— Mestre Bruce, é melhor tirar o uniforme e me escutar! — o mordomo pediu pela quinta vez enquanto seguia o herói morcego pelos corredores da mansão.

— Depois que eu falar com o meu filho conversamos, Alfred...

Bruce não estava ignorando todos os avisos e pedidos de Pennyworth por mal, só estava deixando seu lado paterno falar mais alto – até mesmo gritar. Haviam passado dias ao lado de Damian esperando que ele acordasse ou ao menos apresentasse uma melhora no quadro.

— Precisa entender que ele não está totalmente em si e...!

— Alfred, eu preciso escutar a voz do meu filho! — Batman respondeu, já com a mão na maçaneta da porta. Entretanto, antes que ele pudesse abrir e entrar, foi Richard Grayson quem abriu a porta e saiu, fechando-a atrás de si.

— É melhor tirar esse uniforme antes de entrar, B... — o rapaz falou sem nem ao menos tentar esconder todo o desanimo que estava sentindo.

Finalmente aceitando que algo estava errado, Batman deu meia volta e foi para o quarto se trocar. Alfred chegou a dar alguns passos na direção dele, mas foi Dick quem o seguiu para tentar explicar o que estava acontecendo.

— Alfred acha que é Amnésia Dissociativa. Quando ele acordou, pensei que era só uma brincadeira de mal gosto... droga! — O rapaz olhou pela janela do quarto, se culpando por ter deixado Damian ainda mais nervoso no começo —  Ele não lembra de nada.

— É melhor que ele não lembre o que aconteceu...

— Bruce, ele não lembra de nada.

O mais velho o encarou, terminando de tirar os acessórios. Ficou em silencio por alguns momentos e pareceu até mesmo ignorar o que escutou, mas finalmente perguntou:

— O quanto é nada?

— Absolutamente nada. — Dick passou a mão pelo cabelo — Tentamos explicar quem ele era, mas só piorou tudo! Eu achei que seria fácil, mas só de escutar “Robin”, ele teve uma crise de pânico e...!

— E como ele está agora? — Bruce o interrompeu com a pergunta, depois de vestir um sobretudo volumoso escondendo o uniforme por baixo.

— Não se lembra de nada, nem mesmo que já tinha acordado antes... — o rapaz suspirou mais uma vez — Alfred disse que é mais sensato deixar ele se lembrar sozinho e aos poucos.

Batman, ou melhor, Bruce Wayne não falou mais nada. Saiu do quarto e caminhou da forma mais silenciosa que conseguia com seus sapatos lustrados, estava vestido como um homem de negócios que acabara de chegar em casa.

Mais uma vez ele estava com a mão na maçaneta da porta, dessa vez abrindo-a e entrando no quarto do filho. Damian estava sentado na cama, recostado na cabeceira e cercado por almofadas – incluindo uma onde repousava a perna fraturada. Estava foleando o álbum de fotos de Família Wayne.

— Filho... — Bruce o chamou em timbre baixo, estranhando não ter sido notado assim que entrou — Filho, como está se sentindo?

— Patrão Bruce, vai ter que falar um pouco mais perto... — Alfred informou sem tirar os olhos da criança, estava de pé ao lado da porta — A audição foi muito prejudicada, ele se queixa constantemente.

O homem se aproximou da cama, mas só foi realmente notado por Damian quando se sentou na beirada mais próxima. A primeira reação que teve foi medo, logo substituído por estranheza e até mesmo timidez.

— Filho, como está se sentindo? — Bruce perguntou novamente, um pouco mais alto do que a primeira vez.

— E-eu? — O rapaz o encarou por alguns segundos tentando entender do que estavam falando e, assim que percebeu, abaixou o olhar se sentindo ainda mais deslocado — Já estou melhor...

— Isso é ótimo, filho — Zeloso, ele bagunçou o cabelo do mais novo — Queria muito estar aqui quando você acordasse, mas tive uma reunião.

— Já me explicaram sobre isso. Obrigado mesmo assim... — ainda tímido, Damian respondeu encarando o álbum de fotos mais uma vez.

— Alfred, Damian está sendo compreensivo e educado ao mesmo tempo?

— Sim, Patrão Bruce.

— E ele não quer nada em troca disso?

— Acredito que não, Patrão Bruce.

— Por quanto tempo será que vamos ter essa versão tão amável do meu filho? — Novamente, ele bagunçou os cabelos de Damian com o mais absoluto cuidado. O mais novo o encarou, ainda tímido, porém sorrindo.

— Não está zangado comigo? — o rapazinho perguntou.

— Eu deveria estar?

— ... Achei que ficaria, porque eu não lembro do senhor.

— Não vou ficar irritado por algo desse tipo, Damian — Bruce sorriu, se aproximando um pouco mais do filho — Sabe, que tal me chamar de “pai” ao invés de “senhor”?

— Como quiser, sen... pai! Como quiser, pai! — se retratou apressadamente.

— É um bom recomeço — Foi impossível impedir um princípio de riso de escapar, até mesmo Damian achou graça de si mesmo — E que tal deixar as fotos antigas de lado e escutar sobre as suas travessuras? — Recebendo um aceno positivo e muito entusiasmado, ele se aproximou ainda mais do filho e colocou o álbum entre os dois, mostrando uma das primeiras fotos de Damian na mansão — Aqui: nesse dia você fugiu de casa e foi me encontrar na empresa. Quando eu entrei na minha sala você estava lá, sentado na minha cadeira, falando que alguém estava desviando dinheiro no setor argentino...

Alfred continuou ao lado da porta, observando-os com um sorriso singelo. O mordomo mal conseguia acreditar que Bruce estava se saindo tão bem em manter aquela áurea de “calma e compostura” devido a situação, ele estava se esforçando de verdade para ser um bom pai.

Damian escutou atentamente as histórias, cujo “detalhes” foram ocultados. Bastaram três até que o sono superou a curiosidade por si mesmo, afinal de contas, ainda estava com alguns efeitos ativos dos sedativos.