A Folha e o Som escrita por BastetAzazis


Capítulo 7
Volta para Casa


Notas iniciais do capítulo

Ufa! 5000 palavras na estica! Espero que gostem XD



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Eu deixava as palavras entrarem e saírem pelos meus ouvidos, sem coragem de falar mais nada. Não sabia se ele tinha notado que eu estivera a ponto de beijá-lo num momento de fraqueza. Quando chegamos na casa da Ino, nos despedimos formalmente, e eu ainda fiquei observando ele se afastar antes de entrar.

o.O.o


Capítulo 7: Volta Para Casa


Eu não sei qual foi a repercussão da minha fuga na Vila do Som, mas até hoje ainda se comenta do furor causado, cinco dias depois, por uma carta enviada à minha mãe pelo Hokage. Quando a águia mensageira de Konoha chegou ao Som, os ninjas que a receberam descobriram um envelope lacrado com um selo que reconheceria apenas o chakra de quem estava endereçado: Sakura Haruno. Sem saberem o que fazer, o envelope foi levado até o escritório do Otokage, que dizem, urrou de raiva ao ler o nome do remetente: Naruto Uzumaki.


Meu pai atravessou a vila no caminho do seu escritório para sua casa em tempo recorde, e dizem também, que o nome da minha mãe foi ouvido por todos os habitantes da vila quando ele a chamou.


- O que significa isso? - ele perguntou, ameaçadoramente, estendendo o envelope assim que ela apareceu na frente dele.


Ela franziu o cenho, pegando a carta com curiosidade, e abriu o envelope. Sentando-se no sofá, começou a ler o conteúdo em voz alta:




Sakura-chan,


Espero que esta carta encontre você e o Sasuke em boa saúde, pois apesar dos anos de distância, nunca deixei de considerá-los como amigos. Não me estenderei muito, apenas gostaria de deixar claro que quem a escreve não é o Sexto Hokage, mas seu antigo companheiro de time, Naruto, e esta não é uma carta oficial. Para evitar qualquer dúvida, está endereçada a você, e não ao Sasuke.


Há dois dias, Amisa Uchiha chegou aos portões da vila pedindo por refúgio. Ela estava exausta de uma viagem de três dias sem paradas e, provavelmente, sem provisões, e a única coisa que pudemos fazer foi interná-la no Hospital de Konoha até que ela se recuperasse totalmente. Não há motivos para preocupações, ela está bem e receberá alta ainda hoje.


Entretanto, ela diz ser uma ninja renegada do Som e usa sua linhagem com Konoha para nos pedir asilo. Tenho certeza que isso não passa de um mal entendido, e tomo a liberdade de escrever esta carta para evitar que este evento não desencadeie desentendidos ainda maiores. Logo após a chegada da Amisa-chan à vila, recebemos também a notícia de um confronto entre o Som e a Névoa, por isso gostaria de deixar claro que a presença da filha do Otokage em Konoha não tem ligação direta com este evento, e que a Folha não é aliada de nenhuma das duas vilas.


Eu sei que não tenho o direito de me intrometer na sua família, mas duvido que os anciões da Folha concordarão com a presença da Amisa-chan aqui. Como amigo, gostaria de sugerir que vocês tentassem falar com ela para convencê-la a voltar para casa. Caso contrário, como Hokage, serei obrigado a pedir para que ela deixe a vila e, aí sim, ela deverá viver como uma renegada. Tenho certeza que não é isso que vocês desejam para sua filha, e por isso, deixarei os portões de Konoha avisados da possível chegada de vocês em breve.


Siceramente,

Naruto





- Pelo menos agora nós sabemos que a Amisa está bem - minha mãe concluiu, assim que terminou de ler, levantando os olhos para o meu pai com um leve sorriso.


Meu pai apenas pegou os papéis da minha mãe e começou a ler, como se para ter a certeza que não havia perdido nada da comunicação entre o Hokage e a sua mulher.


- O Naruto fez muito bem em nos avisar - minha mãe comentou enquanto meu pai ainda lia. - Ele pareceu tão maduro na carta... Nem parece o Naruto que conhecemos - ela refletiu.


- O que ela está fazendo em Konoha? - meu pai perguntou, irritado, ignorando as últimas palavras da minha mãe.


Minha mãe pousou seus enormes olhos verdes sobre ele e, levantando-se até o meu pai, pegou a carta da mão dele e respondeu calmamente:


- Ela está confusa. É normal que ela procurasse por refúgio no único lugar onde ainda tem alguns laços.


- Ela nasceu no Som! - ele replicou, indignado, caminhando de um lado para o outro da sala. - Ela não tem mais nenhum laço em Konoha.


Minha mãe deu um longo suspiro.


- Sasuke - ela começou, calmamente -, você tem que buscá-la.


- O quê? - ele perguntou, parando na frente dela e franzindo o cenho. - Ela deixou a vila por conta própria. Se ela quiser voltar, que volte com as próprias pernas.


Outro suspiro. Minha mãe parecia precisar juntar toda sua paciência quando tinha que dialogar com o meu pai.


- Será que você não entende? Ela está sofrendo, Sasuke! - ela insistiu. - Ela perdeu todos os companheiros de time de uma só vez. Ela perdeu o melhor amigo e o namorado... E ela acha que é tudo culpa sua... Você tem que falar com ela.


Meu pai pareceu pensar no assunto por um breve momento, entretanto, logo declarou sua decisão:


- Eu não posso deixar a vila por tanto tempo. Nós acabamos de expulsar os ninjas da Névoa que tentaram nos atacar. Se alguém perceber que o Otokage não está na vila, eles podem voltar.


- Ela é a sua filha - minha mãe argumentou, indiferente às explicações do meu pai. - Tenho certeza que o Juugo-san e o Suigetsu-san saberão ser discretos quanto a sua ausência.


- Sakura... - meu pai começou, levantando a voz.


- Sasuke Uchiha! - minha mãe o cortou, impondo-se com a voz ainda mais alta que a dele. - Se eu tiver que ir até Konoha para falar com a Amisa, eu levarei nossos outros filhos comigo e não voltarei mais!


Toda paciência tinha limites. Os olhos do meu pai se arregalaram, e ele chegou a recuar um passo com a reação inesperada da minha mãe.


- Você não... - ele começou, agora com a voz baixa.


- Experimente - ela respondeu, estreitando os olhos numa ameaça.


Vencido e sem palavras, meu pai bufou de raiva. Entretanto, antes de sair da sala para arrumar suas coisas para uma viagem que o deixaria afastado da vila por quase uma semana, virou-se para minha mãe e ordenou, com o tom austero para provar que ainda tinha sua liderança:


- Encontre o Juugo e o Suigetsu. Eu precisarei falar com eles antes de partir.


\\o/\\o/\\o/\\o/\\o/


Depois que o Hokage me deixou na casa da Ino, eu o vi apenas uma ou duas vezes em três dias. A Ino e o Sai tinham uma linda menininha de dois anos, que eu ajudava a tomar conta sempre que ela precisava cuidar da loja dos pais. E era no fim da tarde que ele vinha até a floricultura, sempre perguntando gentilmente como eu estava e então tratando com a Ino dos assuntos da vila. Felizmente, ele agia como se jamais tivesse percebido minha fraqueza aquele dia, no lago, enquanto eu ainda tentava entender o que foi aquilo que senti. Depois de muito refletir, concluí que aquele impulso de dias atrás fora apenas uma tentativa desesperada de reviver algo que eu jamais sentiria novamente, talvez movida pela idéia de ter encontrado alguém que também já tinha sofrido grandes perdas. E eu agradecia por ter me impedido antes que algo irreversível pudesse acontecer, porque eu sabia que jamais amaria outra pessoa como tinha amado o Kaito.


Quando o Hokage estava por perto, era difícil a conversa não voltar para as lembranças dele e Ino sobre a minha mãe. Eu passava horas ouvindo os dois comentarem sobre o treinamento dela com a Tsunade-sama, dos jutsus poderosos dela e de como ela se tornara uma excelente ninja médica. Ás vezes, o Sai também se juntava a eles, lembrando de como minha mãe e o Hokage lhe ensinaram o verdadeiro sentido da amizade e do trabalho em grupo, e eu não podia deixar de me orgulhar cada vez mais dela, embora ainda não entendesse como ela parecia tão diferente depois de ter acompanhado meu pai para o Som. Quanto mais eu ouvia sobre minha mãe, mais eu sentia meu coração se apertar com saudades de casa. A conversa com o Hokage me deixou em dúvida sobre o papel do meu pai nas mortes do Kaito e do Yiuki, e a idéia de jamais poder ver minha mãe e meus irmãos novamente começava a pesar nas minhas decisões.


Mas eu sabia que não podia voltar. Eu tinha desafiado o meu pai. E foi graças à ameaça dele que, finalmente, meu Sharingan se desenvolvera até o último nível. Embora eu não tivesse perdoado meu pai pelo que acontecera, ele era a única pessoa que poderia me ajudar a desenvolvê-lo completamente. Eu já estava percebendo que, com meu novo doujutsu, era ainda mais fácil perceber o movimento de outros ninjas, a ponto de conseguir copiar seus próprios jutsus ou identificar seus genjutsus. Eu sabia que possuía uma técnica muito poderosa, mas precisava de um treinamento apropriado. Em Konoha, eu me limitava apenas a observar ao longe outros times ninja em treinamento, usando meu novo Sharingan para avaliar a quantidade de chakra e o estilo de luta de cada um.


E foi observando um grupo de gennins em treinamento nas proximidades da entrada de Konoha que eu vi, ao longe, uma figura se aproximando que parecia com o Otokage. Ele era rápido, e assim que parou na frente dos guardiões da vila, eu tive a certeza de que era mesmo o meu pai. Meu estômago gelou, e eu engoli em seco, temendo as reais intenções dele. Escondida, mas perto o bastante para ouvir o que diziam, esperei enquanto um dos guardas saiu à procura do Hokage porque o meu pai se recusou a entrar na vila.


- Sasuke... - o Hokage soltou uma leve exclamação de surpresa assim que o viu, ainda parado na entrada de Konoha.


- Naruto - meu pai respondeu, cumprimentando-o com um leve aceno de cabeça.


- Já faz muito tempo - o Hokage continuou. Era possível perceber que havia uma grande distância entre eles. Não física, mas emocional.


- Sim - meu pai assentiu.


- Sempre nos chegam notícias de grandes feitos dos ninjas do Som. É uma vila...


- Eu não vim aqui para conversa - meu pai o cortou, seco.


Os olhos do Hokage parecerem escurecer. Ele baixou a cabeça e simplesmente murmurou:


- Claro.


- Onde ela está? - meu pai perguntou, sério.


O Hokage permaneceu em silêncio por alguns instantes. Quando respondeu, levantou os olhos encarando firmemente o antigo amigo.


- O que aconteceu exatamente, Sasuke?


- Você estava certo na sua carta, Naruto - ele respondeu, enfrentando o Hokage com o olhar. - Você não tem o direito de se intrometer na minha família.


- Não, realmente eu não tenho. Mas ela me pediu pessoalmente por refúgio. Eu gostaria de ter a certeza de que ela ficará bem.


Meu pai estreitou os olhos e ativou seu Sharingan.


- Você não vai querer lutar comigo, Naruto.


Os olhos entristecidos do Hokage se estreitaram.


- Você está na entrada de Konoha, Sasuke - ele respondeu com uma voz ameaçadora, mas eu também pude perceber que havia mágoa escondida naquelas palavras. - Não é só comigo que você teria que lutar...


Eu não podia mais olhar aquilo e ficar parada. Depois de tudo que ouvi sobre a antiga amizade dos dois, não podia permitir que outra guerra se iniciasse por minha culpa. Corri para a entrada da vila, parando entre os dois.


- Não! - disse para o meu pai. - Você não precisa começar outra guerra só por minha causa. Eu vou para o Som com você.


Por mais que ainda não tivesse perdoado meu pai, sabia que não poderia ficar em Konoha; eu não pertencia àquele lugar e já começava a perceber que minha presença ali estava se transformando num grande problema para o Hokage. Observei a expressão do meu pai se apaziguar quando seus olhos moveram-se do Hokage para mim e voltaram para a cor preta. Remexendo em suas coisas, ele tirou minha antiga hitaiate, estendendo-a para mim.


- Neste caso, acho que você se esqueceu disso - ele falou.


Eu peguei a hitaiate com o símbolo do som que sempre tive tanto orgulho de usar, mas não a prendi na cabeça. Apenas fiquei segurando-a em minhas mãos, ainda em silêncio.


- Seus irmãos estão prestes a terminar a academia - ele disse para mim, no que parecia o esboço de um sorriso. - Eles vão precisar de você.


Ele estava se referindo ao acordo que tínhamos, que eu treinaria o time dos meus irmãos quando eles se tornassem gennins. Da mesma forma que aconteceu comigo, ele queria alguém que entendesse todos os segredos do Sharingan para treinar seus filhos.


- Eu pensei que ainda não estava pronta para me tornar uma jounin - respondi, desafiando-o.


- Isso foi antes de... - ele replicou, mas se interrompeu antes mesmo de terminar a frase. - Você sabe.


Eu estreitei os olhos para ele. Apesar de tudo que aprendera sobre o passado do meu pai, ainda continuava achando que ele era a pessoa mais odiosa que existia. Mas eu estava num beco sem saída; não podia enfrentá-lo, e meus irmãos realmente precisavam de mim, eu não deixaria que meu pai fizesse com eles o mesmo que fizera comigo.


Decidida a deixar Konoha, finalmente prendi a hitaiate como sempre costumava usar e me virei para o Hokage.


- Obrigada por me acolher na sua vila - disse, sorrindo tristemente -, mas acho que é melhor para todos se eu voltar.


Ele assentiu com a cabeça, um sorriso triste também surgiu em seu rosto.


- Vamos, Amisa - ouvi a voz do meu pai, sentindo a mão dele sobre o meu braço, puxando-me para trás.


- Mas...? - indaguei, virando-se novamente para ele. - Eu preciso me despedir da Ino-san, e...


- Eu já estou há três dias longe da vila - ele respondeu, indiferente. - Nós precisamos voltar imediatamente.


Eu abri a boca para revidar, mas entendi que seria inútil. Resignada, voltei-me uma última vez para o rosto tranqüilo e decepcionado do Hokage, com olhos suplicantes.


- Não se preocupe, Amisa-chan - ele disse. - Eu avisarei a eles que você teve que partir imediatamente.


- Adeus - respondi, baixando a cabeça.


Ele respondeu também com um assentimento, e eu dei as costas para Konoha, seguindo meu pai para o Som. O Hokage permaneceu parado nas portas da sua vila por um bom tempo, observando aquele que ele considerava seu melhor amigo partir mais uma vez...


\\o/\\o/\\o/\\o/\\o/


Nós já havíamos cruzado a fronteira do País do Fogo quando meu pai resolveu fazer uma pausa. Foi uma viagem silenciosa, eu apenas o seguia quieta, sem vontade alguma de dirigir qualquer palavra a ele. Assim que escureceu, ele decidiu parar para descansarmos e nos alimentarmos. Eu simplesmente assenti com a cabeça e, sem falar nada, comecei a preparar um pequeno acampamento como fazíamos quando estávamos em missão.


Foi estranho me sentar com o meu pai em volta de uma fogueira sem o Kaito e o Yiuki conosco. Pela primeira vez senti o vazio que eles deixaram e, finalmente, a percepção óbvia de que jamais os veria novamente. A surpresa e o desespero inicial aos poucos davam espaço para uma saudade dolorida, mas só então eu entendia que a única coisa que me restava era aceitar que eles estavam mortos.


Levantei os olhos por um instante e encontrei os olhos negros e inexpressivos do meu pai. Ele olhava fixamente para o nada, perdido em pensamentos que eu temia descobrir, mas que de alguma forma entendia que estavam relacionados com a ausência daqueles que completariam nosso antigo time. Era como se nós dois estivéssemos conversando sobre eles em silêncio. Confirmando minhas suspeitas, ele subitamente resolveu expressar seus pensamentos:


- Graças a eles nós conseguimos impedir um ataque massivo da Névoa - disse, um tom raro de melancolia em sua voz. - Foi uma grande perda para a vila.


Então, finalmente, o grande Otokage reconhecia que cometera uma injustiça... Eu o considerei por um momento com os olhos estreitos, observando-o olhar fixamente para o fogo queimando lentamente a lenha entre nós. Ele realmente parecia sentir a falta dos dois.


- Eles foram enterrados com todas as honras de heróis - ele continuou. - Foi uma cerimônia muito bonita. Você deveria estar lá. Era o que eles esperariam da companheira de time.


Eu arregalei os olhos. Ele estava me repreendendo por não ter ficado na vila? Por não ter aceito pacificamente o que ele fez?


- Você mandou o Kaito sozinho para uma missão suicida - eu revidei, não conseguindo mais ouvi-lo sem dizer nada. - Enterrá-los como heróis não muda isso.


Os olhos dele finalmente se levantaram para me encarar. Com o brilho do fogo refletindo neles, pareciam ainda mais furiosos.


- Foi o Kaito quem me pediu para investigar os movimentos da Névoa - ele disse, seco. - Nós já desconfiávamos deles, mas não imaginava que estavam tão próximos de agir.


- Eu sei que ele pediu uma missão para provar seu valor - respondi, levantando a voz. - Mas você não precisava mandá-lo sozinho para a Névoa, muito menos me mandar para o esconderijo Sul com a Karin - completei, lutando para não chorar na frente dele.


Meu pai deu um longo suspiro.


- Se você quer me culpar de alguma coisa disso tudo, Amisa - ele continuou, desviando os olhos novamente para a fogueira -, culpe-me por ter tentando poupar minha filha do mesmo destino do time dela.


As últimas palavras ele pronunciou quase num sussurro, mas eu não queria mais ouvir nada. Para mim, aquilo era só mais uma confissão de que ele sabia do que aconteceria quando indicou aquela missão para o Kaito.


- Fui eu quem treinou vocês, afinal - a voz dele continuava, cada vez mais sombria. - Eu sabia que o Yiuki não o deixaria partir sozinho, e você teria feito o mesmo se estivesse na vila.


- Nós éramos uma célula tripla - eu concluí. Por um momento, havia esquecido da raiva que sentia do meu pai.


Nós ficamos em silêncio por mais um tempo. Vencida pelas lembranças que vieram à tona, falhei em segurar as lágrimas que começaram a escorrer facilmente pelo meu rosto.


- Mas então, por quê? - perguntei, balbuciando entre o choro. - Se você sabia que era perigoso, por que você enviou o Kaito sozinho?


Com a vista borrada, eu observei ele levantar do seu lugar para se sentar ao meu lado. Antes de me responder, ele me fez encostar a cabeça em seus ombros e começou a brincar com os meus cabelos como fazia quando eu ainda era criança.


- Eu já havia comentado com ele que suspeitava que havia ninjas da Névoa espionando nossas fronteiras - ele começou a responder. - Foi ele quem me sugeriu uma missão de reconhecimento. Entretanto, quando seguiu para o País da Água, o Kaito não apenas confirmou nossas suspeitas como descobriu que eles já estavam prontos para uma invasão. Nós não imaginávamos que eles estavam tão perto. Mesmo sendo o Kaito, ele não tinha chance contra todo um exército da Névoa.


- Você quer dizer que... - eu levantei a cabeça para encará-lo - que nós seríamos atacados se ele não...


Não consegui continuar. Era ainda mais dolorido para mim saber que o Kaito tinha morrido para salvar todos nós enquanto eu chorava egoisticamente pela falta que ele me fazia.


Como resposta, meu pai apenas assentiu com a cabeça, silenciosamente. Só depois de limpar as lágrimas que ainda escorriam em meu rosto, ele continuou:


- Foi graças ao Yiuki, que o seguiu e o trouxe de volta para a vila, que nós soubemos do que aconteceu e pudemos nos preparar para nos defender.


Eu arregalei os olhos. Aquilo significava que o Som estava em guerra com a Névoa, enquanto eu havia fugido ao invés de lutar pela minha vila como o Kaito e o Yiuki fizeram. E por causa da minha fuga, eu ainda fiz o Otokage deixar a vila, expondo-a ainda mais aos ninjas da Névoa. Envergonhada, eu simplesmente baixei a cabeça, evitando encarar o meu pai e lembrando da voz da minha mãe quando ela me fazia decorar os cem dizeres shinobi: "Não importa qual a situação, um shinobi deve esconder seus sentimentos, deve fazer da sua missão sua primeira prioridade e deve possuir um coração que nunca chora."


Eu não podia fazer aquilo. Não podia fingir que meu coração não doía, ou impedir que lágrimas se derramassem cada vez que pensava neles. Só havia uma coisa que podia fazer; desatando a hitaiate presa na minha cabeça, eu a entreguei ao meu pai.


- Eu... eu não posso fazer isso - disse, balbuciando entre lágrimas. Meu pai apenas me encarou, curioso. - Eu não tenho o coração de um shinobi. Eu ainda sinto a falta dele... e eu... Como eu faço para essa dor parar? - implorei, com os olhos chorosos.


Meu pai não pegou a hitaiate da minha mão. Ao invés disso, ele me abraçou, fazendo eu enterrar minha cabeça em seus ombros, como se ainda fosse uma garotinha.


- Não vai passar, Amisa - ele me respondeu, voltando a passar as mãos nos meus longos cabelos. - E é isso que faz de você uma shinobi.


Eu recuei do abraço dele para encará-lo. Ele percebeu minha expressão de dúvida e continuou com um sorriso discreto:


- Você é igual à sua mãe, Amisa.


Eu franzi o cenho. Até onde eu sabia, meu pai jamais considerara minha mãe como uma kunoichi forte.


- Quando deixei Konoha, eu tive que partir sozinho - meu pai explicou. - Sua mãe tentou me convencer a ficar, ou então, a levá-la comigo. Mas eu não podia fazer nenhuma das duas coisas. A única coisa que restou a ela, então, foi treinar. Treinar cada vez mais para me ajudar a me libertar da maldição do Orochimaru. Se não fosse por ela, pela força dela, talvez eu jamais tivesse me libertado dele.


Eu arregalei os olhos. Jamais ouvira meu pai se referindo à minha mãe daquela maneira.


- Se você não pode treinar para trazer o Kaito de volta, como a sua mãe fez comigo - ele continuou -, use essa força para lutar como eles, para lutar contra os que fizeram isso com eles.


- Você quer dizer... - comecei, um pouco em dúvida - para me vingar dos ninjas da Névoa?


- Não - ele respondeu prontamente. - Acredite-me, vingança não é o motivo certo para um shinobi procurar poder.


Eu baixei os olhos, fitando o chão. Sem levantar uma única vez a voz para mim, meu pai conseguiu me deixar pior que se nós tivéssemos discutido ferozmente. Ele não era o monstro que eu havia criado em minha mente nos últimos dias, e agora eu me sentia culpada por fazê-lo deixar nossa vila em guerra, ou mesmo por não ter ficado e lutado ao lado dele e de todos os demais ninjas do Som.


- Eu sinto muito - foi a única coisa que consegui responder. - Eu deveria ter ficado.


- Você é minha filha - ele respondeu, puxando-me para perto dele e me abraçando novamente. - Eu não poderia esperar que você aceitasse tudo isso pacificamente. Mas estou feliz que tenha decidido voltar.


Eu apenas assenti com a cabeça. Apesar de ainda sentir saudades do Kaito e do Yiuki, meu coração agora parecia em paz. Entretanto, ainda tinha dúvidas sobre a relação do meu pai com Konoha.


- Eu nunca imaginei que seria responsável por fazer você voltar à sua antiga vila - comentei, tentando esboçar um sorriso.


A expressão dele tornou-se fria novamente.


- Por que você nunca nos deixou viajar para Konoha? - insisti. - Os meus irmãos nunca conheceram nossos avós.


- Você sabe muito bem que não é permitido ninjas de outro país numa vila oculta - ele respondeu. - Por que você quer saber disso agora?


- Você sabe que meus avós morreram? - eu o desafiei. - O Hokage disse que os avisou da morte deles. Mesmo assim, a minha mãe nunca voltou para Konoha, nem mesmo para visitar...


- Ela se recusou a voltar - meu pai respondeu, interrompendo-me. - Ela jogou aquela maldita carta em mim e disse que era tarde demais para tentar reaver laços com Konoha. - Num suspiro cansado, ele ainda completou: - Eu acho que fiquei mais de um mês dormindo no quarto de hóspedes naquela época...


Eu arregalei os olhos para o meu pai, esforçando-me para não rir com a idéia da minha mãe expulsando-o do quarto. Eu já vira meus pais discutindo algumas vezes, mas sempre parecia que era o meu pai quem dava a última palavra. Nunca imaginei que as coisas podiam ser um pouco diferentes quando eles estavam sozinhos. Estava ficando cada vez mais impressionada com a minha mãe a cada novidade que ouvia sobre ela.


Meu pai deve ter percebido meu assombro, pois logo em seguida explicou:


- Você estava em missão com o seu time quando isso aconteceu, e seus irmãos eram muito novos para entender alguma coisa. Sua mãe preferiu não contar nada a vocês.


Eu assenti com a cabeça, mas depois continuei:


- Você nunca mais voltou a Konoha por causa do que aconteceu com o seu clã, não é? - perguntei, arriscando entrar num assunto que pela primeira vez eu tinha coragem de discutir com o meu pai. - Pelo menos é isso que o Hokage acha.


- Amisa - meu pai começou, os olhos escurecidos -, há um motivo para eu ter feito questão de treiná-la e, depois, querer que você seja a responsável pelo treinamento dos seus irmãos.


Eu levantei uma sobrancelha, e então ele começou a me contar toda a história do clã Uchiha, desde a formação de Konoha até o dia em que seu irmão assassinou toda a família, deixando apenas meu pai sobreviver. Não era nenhum conto de fadas ou uma história para crianças dormirem. Pelo contrário, havia muito sangue, vingança, dor e traição na história do nosso clã, e ouvindo atentamente tudo o que meu pai me dizia, eu não podia deixar de concordar com ele que Konoha e o antigo bairro Uchiha não eram lugares apropriados para o início de uma nova família.


O Sharingan era um doujutsu amaldiçoado. Era necessária uma série de assassinatos para que ele se desenvolvesse completamente, como o do meu pai. Foi por causa do Sharingan que o antigo Otokage foi atrás do meu pai, e foi apenas para obter o poder de controlar a Kyuubi que Itachi Uchiha, meu tio, fez meu pai desejar se vingar dele, para que os dois lutassem até a morte. Foi meu pai quem ganhou a luta entre os dois irmãos, e sua recompensa foi o Eterno Magekyou Sharingan. Ele nunca teve orgulho deste seu poder e, temendo que a história do clã Uchiha se repetisse novamente, deixou Konoha para sempre.

- Eu não quero ter que assistir meus filhos lutando ente si por um poder maldito - ele concluiu, sua voz cada vez mais pesarosa. - Eu a ensinei como usar todo o poder do Sharingan, sem precisar recorrer às armadilhas do Magekyou. Quero que você faça o mesmo com os seus irmãos, que você os treine como um time, uma célula tripla, como eu treinei vocês.


Eu assenti, entendendo o recado dele. Ele queria que nós, seus filhos, fossemos tão unidos que jamais aceitaríamos as condições para obter o poder do Mangekyou. Era uma grande responsabilidade que ele me delegava, mas eu não podia negar. Não depois de se referir ao Kaito e ao Yiuki mais uma vez, ao meu time que se sacrificou pela vila e a quem eu tinha a obrigação de garantir que eles não lutaram em vão. Eu treinaria meus irmãos, e nas horas de folga treinaria arduamente para não deixar que a memória de Kaito e Yiuki fosse apagada.


Cansada da viagem e, provavelmente, com as emoções dos últimos dias, deixei meu corpo relaxar nos braços do meu pai e, em poucos minutos, estava dormindo com a cabeça apoiada nele. Quando o dia amanheceu, nós continuamos nosso caminho até o Som, desta vez decididos a não parar até chegarmos em casa.


Foram mais dois dias de viagem até chegarmos às proximidades da vila. Antes de continuarmos, entretanto, eu ainda chamei o meu pai, com uma idéia que vinha insistindo em minha mente durante toda a viagem, depois de tudo que ouvi sobre minha mãe.


- Antes de voltar para casa eu gostaria de lhe pedir uma coisa - disse, séria.


- O quê? - ele perguntou, franzindo o cenho.


- Eu sei que você quer que eu treine o time do Ando, do Yusuki e do Yori, mas eu também gostaria de treinar jutsus médicos com a minha mãe. - Ele me considerou em silêncio, então expliquei: - Se alguém com conhecimentos médicos estivesse com eles naquele dia, quem sabe eles ainda estivessem vivos...


A expressão dele mudou subitamente de preocupada para aprovadora, e ele me respondeu com um sorriso discreto.


- Sua mãe ficará muito orgulhosa.


Eu respondi o sorriso, mas ainda tinha mais um pedido a fazer:


- E eu também gostaria de me despedir deles antes de chegar em casa.


Meu pai assentiu com a cabeça, indicando a direção onde Kaito e Yiuki foram enterrados. Eles estavam num lugar especial, dedicado apenas àqueles que morreram pela vila.


- Eu vou avisar sua mãe e seus irmãos que nós já chegamos - eu o ouvi falando pelas minhas costas. - Imagino que você queira ficar um tempo sozinha.


Eu assenti com a cabeça, sem me virar para trás, ouvindo os passos dele se afastando. Assim que soube que estava sozinha, saquei uma kunai e a usei para cortar o meu cabelo. Fiquei com um chumaço cor-de-rosa na mão que depositei à frente da lápide com o nome do Kaito.


- Isso é para você, Kaito - murmurrei, meus olhos lacrimejando. - A Amisa que você conheceu não existe mais...



Continua...

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Notas finais do capítulo

N.A.: Obrigada a todos que chegaram até aqui e não desistiram da fic mesmo com a demora em atualizar! Eu avisei que os caps estavam ficando longos e o meu tempo cada vez mais curto...

Mais uma vez, muito obrigada a Miateixeira – profunda conhecedora da geografia do mundo de Naruto e sem a qual a guerra entre o Som e a Névoa seria uma aberração. Ela puxou bastante a minha orelha, e se ainda ficou alguma coisa esquisita é porque eu não sigo os fillers.

E muito obrigada pelas reviews! É o carinho de vocês que anima a continuar a fic!



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