um caos. Os grupos estavam novamente formados. Há dois grupos na escola. Rivais. Um, é o grupo do Sasuke. O outro, é do Gaara.

O grupo dos "Populares", liderado pelo Sasuke, é composto por pessoas fúteis, que combatem o que eles chamam de perdedores com piadas "extremamente engraçadas". Eles são donos de metade do colégio. O outro grupo que, de forma não muito original, são chamados de "Impopulares", têm como líder o Gaara.

Basicamente, é o seguinte… Ou você pertence a um dos lados ou você é um perdedor. Os perdedores são conhecidos como "Os Outros", dada a sua importância na comunidade acadêmica. Chamar uma pessoa de "a outra", é como chamá-la de insignificante e, a partir daí, você está condenado. E eu estou condenado.

Nos primeiros momentos, eu não percebi que havia alguma coisa diferente. Por algum motivo, os grupos de conversa foram se dispersando e, de algum lugar distante, surgiram três pessoas, uma delas à frente das outras, que seguiam caladas e obedientes. Ao encontro delas, vinha mais três pessoas, quase na mesma formação.

Os dois garotos que lideravam os grupos pararam bem perto, com os rostos sérios e impassíveis. Encaravam-se com ódio. Por distração ou burrice eu era quem estava mais perto deles e pude ouvir claramente.

— Amanhã, às três, no campo de futebol. Traga a sua turma.

Assim que disse essas palavras, Gaara se afastou, com Neji e Sai na sua cola. Sasuke ficou um instante parado e, antes de se virar para ir embora também, com Suigetsu e Juugo, olhou na minha direção.

— Espalhe para todo mundo. - Disse, antes de ir.

Eu queria saber se aquele garoto achava que eu era escravo dele. Dar-me ordens como se eu estivesse ali de propósito, para servir como juiz para os dois. De qualquer forma, foi exatamente o que eu fiz. Não porque ele me pediu de forma tão gentil, mas porque eu já pretendia fazer isso antes.

*

— Gaara e Sasuke vão brigar? — perguntou Kiba, logo que Naruto acabou de falar.

— Não foi isso que ele acabou de dizer? — respondeu Tenten, impaciente. - Você tem certeza, Naruto? 

— Claro que tenho, Tenten — insistiu Naruto. — Foi como eu falei: o Gaara parou na frente do Sasuke, disse que amanhã, às três, no campo de futebol, era para o Sasuke levar a turma dele. Daí, o Sasuke virou para mim e me pediu para espalhar.

— E é isso que faremos! - Shikamaru levantou depressa, indo até o microfone.

— Como assim? - Lee acompanhou o movimento de Shikamaru.

O grupo estava no estúdio de rádio que havia na escola, do qual Chouji era o locutor e responsável. Shino era presidente do grupo de jornalismo, que incluía Lee como fotógrafo, Naruto e Shikamaru como repórteres. Tenten era responsável pelo canal de televisão da escola.

Kiba, por sua vez, não era parte do jornal, mas estava sempre por perto desde que havia brigado com Sai e sido expulso dos Impopulares. Ele ajudava em quase tudo que precisavam, mas era relutante em oficializar seu pertencimento ao grupo. Ao mesmo tempo em que não queria se comprometer com nada, também não queria ficar de fora.

Shikamaru mexeu em alguns botões e, antes que alguém conseguisse impedi-lo, se colocou em posição na frente do microfone e começou a falar:

— Atenção alunos da Escola Secundária de Konoha. - Começou, com um sorriso de satisfação, usando um tom profissional. - Atendendo a pedidos, a Rádio Konoha informa com absoluto prazer, entusiasmo e ironia que amanhã, às três horas, os dois grupos que se consideram donos da NOSSA escola se enfrentarão no campo de futebol. Parece que Gaara e Sasuke finalmente cansaram de colocar sua rivalidade em panos quentes e vão nos dar a oportunidade de ver qual dos dois é o verdadeiro DONO DA ESCOLA. Façam suas apostas! Quem será o novo SENHOR de Konoha? A quem vocês serão fiéis? Aos Populares ou aos Impopulares? - Shikamaru olhou para os companheiros, com um olhar divertido. - Com essa notícia bombástica, deixo vocês ao som de… - Olhou para Chouji, que apertou um botão qualquer e fez uma música começar a tocar. - "Revolution", dos Beatles. Até a próxima. Shikamaru Nara.

— Você é louco. – disse Chouji, sem esconder um sorrisinho irônico, que se refletia em todos os outros.

— Dessa vez você se superou - Tenten deu umas palmadinhas nas costas de Shikamaru.

— Corajoso — Disse Kiba, dando de ombros, mas rindo também. - Agora é esperar para ver qual dos dois acaba com você primeiro.

— Então vamos esperar — retrucou Shikamaru, sem se abater.

— Eles têm mais coisas com que se preocupar – disse Shino, de repente, deixando alguns papéis sobre o equipamento de rádio. - E nós também. Vamos.

*

Nas horas seguintes, que custaram a passar, Naruto assistiu às aulas, fez as tarefas extras curriculares e tentou passar despercebido, em meio à confusão em que a escola tinha se transformado. Os professores e a diretora Tsunade estavam afobados, pensando num jeito de dispersar os alunos daquela euforia e de impedir o confronto de Gaara e Sasuke. Que, além de inevitável, era previsível.

Durante o intervalo, Shikamaru foi chamado na diretoria, onde num primeiro momento, quiseram confirmar a história da briga. Num segundo momento, tentaram convencê-lo a voltar à rádio e dizer que aquilo era mentira.

— Eu olhei bem para a cara dela… — começou Shikamaru, quando saiu da diretoria e encontrou os no refeitório. — e disse: "Desculpe, diretora Tsunade, mas eu não posso. O nome da Rádio de Konoha está em jogo e, com ele, o nome do meu melhor amigo, responsável pela rádio. Além disso, o fato de "desmentir" essa história, não vai mudar o fato de que ela NÃO é mentira”. 

— Isso é verdade — disse Tenten, parecendo subitamente séria. — Mas agora a diretoria vai fazer de tudo para impedir a briga, não é?

— Como ela deveria fazer! — disse Chouji. — É para isso que ela tem o emprego dela.

— É, mas o próprio Sasuke fez questão de que a história se espalhasse — disse Naruto, calmamente. — E agora não tem escapatória. Ou eles brigam ou perdem o respeito dos colegas.

— O Naruto tem razão — Shikamaru disse isso como se fosse uma grande surpresa para ele.

 — E qualquer uma das duas coisas, são vantajosas para nós — concluiu Shino.

Após um segundo de silêncio, Lee levantou uma latinha de Coca-Cola e disse, tentando ficar sério: 

— Aos Outros!

— AOS OUTROS! — responderam os demais. 

— O que vocês estão comemorando?

Nesse momento, Naruto sentiu uma mão nada gentil pousar no seu ombro. Quando olhou para trás, viu Sasuke o encarar com aquela expressão de "eu-quero-te-matar", que lhe era tão peculiar.

— Nada — disse Tenten, antes que Naruto conseguisse abrir a boca.

— Parece que fez um bom trabalho, Naruto — Sasuke continuou — Mas dá próxima vez, não abusa da sorte. Entendeu?

— O Naruto não fez nada — retrucou Shikamaru. - Fui eu.

— Não é para mim que você terá que se explicar, Nara.

Ao dizer isso, Sasuke se afastou. Estava claro que ele não estava feliz com o modo com que as pessoas ficaram sabendo da briga. Ele tinha mandado espalhar a notícia, não criar um caos, irritar o Gaara e colocar mais pressão sobre eles. 

— Vai entender esses caras — comentou Shikamaru.

— Me lembre de te agradecer depois — disse Naruto, levantando novamente a latinha de Coca-Cola, como se fosse um brinde.

— Eu estou pior que você, amigo! — Shikamaru dessa vez não riu. — Gaara provavelmente não sabe que foi o Sasuke que te pediu para espalhar sobre a briga. Para ele, fui eu que criei essa situação. Não ouviu o que o Sasuke disse?

Mais um segundo de silêncio e, mais uma vez, Lee deu a primeira palavra:

— A Sasuke e Gaara...

Ninguém se deu ao trabalho de responder e Lee sequer esperava uma resposta.

Perdedores podem ter seus momentos de glória, mas no final, continuam sendo perdedores.