Valeran - A Ascensão dos Reis escrita por Lorde Vallex


Capítulo 9
Os Mercenários


Notas iniciais do capítulo

Hello!
Continuando com a história, esta estará dando início a uma parte bem importante da história!!!



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Na Academia Greyhorn, finalmente havia chegado uma semana tão esperada. Sete dias sem haver estudos. Para os alunos que possuíam tarefas atrasadas ou que estavam a um passo de sair da academia, aquilo significava debruçar-se sobre a mesa da biblioteca e passar o dia e a noite lá.
Mas isso não se aplicava aos alunos que estavam bem sucedidos na academia. Para eles, aquilo significava uma semana de descanso. Uma semana de paz, sem precisar decorar fórmulas mágicas ou treinar intensivamente.
Neste momento, Killian Maklaw, Artariel de Elderin, Lira von Dartã, Herys von Farandar e Soren Heirdarus caminhavam pelas ruas da cidade de Feradöhr, naquela noite de clima agradável. Soren estava pensativo, tenso. Queria fazer algo, mas não tinha certeza de quando e nem de como fazer.
Os demais, pelo menos aparentemente, estavam aproveitando os raríssimos dias de paz. Arty aproveitava para observar com mais atenção os trabalhos humanos. Arquitetura, forja, até mesmo a moda possuía leve influência do povo élfico.
“E as mais belas cidades humanas foram construídas em cima das nossas próprias cidades”, pensou o alto elfo.
Continuaram andando enquanto discutiam assuntos de pouca relevância, como o fato de Killian estar usando armadura em um dia de folga, até estarem frente a frente com uma estranha loja. Ela parecia velha, e havia um buraco no teto. A porta parecia ter sido aberta ainda na época do velho rei Aemond.
Bateram na porta.
Ela abriu-se, revelando um homem magro e meio corcunda, alto, com uma barba mal feita. Olhou para eles, e um de seus olhos era cego. Cortando-o, havia uma enorme e feia cicatriz.

— O que vocês querem? — perguntou ele.

— Somos clientes.

— Que engraçado. Não vendo para crianças.

— E que tal para a nobreza? Sou Lira von Dartã.

O homem semicerrou os olhos e virou-se.

— Muito bem. Que seja. Mas não peguem nada perigoso.

— Lira — disse Arty. — O que estamos fazendo aqui, exatamente?

— Só vim pegar algo para me ajudar a dormir.

Assim que entraram, sentiram um cheiro fortíssimo de muitos odores diferentes. A maioria provavelmente seria agradável se estivesse isolada, mas com tantos cheiros juntos, fora criado um odor extremamente desagradável.
O piso de madeira rangia enquanto davam seus passos, e Lira questionou-se se o piso iria ceder em algum momento. Por garantia, aproximou-se um passo de Killian. Ele possuía reflexos rápidos. Iria pegá-la se caísse.
Herys parou.

— Eu vou esperar lá fora — declarou, com os olhos molhados.

— Eu também — concordou Soren, embora não aparentasse estar tão incomodado. — E é melhor não começar com suas frases maliciosas e sem sentido.

— Há controvérsias em relação à falta de sentido — comentou Lira, inocente.

Soren revirou os olhos e abriu a porta da loja novamente. Então olhou para Herys.

— As damas primeiro.

— Sério? — perguntou ela, arqueando a sobrancelha. Soren suspirou.

— Muito bem. Então quem está quase chorando com este cheiro aqui dentro primeiro.

Assim que os dois estavam do lado de fora da loja, Herys inspirou profundamente o ar noturno.

— Lembre-me de nunca ir fazer compras com a sua irmã.

— Claro. Se ela não te arrastar à força.

Os dois aprendizes então começaram a andar pela cidade de Feradöhr. Enquanto caminhavam, Soren parecia tenso.
Finalmente, encontraram um local com um número menor de pessoas andando. Na verdade, não havia mais ninguém ali.
Tratava-se de um pequeno morro. Segundo os contos locais, teria sido, no passado, um gigante adormecido, que morrera em defesa da cidade contra mil demônios nos Tempos Antigos. Herys não saberia dizer se a lenda era verdadeira, e provavelmente não era, porém era uma bela história.
Os dois sentaram-se neste pequeno morro, observando as pessoas que andavam na rua. Herys olhou Soren com o canto dos olhos, e logo em seguida desviou o olhar.
O garoto deitou-se na grama, e Herys logo o seguiu. E ficaram os dois assim, deitados, olhando aquelas estrelas que tanto fascinavam os estudiosos de Valeran.
Outros mundos. Sim. Já havia conhecimento de que existiam outros mundos. Ora, fazia menos de um mês que eles voltaram de Yont-i, que era outro plano. Mas alguns ainda acreditavam que havia outros mundos naquele mesmo universo. A maioria, é claro, desprezava aquela ideia. Os deuses não teriam criado mais de um mundo em cada plano.
Mas e se realmente o tivessem? E se cada pontinho brilhante no céu, chamados de estrelas, na verdade não fossem outros mundos, habitados por outras raças completamente desconhecidas?
A maioria das pessoas não aceitava essa teoria. Afinal, um dos maiores medos dos seres humanos era o medo do desconhecido. Pior ainda: de um desconhecido que não podia ser controlado ou subjugado.
Herys não fazia parte desta maioria. Ela vivia pensando em como seria viajar para outros mundos, além mesmo dos Planos já existentes e conhecidos. Mas, acima dos desejos de encontrar novos mundos, era o de encontrar outro Plano já existente e conhecido, que nenhum humano vivo já visitou: Faloryn, o Plano Eterno do Fim. O local onde havia o Relógio Final que marcaria o início do Apocalipse.
Aquele era um sonho distante. Primeiro, precisaria tornar-se a Arquimaga. Só assim teria poder suficiente para tentar chegar a Faloryn. Mas, até lá, qual era o errado em sonhar?

— Não é mesmo? — perguntou Herys, após dizer em voz altas seus pensamentos.

— Talvez. Apenas tome cuidado para não sonhar alto demais.

— A graça dos sonhos é realmente ter a possibilidade de sonhar alto.

— Bem, você deve saber o que está dizendo.

— E você, Soren von Dartã. Qual é o seu desejo? Seu objetivo? Seu sonho? Há algo além de se tornar um nobre importante? Algo além de ajudar seu feudo? Algo pessoal?

— Algo… pessoal.

Soren começou a pensar. A deixar que sua mente o levasse até seus desejos mais profundos. Permitiu-se pensar em seus mais sinceros sentimentos.
Fora um erro. Não deveria ter pensado nisso.
Memórias antigas preencheram sua mente. Ideias absurdamente erradas e condenáveis logo dominaram sua mente. Ideias cujo mero pensamento poderiam levá-lo à ruína.
Então, Soren Heirdarus respondeu:

— Não. Não tenho nenhum objetivo pessoal. Meu desejo é ser a melhor pessoa possível para aqueles que cuidaram de mim.

— E por quê? O que Sor Roderik fez de tão bom para você? Pode me dizer, corvinho?

— “Corvinho”? Que engraçado — resmungou o garoto. Depois, manteve-se em silêncio.

“O que Sor Roderik fez por mim?”, pensara. “Concedeu-me o direito de viver. Deu-me um lar e uma família. Pessoas que gostavam de mim e me respeitavam. Deu-me um objetivo. Uma motivação. E é por isso, Herys von Farandar, que meu objetivo é protegê-los e ajudá-los.”

— Um dia — decidiu falar. — Um dia eu irei te contar o que Sor Roderik fez por mim. Um dia irei te deixar à par da história de vida de Soren, o mago das trevas que decidiu virar um nobre. Que decidiu não seguir o caminho da escuridão e que vai precisar se manter anônimo pelo resto de sua tola vida.

— Odeio quando você começa a falar desse jeito — reclamou Herys, aproximando-se de Soren e encostando a cabeça em seu ombro. — Quando começa a falar como se estivesse sozinho e como se estivesse condenado a um destino ruim.

— E não terei? Sou um mago das trevas em um reino onde desprezam magia das trevas.

— Acha isso errado?

— Acho isso errado, sim — confessou Soren. — A maioria dos magos das trevas é ruim, cruel e maligno, ou acaba se rendendo à corrupção. Mas eu sou a prova de que isso não é obrigatório. Entende, Herys? O problema da magia das trevas é a ganância por poder dos próprios seres humanos. O fato dela utilizar do sangue e da força vital dos outros é o que faz essa magia ser proibida, mas é fácil simplesmente não render-se a isso.

Herys permaneceu em silêncio, ouvindo atentamente as palavras do garoto.

— Você entende agora, Herys von Farandar? A maldade da magia das trevas não passa do fruto plantado pelos seres humanos. Nós usamos todos os ao redor em virtude de nossa própria felicidade, atravessando portas que deveriam ficar trancadas e correndo sem sequer olhar onde pisamos.

— Os demônios são a fonte da magia das trevas, e a usam para o mal — retrucou Herys.

— É parte da natureza deles. Sua deusa os fez deste jeito. Mas os seres humanos foram criados imperfeitos, não malignos. A nossa corrupção, a nossa podridão, é apenas nossa culpa. Mas ninguém aceitaria isso. É mais fácil condenar uma magia que veio de uma “raça maligna” do que condenar suas próprias falhas.

Um longo silêncio seguiu-se ao discurso do garoto. Herys refletia com surpreendente interesse nas palavras do garoto, e quanto mais pensava, mais concordava com ele.

— Você está fazendo com que eu me sinta mal — disse a maga elemental.

Soren sorriu.

— Perdoe-me. Não foi a minha intenção. Mas agora você entende. O problema de Valeran, ou melhor, de quase todos os seres humanos, é o fato de condenarem tudo o que é diferente e também transformar os seus erros nos erros dos outros.

— Sinto que estou começando a entender o seu pensamento — comentou a garota. — Você deseja mudança.

— Eu desejo justiça. Sim. Quero que Valeran mude. O ódio a inumanos, a magos das trevas, a estrangeiros… Isso tem de acabar. A escravidão, não apenas deles, mas de humanos comuns, isso é errado, Herys. Eu irei fazer com que Casymir Loernvel entenda isso.

Uma sombra de medo passou por Herys.

— Eu concordo com seu pensamento, mas isso dará errado! Ele silenciará você. Ele matará você.

— Talvez — concordou o garoto, indiferente. — Mas se estivermos sempre em silêncio, ele sempre irá vencer. Isso irá sempre continuar. Alguém precisa levantar-se contra ele.

— E esse alguém precisa ser você?!

— Agradeço a sua preocupação — agradeceu Soren, sorrindo sinceramente para Herys. Ele jamais havia sorrido de maneira tão bela. — O fato de você concordar comigo significa que Valeran ainda pode receber a salvação.

Herys entrelaçou seus dedos com os do mago das trevas.

— Por favor, Soren. Não faça algo que possa te colocar em perigo.

— Herys. Você não viu o que eu vi. Não sentiu o que eu senti.

— E o que você sentiu?! — rosnou Herys, furiosa.

— Senti o medo na pele. Senti muita dor, Herys. Eu vi o que acontece quando alguém vai contra Casymir Loernvel. E é por saber disso que eu tenho plena convicção de minhas palavras, assim como terei de minhas ações.

— Não poderá mudar os pensamentos dos outros. A suposta superioridade dos seres humanos de Valeran está impregnada em suas mentes.

— Pode ser. Mas não saberei se não tentar.

O mago das trevas levantou-se. A maga elemental levantou também. Os dois se entreolharam.

— Obrigado, Herys. Esta conversa me fez ter certeza de que ainda não é tarde demais para obter mudança.

— E que métodos irá usar se não pode se tornar um mago poderoso?! Acha que vão te respeitar se você usar apenas palavras?!

— É exatamente isso. Até porque, se eu usar a força, serei como aquele que eu estou querendo parar.

Os dois encararam-se por um momento. Olharam nos olhos um do outro, e pareciam entender o que o outro pensava.

— Feche os olhos — pediu Soren.

— O-o quê?!

— Apenas feche os olhos.

Corando, Herys fechou os olhos.
Soren levou a mão até o pescoço e retirou o belo colar que usava. Metade de ferro, e metade de ouro. O garoto então foi para trás de Herys e posicionou o colar no pescoço da garota. A nobre arrepiou-se com o toque da mão de Soren. Estava fria.

— Pronto.

Herys abriu os olhos e pegou o belo colar, olhando com curiosidade para o mago das trevas.

— Era da minha mãe — explicou Soren. — E da mãe dela antes dela. Representa o equilíbrio. Sol e lua. Luz e sombra. Bem e mal. Um não pode existir sem o outro, pois são conceitos opostos, mas que se completam. É meu presente para você. Significa que confio em você. Se algo acontecer comigo… Quero que se lembre de mim.

“Como se eu precisasse disso para me lembrar de você”, pensou Herys, sorrindo de canto, mas não disse nada.
Os dois olharam-se novamente, e as bochechas de Soren coraram.

— H-Herys… Eu…

Parou de falar quando Herys olhou de maneira estranha para algum ponto atrás dele. Assim que olhou para trás, notou, em uma área sem cidadãos, dois homens com roupas comuns de camponeses entrando em um beco. Possuíam espadas presas às bainhas e carregavam uma caixa oculta sob um manto de tom arroxeado e meio desbotado. Não era possível ver nada no seu interior.
Herys, entretanto, começou a descer do morro.

— Aonde você vai?

— Aonde nós vamos — corrigiu ela. — Tem algo de errado com aqueles homens.

— Por quê? Quer dizer, talvez seja meio estranho, mas…

— Soren! T-tem algo errado… Eu senti algo vindo de dentro daquela caixa… Era algum tipo de Mana estranha, ou algo assim. Por favor. Eu… Eu sinto que precisamos saber o que aquelas pessoas querem.

Soren gaguejou, suspirou e, por fim, aceitou.
Herys não sabia o que a movia naquele momento. Não podia saber. A única coisa que sabia era que sentira uma estranha energia vinda de dentro daquela caixa. Uma energia… incomum, antiga, caótica…
O mesmo tipo de energia que seu anel possuía. O mesmo tipo de energia que sentira na caverna no qual encontrara-o. E aquilo era o suficiente para mover Herys. Se havia algo com aqueles homens que pudesse ajudá-la a finalmente entender o que aquele anel portava, ela estava disposta a arriscar-se.
Esperava apenas que não fosse nada que colocasse a vida de Soren em risco. Ela não poderia se perdoar caso algo acontecesse ao mago das trevas por sua culpa…
Quando estavam quase chegando à entrada do beco, Killian surgiu ao lado deles.

— Para onde vocês dois estão indo?

— Hum… — começou Lira. — Eu estava assistindo ali, o que acontecia no morro. Daí vocês estão indo sozinhos para esse beco escuro e deserto…

— Lira, faça um favor a todos e fique quieta — ralhou Soren. — E vocês podem vir conosco.

— I-ir aonde? — perguntou Artariel.

Herys ignorou a todos e tornou a andar. Soren, decidindo seguir o seu exemplo, fez o mesmo. Logo, cinco pessoas entravam o mais silenciosamente possível em um beco escuro. Quando chegaram, viram que o beco ramificava-se em três ou quatro caminhos.
A primeira coisa que viram quando conseguiram se esconder em um local que não chamasse muita atenção foi que, se uma briga começasse, estariam em desvantagem. Havia no mínimo uns vinte homens lá, todos armados.
Os dois que chamavam mais atenção estavam sentados em barris. O primeiro era um homem enorme, com um elmo de ferro que permitia visão do rosto, com uma capa de pele de urso e um enorme martelo de guerra. O segundo era um homem de sobretudo marrom, encapuzado, com um peitoral de aço. Na bainha, uma espada de cabo belamente adornado.

— Hehe, irmãozinhos, vocês foram ótimos — elogiou o encapuzado.

— Obrigado, Adrian. Tivemos que bater um pouco naquele velho, mas nada com o que se preocupar.

— Ótimo, irmãozinho. Agora, mostrem-me.

Os dois homens que Herys e Soren viram por primeiro então levaram as mãos ao manto que cobria a caixa, retirando-o com um gesto exagerado.
Todos soltaram um suspiro de admiração, enquanto os estudantes da academia tapavam as bocas e Herys arregalava os olhos.
Pois dentro da caixa, havia um ovo.
O ovo possuía um tom verde-musgo, e sua textura lembrava escamas, porém elas eram largas e grossas. Killian imaginou que um golpe de espada mal poderia arranhar o ovo.

— Um ovo de wyvern — anunciou, sem necessidade, um dos homens que trouxe o ovo. — São, atualmente, as criaturas mais próximas dos antigos dragões.

— Eu entendo porque aquela lagartixa fedorenta do Isnar não queria que ninguém tocasse nisso — comentou Banner, o brutamontes com o martelo.

No momento em que ouviu esse nome, Killian empalideceu.

— I-Isnar? — murmurou ele. — S-será possível?

Os outros alunos olharam para ele, mas não puderam comentar nada.

— Sabe — disse Adrian —, eu estou quase tentado a ficar com esse ovo para mim, mas existem certas necessidades, não é? Somos profissionais, bandidos honrados. Quebrar o contrato seria ruim para a nossa respeitada imagem.

Os mercenários gargalharam, mas nenhum mais alto que Banner. Adrian deu um singelo sorriso.

— Certo. Vamos levar isso logo para Willt. Precisamos estar em Illuminis o quanto antes. Aqueles fanáticos querem fazer aquilo o quanto antes, seja lá o que aquilo seja.

Foi a vez de Soren empalidecer. Artariel e Lira, que sabiam sobre a verdadeira nacionalidade do garoto, olharam para ele.

— Vamos impedi-los — declarou Herys. — Não podemos deixá-los com este ovo.

— Concordo — disse Killian, pensando em Isnar.

— Eu também — disse Soren, pensando no que ouvira sobre Illuminis.

— Eles são muitos — analisou Arty, preocupado.

— Somos quatro magos, e um guerreiro melhor do que a maioria — retrucou Lira. — E temos o elemento surpresa. Faremos isso.

“Até porque eu sei que você não vai dormir de noite se não fizer nada, Soren…”, pensou ela.
Os cinco entreolharam-se.

— Agora — sussurrou Herys, saído da proteção.

Logo, os outros quatro haviam saído também.
A primeira a atacar foi Herys. Disparou um raio de gelo na direção de Banner, congelando seu martelo no chão. Lira murmurou uma fórmula mágica, e um dos mercenários olhou furiosamente para o colega, atacando-o.
Arty estava logo atrás, e invocou um lobo cinzento, que rosnou e atacou. Antes mesmo que o lobo alcançasse algum alvo, Soren já havia disparado um [Dardo Místico] em outro inimigo, atingindo-o com tanta força que ele foi arremessado para trás, com o nariz quebrado.
Soren então disparou contra Adrian, que girou a espada com velocidade, anulando o [Dardo Místico].

— Uma arma mágica — percebera o mago das trevas.

Killian saiu correndo na direção de Adrian. Dois mercenários atacaram-no, mas ele aparou o golpe de um enquanto desviava de outro. Sem esperar, mirou uma estocada na garganta do mercenário, e a lâmina ensanguentada saiu do outro lado de seu pescoço.
O outro mercenário ia atacá-lo, mas o lobo de Arty pulou nele, estraçalhando seu rosto. Killian tornou a correr na direção de Adrian.
Banner tirou o martelo do chão, mas foi atingido por um pulso psíquico de Lira e mandado contra uma parede.
Killian finalmente chegara até Adrian, que encarou-o. O antigo Cavaleiro Santo então retirou o capuz, revelando um rosto relativamente jovem — não mais de vinte e cinco anos —, com cabelos alaranjados e olhos castanhos.

— Você é o irmão do Kane, não é? — perguntou Adrian. — Seu irmão era incrível, garoto.

— E quem seria você? — indagou Killian ameaçadoramente, com a espada apontada para o mercenário.

— Haha. Meu nome é Adrian, eu fui um Cavaleiro Santo ao lado do seu irmão. Eu e ele tivemos o mesmo professor. Sor Kurt.

— Qualquer um pode alegar isso — disse Killian. — Se é aprendiz do Cavaleiro Dracônico Kurt Darkandew, deve saber lutar. Então venha, e me mostre que era mesmo um Cavaleiro Santo.

Embora dissesse isso, no fundo estava tenso. Se fosse verdade que aquele homem era um antigo Cavaleiro Santo, ainda mais aprendiz de Sor Kurt, e portava uma espada mágica, então Killian estava em uma desvantagem assombrosa.
Atacou, mas antes que Adrian aceitasse o desafio, o mercenário fora atingido por um [Dardo Místico] de Soren. Atingiu seu ombro, fazendo-o cambalear, e Killian aproveitou a chance para atacar.
Embora meio tonto, Adrian aparou o golpe com agilidade, pulando para trás, na direção de uma das ramificações do beco. Dissipou um raio de chamas que Herys lançou contra ele e sorriu para Killian.

— Venha, guerreiro.

Killian atacou, com fintas e estocadas, optando por não atacar verticalmente (além de deixar o tronco exposto, tinha certeza que o mercenário consiguiria desviar com maior facilidade de um golpe vertical).
O Maklaw estava acostumado a enfrentar dois ou mais oponentes ao mesmo tempo. Mesmo assim, nunca enfrentara ninguém tão rápido ou forte quanto Adrian. O mercenário aparava seus golpes quase com desprezo, e Killian hesitava em medir forças com ele.
Afinal, a espada do inimigo era uma arma mágica.
Enquanto Adrian e Killian trocavam golpes em enorme velocidade, Banner correu na direção do escudeiro, determinado a impedir que ele atrapalhasse seu líder.
Antes que pudesse entrar na ramificação em que Adrian e Killian lutavam, um escudo mágico formou-se entre ele e os dois espadachins.
Banner olhou furioso para o lado, e viu Soren na entrada de outra ramificação do beco.

— Não interrompa a dança dos outros — ralhou o mago das trevas. — É falta de classe. Quer bater em alguém? Então venha me pegar!

O brutamontes, tomado pela fúria ao ser desafiado por uma criança, investiu contra Soren. O garoto saiu correndo.
Herys viu o que acontecia e sorriu de canto. Sabia que Soren queria um local isolado em que pudesse usar sua magia.
Lira correu na direção do beco em que o irmão fugia de Banner, mas parou com o grito de Herys.

— Não, Lira! Confie nele!

A garota ficou confusa, e outro mercenário saltou em sua direção, mas logo um raio flamejante de Herys acertou-o na cabeça, fundindo o elmo ao seu rosto e matando-o na hora, com sua pele derretendo.
Lira desviou com nojo daquela visão. Outro mercenário correu contra ela, mas a maga mental murmurou algo, e logo cinco Liras corriam para cinco locais diferentes do pandemônio que era o combate entre Herys, Lira, Artariel (e seu lobo) e os mercenários restantes.

*

Enquanto os seus três amigos enfrentavam os mercenários de Adrian, Soren já estava em um local bem distante. Atrás dele, Banner corria enfurecido.
“Já estou longe o suficiente”, decidiu Soren, reduzindo o passo e parando de correr.
Quando virou para trás, com um sorriso convencido, viu que Banner já estava quase em cima dele. Perdendo o sorriso, Soren conjurou uma [Barreira Arcana] entre ele e o mercenário.
Mal o mago havia afastado-se, Banner quebrou a barreira com um único golpe do pesado martelo.
“Forte”, concluiu Soren. “Se aquilo me acertar, duvido que eu sobreviva…”
O guerreiro tornou a avançar, enquanto Soren criava escudos e disparava esferas de Mana contra ele, porém nada era suficiente para que o homem parasse.
Banner chegou até Soren e moveu horizontalmente o martelo, mas Soren pulou para trás e parou cambaleando quase um metro para trás.
O garoto disparou um [Dardo Místico] no oponente, fazendo-o cambalear. Antes que Banner pudesse se recuperar, Soren invocou seu livro de capa negra.
Assim que viu o livro, Banner empalideceu e deu um passo para trás.

— E-esse livro… V-você é um… É um mago das trevas!

Soren não respondeu. Em vez disso, olhou com frieza para o mercenário.

— Eu não quero imaginar quantas pessoas você já machucou. Ou coisa pior. É por isso que te darei dois segundos para fugir.

Banner apertou o martelo com força. “Só preciso alcançá-lo uma vez”, pensou. “Dizem que alguns magos sombrios são imortais, mas esse pirralho não deve ser um deles.”
Confiante devido à idade pouco elevada de Soren, o criminoso rugiu e atacou. Soren contava com isso. No momento em que o martelo do homem vinha em sua direção, Soren desviou e revestiu a mão com chamas de um verde espectral, agarrando o braço esquerdo de Banner.
Banner afastou-se com agilidade, mas demorou meio segundo para perceber que seu braço estava apodrecendo. O mercenário começou a gritar.

— Me perdoe — pediu Soren, e Banner notou um fino contorno avermelhado nas íris dos olhos sem vida do garoto. — Eu ando um pouco irritado. O pensamento das coisas que Casymir faz, que ele fez, me enfurece. Pensar que vocês querem fazer algo em Illuminis, minha terra natal, que meus pais morreram defendendo, é simplesmente irritante. Me deixa furioso. E é por isso que peço perdão, mas estou segurando esta raiva a tanto tempo… Me perdoe por descontar em você.

O livro negro emanou miasma. Um círculo mágico em tom violeta, de duas camadas, preencheu uma área de quase dez metros de raio.

— [Zttu onla Laz].

Em um segundo, Banner estava no meio de um breu. Um campo de escuridão que impossibilitava qualquer visão. As chamas no seu braço haviam dissipado-se subitamente, mas seu braço apodrecido estava de aspecto horrível.

— APAREÇA! — rosnou Banner, tremendo.

— [Adtudaz Onla Shai'nur]!

Antes que Banner pudesse procurar pela origem da voz, dois tentáculos de escuridão brotaram de bolhas negras que surgiram próximas a Banner. A mera visão daquelas formas retorcidas tiraram qualquer resquício de coragem que Banner possuía.
O enorme mercenário largou o martelo e saiu correndo, mas os tentáculos alcançaram-no em poucos segundos. O primeiro prendeu as suas pernas, caindo no chão. O segundo ergueu-se como uma serpente, em formato de "S", e então desceu como um raio, atravessando o peito de Banner.
O mercenário morreu na hora. Quando o tentáculo saiu, havia um buraco de vinte centímetros no centro de seu peito.
Os tentáculos desfizeram-se em um líquido negro que fundiu-se com a escuridão sobrenatural. Logo, a escuridão começou a sumir e a concentrar-se em uma única esfera negra na mão de Soren. Quando ele fechou a mão, a esfera sumiu.
O mago das trevas aproximou-se do corpo de Banner.

— Sem vestígios.

E as chamas espectrais tornaram a iluminar o beco.

*

Herys, Lira e Artariel já haviam derrotado quase todos os mercenários. Em pouco tempo eles entenderam como seres humanos comuns raramente podiam enfrentar magos.
Herys disparou um relâmpago contra um soldado, estourando seu peito e mandando-o contra a parede do beco. O lobo de Artariel foi morto por um mercenário que espetou seu pescoço com uma lança, um tipo de olhos esbugalhados.
Arty, embora soubesse que o lobo não havia morrido, apenas voltado para seja lá de onde havia sido invocado, ficou com raiva. Raramente sentia aquilo.
Artariel disparou um [Dardo Místico] no assassino de seu lobo, sem ver que Lira disparava um pulso psíquico no mesmo mercenário.
Enquanto o criminoso fora atingido por Arty, o pulso de Lira lançara-o contra outro mercenário. Os bandidos restantes, apenas três, entreolharam-se, abandonaram as armas e saíram correndo.
Herys suspirou e olhou ao seu redor.

— Terminamos — comentou ela, satisfeita.

Neste momento, Soren voltou do beco, ofegante, pois havia corrido muito.

— E então? — perguntou Lira. — Acabou com aquele urso gigante?

— S-sim.

— Que surpresa — comentou sua irmã. — Você não usa só feitiços do primeiro círculo?

— Não é o que você usa, Lira, mas como você usa.

— Ei! — disse Herys. — Temos que ir atrás do Killian!

— Certo! Você e o Arty ficam aqui com o ovo. Lira e eu vamos atrás dele!

Sem dar tempo para a garota discutir, Soren agarrou o pulso de Lira e puxou-a na direção da ramificação por onde os dois espadachins haviam ido.
Precisavam se apressar.

*

Em algum lugar, quase no fim do beco, Killian e Adrian trocavam golpes furiosos. O escudeiro era surpreendentemente rápido e forte, com um talento que Adrian vira pouquíssimas vezes em alguém tão jovem.
“Ele será ainda melhor que o Kane”, pensou Adrian, aparando outro golpe de Killian.
O escudeiro também tinha outra preocupação. Não estava com seu escudo. Nunca separava-se de sua espada, mas deixara o escudo no dormitório na Academia Greyhorn. Claro, sabia lutar sem escudo — melhor do que qualquer outro aprendiz da academia —, mas contra um oponente tão superior ele desejaria estar com todos os seus equipamentos.
Também não havia trazido seu elmo.
Adrian desferiu uma série de estocadas na direção de Killian, mas o garoto recuou e, quando o mercenário parou, Killian avançou contra ele novamente.
Uma nova troca de golpes fora iniciada, e logo já haviam saído do beco e, para a surpresa de Killian, estavam a poucos metros de uma passagem que dava para longe de Feradöhr.
Havia um cavalo selado ali.
Adrian e Killian encontraram as espadas e começaram a medir forças.

— Olhe — comentou Adrian. — É minha passagem para fora desta cidade. Eu até podia ir atrás do ovo novamente, mas lutar contra tantos magos juntos não é minha intenção. Vou ter que abandonar o serviço que a lagartixa me deu.

— Isnar — bradou Killian. — Onde está Isnar Fyrestia?!

Adrian sorriu e empurrou Killian.

— Eu adoraria falar, mas tenho horário, sabe?

Killian rosnou e atacou.
O escudeiro desferiu uma série de golpes no antigo Cavaleiro Santo, mas este apenas recuava com um sorriso cínico. Adrian contra-atacou.
O Maklaw rebateu a espada mágica e mirou uma estocada em Adrian, mas atingiu apenas seu peitoral de aço.

— Opa. Bem, não faz mal. Vamos terminar logo esta dança.

Os dois voltaram a lutar, mas agora os golpes de Adrian pareciam estar muito mais pesados. Cada vez que aparava, Killian tremia. Raramente conseguia desviar, pois o mercenário parecia finalmente ter decidido lutar a sério.
Killian aparou um novo golpe, e sentiu os braços tremerem. Adrian sorriu e atacou novamente. E, desta vez, a espada de Killian partiu-se em duas.
O escudeiro olhou para o mercenário, que golpeou-o com um corte vertical que atingiu seu olho esquerdo. O rapaz berrou enquanto caía no chão.
Adrian pisou nele.

— É uma pena. Você teria sido ainda melhor que o seu irmão.

Foi quando Adrian foi atingido por um [Dardo Místico] e caiu no chão a um metro de Killian.
Quando levantou-se, viu Soren e Lira, a uma pequena distância. Sem ficar pensando muito, Adrian saiu correndo na direção do cavalo. Lira disparou novamente contra ele, porém o antigo cavaleiro rebateu o feitiço e a esfera de Mana atingiu Soren.
Adrian pulou no cavalo, empinou-o e saiu galopando em uma enorme velocidade. Em poucos segundos, já estava tão longe que quase não era possível vê-lo.
“Atrapalhado por um bando de crianças abençoadas”, irritou-se o mercenário. “Que seja! Se não puderam matar um bando de crianças, não valiam nada!”
Lira aproximou-se de Killian. Ao ver o estado do garoto, chamou Soren para ajudá-la a levantá-lo.

— Precisamos levá-lo para a academia!

Soren assentiu. Não pôde evitar de notar que um simples corte era um dano minúsculo para alguém que enfrentava um oponente como Adrian.
Sim. Killian teve sorte. Afinal, não perdera a vida.

 


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