Sobre a Terra Firme (Série elementos 2) escrita por Spoiler Cia


Capítulo 1
Capítulo 1




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/790001/chapter/1

Ser a pessoa mais alegre do seu grupo de amigos às vezes tem suas desvantagens. Eu tento sempre demonstrar que sou alegre, que posso ajudar a Maria com seus problemas, ajudei ela a descobrir o que havia acontecido com sua mãe, eu a apoiei em seus planos. Ao mesmo tempo eu vivo brigando com o Murilo, entretanto com o principal objetivo de distraí-lo dos seus problemas com seus pais, do fato deles não o apoiarem em seus sonhos.

         Afinal eu sigo sendo a melhor amiga deles, porém acho que sou a única que nunca chorei no ombro deles. Eu nunca me permiti isso, até o aquele sábado, onde vi o Murilo desabar, tomando o golpe em meu lugar. Quando eu consegui chegar até ele, toca-lo eu soube que o havia perdido, talvez eu ame mesmo ele, mais do que como amigo, mais do que como a protetora. O Murilo pode achar que é o protetor das meninas, mas eu sempre me senti nesse papel, principalmente quando diversas vezes o encontrei chorando por seu desejo de seguir a carreira de artista, e as brigas que seus pais sempre têm.

         Mas no final ele entrou em minha frente quando a Joana lançou um tronco sobre mim. Ele acabou morrendo por mim. Somente quando a Deusa Inaiê permitiu que ele recuperasse sua vida que eu pude respirar novamente. Mas mesmo assim eu chorei sobre seu corpo, eu chorei nos braços da Maria.

         Mas para ser o mais precisa possível, já fazem 2 semanas e eu continuo chorando, porque mesmo ele respirando, ele não é mais o meu Murilo, que eu descobri amar tanto. Ele não abre seus olhos, eu não vejo seus olhos castanhos desde o dia do nosso sequestro. Eu não escuto sua voz brigando comigo a tempo demais.

         A minha mãe está cada dia mais preocupada com o meu estado de saúde, porque eu continuo ficando a tarde toda no hospital, eu saio da escola e venho direto para cá, muitas vezes a Sophia vem junto comigo, seus pais estão se revezando para não deixarem-no sozinho. Mas apenas eu venho todos os dias.

— So, vai para casa um pouco, sua mãe me ligou ontem, e pediu para eu tentar convencer você a ir embora um pouco, ficar pelo menos um dia longe desse ambiente hospitalar.

— Eu não consigo Maria, eu prometi para mim mesma e para ele que eu vou ficar com ele em todos os momentos que eu conseguir, eu só vou depois das 18 para casa, porque só os pais dele podem ficar para dormir. Mas eu me recuso a deixa-lo, eu quero estar aqui quando ele acordar. Ele se arriscou por mim, eu nunca poderei pagar pela minha vida.

— Querida, o Murilo não fez isso esperando que você retribuísse isso de alguma forma, e você sabe disso. Ele fez isso porque ele te ama.

— Eu também o amo – mas não vou assumir para a Maria que eu acho que estou apaixonada por ele. Acho não, eu tenho certeza. A primeira pessoa que precisa ouvir isso é ele.

— Mas para você ajuda-lo a se recuperar precisa estar bem, saudável, ele vai precisar muito mais da gente quando estiver acordado do que agora.

— Eu não posso concordar com você, eu acho que mesmo em coma ele pode me escutar, eu converso com ele o dia todo. Eu sinto que se eu deixar de conversar com ele, mesmo que um dia ele vai desistir de lutar pela própria vida.

— Eu posso revezar com você, que tal? Você vem um dia, e eu venho no outro assim nunca o deixamos sem ninguém.

— Pode desistir Maria. Você não vai me convencer, eu não vou deixar de vir todo dia.

— Tudo bem, parei. Mas se qualquer dia você precisar de mim, por favor, me peça. Você é a pessoa do nosso trio que nunca pede nada, nenhum favor, nada. Eu sou sua amiga também, estou aqui por você. Eu nunca teria descoberto sobre a minha mãe sem você, sem o Murilo.

         Eu sei que assim que o Murilo sair dessa, e ele vai sair, eu vou precisar muito da ajuda dos meus amigos, até mesmo da ajuda do mimadinho do Miguel.

         Eu não vou conseguir descobrir o paradeiro dos descendentes da terra, da Deusa Inaiê sozinha. Mais do que nunca vou precisar aprender a pedir ajuda para outras pessoas.

         Desde que meu pai faleceu quando eu era mais nova ficamos apenas eu e minha mãe, sem ninguém. Minha mãe sempre trabalhou muito, apenas atualmente ela está conseguindo tirar alguns dias para ela se cuidar, mas inicialmente porque a Maria criou um plano para entrar na casa dos Almeidas, e agora porque a Dona Roberta insiste em dar todo fim de semana de folga para os funcionários.

         Mas sendo apenas eu e minha mãe desde muito cedo sozinhas, ela trabalhando e eu em casa, na escola, eu precisei aprender a ser mais independente do que nunca. A Maria também foi criada por uma mulher sozinha, mas a Ana sempre tentou ser o mais próximo possível dela e por ser dona de uma sorveteria própria ela conseguiu ter mais tempo, moldar seus horários para acompanhar o crescimento e as necessidades da minha amiga, por isso Maria nunca precisou se preocupar em limpar a casa, estudar, fazer o almoço.

         Longe de mim querer reclamar sobre a maneira como minha mãe me criou, foi por ela se dedicar tanto ao trabalho, que nós temos a nossa casa, os moveis que estão ali. Ela faz todas as minhas vontades, eu nunca passei nenhum momento de aperto, mesmo após a morte do meu pai. Mas o fato é que tendo minha mãe trabalhando todos os dias eu precisei me adaptar a crescer sozinha, aprendi a cozinhar, lavar louça, sem nunca precisar da ajuda de ninguém. Eu não gosto de depender de nada nem de ninguém.

         Esse sempre foi um dos motivos de eu ficar indignada com o Murilo aceitar tão facilmente ser manipulado por seus pais. Ele é um menino muito talentoso, na verdade o mais talentoso dessa cidade, mas ele não consegue pegar as rédeas da sua própria vida. Isso sempre me irritou completamente a seu respeito, mas são essas diferenças entre nós três que nos uniu como amigos.

— Sophia eu vou indo, tudo bem? Eu marquei de encontrar com o João... Meu pai no lago.

— Claro, pode ir amiga – eu dou um abraço nela e percebo que nessas 2 semanas eu nem tenho conversado direito com ela, ela descobriu que a mãe está morta, que a mãe do namorado dela que a matou, precisou usar seu dom recém descoberto para enfrentar a Joana, e por fim descobriu seu pai que até pouco tempo nunca soube da sua existência – E como está sua relação com ele?

— Um pouco estranha, mas está melhorando. Eu ainda não me sinto a vontade na sua frente para contar sobre tudo e todas as coisas. Mas está bem melhor do que não ter um pai... Desculpe So, eu falei sem pensar.

— Relaxa Maria, eu tenho minha mãe, e apesar de sentir falta do meu pai, nunca me faltou nada, muito menos amor dentro de casa. Eu fico feliz de verdade por você conseguir ter pelo menos um de seus pais perto de você. Além disso, eu sempre falei da minha mãe com você, não é como se eu tivesse tentando te magoar. Eu sei que você nunca faria nada para me atingir. Agora vai logo para o lago.

— Vou sim. Obrigada So. Não fica até muito tarde aqui, eu não quero meus dois melhores amigos doentes.

         Está começando a escurecer, e logo a mãe do Murilo vai chegar para ficar com ele, seus pais nunca gostaram muito da nossa amizade. Eles sempre tiveram grandes planos para o seu filho. Murilo deveria ser rico, amigo de pessoas importantes, casar com uma menina de família, cheia da grana. A única vez que vi o Murilo enfrenta-los de verdade foi quando seu pai quis o obrigar a se afastar de mim e da Maria. Isso ele nunca aceitou, no quesito amizade ele nunca deixou seu pai opinar.

         Ultimamente seus pais estão agindo diferente em relação a mim e minha amiga. Eles nunca nos trataram mal diretamente, afinal são muito finos e elegantes para isso, mas nossa relação sempre foi distante, costumava vê-los apenas uma vez por ano, no aniversario do Murilo, ou em alguma outra data especial. Mas agora eu os vejo sempre aqui no hospital, e nossa relação está quase intima, na medida do possível, sua mãe até me trouxe algo para almoçar ontem.

         Começo a recolher minha bolsa da escola para poder ir para casa, já está na hora de trocar meu lugar com a mãe dele, que deve estar subindo já. Aproveito meu ultimo minuto sozinha com ele, aproximo e o beijo suavemente nos lábios, um beijo quase fraternal, mas de fato não é, porque eu sei o que eu sinto. Eu seguro sua mão, e sinto um leve movimento, algo novo. Os olhos castanhos estão fixos nos meus, como eu estava com saudades desses olhos.

— Quem é você? Onde eu estou? O que aconteceu comigo? – e o mundo desaba sobre mim.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Sobre a Terra Firme (Série elementos 2)" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.