Ela foi para lá sem muitas discussões, isso era um tanto surpreendente. E eu fui procurar algumas pessoas para julgá-la. É claro que elas todas falariam coisas que pudesse condená-la a ficar comigo para sempre! Eu não era tonto, chamei Jeb, Doc e Jared.

Certamente apenas esses seriam capazes de julgá-la, nem precisaria chamar Jamie para participar. Jamie não merecia ver isso, Peg também não contou a ele, e ele não podia sofrer, não como eu. Jamie e eu éramos os únicos que a amávamos verdadeiramente.

Peg estava sentada perto da luz azul do centro, nós quatro estávamos do outro lado, paralelos a ela. Ela na posição de julgada e nós julgando. Jeb até trouxe a arma para que tudo fosse mais oficial e servisse de martelo.

- Como ela está? – Peg perguntou a Doc antes de começarmos.

- Qual delas? – Doc respondeu.

Quando eu fui buscá-lo, tive uma surpresa, Sunny já tinha ido, Jodi logo estaria de volta. O nosso momento especial foi mais longo do que pensei, Doc não pode esperar mais, ele teve que separar o corpo e a alma, Sunny teria que dar espaço para Jodi.

- Sunny? Já?

- Kyle achou que seria cruel fazê-la sofrer por mais tempo. Ela estava…infeliz.

- Eu gostaria de ter podido dizer adeus... – Peg murmurou de cabeça baixa. - E boa sorte. Como está Jodi?

- Sem responder ainda.

- E o corpo da Curandeira? – Peg perguntou.

- Trudy a tirou de lá. Eu acho que elas foram pegar algo para comer. Elas estão tentando achar um nome temporário que ela goste, para podermos chamar ela de algo além de O Corpo.

- Ela vai ficar bem, eu tenho certeza. – Peg disse dando esperança. - E Jodi também. Tudo vai dar certo.

- Eu não quero ficar longe de Jodi por muito tempo. Ela pode precisar de alguma coisa. – Doc falou preocupado.

- Certo. – Peg concordou. - Vamos acabar logo com isso.

- Okay. - Jeb disse. - Peg, qual o seu lado disso?

- Eu vou trazer Melanie de volta. – Ela foi firme e curta.

- Ian, qual o seu?

- Nós precisamos de Peg aqui. – Disse firme e curto, imitando ela.

- Essa é complicada. Peg, por que eu devia concordar com você?

- Se fosse você, você iria querer seu corpo de volta. Você não pode negar isso a Melanie.

- Ian? – Jeb me chamou.

- Nós temos que olhar para o bem maior Jeb. Peg já nos trouxe mais saúde e segurança que jamais tivemos. Ela é vital para a sobrevivência de nossa comunidade, de toda a raça humana. Uma pessoa não pode ficar acima disso. – E eu a amava, só isso bastava.

- Peg, o que Mel acha disso? – Jared perguntou.

- Melanie quer o corpo dela de volta. Ela quer a vida dela de volta. – Peg mentia bem mal, não sei por que ela insistia em fazer isso.

- Mentirosa. – Eu acusei. - Eu consigo ver você discutindo com ela. Eu aposto que ela concorda comigo. Ela é uma boa pessoa. Ela sabe o quanto precisamos de você.

- Mel sabe tudo o que eu sei. Ela será capaz de ajudar vocês. E a hospedeira da Curandeira. Ela sabe mais do que eu jamais soube. Vocês ficarão bem. Vocês estavam bem antes de eu vir aqui. Vocês vão sobreviver, assim como antes.

- Eu não sei Peg. Ian tem uma certa razão. – Jeb falou.

Estava olhando o rosto idiota e feio de Jared, por ele Peg ia embora para que ele ficasse com Melanie. Só que o maior problema era que eu queria ficar com Peg, e ele não ia me impedir, jamais...

- Jeb. – Jared protestou. - Só tem uma decisão a se tomar aqui. Você sabe disso.

- É garoto? Parece que tem um barril cheio delas para mim.

- Aquele é o corpo de Melanie!

- E da Peg também.

- Você não pode deixar Mel presa lá, é como assassinato Jeb.

Sempre Melanie em primeiro lugar, isso não era justo! Desgraçado, não pensava na pequena e linda alma que estava dentro dela... O corpo poderia ter sido um dia de Mel, mas hoje, a alma Peg era minha, só minha! E ela ia viver do meu lado!

- E o que isso vai fazer com Peg? E o resto de nós se você a mandar embora? – Murmurei.

- Você não liga para o resto! Você só quer manter Peg à custa de Melanie, nada mais importa para você.

- E você quer ter Melanie à custa de Peg, nada mais importa para você! – Gritei. - Então com isso sendo igual para nós, no final só importa o que é melhor para os outros.

- Não! O que importa é o que Melanie quer! Aquele é o corpo dela!

Eu estava louco de raiva, por mim eu voava para cima dele e arrancava cada centímetro da sua cara. Queria arrancar cara camada de pele, depois seus músculos, e despedaçar seus ossos...

- Calma, garotos. Parem com isso agora mesmo. - Jeb ordenou. - Isso é um tribunal e nós vamos ficar calmos e manter a cabeça no lugar. Nós temos que pensar em todos os lados.

- Jeb... - Jared começou.

- Cala a boca! – Jeb mandou. - Okay, é assim que eu vejo as coisas. Peg tem razão...

Eu levantei, o sangue pulsando na minha cabeça. Como ele podia pensar num absurdo desses? Ele é o dono daqui, ele viu como melhoramos com tudo...

- Opa. Senta. Deixa eu terminar.

Jeb me esperou sentar, mas eu não deixei de estar nervoso.

- Peg tem razão. Mel precisa de corpo dela de volta. Mas... – Fiquei tenso. - Eu não concordo com o resto, Peg. Eu acho que nós precisamos muito de você criança. Nós temos os Buscadores lá fora procurando por nós, e você pode falar com eles. O resto de nós não pode fazer isso. Você salva vidas. Eu tenho que pensar no bem da minha comunidade.

- Então agente arruma outro corpo para ela. Óbvio. – Jared falou com os dentes cerrados.

E pela primeira vez eu concordei com Jared, seria a melhor solução, não importava com o corpo, só com a alma... Meus olhos se arregalaram e olhei para Peg, para que ela considerasse isso, e o fizesse.

- Não! Não! – Peg negou.

- Por que não Peg? - Jeb perguntou. - Não me parece uma má idéia.

- Jeb. Me ouça. Eu estou cansada de ser um parasita. Você consegue entender isso? Você acha que eu quero ir para outro corpo e começar isso tudo de novo: Sentir culpada por tirar a vida de um outro alguém: Eu preciso ter mais alguém me odiando? Eu mal sou uma alma mais, eu amo vocês humanos brutos, demais. É errado estar aqui, e eu odeio isso. – Ela respirou fundo, lágrimas caiam de seus olhos. - E se as coisas mudarem? E se vocês me colocarem em um corpo de outra pessoa, roubar outra vida e sair errado? E se esse corpo me lançar atrás de um outro amor, de volta às almas? E se vocês não puderem mais confiar em mim? E se da próxima vez eu os trair? Eu não quero machucar vocês.

Não suportava a idéia de ver Peg chorando, não conseguia, eu a amava mais do que tudo. Movi-me para perto dela, esquecendo o julgamento completamente, nada mais era importante. Abracei-a com força e apoiei sua cabeça no meu peito, senti as lágrimas molhando minha camiseta.

- Tá tudo bem querida. Você não tem que ir a lugar algum. Nada vai mudar. – Eu sussurrei no seu ouvido.

- Pera aí Peg. – Jeb indagou. - Como é que a sua ida para outro planeta vai ajudar? Você ainda vai ser um parasita.

Eu enrijeci, Peg não podia ir embora, ela continuaria sendo parasita aqui nesse planeta.

- É diferente em outros planetas Jeb. Não há resistência. E os hospedeiros são diferentes. Eles não são individualizados como os humanos, suas emoções são mais sutis. Não parece com o roubo de uma vida. Não como aqui. Ninguém vai me odiar. E eu estarei muito longe para machucar vocês. Vocês ficarão mais seguros…

- Isso tá... complicado. – Jeb suspirou.

- Jeb... – Eu e Jared dissemos, depois paramos para nos encarar.

- Jeb. – Peg disse de vagar, todos olharam para ela. - Você não tem que decidir agora. Doc precisa checar Jodi e eu gostaria de vê-la também. Além disso, eu não comi o dia todo. Por que você não pensa nisso durante a noite? Nós podemos conversar novamente amanhã. Nós temos tempo para pensar sobre isso.

- É uma boa idéia Peg. Eu acho que todos nós precisamos de uma pausa. Vá comer alguma coisa, e todos nós pensaremos nisso pela noite.

- Eu irei te ajudar com a Jodi assim que eu comer, Doc. Te vejo mais tarde.

- Okay. – Doc concordou.

- Com fome? – Murmurei.

Ela assentiu, eu levantei e a ajudei a levantar. Segurei firme sua mão, não ia deixar ela ficar longe nenhum segundo. Iria observá-la para que ela não fosse antes do tempo, ou fizesse alguma de suas atitudes altruístas.

Primeiro fomos comer, ela não queria comer no refeitório, não queria que Jamie a visse. Concordei com ela, por mais que eu não fosse deixar ela ir embora. Ela ficou escondida no campo de arroz enquanto busquei comida.

Comemos em silêncio, eu sempre mantinha meus braços em torno de sua cintura, agarrando ela bem forte. Depois que acabamos, fomos ver Sunny e Jodi.

Quando chegamos no hospital, não foi uma cena boa que vimos. Jodi continuava deitada na cama, sem reação. Kyle e Doc estavam do seu lado, sem muito o que fazer. Peg caminhou para ajudá-los, e eu fui junto.

Kyle segurava um criotanque, provavelmente o que Sunny estava. Ele não deixava nenhum segundo de segurar as mãos de Jodi.

- Você precisa ser delicado com isso. – Peg murmurou em relação ao criotanque.

- É, Doc me disse. - Kyle falou, percebi que ele tinha chorado e não dormido. - Eu estou sendo cuidadoso. Eu só… não queria deixar ela sozinha ali. Ele era tão doce e estava tão triste.

- Tenho certeza que ela gostaria disso, se ela soubesse.

- Há alguma coisa que eu devia estar fazendo aqui? Há alguma maneira de ajudar? – Perguntou segurando a mão de Jodi.

- Fale com ela, diga o nome dela, fale sobre coisas que ela lembraria. Incluindo Sunny. Isso ajudou com a hospedeira da Curandeira.

- Mandy. - Doc a corrigiu. - Ela diz que não é bem isso, mas é perto.

- Mandy. – Repetiu para lembrar. - Onde ela está?

- Com Trudy, foi uma boa aposta, Trudy é exatamente a pessoa certa. Eu acho que ela a colocou para dormir.

- Isso é bom. Mandy vai ficar bem.

- Espero que sim. – Doc sorriu. - Eu tenho muitas perguntas para ela.

Tantas coisas ocorrem nos últimos tempos, isso nunca acontecia na monotonia da caverna. A exatamente um ano, eu deveria estar trabalhando ou incursionando em algum lugar.

- Assim Kyle. – Ela disse passando a mão no braço dela. - Jodi? Jodi, você pode me ouvir? Kyle está esperando por você. Ele se meteu em muita encrenca por te trazer aqui, todo muito que o conhece quer o espancar. – Ela sorriu para ele, mas bem que eu queria espancá-lo também.

- Não que você esteja surpresa de ouvir isso. – Eu disse falando com Jodi. - Quando é que esse não foi o caso, hein Jodi? É bom te ver de novo gracinha. Apesar de não saber se você se sente assim. Deve ter sido um alívio ter se livrado desse idiota por tanto tempo.

- Você lembra do Ian, claro. Nunca conseguiu me superar em nada, mas ele continua tentando. Ei, Ian. – Kyle me chamou levantando as sobrancelhas. - Você não tem nada para me dizer?

- Na verdade não. – Eu nem sabia do que ele estava falando.

- Eu estou esperando um pedido de desculpa.

- Fique esperando. – Resmunguei.

- Você acredita que ele me deu um chute na cara, Jodie? Sem motivo nenhum.

- Quem precisa de motivo, né Jodi?

Ri das várias lembranças minhas socando a cara de Kyle, muitas vezes nos arriscamos fazendo perto de almas. Era bem estranho reviver isso com Jodi, ainda mais por que ela estava totalmente inconsciente na nossa frente.

- Continue assim Kyle. – Peg falou. - Assim mesmo. Ela vai voltar.

- Peg? – Kyle a chamou.

- Sim?

- Desculpa. – Kyle pedindo desculpas?

- Humm.. por que?

- Por tentar te matar. – Ele disse como se fosse pedido de desculpas por um bate boca. - Imagino que eu estava errado.

- Por favor me diga que você tem alguma coisa que grave por aqui Doc. – Arregalei os olhos de surpresa.

Eu jamais, na minha vida, vi algo como isso. Kyle gentil até poderia existir com Jodi, mas Kyle que se desculpava? Kyle que se desculpava para uma parasita, como ele mesmo falava? Kyle admitindo um erro?

- Não. Desculpe Ian.

Ah que droga! Bem que eu queria um gravador agora, não era possível isso. Balancei a cabeça, ainda em choque. Realmente estávamos no fim do mundo.

- Esse momento devia ser preservado. Eu nunca imaginei que fosse viver para ver o dia em que Kyle O’Shea admitira estar errado. Vamos lá Jodi. Esse choque tem que te acordar. – Incentivei.

- Jodi, amor, você não vai me defender? Diga a Ian que eu nunca estive errado antes. - Ele riu.

Peg ficou calada um tempo, Kyle continuava a acariciar o corpo de Jodi. Depois de um tempo, Peg se afastou da maca e se espreguiçou. Ela deveria estar bem cansada, passou a noite acordada.

- Eu estou cansada Ian.

- Aposto que está. Você não ficou acordada com a Curandeira... com a Mandy a noite toda?

- Fiquei. – Bocejou.

- Boa noite Doc. – Eu disse a puxando para a saída. - Boa sorte Kyle. Nós voltaremos de manhã.

- Boa noite Kyle. – Peg murmurou. - Até Doc.

Caminhamos em silêncio, o mesmo aperto do meu coração voltou. Mas não ia deixar Peg ficar sozinha, nenhum momento. Eu a levei para o meu quarto, meio na dúvida se ela ia querer entrar.

Parei na frente da porta, levantei a sobrancelha como um pedido silencioso. Ela assentiu, abri a porta e ela correu se deitar em um canto. Ela se enrolou nas pernas, em posição fetal.

Eu deitei do seu lado, abraçando seu corpo, suas costas na minha barriga, e nossas pernas se tocando. Aquilo estava mais do que perfeito, nós dois juntos, como um só... Ali eu podia sentir seu calor, sua respiração e também seu tremor.

- Vai ficar tudo bem Peg. Eu sei que nós vamos encontrar uma solução.

- Eu de verdade te amo Ian. – Como era bom escutar essas palavras de sua boca. - Com toda minha alma, eu te amo.

- Eu de verdade te amo também minha Peregrina.

Eu movi meu rosto, desenhando com meu nariz na sua pele. Fui encontrando seu lábio, bem de vagar, sentindo cada parte dela. Depois a beijei, lento e gentil, amorosamente. A beijei com todo o meu amor, e isso era correspondido, era o que mais me deixava feliz.

- Durma Peg. Guarde para amanhã.

Ela assentiu e virou seu rosto para o meu, deixando os colados como os nossos corpos. Eu continuava abraçado a ela, estava tudo tão perfeito, maravilhoso, mágico... Logo cai no sono com ela se aconchegando em mim.