Rafael chegou ao consultório depois da viagem, carregando um ar de introspecção. Laura percebeu a mudança e aguardou enquanto ele se acomodava.

— Laura, tenho pensado bastante sobre a visita que fiz à minha ex-esposa. Foi estranho agir como se nada estivesse acontecendo. Conversamos sobre nossas novas vidas e, aparentemente, nada mudou. Mesmo sabendo que não tem volta, ainda alimento dentro de mim um pouco de esperança — Rafael disse, com um suspiro pesado.

Laura assentiu, compreendendo o conflito interno de Rafael.

— Rafael, você precisa viver um pouco a vida sem ela e descobrir mais sobre você mesmo — disse Laura, gentilmente.

— Eu sei, Laura. Falando nisso, vai ter uma festa na empresa onde trabalho. É uma festa de aniversário da nova gestão. Estou com sentimentos conflitantes. Ao mesmo tempo que não quero ir por causa da quantidade de pessoas e de ter que lidar com todas elas, gostaria de ir para conhecer o pessoal da minha equipe. Como trabalhei em home office, acabo não conhecendo ninguém pessoalmente — Rafael explicou, visivelmente ansioso.

— E como ficou o trabalho nesse período? — Laura perguntou, inclinando-se ligeiramente para frente.

— Estou me recuperando aos poucos. Tive uma conversa com meu supervisor no dia que decidi sair de casa. Logo pela manhã, falei com ele que não conseguiria trabalhar. Disse: "Eu posso até te falar que estou trabalhando, mas na verdade eu não tenho forças para fazer isso no momento." Ele ficou surpreso e perguntou o porquê. Contei sobre a separação e expliquei que minha esposa queria viver coisas que não eram possíveis comigo.

Laura escutava atentamente enquanto Rafael continuava.

— Meu supervisor me disse duas coisas que ficaram gravadas em mim. Primeiro, ele disse: "Rafael, eu sinto muito pelo que está passando. Eu também passei por isso quando era mais novo e só posso te dizer que vai passar." E então, ele disse algo que eu não entendi na hora: "Agora, do pouco que te conheço, eu preciso que você retire o chicote da sua mão."

Rafael fez uma pausa, e Laura o incentivou a continuar.

— Eu fiquei sem entender. Ele explicou: "Rafael, você tem o costume de se autoflagelar psicologicamente falando e colocar a culpa em você pelas coisas. É como se qualquer erro fosse sua culpa, mas não é assim. Não estou dizendo que a culpa é dela, mas sim que um relacionamento não é feito apenas por uma pessoa, mas sim por duas, e isso vocês terão que carregar juntos." — Rafael começou a chorar, tanto ao relembrar a conversa quanto ao relatar para Laura.

Laura esperou pacientemente até que Rafael se acalmasse um pouco e então começou a falar com suavidade e firmeza.

— Rafael, você não tem culpa, e nem ela. O relacionamento de vocês começou muito cedo, e vocês não tiveram tempo de se conhecerem sem o outro. É natural que você se sinta perdido e culpado, mas é importante lembrar que a responsabilidade é compartilhada. Você precisa focar em se conhecer e elevar sua autoestima. Isso leva tempo, mas você verá que as coisas irão melhorar. Você está vivendo um luto, Rafael.

— Luto? — Rafael questionou, confuso. — Mas ninguém morreu.

— Rafael, a vida anterior que você conhecia morreu. Você está nascendo e crescendo em uma nova vida, e qualquer crescimento acarreta dores também — Laura explicou, com um tom compassivo. — Este processo de crescimento é difícil e doloroso, mas também é uma oportunidade para você se redescobrir. Você tem que passar por todas as fases do luto: negação, raiva, barganha, depressão e aceitação. Cada uma delas é importante e nenhuma delas é fácil.

Laura fez uma pausa, deixando suas palavras penetrarem profundamente em Rafael. Então, ela continuou.

— Rafael, sua vida agora é um livro em branco. As páginas anteriores foram escritas com capítulos de amor, dor, crescimento e perda, mas as próximas páginas estão prontas para serem preenchidas com novas experiências, novas descobertas e novas conquistas. Você tem a chance de se conhecer de uma maneira que talvez nunca tenha tido antes. Use este tempo para se redescobrir, para entender o que realmente te faz feliz, o que você valoriza e quem você quer ser daqui para frente.

Ela olhou para Rafael com uma expressão de encorajamento e ternura.

— Você é forte, Rafael. Mais forte do que imagina. Cada dia é uma nova oportunidade para se levantar e tentar novamente. E lembre-se, você não está sozinho nessa jornada. Eu estou aqui para te apoiar, em cada passo do caminho. Vamos encerrar por hoje, mas saiba que você está fazendo progressos, mesmo quando parece que não está. A jornada é longa, mas vale a pena.
Rafael assentiu, ainda emocionado, mas com uma nova determinação no olhar.