Wes tinha morrido, a Buscadora tinha arrancado sua vida. Aquela Buscadora, com a arma Glock, ela a usou contra o meu amigo... contra o meu amigo que não voltaria nunca mais... Wes morreu.

Ela atirou contra Brandt, mas graças a Deus ele estava bem. Wes não voltaria mais.

Terminamos de descarregar as coisas, cada caixa que eu colocava no chão, meu peito doía de tristeza por causa dele. Todos estavam abalados, não havia sorrisos em nenhum rosto.

Agora estávamos no refeitório comendo, bem, nem todos estavam engolindo, muitas pessoas enrolavam com a comida, sem apetite para nada.

Peg estava num canto isolada, estava chorando profundamente... Ela não estava bem, se sentia culpada, mas não era. Claro que ela não era, pensava que atraiu a Buscadora para cá, mas não era verdade.

Jeb e Doc estavam sentados perto de mim, Kyle e Jared. Eles estavam explicando sobre o ocorrido, contando todos os mórbidos detalhes da morte de meu amigo...

Aquele amigo que um dia me contou segredos, que foi camarada nas horas difíceis, que me fazia companhia, que não se importava em dividir o quarto quando pedíamos, aquele amigo que jamais eu ia esquecer...

- Conte-nos o que aconteceu Jeb. – Jared falava tentando parecer calmo, mas não convencia ninguém, ele estava tão abalado como todos nós.

- Foi a exatamente quatro dias atrás. – Ele começou. – Não pudemos esperar vocês, tivemos que enterrá-lo.

A exatamente quatro dias atrás tinha ocorrido algo que nos deixou com esperança: foi bem no dia que vimos a família com o bebê humano. Naquele dia pensamos que tudo ia mudar... Mas agora, vendo essa situação com Wes... eu não sabia mais no que pensar.

- Tudo bem, foi necessário. – Jared concordou.

- E como Lily está? – Perguntei.

- Não muito bem... – Doc suspirou.

- Depois eu falarei com ela. – Falei pra mim mesmo. – Pobre Lily, ela não merecia isso, não mesmo.

- E a Buscadora desgraçada? – Kyle perguntou dando um murro na mesa.

- Ela está sob vigia, no mesmo lugar que Peg estava antes. – Doc murmurou. – Estamos esperando para ver se ela quer falar alguma coisa.

- Ótimo. – Kyle xingou sarcástico.

- E o que realmente aconteceu? – Jared perguntou.

- Ela descobriu nosso esconderijo, veio como louca nos encontrar. – Jeb começou. – Tivemos que impedi-la, e foi ai que eles levaram o tiro.

Jeb nos contou com mais detalhes, agora Brandt estava bem, mas ele quase levou um tiro no pulmão ou coração. Doc nos contou que teve que trabalhar muito para conseguir tirar a bala de lá. Eu não ia suportar se ele tivesse ido também, Brandt era tão especial como Wes.

Wes não teve tanta essa sorte. A desgraçada da Buscadora acertou em cheio na mira dele. Ela atirou bem no meio de sua cabeça, não tinha nada para ser feito em relação a ele. O ser humano não vive sem seu cérebro, e o dele foi massacrado.

Agora Jeb iria falar com Peg, ele iria perguntá-la sobre a Buscadora. Ela estava inteiramente nas suas mãos, Peg que mandaria sua morte. Ficamos escutando atentos para ver o que ela iria dizer.

- Peg? Peg? – Jamie sacudia seu braço.

Ela parecia estar absorta em seus pensamentos, alguma coisa a incomodava muito.

- Peg? – Agora era Jeb a falar.

Ela olhou para cima, parecendo compreender.

- Os rapazes querem saber se você tem alguma pergunta para a Buscadora. – Jeb falou.

- E se eu não tiver? – Peg perguntou insegura.

- Eles já cansaram com o serviço de vigia. É um momento delicado. Eles prefeririam estar com os amigos.

Realmente era um momento delicado, bem delicado. Eu realmente não queria estar na pele deles, já bastava perder um amigo... ter que vigiar o assassino era bem pior. Eu no lugar deles já teria matado.

- Okay. – Peg assentiu. -  É melhor eu… ir vê-la logo então.

Ela se levantou, eu estava disposto a me levantar e acompanhá-la. Eu não gostava nenhum pouco da idéia de Peg ir com a assassina.

- Você está bem? - Jamie perguntou.

Ela assentiu com a cabeça.

- Você não precisa fazer isso. – Jeb a garantiu.

- Tá tudo bem. – Murmurou.

- Fique aqui Jamie. – Peg o pediu quando ele demonstrou que iria ir junto.

- Eu vou com você.

- Ah não, não vai não. – Sua voz estava forte, respeitosa.

Antes que eu pudesse me levantar e ir atrás dela, ela me parou com um olhar de reprovação. Eu suspirei e obedeci. O que Peg não me pedia sorrindo que eu não dava chorando?

Ela saiu e eu fiquei ali com os outros, abaixei na mesa enterrando meu rosto nos braços, e ali eu chorei, chorei muito. Não me importei com quem estava ao meu lado, nesse momento, nada mais importava.

Justo agora que ele tinha encontrado um amor? Justo agora que ele estava feliz, sorria... Por que foi acontecer isso justo agora? Isso só fazia as mágoas florescerem...

- Calma Ian, não fique assim! – Doc murmurou me consolando.

- Não era justo Doc! Ele não merecia isso!

- Eu sei Ian... Como eu sei... fiz de tudo, mas não deu...

- Você não é o culpado, pode ter certeza disso! – Engoli um pouco as lágrimas. – A culpada é aquela Buscadora nojenta!

- Tem razão, agora nem tem muito o que possa ser feito...

- Só resta lembrar dele pelas coisas boas... Eu preciso conversar com Lily, ela está abalada, certeza.

- Vai lá, ela precisa...

Caminhei de vagar até o corredor de dormitórios. A escuridão do lugar dava um ar fúnebre, dava vontade de se encolher e chorar.

Logo eu estava na frente de seu quarto.

- Lily?

Chamei-a pelo lado de fora de sua porta, não obtive nenhuma resposta convincente, mas ela estava lá, isso eu não tinha dúvidas. Podia escutar seu choro de longe, aquele choro de desespero, puro desespero.

- Lily? – Insisti mais uma vez.

- Ah Ian... – Soluçou. – Por que?

Abri a cortina que cobria a porta de seu quarto, tudo estava muito escuro lá dentro. Mal podia ver a silhueta agachada de Lily, totalmente encolhida, como se tentasse proteger sua vida, como se aquilo fosse amenizar a dor.

- Ah Lily...

Faltou palavras para eu consolá-la, eu não tinha muita coisa para falar, me abaixei do seu lado e a abracei. Apoiei sua cabeça em meu peito, e a segurei com força quando ela tremeu de tanto chorar.

- Não fique assim...

Sua voz saia num tom diferente do normal, ela estava rouca, mas ao mesmo tempo bem clara e penetrante.

- Por que ele tinha que morrer? – Era uma pergunta retórica.

- Eu não sei, eu também não entendo... Eu... – As palavras faltavam de minha boca.

- Justo agora Ian?

Mordi os lábios, não tinha palavras para isso, era muito triste. Wes tinha esperado tanto tempo por esse momento, tantos dias procurando um amor... e quando achou, ele se foi, e deixou essa mágoa no coração dela.

- Não da para acreditar, eu sei Lily. – Tentei consolá-la.

Ela apertou mais forte meus braços, seu corpo ainda tremia com o desespero e pranto.

- Por que ela tinha que vir aqui? Quem é ela? – Sua voz atravessava a barreira de desespero junto com a raiva e injuria.

Lily falava sobre a Buscadora, eu também não entendia por que ela teve que fazer isso... Justo Wes, se ela o conhecesse saberia que ele não era nenhum pouco ruim... Ele era um dos melhores aqui. Mas não, o que ela queria ela teve, mas uma vida arruinada...

- Eu não sei... mas olha, ela vai pagar por isso, pode ter certeza! – Falei sem ao menos ter certeza disso.

- Mas Wes não vai voltar... – Sua voz sumiu.

- Não, eu sei Lily... Isso é muito triste, mas...

- Por que a vida e os amores continuam?

Respirei fundo, eu precisava consolá-la, não adiantava mais sofrer.

- Sabe Lily, todo mundo aqui perdeu alguém que ama... Bom todos aqui perderam todo mundo não é?

- Mas ele era diferente, ele não foi possuído, ele só...

- Eu sei Lily, mas sabe, a vida é assim, você não pode ficar assim para sempre...

- Bem que eu queria morrer...

- Não fale assim, olhe para os outros aqui, os outros que te amam aqui... é como eu disse, cada um chorou um dia como você...

- Eu sei mas... – Sua voz soava um pouco mais calma.

- Todo mundo chorou, mas olha como todos estão agora? Eles não se recuperaram disso?

- Se recuperaram...

- Você também vai se recuperar Lily, é uma questão de tempo!

- Mas jamais vou esquecer disso.

- Não estou falando que você vai se esquecer, o que eu digo que você vai conviver com a dor... Não tem como esquecer, eu sei, mas... Lily, você tem que viver! Toda dor um dia vai passar, pode ter certeza!

- Ah Ian... – Ela voltou a soluçar como antes.

- Não se esqueça, ele não tá, mas você está viva! Você acha que ele iria gostar de te ver assim?

- Não, ele não gostaria... – Afundou a cabeça mais ainda no meu peito.

- Eu sei como você se sente, eu te compreendo, por isso quero te ajudar! Nesse momento você precisa mais do que tudo de um ombro amigo, de alguém para dar apoio.

- Isso você já faz, obrigada...

- De nada Lily, só digo para você ser forte, encarar as coisas de cabeça erguida...

- É difícil... – Ela relutava, mas eu sabia que era um motivo bem forte para isso.

- Eu sei que é... Mas olha, por mais que ele não esteja mais entre os vivos... Tem um lugar que jamais ele vai morrer... Você sabe disso não é?

- Sei, ele vai ficar pra sempre no meu coração. – Pelo tom de sua voz, eu podia até ver um sorriso, não de felicidade, mas de conformação.

- E não apenas no seu coração, mas também na sua mente... Você pode vê-lo lá quando quiser... Mas só se isso não te fazer sofrer...

Fiquei na dúvida em relação a que falei nesse momento, eu mesmo não saberia dizer se ela iria melhorar ficar lembrando dele... Talvez se ela conseguisse esquecê-lo, apagar completamente cada vestígio em seu coração... Mas isso poderia ser pior...

- Eu vou tentar melhorar Ian, eu prometo! – A voz continuava de choro.

- Você não tem que prometer isso para mim, e sim a si mesma!  A vida está de olhos abertos para você! Olhe para ela!

- Mas eu nunca mais vou ter ninguém para amar...

- Eu também pensei assim um dia, mas veja agora, eu tenho a Peg para amar...

- Mas eu nunca vou achar alguém como ele...

- Claro que vai, é uma questão de tempo!

- Ah Ian, você não sabe como me ajuda!

- Eu estou aqui sempre que precisar, você sabe disso não é?

- Sei sim...

- Você é uma grande amiga, quase uma irmã para mim... Bom, o meu conceito de irmão não é muito certo. – Sorri com a piada. - Eu não quero te ver sofrer mais...

- Eu vou tentar, mas... Ah Ian, ele era tão especial...

- Eu sei disso, pode ter certeza que eu sei.

- Os momentos que passamos juntos... Foram poucos, mas muito valiosos...

- Eles ficarão guardados para sempre com você!

- Pelo menos isso... Eu me lembro de quando ele contou seus sentimentos...

- Você duvidou não é?

- Sim... ah, eu não sabia que não tinha idade para o amor... – Lily voltou a se desesperar. – Se eu soubesse antes...

- Não tinha como saber, isso você não pode se culpar.

- Tantas lembranças...

- Lily, se isso te fizer sofrer, não fale mais...

- Não Ian, está tudo bem... não, não está, mas eu gostaria que estivesse...

- Vai ficar, pode ter certeza!

- Ah... – Chorou mais um pouco.

- Tudo pode mudar... Tudo.

Segurei ela mais forte, ficamos em silêncio. Não tinha mais nada que eu pudesse fazer por ela, agora só restava esperar o tempo decidir o que fazer... só restava esperar o coração de Lily se aquietar, se acalmar e poder relaxar...

Nem que isso demore, eu sabia que um dia ela ia superar cada coisa que aconteceu... Foi assim com todo mundo, é assim com todo mundo, sempre será... Enquanto tivermos um coração batendo aqui dentro, corremos o risco de morrer a cada segundo...

Minha mãe sempre dizia... Desde que nascemos, já estamos morrendo. Não era a mesma coisa, o que aconteceu com Wes foi totalmente proposital, mas mesmo assim, nada pode parar a morte, e quando chega a nossa hora... Nada pode impedir.

A única coisa que jamais podemos fazer é desistir de viver, por mais que você tenha traído tudo que considere especial, por mais que não haja lugar para você, por mais que seu grande amor não te ama, ou não pode estar junto a ti...

A vida é um presente, e não podemos jogá-la fora... Wes vai ficar na memória...