Os últimos dragões escrita por Break
Naquela noite, os pesadelos de Robert retornaram, mas desta vez, o sonho tomou uma forma ainda mais perturbadora, um pouco mais complexa.
Ele se viu no Fosso dos Dragões, não como a ruína que ele conhecia, mas em seu auge, quando as majestosas criaturas ainda vagavam pelas correntes de ar quente de King's Landing. O calor era quase sufocante, e o rugido dos dragões reverberava nas paredes de pedra, ecoando como trovões no céu. As chamas saíam das gargantas poderosas das bestas, iluminando o fosso em tons de laranja e vermelho, enquanto seus olhos brilhavam como brasas vivas.
Robert caminhava entre eles, sentindo o chão tremer sob seus pés a cada passo das criaturas. Ele era um intruso em uma época que não lhe pertencia, cercado por um poder antigo que não compreendia, e nem sabia se gostaria de compreender. Sentiu um medo instintivo, mas também um fascínio irresistível. Ele sempre desprezara os dragões, os últimos vestígios de uma dinastia que ele havia ajudado a destruir, mas agora, vendo-os em toda sua glória, uma pequena parte dele sentiu uma pontada de respeito – ou seria inveja?
Antes que pudesse compreender totalmente o que estava acontecendo, o sonho mudou abruptamente, como um abrir e fechar de cortinas. Agora, ele estava de volta à sala do trono em King's Landing, mas o ambiente era diferente. As luzes eram fracas, quase trêmulas, lançando sombras distorcidas nas paredes. O Trono de Ferro, com suas mil espadas retorcidas, reluzia ameaçadoramente sob essa iluminação tênue, como se estivesse à espreita, esperando para reivindicar outro dono.
E lá estava ela.
A garota dos olhos lilases, com seus cabelos prateados brilhando suavemente à luz das tochas, apareceu diante do trono. Ela parecia calma, serena, uma figura etérea em meio à escuridão. Seus olhos, que tantas vezes haviam assombrado Robert, o encaravam com uma intensidade que fazia seu coração pulsar forte no peito. Havia uma sabedoria antiga e uma tristeza profunda em seu olhar, algo que a tornava ao mesmo tempo inocente e terrivelmente perigosa.
Ela não falou, mas Robert sentiu sua presença como uma ameaça silenciosa. Aquela garota, tão jovem e delicada, parecia carregar o peso de gerações de reis e rainhas em seus ombros, e Robert, por um breve momento, se viu diante de algo que ele não podia esmagar ou destruir. Ele tentou falar, mas sua voz não saiu. Tentou se mover, mas seus pés estavam presos ao chão.
O Trono de Ferro reluziu novamente, e Robert sentiu o suor escorrer por sua testa. Ele sabia que isso era apenas um sonho, mas a realidade do pesadelo era sufocante. A garota deu um passo à frente, e ele sentiu uma onda de pavor. Ela não era Daenerys, mas algo mais – algo antigo, algo que ele não podia enfrentar com força bruta.
Quando ela deu outro passo, o cenário começou a desmoronar ao redor de Robert. O chão rachou, o teto desabou, e o Trono de Ferro, antes reluzente, se distorceu em formas grotescas, como se as espadas estivessem vivas, querendo capturá-lo. Robert sentiu o chão desaparecer sob seus pés, e ele caiu no vazio, seu grito ecoando na escuridão.
Foi nesse momento que ele acordou, ofegante, com o coração batendo tão rápido que ele pensou que poderia explodir. O suor encharcava sua camisa, e ele se viu sozinho em seus aposentos, mas a sensação do sonho persistia, como se a garota ainda estivesse ali, observando-o das sombras, pronta para o julgar.
♚♚♚
Cersei Lannister, com seus olhos afiados e mente astuta, foi a primeira a perceber a mudança em Robert. Não era algo que qualquer um notaria de imediato, mas ela conhecia seu marido bem o suficiente para perceber as sutilezas que escapavam aos outros. O outrora imponente Rei Robert Baratheon, cuja presença física era tão esmagadora quanto sua fama, agora estava inquieto, como uma fera presa em uma jaula. Havia um nervosismo constante em seus movimentos, e ele saltava ao menor som inesperado, uma sombra do guerreiro que outrora dominara campos de batalha, o guerreiro que carregava um martelo enorme e havia esmagado o príncipe Rhaegar até sua morte.
No início, Cersei apenas observou, intrigada. Robert nunca fora um homem de medos ocultos ou ansiedades que não pudessem ser aplacadas com vinho, carne ou sexo. Mas o que quer que o estivesse assombrando agora era diferente. Ele não buscava consolo em seus prazeres habituais, e até mesmo o vinho parecia incapaz de apaziguar sua mente atormentada.
Em uma noite, durante o jantar, Robert mencionou os rumores que circulavam sobre dragões sendo avistados nas ruínas de Valíria. A notícia o deixou ainda mais agitado, e ele parecia ansioso para que os conselheiros confirmassem ou desmentissem os relatos. Cersei, por sua vez, apenas observava enquanto Robert falava, com uma mistura de incredulidade e desespero em sua voz.
Joffrey, sempre o mais insolente e destemido dos filhos, não perdeu a oportunidade de zombar do pai. Ele soltou uma risada alta, quase desdenhosa, enquanto cortava sua carne.
— Dragões? Isso é ridículo, pai. São apenas histórias para assustar crianças e velhos supersticiosos. Ninguém jamais viu um dragão, e mesmo que eles tivessem existido, certamente já estão todos mortos. Não passam de mitos — o príncipe herdeiro falou, a ironia e malícia permeando em sua voz.
Cersei lançou um olhar afiado para Joffrey, mas não o repreendeu. Parte dela concordava com o filho – a ideia de dragões parecia absurda. No entanto, ao olhar para Robert, ela percebeu que, para ele, a ameaça era muito real. Ele estava tão perturbado que a zombaria de Joffrey só parecia aumentar sua ansiedade.
“Você está certa, Cersei," pensou ela, enquanto observava o marido beber mais do que o normal. "Algo está realmente errado com ele."
Naquela mesma noite, enquanto os outros membros da corte se retiravam, Cersei ficou acordada, refletindo sobre o comportamento de Robert. Ela sabia que ele estava assombrado por algo, e aquilo a deixava desconfortável. Cersei sempre fora uma mulher de controle, que sabia manipular as situações a seu favor, mas o que estava acontecendo com Robert estava além de sua compreensão – e isso a irritava profundamente.
Ela começou a perceber que os murmúrios sobre a garota valiriana, os dragões e os pesadelos que Robert mencionava não eram apenas fantasias de um rei bêbado. O medo que ele carregava era verdadeiro, e Cersei odiava não ter o controle sobre a situação.
Mas, para Joffrey, tudo isso não passava de um conto ridículo, digno de riso. Ele se divertia ao ver o pai, o grande e forte Robert Baratheon, o temido Demônio do Tridente, tão abalado por histórias de criaturas que, para ele, não passavam de lendas. Essa atitude, no entanto, só contribuía para aumentar a distância entre pai e filho, e Cersei, apesar de sua inquietação, começava a perceber que havia algo muito mais profundo e perigoso assombrando Robert. Algo que talvez ela não pudesse controlar, mas que precisava compreender antes que consumisse o rei – e, consequentemente, seu próprio poder.
♚♚♚
Na escuridão silenciosa da noite, Jaime perambulava pelos corredores da Fortaleza Vermelha, sua mente ocupada com os mil pensamentos, indo de Cersei a Robert e voltando para Cersei, sua amada irmã, mais amada que irmã. Os sons abafados de seus passos ecoavam pelas paredes de pedra enquanto ele caminhava, as tochas acesas lançando sombras trêmulas ao longo do caminho. Não havia muita coisa que pudesse surpreendê-lo, especialmente em uma hora tão avançada, mas, ao se aproximar da sala do trono, Jaime ouviu algo que o fez parar abruptamente.
Um grito. Um grito que ele conhecia bem.
A porta da sala do trono estava entreaberta, e, conforme Jaime se aproximava, ele ouviu Robert Baratheon gritar mais uma vez. Não era o grito de um homem acordado, mas de alguém mergulhado nas profundezas de um pesadelo. Empurrando a porta com cuidado, Jaime entrou na vasta sala, onde o Trono de Ferro reinava supremo, suas lâminas retorcidas e afiadas refletindo a luz fraca das tochas.
Robert estava lá, parado em frente ao trono, sua figura imponente destacando-se contra as sombras que preenchiam a sala. No entanto, havia algo errado – muito errado. Seus olhos estavam abertos, mas não viam. Ele estava dormindo, preso em algum sonho horrível, sua mente longe daquela sala, mas seu corpo, inconscientemente, levado até ali.
De repente, Robert começou a gritar novamente, desta vez com uma fúria que fez os cabelos na nuca de Jaime se arrepiarem.
— Venha, demônio maldito! Mostre-se, maldito de cabelos prateados! Eu o destruirei, aqui e agora! Apareça e enfrente sua morte!
Jaime, com um misto de surpresa e preocupação, hesitou por um momento. Ele havia visto Robert em muitas situações, algumas das quais teriam derrubado homens mais fracos, mas nunca assim. Nunca em um estado tão vulnerável e ao mesmo tempo tão selvagem.
Com cautela, Jaime se aproximou, tentando decidir o que fazer. Ele não poderia simplesmente deixar o rei lá, perdido em seu pesadelo. Jaime sabia que a mente de Robert estava sendo atormentada por algo – talvez uma culpa antiga, um medo reprimido ou, como os rumores já começavam a sugerir, as sombras dos Targaryen que ele havia destruído. Mas o que quer que fosse, Robert estava sendo consumido por isso.
Finalmente, Jaime estendeu a mão, tocando levemente o braço de Robert. A pele do rei estava quente, quase febril. O contato físico pareceu quebrar, por um momento, o feitiço do sonho, e Robert se virou, os olhos fixos em Jaime, mas ainda vidrados e sem foco.
— Robert — Jaime chamou suavemente, tentando trazer o rei de volta à realidade, ou algo perto disso. — Você está seguro. Não há demônios aqui.
Mas antes que Jaime pudesse dizer mais, Robert recuou, levantando um punho como se fosse atacar, mas suas palavras foram carregadas de desespero, não de fúria.
— Eu o destruirei, o próprio Estranho de cabelos prateados! Você não pode me derrotar! — Foi então que Robert estremeceu, piscando várias vezes, como se finalmente estivesse acordando. Seus olhos, antes perdidos, começaram a focar em Jaime, e a confusão tomou conta de sua expressão. Ele parecia não entender onde estava ou o que estava fazendo ali. — Jaime? — A voz de Robert era rouca, quase fraca, uma sombra de seu habitual tom de comando. — O que... o que está acontecendo?
Jaime relaxou, soltando um suspiro que nem sabia que estava segurando.
— Você estava sonhando, Robert. Um pesadelo, nada mais. Está tudo bem agora.
Robert passou a mão pelo rosto, tentando afastar os últimos vestígios do sonho. Ele olhou ao redor, finalmente percebendo onde estava – na sala do trono, diante do Trono de Ferro. Seus ombros caíram, e, por um momento, ele parecia menor, mais frágil, como se o peso de seus sonhos e de sua culpa fosse demais para suportar.
— Malditos sonhos — murmurou ele, quase para si mesmo. — Eles estão me assombrando, Jaime. Dia e noite... não consigo me livrar deles — admitiu.
Jaime não tinha palavras para confortá-lo, nem interesse em fazê-lo. Ele sabia que os sonhos de Robert não eram simplesmente pesadelos comuns, era culpa, como ele próprio sentia. Havia algo de muito real e perigoso neles, algo que Robert não podia – ou não queria – enfrentar. E enquanto o rei permanecesse preso a esses terrores, não havia muito que Jaime pudesse fazer, exceto vigiar, proteger e, talvez, impedir que o próprio Robert se destruísse, o que era apenas seu dever e não um amor de cunhado.
Quando Robert voltou ao seu quarto na Fortaleza Vermelha, ainda abalado pelos pesadelos e pela visão do Estranho de cabelos prateados, ele tentou afogar seus medos da maneira que conhecia melhor: no vinho e no calor do corpo de várias mulheres. Porém, dessa vez, nem mesmo o álcool ou a luxúria pareciam capazes de silenciar as vozes em sua mente ou afastar as sombras que o assombravam.
Enquanto as mulheres riam e o cercavam, tentando distraí-lo, Robert permanecia tenso, seus olhos vagando pela sala como se esperasse que algo – ou alguém – surgisse das sombras a qualquer momento. Ele falava pouco, apenas grunhindo respostas ou soltando risadas forçadas, claramente perturbado. As prostitutas, acostumadas com a exuberância e o apetite do rei, começaram a notar a mudança, mas nenhuma ousava comentar.
Porém, uma delas, uma jovem de cabelos castanhos e olhos arregalados, percebeu que algo estava muito errado. Quando ela se aproximou de Robert, tentando acariciá-lo para aliviar sua tensão, o rei repentinamente mencionou seus tormentos, como se falando para si mesmo, sem perceber que os outros podiam ouvir.
— Ele está aqui, nas sombras... O Estranho de cabelos prateados... Ele não me deixa em paz — As palavras de Robert, carregadas de desespero e pavor, ecoaram pelo quarto, e a jovem recuou imediatamente, os olhos arregalados em puro medo. Ela nunca tinha visto Robert assim – o grande rei, o homem poderoso que todos temiam e respeitavam, agora parecia... fraco, vulnerável, como se estivesse à beira de uma ruptura.
O silêncio que seguiu foi sufocante. As outras mulheres trocaram olhares inquietos, sem saber como reagir. A jovem, tremendo, tentou falar, mas sua voz saiu fraca e hesitante.
— Majestade... você está seguro aqui. Não há ninguém... nada nas sombras.
Mas mesmo ao falar, ela própria não acreditava totalmente em suas palavras. A ideia de que algo – ou alguém – pudesse estar perseguindo o rei, algo tão terrível que até ele temia, fez o medo se alojar em seu coração. Ela começou a se afastar lentamente, seus movimentos refletindo seu desejo de fugir daquela situação desconcertante.
Robert, no entanto, não pareceu ouvir suas palavras. Ele estava perdido em seus próprios pensamentos, as mãos tremendo enquanto tentava levar a taça de vinho aos lábios, mas o líquido derramou em seu peito, manchando sua túnica. Ele não se importou. O rei de Westeros, o homem que havia conquistado o trono à força, estava sendo consumido por algo que nem ele podia lutar.
A jovem prostituta, assustada e confusa, finalmente se afastou por completo, recuando até a porta, onde as outras a seguiram, deixando Robert sozinho em sua luta interna. Ela não conseguia tirar da cabeça a visão do rei atormentado, e uma sensação de que algo muito errado estava acontecendo tomou conta dela. As palavras de Robert ecoaram em sua mente enquanto ela se retirava, e pela primeira vez, ela desejou nunca ter aceitado o convite para aquela noite com o rei.
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