Percy acabara de contar ao pai sobre todas as coisas em que era viciado.

Kevin tinha a cabeça baixa e lágrimas rolavam até o tampo da mesa.

- Onde eu errei com você?

Mais lágrimas, todas involuntárias, ousaram cair dos olhos de Percy. Apesar de amar sua mãe mais do que qualquer coisa no mundo, sempre fora apegado ao pai e nunca pensou que poderia decepcioná-lo tanto assim. Verdadeiro foi quem disse que a verdade doía.

- Você não errou comigo. Eu errei sozinho. – Percy disse buscando os olhos baixos do pai. – E eu não vou pedir desculpas. Eu não vou parar.

- Não imaginei que você fosse. Me diz, como eu e sua mãe seguimos agora? Onde estão todas as coisas que nós te ensinamos? Quem te ensinou a não querer ajuda? Onde está o filho que eu tanto amo? O que você fez com ele? – Kevin levantou a cabeça somente para cuspir tais palavras em Percy sem se dar conta da dor que estava causando ao filho.

- Talvez eu o tenha matado e largado o corpo em uma esquina qualquer onde eu usei drogas enquanto a alma se perdeu no caminho pro inferno. – Percy disse engolindo o choro e sem mais, se levantou e só deixou a sala depois de chutar duas cadeiras para longe.

O Sol que esquentava o asfalto e alegrava o dia das pessoas que passavam apenas incomodava os olhos ardentes e a alma ferida de Percy enquanto ele caminhava sem se importar com os olhares curiosos que o acompanhavam. Xingava-se mentalmente, perguntava-se porque diabos fora ver o pai, queria morrer. Sabia que sempre fora o errado na história, mas no fundo, ele fora buscar apoio no pai e por ele fora rejeitado.

Percy sentou-se a sombra de um prédio em uma esquina qualquer e respirou fundo várias vezes lembrando-se de várias promessas que havia feito. Poucas foram a que ele conseguiu cumprir, mas de todo o jeito, elas haviam sido feitas.

Tinha acabado de apagar o último vestígio de lágrimas de seu rosto quando seu celular tocou. Era Thalia.

- Percy pelo amor de Deus, você tem que vim pra casa da Annie, agora! – a garota gritou sobressaltando Percy.

- Quê? Que aconteceu?

- Seu amigo eu acho... Esqueci o nome dele... Ele tá com a Annabeth dentro da casa dela.

- Quem? O Marshall?

- É! Foi isso que ela disse! Ela disse que ele tá tendo uma crise de esquizofrenia ou sei lá e é pra você vim aqui agora!

Percy desligou o telefone e correu o máximo que pôde, mas nem seus pés, nem aquele ônibus eram rápidos o suficiente. Annabeth estava, em termos, seqüestrada. Sua Annabeth. E ele não conseguia chegar até ela...

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Do lado de dentro da pequena sala, Marshall já havia colocado a estante no lugar do sofá e agora corria pela casa trancando as janelas, sempre mantendo Annabeth em suas vistas e a arma em sua direção.

- Marshall! – Mike gritou. Sua voz soava abafada através da porta. – Para com isso! Abre essa porta!

- Não! Sai daqui Mike! Eu não quero machucar você!

- Me machucar? Você tá armado?

- Está! – Annabeth gritou e Marshall deu um tapa em seu rosto que fez a garota cambalear com o impacto.

- Marshall você está com uma arma apontada pra minha irmã, como você espera não me machucar? – Mike disse com a testa encostada na madeira.

Thalia estava um pouco mais atrás, sentada com as costas na parede. Queria ligar pra polícia, mas Mike dissera que não. Marshall provavelmente entraria em pânico e poderia fazer alguma coisa estúpida. Thalia fora obrigada a concordar.

- Mike eu amo a Annabeth! – Marshall gritou fora de si.

- Annabeth! – Percy gritou enquanto passava pelo portão correndo, ignorando as pontadas no abdômen e a garganta seca.

Mike agora dava chutes na porta causando leves tremores na estante.

- Percy! – Annabeth gritou. Aliviada por saber que ele estava ali.

- Marshall, solta ela! – Percy gritou fazendo companhia a Mike na tentativa de derrubar aporta à força.

Do lado de dentro, Marshall passou o braço em torno de Annabeth, a arma mais uma vez em sua têmpora.

- Marshall, larga isso. – Annabeth pediu em voz baixa.

- Percy sai daqui!

- Não! – Percy respondeu.

- Eu vou matar ela! Sai daqui!

- Não! – Mike interferiu. – Marshall para com isso, por favor cara! Você vai acabar fazendo alguma merda!

- Eu não quero machucar ninguém. Eu só quero a Annabeth! – Marshall disse, sua voz ficando chorosa.

Em seus braços, Annabeth respirava com dificuldade. Agora em pé, andando de um lado pro outro, Thalia tentava pensar em alguma coisa enquanto Mike e Percy ainda agrediam a porta.

- Parem. Parem. Parem! – Thalia gritou de repente. – Isso não vai funcionar!

- Ele vai matar a Annie! – Mike gritou se virando pra Thalia, era impossível não notar o tom de pânico em sua voz.

- Ele vai acabar matando a todos nós se continuar assim! – Thalia retrucou. – A gente precisa pensar!

Ao cair o silêncio, Percy colou o ouvido na porta o mais próximo que pôde.

- Marshall, me deixa falar com a Annie?

- Não!

- Por favor. – Annabeth pediu em tom indefeso fazendo o coração de Marshall doer.

Ele não disse nada, apenas a soltou e ficou estático, as mãos tremendo pela primeira vez.

Annabeth correu em direção à estante e jogou os livros que estavam ali no chão.

- Percy. – ela disse em voz baixa.

- Você está bem? – Percy perguntou um tanto quanto desesperado.

- Estou.

- Eu vou tirar você daí.

- Percy eu não estou morrendo, só estou trancada dentro de casa.

- Com um cara armado que pode te matar a qualquer momento.

- Ele não vai fazer isso.

- Mas você sabe o quanto dói pensar que você pode morrer?

- Eu não vou morrer.

- Eu estou desesperado.

- Fica calmo. Eu que deveria estar em pânico, não você!

- Annabeth, ele já matou por menos.

- Ninguém vai morrer. Calma.

Percy hesitou.

- Eu... Eu... Annie eu te... – Mas ele parou a frase. Não era hora ainda. – Eu já volto.

Percy correu até a garagem da casa e pegou um martelo e um pé de cabra, uma idéia lhe passava pela cabeça. De longe era o certo, mas ele estava ansioso demais pra pensar em mais alguma coisa.

Percy já voltara ao encontro de Mike e Thalia agredindo a porta com o martelo. A resposta foram os tiros que Marshall disparou contra a porta. Apenas um atravessou as madeiras e perdeu a força caindo aos pés de Mike.

Mike subiu o olhar até encontrar os de Percy e de imediato, ele entendeu o que se passava na cabeça do amigo. Percy estendeu o pé de cabra a Mike, mas ele não pegou o objeto, se virou na direção de Thalia.

Seus olhos encontraram os de Thalia pela primeira vez.

- Sai daqui. – O rapaz disse.

- Não, é a minha melhor amiga que está aí dentro.

- Eu vou tirar ela de lá, sai daqui.

- Não.

- Thalia, por favor.

Thalia suspirou e, com dificuldade, deu as costas aos rapazes.

Mike a acompanhou com olhar até o que ele decidiu ser uma distância segura, então se virou para Percy e pegou a ferramenta de sua mão.

- Qual é o plano completo?

- Não tem.

Juntos eles começaram a agredir a porta. Percy acabou por quebrar as dobradiças e logo a porta já não era empecilho.

Marshall pretendia levar Annabeth para o quarto da garota, mas em um impulso, Annabeth soltou-se de seus braços e correu de volta à sala ao mesmo tempo que Percy e Mike adentraram a sala.

Percy puxou Annabeth para seus braços e Mike correu em direção a Marshall.

Os dois amigos entraram em uma briga corporal pela arma. Nem Percy, nem Annabeth conseguiam ver o que realmente se passava. Percy tentou correr em direção aos amigos, mas Annabeth o puxava de volta.

Até que um tiro foi ouvido.

Mike e Marshall entraram em um silêncio tenso e logo os dois caíram no chão, uma pequena poça de sangue crescendo ao redor deles.

Percy correu em direção aos amigos, Mike caiu ao lado do amigo chorando, a arma em suas mãos, o sangue correndo por seu corpo.

Marshall já tinha os olhos vagos, as mãos em cima do corpo, contendo inutilmente o sangue que corria com velocidade. Morto.

Annabeth escondera o rosto no peito de Percy, os olhos finalmente enchendo de lágrimas. Percy envolveu seus braços na cintura de Annabeth, suas lágrimas se misturando as madeixas da garota.

Mike ainda se encontrava no chão, chorando, chamando pelo amigo.

Thalia adentrara a sala e Annabeth a pediu pra que chamasse a polícia. Logo, John, Sally, Fred e Sheila, a mãe de Marshall, estavam na delegacia onde passaram a noite.

- Mike... – Annabeth chamou quando o sol começou a sair. – Já se passaram nove horas e você ainda está aí sem se mexer.

Mike não disse nada, apenas virou o rosto para a irmã. O rastro de lágrimas frescas manchando seu rosto.

- Nada contra o Percy, mas ninguém nunca vai me entender tanto quanto o Marshall fazia. – Mike sussurrou inconsolável.

Annabeth abraçou o irmão o mais apertado que pôde e assim ficaram por um tempo, até que Thalia se aproximou.

- Posso falar com ele? – Ela perguntou incerta.

Mike levantou a cabeça e assentiu. Annabeth os deixou e foi ao encontro de Percy que estava sentado no chão sozinho desde que Sally havia sido chamada pelo delegado.

Annabeth não disse nada quando se sentou ao seu lado e começou a acariciar os cabelos negros do rapaz. Percy encostou a cabeça no ombro de Annabeth, ele já não chorava havia pelo menos três horas.

- Como você está? – Annabeth perguntou depois de um tempo.

- Razoável. Ele nunca valeu nada, mas eu até gostava dele.

Annabeth mudou de posição e ficou na frente de Percy. Eles se encararam longamente até que Annabeth se ajoelhou e pegou o rosto de Percy em suas mãos, ela deu um sorriso mínimo antes de encostar seus lábios nos dele em um selinho demorado.

Quando se separaram, Percy puxou Annabeth pra que ela se sentasse entre suas pernas e a envolveu com seus braços.

- Como você está? – Ele sussurrou em seu ouvido.

- Não sei.

- Você deve estar em estado de choque.

- Não estou.

- Não sei se devo confiar em você.

- Acredite, eu não estou.

Percy decidiu acreditar na garota. Ele sabia o quanto ela era forte.

- Quando você vai embora? – Ele perguntou, sentindo o estômago afundar.

- Domingo à noite. – Annie respondeu com um suspiro pesado.

- Eu vou sentir sua falta.

Annabeth sorriu minimamente, pensando no quanto a vida era irônica.