Capítulo 182 - Xeque-Mate

- Tá legal - continuou Sérgio - Vou falar porque decidi fazer tudo isso.

Ótimo. Éramos todo ouvidos. Afinal, o que levou Sérgio a fazer tudo o que fez? Não só no Megatec, mas em todas as escolas por onde passou.

- Bom, na verdade, tudo começou quando percebi uma característica comum nas pessoas - disse ele.

- Característica? - indagou Wilson.

- Sim - continuou ele - As pessoas são distraídas e não prestam atenção em detalhes.

Até aí, nada de novo.

- E o que isso tem a ver? - perguntou Demi.

- Bom, tudo começou quando eu estava com a minha mãe no supermercado - ele continuou - Ela colocava cada produto que ia levar no carrinho e continuava andando. Mas, foi aí que eu percebi uma coisa. Se eu colocasse trocasse o produto que ela colocou por um outro exatamente idêntico, ela não percebia.

Resumindo, quando sua mãe coloca um pacote de arroz no carrinho, você tira e coloca um outro pacote de arroz da mesma marca e do mesmo tamanho sem que ela perceba.

- E daí? - perguntou Jorjão.

- Não percebem? - Sérgio sorria - Eu consegui mudar todas as compras da minha mãe sem que ela sequer percebesse! Foi aí que eu conheci minha verdadeira habilidade: armar pegadinhas! Dizem que o crime perfeito não existe, mas provavelmente porque nunca ninguém o descobriu! Desde então comecei a ficar fissurado em armações. Estudei, treinei truques, pesquisei as mais diversas áreas até finalmente ganhar confiança para começar a agir. Ah, eu me lembro como se fosse hoje...aquela escola amanhecendo com a estátua toda zuada. Hilário.

Sérgio ria de sua própria história. Mas ainda tínhamos muito mais para ouvir.

- Mas fazer as mesmas coisas na mesma escola não tinha muita graça. Por sorte, meus pais sempre achavam algo de ruim nas escolas que frequentei e acabavam mudando eu e meus irmãos para outro colégio. Enfim, acabamos vindo para o Megatec...entramos no ano passado.

Ano passado. Foi quando eu e Demi entramos. Aquele cara foi calouro do colégio junto comigo.

- Ano passado...foi quando formamos a NERD - lembrou Wilson.

- Exato - disse ele - Eu acompanhei a trajetória de vocês, desde que ouvi falar de uns alunos que entraram no colégio à noite.

Foi na vez que viemos investigar se havia ou não o Estagiário Fantasma. Foi tudo uma grande palhaçada, mas Sérgio parecia nos acompanhar desde aquela época.

- Fiquei curioso...eu ainda estava estudando o colégio, esperando um momento para agir, mas vi que também tinha estudantes bem espertos por aqui. Mas eu escolhi esperar. Esperei mais ações de vocês e a cada semana que passava, via de longe seus projetos mirabolantes. Vocês concorreram para o grêmio da escola, desafiaram um time do ensino médio para um jogo de basquete, apresentaram um musical, mas a melhor parte de tudo...é que fizeram seu próprio filme! Eu finalmente havia encontrado alguém que valesse a pena desafiar!

- Ha..haahuaha...não é? Afinal de contas, somos a NERD! A gangue que domina essa escola! Hehe! - disse Wilson, que amava ver nossa gangue reconhecida. Já eu, estava simplesmente assustado por ter uma única pessoa naquele colégio que acompanhava nossas bobagens com tanta admiração. Ele não devia bater bem da cabeça. Ei, espera aí...estamos no Megatec. É ÓBVIO que ele não devia ser uma pessoa mentalmente sã! Ele não podia ter vindo para um colégio melhor.

- Sim. Vocês fizeram meu sangue ferver! Acompanhei tudo que fizeram por mais de um ano, mas finalmente havia chegado a hora de agir. Eu quase nunca fico mais de dois anos no mesmo colégio. Aposto que ano que vem meus pais vão me mudar de escola. Mas antes disso eu precisava deixar meu nome nessa escola. Só que para fazer isso, precisaria fazer algo grande, algo que ficasse na história dessa escola para sempre!

- E por isso você decidiu nos testar? - perguntou Demi.

- Isso mesmo. Comecei com pegadinhas leves. Depois, passei para as mensagens mais claras. Não bastava eu fazer algo grande. Precisava derrotar a NERD! Precisava sair dessa escola tendo certeza de que teve algo que a NERD nunca foi capaz de fazer: derrotar o Troll! E isso ficará marcado hoje, com aquilo que chamo de pegadinha suprema!

- Pegadinha suprema? - indagou Demi - Como assim?

- Olhai! - disse ele, caminhando até um pedaço de pano que nenhum de nós havia percebido e revelando uma geringonça estranha.

- O que é isso? - perguntei.

O negócio tinha várias garrafas de refrigerante de cola (aquele preto, você sabe) e estava acoplado a um tipo de máquina que eu desconhecia. De todo modo, as garrafas estavam apontadas para o pátio, mais especificamente para a quadra do colégio, onde a cerimônia dos campeões das olimpíadas escolares seriam homenageados.

- Vocês sabem o que acontece quando esse refrigerante entra em contato com uma certa marca de bala de menta? - disse ele, com uma expressão maquiavélica.

- Espera...você está falando...da reação explosiva do refrigerante com a bala? - perguntou Wilson.

- Sim! Esse será meu último trunfo! A grande explosão de refrigerante do Megatec! Essa máquina atingirá a cerimônia de entrega das medalhas das olimpíadas escolares que ocorreram esse ano na escola, causando um grande tumulto! Nenhum terrorista faria melhor!

Ele realmente parecia em êxtase.

- Não se pudermos impedir! - falou Wilson, indo até a máquina, só para dar de cara com um mecanismo desconhecido - Ei, que negócio é esse?

- Isso será acionado à distância - falou Sérgio - Não pode ser destravado sem a senha correta. Vocês não podem impedir o ataque.

- Então..tudo acabará em refrigerante? - concluiu Demi.

- Seu monstro! Como pode desperdiçar tanto refrigerante assim? - bronqueou Jorjão.

- Sinto muito...certos sacrifícios precisam ser feitos para entrar na história. E o fato é: o Troll estará nessa escola como símbolo! Aquele que causou o caos completo e nunca foi descoberto! Hauhauhaha! Poderei sair desse colégio com a certeza de que fiz a maior pegadinha de todas!

Não que eu me importe com a entrega das medalhas das Olimpíadas escolares. Não que eu me importe se a quadra da escola ficará toda melada de refrigerante. O que realmente me incomoda é que perdemos todas essas semanas perseguindo um babaca desses. Juro que lá no fundo, bem no fundo mesmo, imaginava que o Troll fosse uma pessoa um pouquinho diferente, mas já devia saber que ter esperanças de encontrar alguém dentro dos muros do Megatec que não fosse doido é inútil.

- Mas Sérgio - falou Demi, tentando inutilmente fazê-lo pensar em seus planos - Nós já sabemos que você é o Troll. Nós já te descobrimos. Tudo que fizer agora não vai mudar isso.

- Sim, vocês descobriram. Mas isso é inútil se ninguém da escola acreditar em vocês - falou Sérgio - Afinal, como vão provar que eu sou o Troll? Será minha palavra contra a de vocês.

- Até parece - falou Wilson, agora esboçando um sorriso confiante - Não subestime a NERD, Sr. Troll!

Ele revela um gravador escondido no bolso.

- O quê....?! - Sérgio mostrou uma cara de preocupado.

- Isso mesmo! Estávamos gravando essa conversa o tempo todo, inclusive quando você confessou ser o Troll! - disse Wilson, apontando confiantemente para a cara de Sérgio - Você está acabado!

- Oh, droga... - disse Sérgio, se virando - Parece que vocês me pegaram...

- Heh! É como eu disse, nunca subestime a NERD! - falou Wilson.

- ...SÓ QUE NÃO! - Sérgio voltou para nós de novo com uma expressão insana, mostrando um outro tipo de aparelho, que estava dentro de sua camiseta.

- O que é isso? - perguntou Wilson.

- Que pena, NERD! Vocês quase me pegaram! Huahauhauha! - Sérgio ria escandalosamente - Mas eu desenvolvi um aparelho capaz de emitir um frequência que interfere nas gravações, seja em áudio ou em vídeo. Acham mesmo que eu viria para cá, me arriscando a encontrar com vocês, sem me prevenir quanto a isso? Eu não subestimei vocês, foi o contrário..vocês é que me subestimaram. Estão lidando com o Troll.

O cara pensava em tudo mesmo. Parece que teríamos que engolir essa.

- Ele criou até isso?! - Demi estava admirada - Ele é mesmo um gênio.

- Incrível - comentou Jorjão.

- Admita, Wilson! A NERD foi derrotada! A identidade do Troll nunca será revelada. Eu sairei desse colégio no final do ano e a história nunca será apagada! Houve uma coisa que a NERD nunca foi capaz de fazer: derrotar o Troll! Ele ficará eternamente gravado como o personagem mais incrível da história desse colégio! Hauhauhaha!

Wilson caiu de joelhos. Sim. Esse era o pior cenário. O sonho que Wilson preparou para a nossa gangue era simples: sermos o grupo mais incrível daquele colégio. Mas se fomos derrotados por uma única pessoa capaz de ocasionar um evento mais incrível que qualquer outra coisa que tentarmos fazer...então não somos os mais incríveis. Nunca seríamos capazes de superar a lenda do Troll a menos que conseguíssemos fazer uma pegadinha tão fantástica quanto aquela. Espera...se formos derrotados, Wilson vai querer criar uma pegadinha ainda pior para superarmos o Troll. Não, não pode ser. Deve ter um jeito de impedir esse cara.

- Não acabou ainda - gritei - Demi! Rápido! Chame alguém da coordenação até aqui! Ainda podemos pegar o Sérgio!

- Não, não podem. Como eu falei, é a minha palavra contra a de vocês. Eu posso muito bem dizer que vocês estavam planejando isso o tempo todo. Lembrem-se, vocês sempre aprontaram todas! Todos vocês são suspeitos de serem o Troll

- Bobagem. Nós somos os únicos que estavam te investigando - reclamou Jorjão.

- Exato. Quer um disfarce melhor? O detetive ser o criminoso...é bastante inteligente. E vocês são inteligentes. Além disso, todos vocês estão sempre juntos. Se um mente, é a mesma coisa de todos mentiram. Mesmo sendo cinco, a palavra de vocês vale por um. Cai perfeitamente. A união de vocês foi sua derrota. Admitam. Sem uma gravação ou prova, vocês nunca poderão me incriminar! Vocês são todos uns perdedores! Mas reconheço que foram ótimos adversários...vocês tem o meu respeito por conseguirem me descobrir, mas se não puderem provar que eu sou o Troll, não conseguiram me vencer. Sinto muito.

- Será mesmo? - falou Wilson, ligando o gravador.

- Duvida? Eu testei várias vezes esse aparelho! Ele interfere com qualquer gravação. Tudo que você vai escutar nesse gravador serão apenas ruídos - disse Sérgio, totalmente confiante.

- Então, como explica isso? - disse Wilson, mostrando em alto e bom som a confissão de Sérgio.

- Hã? Como? - agora a expressão de Sérgio ficou séria - Ei, espera aí...isso é impossível! Meu interceptor deveria anular qualquer tipo de gravação, como..

- Talvez eu consiga explicar... - disse uma voz conhecida, entrando pela escada. Era Cássio, a outra pessoa que estava investigando o Troll - ...Sérgio Sapiano...ou devo dizer, Troll!

- Como? - Sérgio não estava entendendo nada.

- É simples - disse Wilson - Imaginei que você tivesse alguma coisa para interceptar minha gravação. Acha que eu também não conheço essa tecnologia? Por isso, pedi que Cássio usasse um anti-interceptor para impedir o seu de funcionar.

- Hã? Você não contou isso pra gente - falei.

- Desculpem. Mas Sérgio não podia desconfiar de nada. Nossa reação precisava ser de surpresa - disse ele.

- Quando vocês combinaram isso? - perguntou Demi.

- Cássio estava atrás da gente para tentar roubar, digo, conseguir alguma informação que a gente tivesse. Daí, hoje, antes de entrar na sala de xadrez para espiar o Sérgio, encontrei com ele e mostrei meu anti-interceptor. E não é que deu certo?

- Mas espera aí! - reclamei - É o Cássio! Por que ele ajudaria a gente?

- Não pense que gostei de fazer isso - falou Cássio - Mas tive uma razão muito boa para fazê-lo. Se o Sérgio vencesse, vocês seriam derrotados por ele e não por mim! Não posso admitir isso! Eu é que vou derrotar a NERD, ouviu

Cássio se aproximou de Sérgio e tomou o interceptou das mãos dele.

- Humph! Amador - zombou Cássio, deixando Sérgio furioso.

- Heh! Realmente...até hoje vocês foram os únicos que conseguiram bater de frente comigo - disse ele, pegando o outro controle - Mas ainda posso rir por último! Ainda tenho o controle da explosão de refrigerante! O Troll pode ter acabado, mas a pegadinha suprema ainda será realizada!

Ele tinha surtado. Já era a calma e frieza do Troll.

- Ah, vai pensando - disse Demi, arremessando um de seus pompons (é, ela ainda estava com eles devido ao seu disfarce de líder de torcida) bem nas mãos de Sérgio. O controle caiu e Wilson o pegou. Agora, tínhamos mais uma prova contra Sérgio.

- É isso aí, Sérgio. Xeque-mate! - disse Wilson, para as lágrimas do Troll.

- N-não pode ser...meu plano perfeito...falhou - lamentou ele, caindo de joelhos no chão.

Não demorou muito para entregarmos Sérgio para as autoridades, ou melhor, para a coordenação. Devido a todos os crimes digitais e pegadinhas, não havia dúvida de que ele seria expulso. Foi o preço a ser pago por agir como Troll. E ele também não poderia mais agir em outras escolas, pois seria facilmente capturado, agora que sua identidade foi revelada. Fim de jogo. O colégio estava em paz de novo, leia-se, a NERD era a única coisa que poderia tirar a paz do colégio agora.

- Obrigado mais uma vez por nos ajudar, Cássio - falou Wilson na hora do intervalo do dia seguinte, agradecendo seu rival pela ajuda.

- Só não queria que ele ganhasse de vocês antes de mim - reclamou ele.

- Não teríamos conseguido sem você - falou Demi.

- Vamos considerar um empate, tá bom? - disse ele - Vocês pegaram o Troll antes de mim, mas só puderam provar porque eu ajudei. Mas na próxima, eu derrotarei vocês sem dúvida! Falou, otários.

- Ele nunca vai pegar leve com a gente, né? - disse Demi.

- Deixe-o - falou Wilson - Vocês sabem que é o jeito dele. Mas agora, podemos respirar aliviados. Ainda podemos nos tornar o grupo mais incrível desse colégio.

Sinceramente, acho que desmascarar o Troll é algo bastante incrível. Tudo bem, tudo bem, admito. O currículo da NERD não tem só maluquices. Também conseguimos fazer algo de bom.

- A partir de amanhã, já podemos voltar com nossas atividades normais - falou Wilson.

- Por quê? O que vamos fazer amanhã, Wilson? - perguntou Jorjão.

- O mesmo que fazemos todos os dias, Jorjão - disse Wilson, com os punhos fechados e olhar maquiavélico - Tentar dominar o colégio!

Ele falou isso de novo! Ai, ai! É minha sina seguir as maluquices desse cara. Os tempos de paz duram pouco. Ufa. Toda essa história me cansou. Acho que preciso de umas férias antes de voltar a narrar os acontecimentos do restante do semestre. Sim, ainda não acabou. Mas eu preciso de um descanso, tá legal? Chega de brincar de detetive...

Fim de transmissão.