Among Other Kingdoms - Quinta Temporada escrita por Lady Lupin Valdez, Break
Após conhecer adequadamente cada representante das vilas, Artemisa conseguiu entrar no castelo. Respirando fundo, ela foi conduzida até seu quarto, o mesmo que Orion havia lhe mostrado antes: o quarto das Rainhas de Saphiral. Ela riu ao perceber que realmente era a Princesa desaparecida; aquele quarto era seu. Auterpe entrou com ela, fechando e trancando a porta. Ambas se sentaram, cada uma em sua cama, e Auterpe acariciou o rosto de Artemisa.
— Pelos deuses, lembro quando te vi pela primeira vez, você era tão lindinha, e seu irmão... tão molenga. — Artemisa riu com o comentário. — Ainda bem que você já conheceu as pessoas mais influentes de cada Aldeia, não precisará de apresentações. — Aquilo a aliviou; ela não estava acostumada com multidões, fugia dos bailes pomposos de Estevão. Não imaginava que era uma "forma" de socializar.
— Vou precisar matar alguém? — Auterpe negou e sorriu.
— Claro que não. Você precisa sorrir, se acalmar, observar todos ao seu redor. Decorar nomes é difícil, mas você vai aprender. — A garota concordou, um pouco nervosa e ansiosa. — Estaremos ao seu lado o tempo todo. — Ela abaixou a cabeça e suspirou profundamente. Queria esquecer a conversa com Max e a emoção que sentiu. Se Orion conseguiu, por que ela não conseguiria? Ela começou a controlar sua respiração, e foi então que Auterpe tocou em seu ombro.
— Sinto sua tristeza e vejo em seu olhar... — A tia tirou uma ampola do colar e esticou para a sobrinha. — Talvez seja a hora de seguir em frente, e se você abrir seu coração, o amor virá. Com toda certeza.
— O que é isso?
— Gotas do Rio Mnemósine... — A garota engoliu em seco. — Algumas memórias devem ser deixadas para trás, por bem ou por mal.
Naquela noite, o jantar foi servido como de costume. Devido aos convidados, apenas os Guardiões, dois Mensageiros, as duas Bruxas habituais, três Guerreiras e quatro Guardas, além da Conselheira, se juntaram à mesa. Mesmo assim, já era bastante gente. Principalmente porque Navi estava lá, junto com sete de seus irmãos e dois sobrinhos. Por um mero segundo, parecia tudo formal, mas quando Mérope começou a comentar como parecia que fazia eras que haviam partido, as conversas fluíram.
Auterpe gostava da companhia das Bruxas e Guerreiras, mas gostou ainda mais de ver a surpresa dos demais ao ver a mesa cheia de pessoas sem títulos, como uma família. A conversa seguiu, Joice estava um pouco desconfortável em dividir a mesa com "pessoas comuns", mas para os outros era divertido. O ambiente era acolhedor, eles riam, ouviam as histórias de Lincan com curiosidade, prestavam atenção às diferenças entre os Reinos. Era diferente; Artemisa se sentia diferente, pois naquela noite ela não era Eveline como da última vez, mas sim a própria Artemisa, sempre foi e sempre será.
A coroação começaria com o nascer do sol. Apolo daria início à cerimônia no Anfiteatro Maysleé, localizado no lado leste do castelo. Antes disso, ela já devia estar com os cabelos arrumados em um belo penteado trançado. Seu vestido não se parecia com os de Calasir; era elegante, cintado, modelava seu corpo com leveza, com pequenos emblemas das Aldeias no cinto sobre a cintura.
Antes do amanhecer, todos estavam bem vestidos. A procissão se iniciou com Apolo emergindo com o sol. Grande parte dos presentes foi de carruagem, mas Artemisa, Perseu e Auterpe seguiram de bigas puxadas por três Pégasus. Quando chegaram ao Anfiteatro, a presença dos Três Grandes deuses, junto com os Olimpianos e alguns outros, aguardavam na arquibancada. Atena era a única ausente. No lado oposto, em um lugar mais aconchegante e com melhor vista para toda a arena, Artemisa foi colocada no centro da arena, junto com Hermes, que exibia um sorriso brilhante. Houve uma pausa quando Perseu se levantou do seu lugar, junto com Auterpe.
— Hoje, coroamos minha Herdeira Primogênita, Artemisa, como Princesa de Saphiral e seus territórios aliados. Agradeço a presença de todos vocês para este momento único e especial, há muito tempo não visto antes. Agradeço a presença dos deuses para esta cerimônia. — Ele retirou a coroa por um minuto e fez uma reverência aos deuses, que elevaram as taças que tinham em suas mãos. Em seguida, Hermes esticou a mão e pediu o colar que havia dado a ela.
— O colar. — A garota tirou e entregou para Hermes, que levou até Hefesto, enquanto Auterpe retirava uma coroa de uma caixa e a jogava na arena, surpreendendo a garota.
— Povo de Saphiral, hoje eu, Auterpe Interlok, deixo de ser Princesa de Saphiral. Este posto foi meu por estações, e agradeço cada um de vocês por toda generosidade, acolhida e recepção que me foram oferecidas. Peço apenas que sejam generosos, acolhedores, receptores, gentis e atenciosos com ela, com um toque mais adorável, pois safiras são feitas de amor. — Houve uma grande onda de concordância. Artemisa foi então instruída a destruir a coroa de Auterpe, mas ela ficou imóvel; não era possível destruir uma coroa de ouro. Demorou bastante até ela tentar congelar a coroa e pisar em cima. Ela ficou apreensiva, pois julgava que aquilo poderia ser mais rápido.
O discurso de comprometimento era enorme para ela decorar, então ela escreveu à mão e tirou de alguma parte do vestido, o que fez Orion rir baixinho pelo jeito desajeitado da prima. Isso chamou a atenção de Connor; a garota era firme, mas seu jeito desajeitado durante um momento que deveria ser sério a fez parecer mais autêntica.
— Eu, Artemisa, prometo servir em todos os momentos com respeito e lealdade. Peço que confiem em mim; deposito toda minha confiança no nosso futuro, no futuro de Saphiral. Que está sendo reescrito da melhor forma possível. O futuro de Saphiral será minha motivação para ver o melhor deste Reino. — Ela respirou fundo quando dois Guardiões colocaram pulseiras douradas com safiras rosas em seus pulsos. Assim como tornozeleiras de ouro e safiras, e alguns enfeites com asas foram colocados em seus pés. Perseu trouxe uma pequena caixa e a abriu com calma, revelando um colar extremamente encantador, com sete pedras e uma grande safira rosa no centro, rodeada por desenhos de rosas no fino aro de ouro. Ele pegou delicadamente o colar e o colocou no pescoço de Artemisa.
Tocar no colar parecia transmitir uma energia diferente, uma sensação de completude. Perseu então sorriu com a familiaridade dela com a pedra.
— Receber estas joias indica algumas responsabilidades que deverá assumir, inspirada nos valores e ideais mais profundos; valores que você deve abrigar e fortalecer dia a dia em seu coração. Todas as suas ações devem ser pautadas pelo maior sentido de dignidade e exemplaridade, pela honestidade e integridade, pela capacidade de renúncia e sacrifício, pelo espírito permanente de melhoria e pela sua dedicação sem reservas ao seu país, à sua pedra, ao seu Reino e ao seu povo. Você se compromete com isso? E, em caso da minha morte, compromete-se a manter o Reino firme, forte, protegido e acolhedor para seus súditos, aliados e refugiados?
— Prometo. — Ela disse, um pouco nervosa. Era muita coisa, quase uma pressão esmagadora que ela nunca tinha imaginado.
— Você recebeu o Colar Real da Princesa Dimosthenis, que depois se tornou a terceira Rainha de Saphiral. Esse colar lhe foi concedido pelo Rei Perseu. — Zeus começou a dizer, sua voz soando como trovões. — Significa que você, além de Herdeira de Perseu, se torna também Herdeira da Coroa, do Reino, futura Rainha. Suas funções reais começam a partir de hoje.
— E, em caso de o Rei Perseu precisar se retirar do Trono, você assumirá os compromissos ligados às suas responsabilidades. — Hera falou calmamente, o que fez Artemisa trincar os dentes. — Por virtude, sangue e mérito, o Olimpo aceita sua nomeação como Princesa do Reino.
— Obrigada. — Ela fez uma reverência para Hera. — Espero retribuir com dignidade e dar o melhor exemplo para o povo. — Suas palavras saíram incertas; ela lia o que escreveu, mas sua voz saía um pouco trêmula.
— Quer declarar algo? — Hermes perguntou, o que a fez ficar séria por um momento, um pouco petrificada e tensa. — Algo que queira contestar?
Ela olhou para Perseu, que lhe ofereceu um sorriso encorajador, e depois seus olhos se voltaram para sua mãe, que parecia perceber o nervosismo da filha. Artemisa não havia sido preparada para aquele momento. Ao encontrar o olhar de Orion e depois o de Ben, conseguiu relaxar um pouco.
— Quero pedir desculpas... — anunciou, e a plateia reagiu com expressões de surpresa e murmúrios. Orion bateu a mão na testa, acompanhado por William.
— Desculpas?! — exclamou Hades, surpreso. Hermes o encarou.
— Por quê?!
— Peço mil perdões se, no futuro, eu ofender algum de vocês, deuses, súditos, Guardiões, Guardas ou Guerreiras. Peço desculpa porque não consegui decorar o discurso corretamente. Não queria quebrar a tradição, mas não quero ser vista como uma mentirosa. — Ela fez uma pausa, sentindo o calor subir ao rosto enquanto os olhares se fixavam nela. — É verdade, não decorei o que deveria dizer, mas me importo profundamente com Saphiral, com seu povo, e com cada pessoa que conheci ou que conhecerei. — Seu rosto estava vermelho, o que atraiu ainda mais atenção. — Sou um pouco desastrada; posso esquecer nomes ou como fazer certas coisas, mas prometo de coração seguir as regras de Saphiral, ser obediente ao Rei e respeitosa com todos. — Perseu cerrou os lábios e lançou um olhar a Estela, que estava apertando a glabela com os dedos, pensando no que sua filha estava fazendo, poderia ser sim uma boa atitude, mas ela era a coroa e a coroa não deve demonstrar fraqueza — Sei que posso cometer erros, mas vou me esforçar para respeitar a todos, proteger e acolher, e tentarei ser a mais amável e sociável possível! Vou realmente me empenhar em fazer as preocupações de vocês se tornarem as minhas, assim como farei com a minha alegria.
Ben soltou uma risada abafada, tocado pela sinceridade dela.
— Artemisa... — Perseu sussurrou.
— Não estou mentindo. Quero aprender a ser uma boa Princesa para o povo e preciso da ajuda de todos vocês para me tornar a Herdeira da Coroa que eles merecem. Desejo servir à Pedra, à Coroa, ao Rei e...
— Ao Reino. — Orion sussurrou.
— E ao Reino de Saphiral. — Artemisa coçou a nuca, nervosa. — Quero pedir desculpas se algum dia eu ferir alguém; mesmo que isso não aconteça, meu desejo é proteger o Reino, seus aliados e seus territórios. Sei que nasci para ser a Herdeira do trono, mas preciso aprender. Se tiverem paciência e compreensão, a história de Saphiral será reescrita com harmonia e singularidade, para o bem de todos. — Hermes se inclinou, interessado.
— Algo mais? — perguntou.
Ela balançou a cabeça, e o deus sorriu antes de se afastar e retornar com Hefesto, trazendo uma coroa dourada que mais parecia uma tiara. Seu design lembrava um ramalhete de flores entrelaçadas, com asas delicadamente esculpidas ao redor. Os enfeites dourados, junto à safira central, formavam padrões que se entrelaçavam como flocos de neve. Após colocar a coroa na cabeça da jovem, Hermes fez uma reverência.
— Sua Alteza Real... — Ele se afastou e levantou os braços. — A Princesa de Saphiral! Artemisa!
Uma grande comemoração se seguiu, com aplausos e gritos entusiasmados. Artemisa ouvia o som das ondas e dos animais, sentindo seu coração bater forte, como se estivesse prestes a explodir.
— Alteza... — Perseu segurou a mão dela e a ergueu. Não houve comentários sobre ela ser uma péssima Rainha, nem palavras de maldição ou ataques. Eles a aceitaram como Princesa e a aceitariam como Rainha. Isso era a melhor coisa que ele poderia presenciar em sua vida. — Estou orgulhoso de você.
O clima da coroação era animado, acolhedor, aquecendo o coração de todos os presentes, no entanto, havia algo que ainda permeava a família. Foi durante a festa que Auterpe puxou Lincan para um canto afastado, seus olhos o fuzilando.
— Você é próximo do William, não é? — praticamente rosnou, mesmo que soubesse a resposta.
— Um tanto — Lincan deu de ombros, despreocupado.
— O que sabe dele e Estela? — um sorriso irônico brotou nos lábios de Lincan, entendendo exatamente o que Auterpe queria saber.
— Quer saber se eles fuderam? — ele riu — Talvez quando ela era mais vulnerável. A única coisa parecida entre Estevão e William era o gosto por mulheres frágeis.
— Eu não sou frágil! — Auterpe rugiu.
— Oh, eu sei — ele mantinha um sorriso inabalável. — Não fique remoendo isso, querida, há coisas que não estão no seu controle — com essas palavras ele a deixou sozinha com seus pensamentos e sua raiva.
Foi quando a festa já tinha se dissipado que a rainha de Ruphira decidiu colocar para fora o que a consumia, sabendo que precisava fazer isso antes que explodisse. A sala do trono estava praticamente vazia, exceto por William e Lincan, que conversavam próximos a uma porta, Orion, que fazia companhia a Artemisa e Ben, e seu alvo: Estela, que acariciava o rosto de Perseu com uma ternura visível, sorrindo para ele enquanto as costas da mão acariciavam a bochecha dele. Auterpe respirou fundo.
— Pelos Deuses, eu estou cansada de você! — Auterpe gritou com uma fúria visceral, o olhar fixo em Estela. — Estou cansada de você querendo para si todos os homens que me amam!
Estela a encarou, os olhos dilatados de confusão e surpresa. Orion, ao ouvir o grito da mãe, se encolheu instintivamente, sentindo a intensidade do ódio que emanava de Auterpe. Artemisa, sentindo o perigo iminente, puxou Ben para perto de si numa tentativa de protegê-lo.
— Auterpe, eu não estou entendendo… — começou Estela, tentando compreender a explosão da cunhada.
— Sonsa! Idiota! — Auterpe gritou, a voz ecoando como trovões numa tempestade. — Você acha que eu não sei de você e William? Acha que não sei que Ethan é outro bastardo? Ele é filho de William! — A revelação veio como um tsunami devastador, arrastando consigo qualquer vestígio de calma.
— O quê? — Perseu soltou uma risada nervosa. — Auterpe, de onde você tirou isso?
— Eu ouvi William e Lincan sussurrando sobre ele. Eu ouvi William falando com Estela sob genes — a voz da rainha saía entrecortada pela raiva. Orion, próximo da prima, sentia seu coração despedaçar, sabendo que cresceu sem pai enquanto Ethan tinha dois à disposição. — E não precisa ser muito inteligente para perceber que o garoto é idêntico a William — Lincan tomou um longo gole de vinho, tentando mascarar a culpa. William pressionava a glabela, tentando esconder seu nervosismo.
— Estela — Perseu disse baixo, os olhos fixos na esposa. Ela estava inabalável, a postura ereta, as mãos sobre o ventre, o rosto demonstrando uma confiança imutável. — Isso é verdade?
— Connor não pode saber — ela comunicou, a voz firme. — Ele jamais deixaria um filho de William ocupar o Ninho da Águia.
— Qual o problema de ser filho de William? — Orion perguntou, magoado. Estela o olhou com condescendência.
— William é o problema — ela respondeu, dando de ombros.
— William não foi um problema para você quando ocupou sua cama — Auterpe rosnou, debochada. — Nem foi um problema quando se deitou com você — ela riu, balançando a cabeça. — Você sempre foi o problema, Estela! Mas quero que saiba que não está sozinha nessa história de traição — o sorriso de Auterpe assumiu um tom de vitória. — Enquanto você gemia de dor, seu marido procurou conforto em mim!
— Estevão o que?! — William se virou para Auterpe, incrédulo.
— Seria engraçado ter um filho dele... um bastardo por um bastardo — Auterpe a olhou desafiadora, testando até onde ia o autocontrole de Estela.
— Não importa a filiação, Ethan é príncipe, cavaleiro de dragão, herdeiro legítimo de Interlok e príncipe herdeiro até um filho de Eilon — declarou Estela, mantendo-se firme. Quanto mais ela se mantinha assim, mais raiva Auterpe sentia.
— Você é tão cínica — a rainha de Ruphira estreitou os olhos. — Tem aquele papinho de que não acredita em monarquias, mas sempre um rei acompanha você.
— É que eu fico linda com uma coroa — o sorriso de Estela foi a gota d'água para Auterpe. A rainha de Ruphira correu até a cunhada, tirando uma adaga da cintura no meio do caminho. No entanto, quando estava pronta para perfurar o belo pescoço de Estela, sentiu a mão da outra se fechar em seu punho, mantendo-a afastada com uma força que Auterpe jamais imaginava que Estela tivesse. — Eu entendo sua raiva, Auterpe. Também me sentiria mal se homens se deitassem comigo porque os lembro de alguém — Estela sorriu. Auterpe lutava contra as lágrimas de raiva. — Sei que William e você tinham um acordo, poderiam se aventurar com outras pessoas enquanto separados.
— Não com você — Auterpe rosnou, forçando a mão para acertar a outra, que a segurava cada vez mais forte. Por um segundo, Auterpe desejou se descontrolar e fritar Estela com raios, mas algo dentro dela queria ouvir o que a cunhada iria dizer. — Você é...
— Sua insegurança — Estela respondeu. Uma lágrima teimosa e solitária escorreu pelo rosto de Auterpe. — Você sempre se enfureceu ao pensar que William se aproximou de você por lembrar de mim, quando deveria apenas ter aceitado isso.
— Eu não sou uma rainha de restos! — Auterpe rosnou, já incapaz de controlar as lágrimas. — Você não passa de uma rainha consorte, idiota, ninguém tem respeito por você se não estiver acompanhada por um rei!
— Não? — Estela riu suavemente. — Ninguém é tão poderoso no reino quanto aquela que divide a cama com o rei.
— Você acha que sua companhia na cama muda algo num reino?! — os olhos de Auterpe faiscavam. Orion torcia secretamente para a mãe descarregar em Estela, irado com a esposa do tio desafiando sua mãe. — Acha que conquistaria um reino dormindo com o rei?!
— Reinos são conquistados com sorrisos e sussurros — Estela sentia o braço de Auterpe perder força e em partes agradeceu por todas as vezes que conteve um ataque de raiva de Estevão ou jamais teria forças para segurar Auterpe — Se você conquista algo com espada e guerra, reina sobre ruínas.
— Cale a boca — Auterpe rosnou. — Você não se contentou em ir atrás do meu irmão, precisou ir atrás do pai do meu filho também.
— Não fui atrás de nenhum deles — Estela lembrou. Auterpe lutava entre chorar e forçar a adaga contra Estela. — Exaustivo, não é? Manter a máscara de calma quando precisa se controlar tanto para não ser sanguinária e violenta — Estela a analisou, desestabilizando Auterpe, Orion nao escondeu a surpresa, sua mãe era dona da filosofia de desestabilizar, nunca havia a visto assim — Você é uma rainha muito amada por seu povo, Auterpe, porque eles não veem sua verdadeira essência, eles não veem seu âmago podre, invejoso e inseguro.
— Cuide suas palavras — Auterpe advertiu.
— Ou o quê? Vai me sacrificar? Vai arrancar meu filho do meu ventre e entregá-lo a algum dos seus deuses? — Estela questionou, erguendo a sobrancelha. O braço de Auterpe começou a ceder. — Você pode fazer isso se for te fazer sentir melhor, mas te adianto que não funcionará.
— Eu adoraria descobrir — Auterpe prensou os lábios.
— Você ama mostrar que é forte, ama lembrar a todos que luta suas próprias batalhas — Estela sorriu. — Mas vou te contar um segredo: os melhores guerreiros são aqueles que mais buscam aprovação porque precisam de validação para se sentirem bem.
— Você não entende de lutas, não entende de guerras, você é só uma parideira fraca! — O xingamento não abalou Estela; pelo contrário, um sorriso de escárnio brotou em seu rosto.
— Quando um rei cai, é a rainha que permanece — Estela observou a feição de fúria de Auterpe desmoronando aos poucos.
— Por que está aqui? — Auterpe murmurou. — Por que não ficou no reino do seu rei?
— Por amor ao seu irmão — respondeu Estela, firme. — Mas se você não pode aceitar isso, infelizmente não posso fazer nada por você. — O braço de Auterpe enfim cedeu, deixando a adaga cair aos pés delas. — Essa insegurança, esse orgulho ferido e o ego frágil são batalhas que você precisará lutar sozinha, sem foices, sem espadas, sem raios, apenas você — Estela soltou o pulso da outra. Auterpe a encarou, indignada, quem era aquela Estela que ela desconhecia? — Ninguém, nunca mais, chame Ethan de bastardo — o tom de voz seguia firme e inabalável. Ela olhou para Lincan e William, suspirando profundamente. — Eu deveria ter ouvido Estevão quando ele dizia que um segredo só está seguro com três pessoas se duas estiverem mortas. — William a olhou com uma mistura de desespero e excitação. Lincan parecia orgulhoso. Estela virou-se, indo em direção à porta.
— Você é poderosa em Calasir, com seus dragões, não aqui — Auterpe disse, a amargura brincando em seus lábios. Estela parou e a olhou por cima do ombro.
— Meu poder nunca foram os dragões — foi tudo que ela disse antes de sair, deixando para trás uma Auterpe despedaçada em sua insegurança, Perseu incrédulo, Lincan divertido e William lutando com a costumeira ereção que tinha quando via Estela ser má.
— Eu odeio ela — Auterpe declarou. — Tomara que dessa vez os deuses não sejam misericordiosos e a salvem — rugiu antes de raiva antes de sair da sala com passos pesados, seus ombros rígidos e os punhos cerrados, ainda tremendo de raiva. Ela empurrou a porta com força, quase arrancando-a das dobradiças, enquanto o silêncio pesado tomava conta do ambiente.
— Estela acha que é tão perfeita, não é? — rosnou Orion, seu rosto vermelho de raiva. — Ela só traz destruição por onde passa — ele olhou para seu pai e para seu tio, buscando algo que o fortalecesse, mas só encontrou rostos tensos. Ele virou para Artemisa, que apertava a mão de Ban com força. — Sua mãe é uma serpente! — ele explodiu, seu rosto vermelho de raiva. — Ela destruiu minha mãe com aquelas palavras venenosas! Eu nunca vi minha mãe ceder a uma briga, ela poderia, e deveria, ter fritado aquela…aquela vadia.
— Basta! — A voz de Artemisa cortou o ar como uma lâmina. — Você precisa aceitar que sua mãe não é a santa e a fortaleza que você pensa que é.
Orion riu, um som amargo e sarcástico.
— E sua mãe é? — ele retrucou. — Porque pelo que vejo, a única coisa que ela fez foi se esconder atrás de um homem, vivendo debaixo da sombra dele.
— E a sua mãe é uma manipuladora que não suporta ver a verdade diante de si! — ela retrucou, sua voz firme — uma mulher orgulhosa demais para ouvir as verdades mesmo que dolorosas.
— E sua mãe é…
— Chega! — Perseu gritou, sobressaltando os dois. — Esta briga entre vocês não levará a nada. Auterpe e Estela têm suas diferenças, mas vocês não precisam carregar essa rixa adiante — sua voz era firme a autoritária, sem deixar brechas para qualquer reclamação vinda dos príncipes. Orion, com os punhos cerrados, virou-se para Perseu, seu rosto contorcendo-se em descrença.
— E você, tio Perseu? — ele começou. — Vai simplesmente ignorar o que foi dito? Vai continuar do lado da sua esposa, mesmo sabendo que ela destruiu nossa família?
— Estela não destruiu família alguma — a voz de William cortou o salão. — Ethan tem meu sangue, mas ele é filho de Estevão, foi criado e educado por ele — os olhos dele pararam em Orion. — Eu sinto muito por não estar com você, Orion, eu amo você, meu filho, mas não fiquei em Ruphira porque não era bem-vindo.
— E sua escapatória foi fazer um filho em sua cunhada? — a voz de Orion exalava dor. William caminhou até ele.
— Foi um acidente, não achamos que daria em alguma coisa — William deu de ombros. — Eu amo você, Orion, você é meu filho — ele abriu os braços, Orion, fragilizado, o abraçou. — Desculpe por não me impor para ficar com você durante a infância — beijou o topo da cabeça dele. — Ninguém nunca ocupará seu lugar na minha vida.
— Promete? — Orion perguntou, um tanto carente.
— Prometo — William sorriu, o abraçando mais forte.
Perseu suspirou, sua cabeça rodava, não conseguia acreditar que Estela havia deitado com William quando ainda era casada com Estevão, ele era tão indigno da presença de Estela que o incomodava. Além disso, William era pai de seu sobrinho e uma vez por ano ele visitava Auterpe, sussurrava juras de amor, mas aparentemente quando voltava, era nos braços de Estela que caía, mesmo que isso parecesse surreal considerando a loucura de Estevão.
— E vocês são primos, parte da mesma família — William disse, sua voz carregada de emoção. — Não deixem que as diferenças entre suas mães destruam o vínculo que vocês têm — ele olhou para Artemisa e deu um sorriso frágil. — Vocês são minha dupla infalível
Perseu balançou a cabeça, tentando focar em algo. Ele subiu as escadas em direção ao seu quarto, sabia que ela estaria lá. Sua mente fervilhava com a complexidade da situação, seu coração pesado com a dor e a confusão, havia um ciúmes real, mas insano, ele não se sentia no direito de ficar incomodado com a situação, mas era impossível não sentir nada. Ele bateu na porta levemente, e ao ouvir a voz suave de Estela permitindo sua entrada, ele abriu a porta, entrando no quarto silenciosamente.
Estela estava próximo da janela, a mão sobre o ventre numa tentativa de acalmar o bebê agitado dentro da barriga. Ela não queria ter dito todas aquelas coisas para Auterpe, mas era inevitável, além disso, Auterpe tinha apontado uma faca para ela. Quando ela viu Perseu, seu olhar se suavizou momentaneamente, mas logo percebeu a tensão em seu rosto, ele estava mais sério e sombrio do que alguma vez havia visto. Perseu fechou a porta atrás de si e se aproximou, mantendo uma certa distância.
— Estela — ele disse, sua voz firme, mas carregada de certa dor —, eu não esperava o que aconteceu, eu jamais imaginaria que William tinha tanta coragem para deitar com você enquanto Estevão respirava. Isso é estranho… — ele suspirou ruidosamente, buscando forças dentro de mim — Eu não a quero no meu quarto. Quero espaço para refletir.
Estela franziu a testa, surpresa com a declaração. Ela o olhou, estreitando os olhos descrente.
— Você está falando sério? — ela perguntou, sua voz ligeiramente trêmula. — Acha mesmo que se afastar vai resolver algo?
Perseu respirou fundo, lutando para manter a compostura.
— Eu não sei se resolverá, mas é necessário — ele respondeu, a voz pesada. — A revelação sobre Ethan, sobre você e William... isso trouxe à tona muitas feridas antigas. Eu preciso de tempo para processar tudo isso.
Estela deu um passo à frente, seus olhos fixos nos dele.
— Você está magoado porque eu tive um filho com William — ela disse, tentando encontrar um fio de compreensão. — Mas se lembra de quem foi meu primeiro amante? Quem foi o pai da minha primeira bastarda? Foi você, Perseu.
Ele apertou os punhos, sentindo a verdade das palavras de Estela perfurar seu coração.
— Eu sei — ele murmurou, desviando o olhar. — E talvez seja isso que torne tudo ainda mais doloroso. Sempre houve uma parte de mim que acreditou que nós poderíamos superar qualquer coisa, mas agora... tudo parece tão complicado.
Estela estendeu a mão, tocando suavemente o braço de Perseu.
— Nós já passamos por tantas coisas juntos — ela disse, sua voz suave. — Não deixe que essa situação nos destrua. Lembre-se de que, apesar de tudo, eu ainda sou a mesma pessoa que você amou lá trás.
Perseu fechou os olhos por um momento, permitindo-se sentir a dor e a nostalgia daquele amor passado, ele lembrou dos sorrisos doces dela, da voz baixa e controlada, de como ela se entregou de maneira tão sutil e intensa ao mesmo tempo. Mas quando abriu os olhos, a determinação estava clara.
— Estela, eu preciso disso — ele disse, afastando-se do toque dela. — Por nós dois. Talvez, com o tempo, possamos encontrar um caminho de volta um para o outro. Mas, por enquanto, precisamos desse espaço.
Estela suspirou, sentindo as lágrimas se acumularem em seus olhos. Ela sabia que lutar contra isso só causaria mais dor.
— Entendo — ela disse, sua voz suave, as lágrimas sendo engolidas. — Se é o que você precisa, eu respeito sua decisão.
Perseu acenou, a dor evidente em seu rosto. Com um aceno, ele a chamou para segui-lo, ela suspirou pesadamente, em parte irritada pela atitude dele, outra parte tentando ser compreensiva.
Perseu conduziu Estela até a outra ala do castelo, seus passos ecoando pelos corredores frios e silenciosos. A tensão entre eles era palpável, e o silêncio só aumentava o peso da decisão tomada. Quando finalmente chegaram ao quarto destinado a Estela, Perseu abriu a porta e indicou para ela entrar.
— Aqui será seu quarto a partir de agora — disse ele, evitando o olhar de Estela.
Ela entrou no quarto, sentindo o ambiente estranho e desconfortável. A cama grande parecia fria, as paredes nuas e a janela, que dava vista para o jardim, não oferecia o consolo habitual. Estela voltou-se para Perseu, seus olhos mostrando um misto de tristeza e determinação. Inevitavelmente Estela pensou em Estevão, Perseu estava cumprindo uma promessa antiga de seu falecido marido: “se você me trair, eu vou trancar você num quarto onde irá parir meus filhos e essa será sua única utilidade”
— Se é o que você acha melhor, Perseu, então assim será — disse ela, sua voz firme, mas com um traço de melancolia.
Perseu fez um aceno breve, como se qualquer palavra a mais fosse difícil de pronunciar. Ele se virou e saiu, deixando Estela sozinha. Ao fechar a porta, ela sentiu um peso enorme cair sobre seus ombros. As dores da gravidez pareciam intensificar-se com a solidão e o afastamento emocional, pois assim que a porta fechou, Sísifo se mexeu violentamente em seu ventre.
Estela caminhou até a janela, se debruçando no parapeito. O chute do bebê foi o estopim para as lágrimas descerem por seu rosto. As lembranças de Estevão inundaram sua mente, trazendo uma sensação de saudade e pesar.
Ela se lembrou de como Estevão sempre esteve ao seu lado durante suas gestações, mesmo que extremamente possessivo algumas vezes. Lembrou-se de sua presença constante, de sua mão firme segurando a dela, e da forma como ele a abraçava durante algum desconforto, sussurrando palavras de conforto e amor, oferecendo banhos quase ferventes para aliviar suas dores. Estela lembrava-se de como ele a beijava suavemente na testa, seus lábios trazendo um alívio momentâneo em meio à dor. Ele nunca a deixara sozinha, sempre ao seu lado, protegendo-a e amando-a incondicionalmente.
— Você é a mulher mais forte que já conheci — ele dizia, sua voz cheia de admiração. — E nosso filho será tão forte quanto você.
Estela suspirou, as lágrimas escorrendo pelo rosto enquanto a dor a puxava de volta para o presente. Ela sabia que Estevão jamais a deixaria passar por isso sozinha. Ele teria lutado contra qualquer um para estar ao seu lado, para proteger sua família, ele não reagiria bem a uma traição, mas ele estaria ali para cuidar de seu filho.
Ao pensar em Perseu, Estela sentiu um amargo gosto de abandono. Embora ele fosse o pai do filho que carregava, ele não estava ali para ela, assim como não esteve na vez de Artemisa. Em vez disso, ele havia feito sua escolha, deixando-a sozinha para enfrentar as dores e dificuldades, apenas porque ela falou algumas verdades para Auterpe, não se arrependia de suas palavras, eram verdades, todas elas. Quanto a Ethan, ele era filho de Estevão, mesmo que seu sangue fosse de William, no entanto, considerava hipocrisia Perseu a abandonar por isso, ela tinha dado uma filha para ele, colocou sua cabeça a prêmio para parir Artemisa, correndo o risco de Estevão descobrir sua traição e matar a criança ou ainda enlouquecer e causar guerra.
Perseu, por sua vez, caminhou até seus aposentos, fechando a porta com pesar, no entanto, para sua surpresa, Auterpe estava ali, sentada aos pés da cama, abraçada aos joelhos e chorando.
— Você está bem? — perguntou ele, sua voz carregada de exasperação. Perseu sentou ao lado dela.
— Eu odeio aquela mulher — declarou. — Me irrita vê-la conseguir sempre o que quer. Ela é uma hipócrita, Perseu. Você sabe tão bem quanto eu que ela está onde está porque gosta do conforto que a coroa proporciona. E você, ao invés de enxergar isso, está se deixando manipular por ela.
Perseu apertou os punhos, sentindo a raiva crescer dentro de si.
— Eu não estou sendo manipulado — respondeu ele com firmeza. — Estou tomando uma posição. Estela deitou com seu cunhado e deu um filho para ele, e agora ela precisa lidar com as consequências.
Auterpe deu uma risada amarga, balançando a cabeça.
— Consequências? Você está falando de consequências para Estela? — disse ela, sua voz carregada de sarcasmo. — Estela é incapaz de sofrer consequências, ela sempre acha um jeito de jogar a culpa em outra pessoa — Auterpe jogou a cabeça para trás, apoiando-se no colchão — William se aproximou de mim porque eu lembrava Estela. Isso me destruiu — encolheu os ombros, tentando controlar sua dor — Não fico magoada com o fato deles terem dormido juntos, eu também dormi com vários homens enquanto William estava lá, mas a concepção de Ethan é uma confirmação que era ela quem William queria — a voz dela era amarga, seu tom era de dor — E agora, você está deixando que ela destrua tudo ao seu redor.
Perseu sentiu a raiva de sua irmã e a dor de suas próprias mágoas se entrelaçarem.
— Eu não estou deixando que ela destrua nada — disse ele, sua voz tremendo. — Estou tentando manter minha dignidade intacta. Estou tentando proteger o que resta do nosso casamento pelo bem de Artemisa, que nunca teve os pais juntos, e também por Sísifo, que nascerá na próxima lua, não quero que meus filhos sejam criados por um ou por outro.
— Você é mais teimoso do que imaginei — murmurou ela. — Mas, talvez, seja melhor assim. Talvez você precise ver Estela cair para se sentir melhor — ela deixou um sorriso surgir em seu rosto. — Eu preciso. Quero vê-la em cacos, quero que ela aprenda seu lugar.
Os gêmeos se abraçaram, cada um tentando tirar a dor do outro, seus corações despedaçados. Auterpe nunca havia pedido fidelidade a William antes do casamento, mas deveria ter frisado que Estela era proibida para ele e não só por ser esposa de Estevão. A rainha de Ruphira se sentia pequena pela primeira vez em muito tempo, as palavras de Estela reverberaram em sua mente, ela parecia ter lido sua alma, descoberto todos seus sentimentos, e ter tantas coisas reveladas doía.
.
Não quer ver anúncios?
Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!
Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!