Capítulo 196 - Arquitetando uma casa da árvore

Não demorou muito para nosso grupo estar ali, bem em frente à árvore do jardim de Wilson em mais um plano maluco: construir nossa própria casa da árvore. Bem, devo confessar que de todas as ideias que Wilson já teve aquela era uma das mais lights. Afinal, o que pode ter de tão extravagante em construir uma casinha em cima de uma árvore idosa e resistente? Não daria para inventar muita coisa disso, daria?

– Ótimo! Estamos prontos! - disse Wilson, que havia gasto um certo tempo procurando seu bom e velho macacão azul para atividades manuais, além de um boné bem gasto e velho - Podemos começar a construir alguma coisa

Todas aqueles pedaços de madeira que Jorjão havia trazido da garagem do vizinho marceneiro foram colocados de modo abrupto no chão. A coisa realmente estava ficando sério.

– Arf! Por que eu tive que carregar tudo isso? - perguntou ele.

– Porque você é o mais forte de todos nós - respondeu Demi.

– Nem tanto. Sou apenas...o mais alto.

– O importante é que já temos um material para começar a construir nossa casa - disse ele - Ah, isso vai ser bom! Mas antes...vamos elaborar um rascunho de nosso projeto.

– Não acho que uma casa da árvore vá ser construída de uma hora para outra - comentei - Espero que seu rascunho leve isso em consideração. Não vá pensar grande demais, heim?

– Daniel, Daniel. Somos a NERD. Temos que pensar grande! Mesmo que demore muito.

Bom, ele é o cara que conseguiu produzir um filme de custo quase zero. Melhor não duvidar da capacidade daquele cara. O problema é que aqueles pedaços de madeira não me inspiravam muita confiança.

– Esses...pedaços de madeira são resistentes mesmo? - indaguei.

– Relaxa. O vizinho marceneiro me devia um favor - respondeu Wilson, enquanto rabiscava algumas coisas em um pedaço de papel - Ajudei a ele a arrumar a máquina de serrar madeira. Economizou uma boa grana...se tivesse mandado consertar sairia bem mais caro. Sabia que ele iria concordar em nos ajudar.

– É verdade. Foi só o Wilson ligar avisando que eu iria buscar que ele já estava com toda a madeira pronta - explicou Jorjão, sentando-se no chão para descansar do pesado trabalho de trazer aquela madeira de uma casa da mesma rua.

– Legal da parte dele dar esses pedaços que não vai mais usar para a gente - falou Demi.

– Pronto! Tive uma ideia inicial para nossa base! - disse Wilson, todo empolgado - Se liguem só!

Pegamos a folha de papel sulfite A4 que ele rabiscou e vimos o início do projeto. A planta não parecia ser muito fiel ao real.

– Quer mesmo uma casa da árvore com cozinha, banheiro, salão de jogos, salão de reuniões, saída de emergência e sala de descanso? - perguntei - Isso não é demais, não?

– Só pensei no mínimo que a NERD precisa - disse ele - A ideia é muito simples. Fazemos uma escadinha com alguns pedaços de madeira menores. Isso para começar. Mais tarde podemos construir um elevador. Daí, tem a entrada principal que leva para a sala de descanso, apenas um lugar onde colocaremos um telão para filmes e jogos de video-game. Daí tem uma entrada nos fundos para a cozinha, a copa, o banheiro e um salão de arquivos para colocarmos todos os nossos planos construídos. Mais visivelmente, colocaremos a entrada para a sala de reuniões, onde realmente poderemos discutir nossos planos de forma mais detalhada e confortável.

Em outras palavras, o lugar onde ele sempre nos chamaria para discutir as ideias malucas. Algo me diz que seria o lugar mais usado naquela casa.

– E aqui... - perguntou Demi, apontando para a sala de jogos.

– Ah, sim. Um salão de jogos. Nada de muito extravagante. Apenas algumas mesas de bilhar, uns fliperamas e alguns simuladores de voo. A gente precisará de um momento de lazer de vez em quando.

– E a saída de emergência? - perguntou Jorjão.

– Sim. É tipo um poste que a gente vai colocar para descer escorregando que nem os bombeiros. Uma vez já pensei em ser bombeiro só para descer escorregando por um desses - disse ele, na maior empolgação. Mas nesse ponto devo concordar com ele. Aquela descida de emergência dos bombeiros era legal pra caramba!

– Sem querer ser estraga-prazeres - entrei na conversa - Mas não acha que é muita coisa para uma simples casa da árvore, não?

– Ora, Daniel. A nossa casa da árvore será progressiva - disse ele - Começamos com uma estrutura básica com esses pedaços de madeira e, com o passar dos anos, nosso projeto final estará concluído.

Incrível como ele via o mundo de forma tão simples. E claro, para variar, eu era o único que ficava inconformado com tudo aquilo.

– Se a tecnologia avançar mais até lá - agora foi um dos raros momentos em que Karina abria a boca - Poderemos fazer nossa casa maior por dentro do que por fora. Nada que uma tecnologia de tempo e espaço relativos não resolvam.

– Sim! Esse é o espírito!

É. Ela é fã de Doctor Who. Já Demi estava tão empolgada quanto, mas mesmo assim, glória, tinha uma postura mais realista.

– Suas ideias são ótimas, Wilson - falou ela - Mas...antes de termos tudo isso, vamos precisar montar a estrutura.

– Relaxa. Temos todo o material que precisamos aqui - falou ele, apontando para os pedaços de madeira cheios de farpas.

– Legal, Wilson, mas...você entende alguma coisa de marcenaria para a gente começar a trabalhar, não entende? - perguntei.

– Relaxe. Tudo que precisamos é de martelo, pregos, serrote e um plano. Já temos o plano e é fácil de conseguir martelo, pregos e serrote.

– É? E onde eles estão?

– É só ir na garagem. A caixa de ferramentas está lá - disse ele - Ou melhor, vou trazer toda a caixa de ferramentas. Deve ter outras coisas que podemos usar lá.

Em resumo, não sabíamos porcaria nenhuma de marcenaria. Essa impressão foi confirmada quando Wilson chegou e jogou todas as ferramentas no chão. E agora? Como a gente começa?

– E então? - perguntei.

– E então o quê? - indagou Wilson, com uma voz levemente nervosa.

– Como a gente começa?

– Pelo começo, Daniel. É muito simples.

– E como é o começo?

– Bem, o começo é o oposto do fim - disse ele - Tudo começa...com um pedaço de madeira. Tudo vem da madeira. Essa madeira veio de uma árvore e agora retornará à natureza em contato com uma irmã árvore. O ciclo da madeira não é lindo?

– Wilson. Precisamos de um marceneiro e não de filosofia... - comentei.

– Tá lega! Tá legal! Eu admito! - exclamou Wilson - Não sei nada de marcenaria! Mas podemos aprender. Só precisamos procurar um tutorial no YouTube sobre isso e...

Olha, sinceramente, eu não acho que aprenderemos marcenaria assistindo um simples vídeo do YouTube, embora eu não duvide que existam. Acho que nosso sonho de uma casa da árvore futurista vai ficar só no sonho mesmo.

– E aí, meninos? O que estão fazendo? - era o pai de Wilson, que estava de folga naquele sábado. Já falei como o pai de Wilson é parecido com o filho? Agora já sei como Wilson será no futuro e poderei fugir de qualquer empregador que tenha a cara dele. Mas era gente boa, isso não podemos negar. Já conversamos algumas vezes com ele, embora seu jeito não fuja muito do...bem, jeito Wilson de ser.

– Estamos querendo construir uma casa da árvore - disse Wilson - Mas...não temos muita ideia de como começar.

– Uma...casa da árvore? - o pai dele pareceu ter sido picado por algum mosquito de entusiasmo - É uma casa da árvore mesmo que vocês querem?!

– S-Sim - gaguejou Wilson - O senhor já fez uma?

– Meu...meu sonho de garoto. Era construir uma casa da árvore! - disse o pai de Wilson, com os olhos brilhando - Filho, pegue as ferramentas! Eu vou ajudar nesse projeto!

– Pai - Wilson também parecia estar com os olhinhos brilhando - O senhor é o melhor pai do mundo!

Agora eu posso ter certeza de que existe um gene Wilson...oh, como o mundo estará daqui a centenas de anos, quando esse gene terá se espalhado pela Terra? De qualquer modo, vamos ver...será que conseguiremos construir uma casa da árvore?