Among Other Kingdoms - Quinta Temporada escrita por Lady Lupin Valdez, Break
Eilon encarou o covil, seu olhar iluminado pelo brilho vibrante dos filhotes de dragão que brincavam alegremente. Os dragões sempre foram companheiros inseparáveis dos deragonianos, primeiro domados por aqueles que moravam em Deragona, e depois pelos que nasceram dessa linhagem. Ele acariciou o majestoso dragão de sua mãe, Jaspe ronronou contente antes de alçar voo rumo aos céus, as asas batendo com força e graça.
O rei girou, observando a vastidão do covil, uma obra grandiosa construída por seu pai para sua mãe. Mas agora, ela estava em outro reino, com outro rei, misturando seu sangue com o de outro homem. Esse último pensamento causou-lhe uma repulsa que se refletia em seus olhos.
— O que houve, Eilon? — perguntou Elisa ao alcançá-lo. Ethan e Elora estavam mais atrás, mas sentiam a tensão no ar ao redor do rei.
— Os filhotes… Mamãe vai querer trazer aquele bastardo para montar um deles — disse ele firme, a raiva latente em sua voz.
— E o que planeja fazer? — questionou Ethan, acariciando o Vieno.
— Dragoi — respondeu Eilon, uma ideia surgindo de repente em sua mente. — Mandaremos os filhotes para Dragoi.
— Eilon, quem irá controlar dragões? — indagou Elora, enquanto afagava o focinho de Cora, que emitiu um som divertido.
Eilon sorriu com a pergunta de sua irmã, a ideia tomando forma clara em sua mente. Ele precisaria de homens corajosos e inteligentes para essa missão.
No fim daquele voo, dois dragões seguiram em outra direção, rumando para Interlok em vez de voltar ao covil. Eilon sorriu, admirando a maturidade de seus irmãos, tão jovens, mas já carregando tamanha responsabilidade.
Dois dias depois, Elisa estava em silêncio enquanto se preparava para o jantar. Ela se sentia abandonada e esquecida por sua própria mãe, especialmente logo após a morte de seu pai.
O casal desceu para o jantar, e a visão da mesa quase vazia feriu o coração da rainha. No entanto, ao ver duas caixas empilhadas em seu lugar, sentiu um lampejo de felicidade.
— Feliz aniversário, meu amor — disse Eilon, beijando sua bochecha. Elisa sorriu surpresa; com tantas coisas acontecendo, ela havia esquecido seu próprio aniversário.
— Feliz aniversário, Elisa — cumprimentou Mandrik, abraçando-a de uma maneira que lhe lembrou seu pai, fazendo-a chorar.
Elisa foi até seu lugar. A caixa de cima era menor e tinha "Papai" escrito no canto direito. Ela desfez a fita e abriu a tampa, revelando uma chave e uma carta, tal como havia nos presentes de Eilon e Artemisa.
"Elisa, minha filha amada (talvez a mais amada, mas não conte para suas irmãs), no dia das suas catorze estações quero te lembrar do quanto me orgulho de ti. És linda, graciosa e inteligente, tal como sua mãe. Sei que errei ao tentar te obrigar a casar com Jonan, mas admito que fiquei com medo do que sua irmã poderia fazer longe dos nossos olhos. Eilon foi muito mais inteligente que eu. Vocês dois são a garantia da era de ouro do reinado que sempre sonhei. Esta chave é de uma biblioteca na Ilha do Sol Nascente. Você é uma exploradora de mundos que cabem na palma da mão. Feliz aniversário, minha princesa. Com amor, papai e mamãe."
Elisa terminou de ler com lágrimas nos olhos e então olhou para Eilon.
— Eu tive essa ideia, mas mamãe e papai foram mais rápidos — disse ele com um sorriso.
Elisa, ainda emocionada pela carta de seu pai, olhou para a segunda caixa. Esta era maior, envolta em uma fita dourada. Ela desfez o laço com cuidado e retirou a tampa. Dentro, havia um vestido deslumbrante, feito do mais fino tecido, com bordados intrincados que lembravam os dragões que tanto amava. Junto ao vestido, havia uma tiara delicada, adornada com pequenas pedras preciosas que brilhavam como estrelas, além de um colar, onde um dragão de rubi e um dragão de safira estavam entrelaçados.
Eilon sorriu ao ver a reação de sua esposa.
— Eu queria que você se sentisse tão especial quanto é para mim — disse ele. — Este vestido foi feito especialmente para você, para celebrar não apenas seu aniversário, mas tudo o que você representa para mim e para o nosso reino.
Elisa tocou o tecido do vestido, sentindo a suavidade e a delicadeza. As lágrimas de tristeza agora se misturavam com lágrimas de alegria. Ela abraçou Eilon, sentindo-se verdadeiramente amada, como sabia que era.
— É lindo, Eilon. Muito obrigada — disse Elisa, com a voz embargada, recebemos um beijo dele.
— Chegamos a tempo da comida? — Ethan perguntou ao entrar correndo, fazendo todos rirem pela espontaneidade dele.
Depois do jantar, a noite continuou em um clima de celebração e amor. Ethan e Elora se revezaram contando histórias engraçadas do condado, trazendo risos para todos à mesa. Mandrik, sempre com sua presença tranquilizadora, fez um brinde à família, ressaltando a união e a força deles, mesmo nos momentos difíceis.
Eilon, atento a cada detalhe, garantiu que a noite fosse memorável para Elisa. Eles foram para o jardim, dançaram sob as estrelas, a música suave enchendo o ar, e ele a segurou perto
Ao final da noite, quando todos já haviam se retirado, Eilon e Elisa permaneceram no jardim, de mãos dadas. A brisa leve acariciava seus rostos, e as estrelas brilhavam no céu.
— Sei que tem sido difícil — disse Eilon, olhando profundamente nos olhos de Elisa. — Mas sempre estaremos juntos, enfrentando tudo. Você é minha rainha, minha companheira, e nada mudará isso.
Elisa sentiu o calor das palavras de Eilon e soube que, apesar das perdas e das mudanças, estava cercada por aqueles que a amavam e que ela amava. Naquele momento, ela se sentiu verdadeiramente amada e protegida, pronta para enfrentar qualquer desafio ao lado de seu rei.
O rei e a rainha subiram para o quarto aos tropeços e aos beijos, tombando na cama tão entrelaçados quanto os dragões do colar de Elisa.
Na manhã seguinte, mais de um casal sorria largamente, Max e Anne também estavam mais unidos, o que de certa forma aliviava Mandrik, mesmo que quisesse que o garoto crescesse um pouco mais para ter um relacionamento mais sério.
Naquele dia uma nova bandeira foi hasteada, dois dragões, um azul e um vermelho, entrelaçados no meio de um fundo branco, a era de ouro de Calasir começaria não com um cavaleiro de dragões, mas com dois. No meio da tarde Eilon convocou Mandrik e Max para uma reunião na sala do pequeno conselho, Elisa, Ethan e Elora também ocupavam lugares ali, todos apreensivos pelo que Eilon falaria.
— Bom, é de conhecimento de todos o péssimo gosto que mamãe tem para homens, assim como a facilidade que tem para engravidar — Eilon começou, incomodado —, logo aquela coi…aquele bebê nascerá e tal como foi conosco, mamãe irá querer uni-lo a um dragão de Calasir, mas Saphiral não precisa dos nossos dragões.
— Mas, Eilon, são filhotes de Sinler e Jaspe, dragões de sua mãe — Max o lembrou sutilmente, recebendo um olhar severo.
— Dragões que ela escolheu deixar aqui para seguir aquele homem — falou, o veneno pingando de suas palavras. — Para evitar que os futuros filhotes dela com Perseu tenham dragões de Calasir estou pensando em mandar os filhotes para Dragoi, sem cavaleiros e sem perigos iminentes eles não cresceram tanto, além disso seria a defesa da ilha.
— E os ovos? Esporadicamente as dragões fêmeas conceberam ovos… — Mandrik franziu o cenho.
— Essa é a segunda parte do plano — Eilon ergueu um dedo firmemente. — Treinaremos pessoas para saberem deragoniano, o básico para não ser devorado por um dragão, e, além deles manterem os filhotes em Dragoi, irão controlar a eclosão de ovos, os mantendo dentro daquela sala que tem no covil.
— Controlar? — Elora arqueou a sobrancelha.
— Os ovos serão retirados para serem chocados apenas quando houver o nascimento de um filho daqui — Eilon respondeu categoricamente. — Alguém tem alguma colocação?
— Greta será ótima nisso — Elisa sorriu ao lembrar da criada de Dragoi, se alguém seria boa em cuidar dos filhotes, seria Greta.
Em Ruphira, a festa em comemoração à coroação de Orion prosseguia. Todos pareciam se divertir, mesmo após o surpreendente anúncio de Orion. Lincan e William estavam mais afastados, monopolizando uma grande jarra de vinho, eles riam de histórias do passado e da atitude inusitada do príncipe.
— Ele é parecido com você, em partes — Lincan sorriu, bebendo um longo gole enquanto observava o príncipe dançar com sua futura noiva. — Mas Ethan também é.
— Não diga isso para Estela ou ela surta — William riu encarando a cunhada dançando em volta da fogueira, o vestido rosa escuro contrastando com os cabelos brancos.
— Aquela cena sua fudendo uma prostituta com lenço branco nunca saiu da minha cabeça — Lincan riu com a lembrança.
— Os cabelos dela são muito melhores que um lenço — William deu um sorriso de canto banhado de safadeza.
— Eu sabia! — Lincan bebeu um gole de vinho, como se fosse um brinde ao feito do sobrinho. — Aquele rei, marido dela, Pernilongo…
— Perseu — William corrigiu.
— Isso, Perseu, ele ficou um tanto ofendido quando perguntei se ela ainda gemia na mesma intensidade da época de Estevão — William torceu o nariz, tentando comparar mentalmente.
— Não, acho que não — balançou a cabeça. — Aqueles dois eram como animais no cio — estreitou os olhos em direção ao tio. — Uma vez Mandrik os pegou transando na sala do conselho, outra vez eu os flagrei em uma das salas do andar debaixo — contou casualmente, bebericando o vinho. — Ah! E teve aquela vez que estávamos em Interlok e eles quebraram a mesa do escritório.
— Tenho certeza que ele aprendeu deragoniano por passar tanto tempo dentro dela — Lincan se jogou para trás em meio a risada. — Mas então, submissa?
— Nem sempre — William sorriu, um tanto corado pelas lembranças. — Ela é bem…versátil. Às vezes dominadora, às vezes dominada.
— Deve admitir que fiquei chateado em saber que ela casou, queria ter a oportunidade de entender porque Estevão queimaria Calasir por ela — William riu contra a borda da taça, pensando que ele entendia porque Estevão faria isso, ele próprio faria por Auterpe, mas não por sexo e sim por sentimento.
— Estevão a amava e a reverenciava como se ela fosse uma deusa…e a chupava como uma laranja — o comentário arrancou uma risada ruidosa de ambos, o que incomodou Perseu, que havia se aproximado deles para pegar vinho de uma das mesas.
— É da minha esposa que estão falando — Perseu disse para eles, os olhos faiscando de ciúmes.
— Ela geme com um ou dois dedos? — Lincan perguntou, desafiador, inclinando a cabeça.
— O que acontece entre quatro paredes não é da conta de vocês — Perseu disse com a voz cortante.
— Queria que fosse da minha conta, mas vossa majestade foi mais rápido — o comentário de Lincan foi a gota de água, Perseu sentiu o fogo escalando seu corpo e então se afastou até a parede da arena, agarrando as pedras para aliviar a energia. Estela percebeu o isolamento dele e se direcionou para lá, pousando uma mão suave no ombro dele.
— O que houve, querido? — a pergunta o fez saltar, ele estava irado, seus olhos brilhavam em fúria.
— Lincan…ele tem comentários nojentos — formulou entre dentes. — É um animal, fica me perguntando como é nossa relação — foi a vez de Estela ficar furiosa, seu rosto ruborizou e não foi de vergonha. — E agora ainda saem — Perseu pontuou quando viu a dupla se afastar para dentro de um corredor.
Ela girou nos calcanhares, se afastou de Perseu, alcançou uma garrafa pela metade que estava em cima da mesa perto do corredor por onde os homens seguiam e a arremessou em direção a Lincan, passando de raspão pelo rosto dele e quebrando aos pés da dupla.
— Você tem a mesma mira ruim de Estevão, querida — Lincan comentou, virando o rosto para vê-la, foi o exato momento que uma pedra o atingiu no meio da testa, o desnorteando. William se afastou aos tropeços quando viu uma faca reluzindo sutilmente na mão dela, ele poderia a vencer na força se estivesse sóbrio, mas não bêbado como se encontrava, ela caminhava daquela maneira graciosa e sempre com um sorriso amável no rosto. Ela se aproximou de Lincan, o segurando pelos cabelos e colocando a ponta da faca no meio de sua garganta.
— Pare de fazer seus comentários nojentos ou cortarei sua língua — ela sussurrou quando as costas dele se chocaram na parede.
— Você não ousaria — Lincan disse, desafiador, sentindo a ponta da faca perfurar levemente sua pele.
— Pare com esses comentários ou cortarei sua língua — repetiu.
— Aprendeu isso com Estevão? — Lincan riu, o corte doendo em sua testa.
— Estevão teria feito isso sem anúncios — ela o sacudiu, a cabeça fazendo um baque surdo ao bater na parede.
— Tem razão, Estevão teria cortado minha cabeça se eu tivesse perguntado com quantos dedos você começa a gemer — novamente a cabeça foi chocada contra a parede. — Um rei por um rei, mas esse é mais covarde.
— Não fale do meu marido — Estela rosnou, o machucando mais com a ponta da faca.
— Está bem, guardarei meus comentários para mim — Lincan ergueu as mãos em desistência.
— Ótimo — o tom de Estela mudou e ela o soltou, retomando o sorriso gentil. — Aproveite a festa, Lincan, Ruphira faz festas espetaculares! — falou ao girar para retornar para a arena, mas então parou e olhou por cima dos ombros para o tio de seu falecido marido — E para sua informação, Estevão teria respondido dois antes de cortar sua cabeça — Lincan sorriu com a resposta dela e observou a silhueta se afastar, antes de olhar para William, que ainda estava no chão.
— Desfaça essa ereção — o tio ordenou antes de seguir para dentro.
Estela começou a caminhar em direção a Perseu, que havia se afastado consideravelmente, até demais para uma grávida cujo o bebê estava agitado dentro do ventre. Ela parou um instante, colocando a mão no alto da barriga numa tentativa de Sísifo se acalmar.
— Ela está sempre grávida…e sempre é de um rei — Lennus comentou casualmente, a Olho dos Deuses ao seu lado.
— Nem todos nasceram de um rei — disse a garota, com um tom de certeza que assustava. — O novo bebê nascerá numa ruptura. Será a união e também um marco. Haverá o antes e o depois do príncipe.
— O que?! Do que você está falando, garota? — Lennus perguntou, seu tom beirando a indignação.
— Aguarde — foi a única resposta dada por ela antes de se afastar.
Estela terminou seu percurso até Perseu, o surpreendendo com um abraço, o que fez ele rir antes de retribuir. Ele afagou as costas da mulher e beijou o topo de sua cabeça.
— Lincan vai beber aquela última garrafa em seus aposentos — mentiu num sorriso gentil. — Não dê atenção para os comentários dele ou serão cada vez piores.
— Ele fazia essas perguntas para Estevão? — Perseu perguntou num tom firme, encarando a fogueira numa tentativa de não olhar para Estela, talvez sentindo medo de que a saudade de Estevão se refletisse nos olhos verdes.
— Não, Estevão esfolaria ele — a resposta veio num tom divertido, mas qualquer sorriso que ela tenha esboçado foi esvaído quando Sísifo desferiu um chute vigoroso em suas costelas, a fazendo se curvar para frente num gemido. — Eu não me acostumo com a força dos seus filhos — comentou sorrindo para ele, tentando arrancar um sorriso dele.
— Sente falta dele? — a pergunta a surpreendeu e a fez franzir o cenho, irritada. — ahn…desculpe, prometi que não levantaria esse assunto novamente.
— Agradeço — Estela acariciou o rosto dele pouco antes do bebê dar uma volta completa com força. — Acho que vou me deitar.
— Claro, vamos… — ela colocou a mão em seu peito, o parando.
— Eu vou sozinha, fique na festa de coroação do seu sobrinho mais tempo — o beijou demoradamente. — Te espero na cama — sussurrou de maneira devassa, o que arrancou uma risada contida de Perseu.
Enquanto Perseu se aproximava de Artemisa e Ben, mais para controlar a conversa do que para fazer companhia. Estela começou o trajeto até seu quarto, mas foi quando passava por uma sala que um choro copioso chamou sua atenção. A porta estava entreaberta, foi por onde ela espiou. Auterpe estava sentada no chão, suas costas contra a parede, seus joelhos encolhidos.
— Auterpe, o que foi? — perguntou abrindo a passagem. Auterpe ergueu o rosto, a tristeza se transformando em raiva.
— Suma daqui! — rosnou, Estela franziu o rosto, surpresa pelo tratamento. Auterpe ficou de pé, marchando em direção a ela. — Sua presença me insulta!
— O que eu te fiz? — a pergunta saiu num tom inocente que fez Auterpe revirar os olhos.
— Você diz detestar atenção, mas na verdade ama…ama que estejam olhando para você, ama que disputem você — Auterpe se aproximou mais, fazendo Estela dar um passo para trás. — É por isso que você sente falta de Estevão, porque ele colocaria fogo no mundo por você — Estela seguiu se afastando sem entender de onde vinha a raiva da cunhada. — E agora você fica aí, exibindo seus filhos perfeitos…
— Auterpe, eu…eu não estou entendendo… — Estela olhou para trás, percebendo que estava se aproximando da parede.
— Rigel é surdo — comunicou —, as mulheres do refúgio acabaram de me informar quando trouxeram ele para conhecer Ruphira.
— Ahn…eu sinto muito, Auterpe…
— Não quero seus sentimentos — a rainha de Ruphira respondeu quando terminou de encurralar a cunhada. — Meu irmão errou quando transou com você naquela noite e errou de maneira inimaginável quando casou com você — Auterpe tirou uma adaga da cintura e a levou rapidamente para a garganta dela. — Quero que lembre que está sozinha nesse lado, não tem seu falecido marido, não tem seus filhos e nem tem a única força que possui: seus dragões. Faça seu papel como consorte, cuide de meu irmão e dê os filhos que ele quiser — a adaga apertou mais contra a pele delicada do pescoço. — É só para isso que você serve.
Auterpe a largou da mesma forma abrupta que a atacou, Estela ficou imóvel, ainda sentindo o fio da faca em sua garganta. Por que Auterpe estava a tratando daquela maneira? O que ela havia feito para a rainha de Ruphira? Eram perguntas que apenas Auterpe poderia responder.
Estela deitou, sentindo a pressão que o bebê fazia em seu ventre. Virou para o lado, a fim de diminuir a dor e então fechou os olhos, sonhando com seu quarto na fortaleza. A mobília que Estevão havia escolhido com tanto afinco, a cama macia e sedosa. Ao seu lado estava William, num sorriso divertido ele acariciava a barriga dela. Estela sabia qual momento era aquele: uma lua antes de Ethan nascer.
— Ele será tão forte quanto os irmãos — William sussurrou, num sorriso.
— Será mais atrevido, com certeza — Estela respondeu, com um sorriso divertido.
— Desculpe, atrevimento é um traço de família — ele riu, sentindo o bebê se mexer embaixo da pele dela.
— William, você sabe que…
— Eu sei, fica tranquila, ninguém além de nós saberá — eles trocaram um sorriso cúmplice, uma prova silenciosa que guardariam o segredo deles.
Estela acordou do sonho, seu coração apertado, como se tentasse avisá-la de algo.
Em Calasir, o covil estava com um grupo de quinze pessoas, homens e mulheres de diversas idades, todos com os olhos arregalados de medo pela proximidade com os dragões. Eilon estava ao lado de Elisa, Ronar e Tyrax parados lado a lado atrás de seus respectivos cavaleiros.
— Eilon, é loucura colocar pessoas comuns diante dos dragões — Elisa sussurrou para o marido, que se manteve impassível e em silêncio.
— Meus corajosos voluntários, é de conhecimento que, atualmente, há mais dragões do que cavaleiros, precisamos de pessoas fortes e destemidas para nos ajudar a controlar isso — Eilon começou, Ronar mostrou os dentes, o que fez dois voluntários se afastaram o máximo que conseguiram até a saída. — Ensinarei comandos básicos para vocês, não para que montem dragões, porque isso é impossível, mas para que consigam caminhar entre eles em segurança. Quem será o primeiro? — um jovem se aproximou, seus cabelos eram negros e seus olhos cor de mel, ele tinha uma expressão desafiadora em seu rosto.
— Eu, majestade — Simon havia crescido vendo as bestas aladas dominando os céus de Calasir e, para ele, não havia nada mais incrível. — Simon Clagfer.
— Muito bem — Eilon sorriu e o ensinou a primeira palavra: “Pare”, era simples e Simon logo a dominou. As pessoas no grupo que não conseguiram repetir o primeiro comando foram dispensadas. Ronar se balançou, seus olhos negros fixos no jovem de cabelos negros, o fogo começou a se formar em sua garganta enquanto Simon tentava controlar o tremor. — Não demonstre medo — Eilon sussurrou para o outro.
— Eilon, Ronar vai matá-lo — Elisa disse baixinho, agarrando a mão do marido. Antes que Eilon respondesse, Ronar preparou-se para atacar, mas o grito desesperado de “Pare” vindo de Simon, deteve o dragão.
— Viu? É possível — Eilon deu um sorriso tranquilizador para a esposa, que suspirou aliviada.
Infelizmente nem todos tiveram a mesma sorte, alguns correram quando encararam os dragões e outros sequer tiveram coragem para encará-los. Foi quando sobrou apenas quatro dos voluntários que uma garota chegou esbaforida. A presença de Greta arrancou um sorriso de Elisa.
— Perdoe o atraso, majestades — ela começou, mas a mão erguida de Elisa a aquietou.
Foi Tyrax que recebeu a garota e ela não demonstrou uma partícula de medo, pelo contrário, após conseguir repetir a palavra perfeitamente, ela se aproximou da dragão e a fez parar antes que o ataque começasse. Elisa sorriu para Eilon, um sorriso de orgulho.
Naquela tarde Eilon começou a Ordem do Dragão, uma apologia frágil da Guarda Dragão, mas simbólica. Aquelas cinco pessoas seriam os responsáveis por garantir que nenhuma besta caísse em mãos erradas e, quando ele se referia a mãos erradas, ele se referia aos filhotes que sua mãe daria para Perseu.
Auterpe chorava indo em direção ao seu quarto, a raiva a consumia, seu amado filho caçula era surdo, por que os deuses eram tão injustos? Eles deram bebês saudáveis para aquela coisinha frágil que seu marido chamava de mulher e para ela, uma verdadeira rainha, um bebê surdo, que seria um alvo fácil para chacotas e outras ameaças.
Além disso tinha o fato de Orion descumprir as regras e anunciar publicamente seu futuro noivado com uma bruxa, não que ela tivesse algo contra a garota, tinha certeza que era uma boa menina, mas Orion estava descumprindo as regras, no entanto, quem era ela para dizer algo sobre seguir as regras? Ela, que havia engravidado de um rei do outro lado?
Ela entrou no quarto, sendo surpreendida pela visão de William se masturbando sentado na cama, ele estava com os olhos fechados e a cabeça jogada para trás, a boca aberta emitia gemidos inaudíveis.
— Mas o que é isso?! — gritou ao entrar, o que fez ele parar subitamente seus pensamentos pecaminosos com a mulher de cabelos brancos. William se cobriu, surpreso pela reação dela.
— Ora, meu amor, não quer se juntar a mim? — ele riu, tentando aliviar o clima.
— Nosso filho é surdo e você pensa em sexo?! — Auterpe berrou, batendo a porta com força.
— Nosso filho o que? — William arqueou a sobrancelha, confuso.
— Rigel é surdo, ele não ouve, sabe como isso será prejudicial para ele quando for um guerreiro?! — Auterpe serviu a taça de vinho até que transbordasse. William estava paralisado, em choque.
— Ele ficará bem, meu amor — disse, enfim. — Rigel será tão habilidoso quanto os irmãos…irmão — Auterpe estreitou os olhos para o encarar, a fúria visível em seu rosto.
— Irmãos? — ela perguntou. — Qual outro irmão que Rigel tem além de Orion?
— Nenhum — disse, quase em desespero. — Eu errei, o vinho, você sabe… — ele deu de ombros, tentando conter o nervosismo. — O que quero dizer é que Rigel ficará bem, ele é perfeito do jeito que é — William se aproximou dela, pousando as mãos no ombro dela e beijando a curva do seu pescoço.
— Por que os Deuses estão zombando de mim, William? Por que deram filhos perfeitos para Estela, que é inútil, e para mim, que sou uma rainha, não? — ela chorava baixinho, sentindo a irritação crescer em sua voz e a mágoa tomar seu peito.
— Porque sabiam que você teria capacidade de amá-lo — o homem falou, tentando ser condescendente com a dor dela.
— Estela também amaria, ela é tão ridícula que não há espaço para outro sentimento dentro dela além de amor — William quis rir, porque discordava disso, Estela sabia ser geniosa quando queria, mas sempre dizia que a melhor forma de ganhar uma guerra é aos sorrisos e não à espada. — Amor e bebês…
— Auterpe, Estela não é a culpada pela condição de Rigel — a mulher o afastou num movimento brusco.
— Por que está defendendo ela? Por que ela sempre precisa de defesa?! — Auterpe rosnou, furiosa. — Ela pode não ser culpada pela condição de Rigel, mas é uma ofensa para mim, para minha família e para meu reino! Ela e suas crias de cabelos brancos!
— Auterpe, por favor, se recomponha, você está furiosa com a pessoa errada — William viu a raiva escalar pelo corpo da esposa, que o acertou um soco no queixo.
— Você a ama, não ama? Passou todos esses anos se escondendo nas sombras do seu irmão apenas para ficar perto dela… — ela começou a se aproximar, William sentia a tensão no ambiente.
— O que? Não! Eu não amo Estela, não como mulher. E fiquei nas sombras do meu irmão porque ele era o rei, oras, que louco eu seria se fosse para longe do castelo? — ele disse, limpando o sangue no canto da boca.
— Você se aproximou de mim porque eu sou parecida com ela…
— Auterpe, estamos juntos há tanto tempo, acho que é prova suficiente que estou com você porque te amo e não porque parece com Estela — William falou, mais firme.
— Ela não merece meu irmão, ela não merece amor algum e também não merece seus filhotes saudáveis — Auterpe gritou, os raios bailando em seus dedos. — Eu sei que vocês estão me escondendo algo e vou descobrir o que é.
William foi deixado sozinho no quarto, seus pensamentos confusos demais para seguir alguma linha de raciocínio.
Na manhã seguinte, quando ainda havia certa tensão no ar, Orion se aproximou de Connor antes que chegassem à sala de refeições, a imagem do avô em choque assombrava sua mente, ele não queria ser algo repudiante para alguém que era tão amável com ele.
— Vô — Orion chamou, o homem virou com um sorriso, vendo o garoto coçar a nuca, nervoso. — O senhor ficou assustado? Eu o decepcionei?
— O que? Por que, querido? — o homem disse em uma voz gentil.
— Quando o sacrifício terminou, o senhor parecia espantado… — ele encolheu os ombros.
— Fiquei impressionado com você, tão jovem e tão habilidoso — Connor sorriu, apertando o ombro tenso do menino.
— Certeza que aquilo não o assustou? — o avô riu, uma risada divertida.
— Orion, eu já vi muitas pessoas morrerem, de muitas formas — ele olhou no fundo dos olhos do menino. — Calasir não é mais tranquilo que Ruphira. Pessoas morrem em todos os lugares — Orion sorriu, em partes aliviado.
A mesa do café estava com algumas ausências, como Estela, que não estava ao lado de Perseu. Orion encarou o lugar vazio, franzindo o cenho, ele sabia o quanto sua tia valorizava momentos em família.
— E tia Estela? — ele perguntou.
— Indisposta — Perseu respondeu.
— Ela deveria aprender que mulheres fracas não devem gestar — Auterpe disse, a voz cortante e a raiva ainda presente em seu rosto.
— Auterpe… — Perseu a olhou de canto.
— Não vou nem falar muito ou irá parar de fuder com ela por medo de machucá-la — disse em saphiral arcaico, rindo ruidosamente. Perseu bufou.
— Temos a coroação de Artemisa ainda, desejo que nos acompanhem à Saphiral para a realização da cerimônia — Perseu comunicou, olhando para todos com um sorriso calmo.
Diferente de Ruphira, Calasir não enfrentava nenhuma tensão muito grande. Eilon e Elisa estavam se esforçando para ensinar os comandos aos guardiões, e estavam fazendo um trabalho muito bom com eles.
Ethan, entediado, buscava algo para o entreter em Drakoj, foi numa dessas que encontrou um caderno do ano do seu nascimento, eram anotações, cada uma falando algo importante que aconteceu, como os primeiros passos de Elisa ou a tentativa de Eilon em subir ao covil no alto dos seus três anos. Foi a anotação do vigésimo segundo dia da segunda lua que chamou sua atenção, era uma viagem do seu pai e a próxima anotação datava do dia três da terceira lua: a rainha descobriu uma nova gestação, mas sua mãe demoraria tanto para descobrir? Ele lembrava dos seus irmãos demorarem tanto para nascer, como se os meses fossem mais longos. Ethan folheou o caderno, indo até a página do seu nascimento, onde aparecia, grifado, a informação de que o quarto príncipe de Calasir nasceu meia lua antes do previsto.
— Mandrik — o garoto virou para o conselheiro, que o olhou — , quem ficava com minha mãe quando meu pai viajava? — Mandrik franziu o cenho.
— William, ele era o conselheiro da cidade, ficava ao lado de sua mãe como regente — as peças começaram a se encaixar na cabeça de Ethan, relembrando como William era mais legal com ele, o chamava para brincar, o presenteava com armas e o ensinava sobre venenos, coisas que nunca fez com seus outros irmãos, e se ele fosse filho de William? Sua mãe já tinha uma bastarda, não custaria fazer outro filho fora do casamento. Ele sorriu com esse pensamento, iria perguntar isso para sua mãe quando a visse novamente.
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