Valeran - A Ascensão dos Reis escrita por Lorde Vallex


Capítulo 2
A Marca de Enomozen


Notas iniciais do capítulo

Hello! Dessa vez foi rápido! Aqui prosseguimos com a história de Soren Heirdarus.
— Aviso rápido: alguns nomes foram mantidos de minha antiga história, Entre Lobos e Fantasmas, já que alguns personagens e locais permanecem os mesmos.

Sem me prolongar muito, boa leitura ^^



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O jovem acordou, abrindo os olhos relutantemente. Com seus quinze anos, seus cabelos negros e bagunçados não passavam da metade do pescoço. Estava deitado em uma cama simples, porém que já era mais do que poderia pedir. Quando abriu seus olhos cinzentos, olhou seu quarto. As paredes eram feitas de pedra, pois estava dentro de uma fortaleza. O piso era de madeira escura, e não havia muita mobília. Além da cama, havia apenas um armário e algo como uma escrivaninha. O que havia em abundância eram livros, livros de todos os tipos falando dos mais diversos assuntos. História do mundo e da magia, livros de feitiços, contos e lendas, informações sobre feudos e reinos, estratégia militar, itens mágicos e um bestiário contendo várias criaturas mágicas eram os assuntos que preenchiam as páginas desses livros.
E o garoto já leu cada um uma dúzia de vezes.
Saiu da cama, e o sol da única abertura na parede bateu-lhe no rosto. Qualquer um que o visse poderia descrevê-lo como belo, com sua pele levemente pálida, cabelos escuros e rebeldes e olhos cinzentos como uma tempestade. Vestia um manto de tecido branco, mas nas mangas haviam fios prateados. Também usava um anel de bronze no dedo médio da mão direita, simbolizando seu laço familiar com o Cavaleiro Santo que comandava aquela área. Muitos criticavam-no por usá-lo, mas seu novo pai, Roderik, insistia que ele não deveria dar ouvidos. Também usava o colar de ouro e ferro, representando sol e lua, que pertencera a sua família por gerações.
Soren von Dartã espreguiçou-se e foi até o armário. No fundo, havia um livro que ele sempre deixava coberto de panos e trapos e amarrado firme. Lera aquele livro completo duas vezes, mas era perigoso deixar que vissem o livro fora dos terrenos da academia de magia.
“É o único lugar em que poderei mostrá-lo e rezar para não ser confiscado”, concluíra ele alguns anos atrás.
Fazia sete anos que iniciara-se a Queda de Illuminis. Em menos de um ano, o reino todo foi destruído. A maioria da população foi morta, incluindo todos os nobres, dos maiores aos menores. “Eu fui o único que sobrevivi”, pensou Soren com tristeza.
Depois da morte de Gilgamesh, rei de Illuminis, aquelas terras foram amaldiçoadas por uma abertura do Abismo, fazendo o território ser inabitável. Portanto, Casymir Loernvel marchou em direção a Mashbal e anexou o pequeno reino ao seu território. Agora não eram muitos os reinos humanos, e nenhum poderia desafiar Valeran.
Deixando o pensamento sombrio de lado, Soren foi na direção da porta e tentou abri-la, mas estava trancada. Meio preocupado, forçou a porta, mas nada funcionava.

— Ei! Me deixem sair!

— O senhor nosso pai mandou prender você até o meio dia depois que você roubou o bolo de aniversário daquele camponês — disse uma voz feminina do outro lado da porta.

Soren se jogou na porta, entristecido.

— Liraaa, foi só daquela vez. Eu prometo que não vai se repetir!

— Você também não vai esconder livros da nossa biblioteca?

— Mas eu quero ler!

— Não precisa esconder para isso — retrucou Lira irritada.

— Mas eu teria que dividir! Ah, tudo bem. Prometo não esconder livros da biblioteca. Hoje — acrescentou a última parte em voz baixa.

— Eu ouvi isso! — ralhou Lira.

— Certo, certo — rendeu-se Soren, rindo.

— Também não vai mais pegar as maçãs do velho Xen sem permissão?

— Certo — concordou Soren, emburrado.

— Também vai parar de usar magia para assustar o Tyon?

— Isso eu não prometo — discordou Soren veemente.

Lira riu por trás da porta, e girou a chave. O garoto abriu a porta e abraçou-a.

— Um belo dia para você, Lira.

— Seria melhor ainda se eu acreditasse em uma única palavra que você disse — respondeu ela sarcástica.

— Hehehe, o que eu posso fazer? Meu charme natural atrai problemas. Para você — acrescentou com um sorriso maldoso.

Lira apenas revirou os olhos. Tinha a mesma idade de Soren, mas seus cabelos eram mais claros, em um tom castanho, longos e soltos. Seus olhos eram verdes como o do pai, e ela usava um vestido de seda vermelho. Também usava o anel de bronze, como Soren. Ela encarou-o com os olhos semicerrados.

— O pai disse para você ir falar com a senhora nossa mãe assim que saísse do quarto — informou ela. — Depois, deve encontrá-lo nos estábulos.

— A essa hora ele está fazendo a patrulha do feudo. Imagino que seja por volta das dez horas depois da meia noite.

— Onze — corrigiu-lhe Lira. — E então ele deveria planejar já estar aqui quando você saísse.

— Como se você tivesse coragem de me deixar preso por todo esse tempo — comentou Soren. Lira desviou o olhar, fazendo o irmão semicerrar os olhos. — Você não faria, faria?

— A mãe está te esperando — disse ela, mudando completamente de assunto.

Lira despediu-se de Soren e foi até as escadarias, enquanto Soren dirigiu-se ao quarto da mãe.
Após os eventos em Astar e no Corte da Senhora, Roderik levou Soren para casa como um servo libertado pelo Cavaleiro Santo. Após demonstrar saber ler e escrever, Roderik teria levado-o para ajudar a filha — embora os mais próximos dele soubessem que a filha já sabia ler e escrever adequadamente. Casymir obviamente não tinha tempo para interrogar um Cavaleiro Santo, não com os conflitos em Illuminis, então foi muito fácil Roderik e Soren chegarem a Dartã.
Chegando no local, Soren foi adotado como um filho de Roderik von Dartã, embora todos soubessem que era mentira. Mesmo assim, Soren sempre teve um bom relacionamento com a família de Roderik. Não podia dizer o mesmo das pessoas no vilarejo que o pai comandava…
Soren então chegou ao quarto de sua mãe. Quando bateu na porta, ouviu um “está aberta”, e abriu a porta.
Sua mãe era uma mulher de cabelos loiros e olhos verdes, que sempre vestia um vestido verde esmeralda. Hoje, entretanto, usava sua roupa como maga, uma túnica vermelha e dourada. Quando Soren a viu, ficou curioso. A mulher abriu um sorriso animado.

— Soren! Eu já conversei com a Lira, mas do jeito que você é já deve ter ouvido falar das notícias — disse ela, animada e agitada.

— Sim — disse Soren com seu habitual sorriso. — Daqui um mês será realizada a abertura para a Academia Greyhorn para Magos e Cavaleiros, no ducado de Konatang.

— Exatamente! E como tanto você quanto a Lira despertaram Mana, eu quero mandá-los estudar lá! Ela disse que queria, mas só iria se você fosse.

— Ela quer é minhas respostas — murmurou ele. — Mas eu quero ir! Aceito com toda certeza!

— Ótimo! Você, que conseguiu realizar os feitiços de 1° círculo com perfeição, nem deveria ter outra opção.

E Soren realmente o fizera. Era um dos únicos aspirantes a magos do reino que já dominava completamente o primeiro círculo da magia, que consistia em feitiços que todos os magos sabiam realizar, independentemente de seu tipo específico de magia.
Ethel von Dartã sorria radiante.

— Certo. Quero que você já prepare suas coisas, pois você partirá ainda hoje com seu pai e sua irmã. Se quiser se despedir de alguém até lá, pode fazê-lo. Lira foi ao vilarejo despedir-se dos amigos.

Mas Soren não tinha amigos verdadeiros no vilarejo. Se importava com todos eles, mas não eram seus amigos de verdade. Em vez disso, foi apenas de volta para seu quarto arrumar suas coisas. Pegou uma mochila e colocou alguns livros que ele considerava mais importantes — incluindo o livro nos trapos —, e também trocou de roupa. Vestia agora uma calça e uma camisa de linho, por cima colocou a pele de lobo que o velho Xen lhe dera como presente de aniversário um dia.
Agora já pronto, Soren desceu pela torre de pedra até chegar ao lado de fora. Observou o céu, e concluiu que ainda tinha uns vinte minutos até o pai chegar. Dirigiu-se então para o campo de treinamento.
Chegando lá, pôde ver meia dúzia de escudeiros treinando com os bonecos de treino. Faziam suas sequências estravagantes e elaboradas enquanto os bonecos permaneciam imóveis como sempre, apenas recebendo golpes.

— Que desperdício! — gritou Soren, dando risada. — Meia dúzia de escudeiros contra simples bonecos imóveis de palha, pano e madeira.

Todos olharam para ele e sorriram.

— Soren! Pensávamos que ficaria preso na torre por mais tempo! — disse um deles.

— Não podem prender alguém tão incrível quanto eu por muito tempo.

— E qual é a dessa mochila? — perguntou outro, com 14 anos.

— É um dos motivos de eu estar aqui. Vim me despedir.

— Você vai embora?!

— Não para sempre — assegurou o garoto, vendo o olhar espantado dos outros. — Mas entrarei na Academia Greyhorn, então passarei grande parte do ano em outro ducado.

— Entendo — disse um deles. — Bem, desejo boa sorte, Lemsey.

— Obrigado, Vaas. Espero te ver em breve. Mas, enquanto isso… — e abriu um sorriso divertido. — … o que acham de um pequeno treino? Sabe, eu tenho medo de perder a prática até chegar na academia…

Os demais sorriram. Três dos escudeiros, incluindo Vaas, investiram contra Soren logo após ele jogar a mochila para o lado. Quando estavam a cinco metros dele, Soren apontou a palma da mão para um, e uma energia azulada foi disparada e acertou o escudeiro na testa, fazendo-o cair no chão como se tivesse levado um soco. Ele repetiu o processo no outro escudeiro, e o resultado não foi diferente.
Vaas chegou até Soren e mirou um golpe com a espada, mas com um movimento Soren produziu um escudo azulado transparente que o protegeu do golpe da espada. Vaas recuou.

— Conjuração perfeita, sem palavras, runas e frases mágicas — disse ele sorrindo de canto. — Mesmo que sejam apenas feitiços do 1° círculo, a senhora Ethel diz que poucos magos dominam a conjuração perfeita com tão pouca idade.

— Apenas uns doze na história o fizeram, eu sei. Ela fala isso toda hora — disse ele meio envergonhado.

— Não se esqueça que dez desses doze viraram arquimagos — disse Vaas preparando-se para voltar a atacar.

Foi quando o som de cascos foram ouvidos. Quando os garotos olharam para o portão de madeira enorme, este já se abria para permitir a passagem do senhor da fortaleza.
Roderik, com sua armadura completa e espada mágica, entrou acompanhado de outros vinte cavaleiros com cota de malha e túnica com o brasão de lua negra.

— … e então informar ao conde se algo ocorrer — dizia um.

— Apenas se a situação tornar-se mais grave — interrompeu Roderik. — Não há motivos para incomodar Sua Senhoria sem provas concretas. Sou o Cavaleiro Santo que protege Bellond, e não permitirei que nada ocorra.

— Como quiser, Espada Negra, mas acredito que os problemas de desaparecimento na fazenda do velho Will e os mesmos sinais na baronia do barão Dali não é uma coincidência. Já informou o barão, Sir Roderik?

— Já informei o senhor Vladimir, sim. Sou um dos cinco Cavaleiros Santos do condado de Dartã, e aqui na baronia de Bellond, não ocorrerão desaparecimentos.

— Certo. Até amanhã então, Espada Negra.

Espada Negra. Todo Cavaleiro Santo possuía um título relacionado com sua técnica, equipamentos, personalidade ou, principalmente, feitos. Roderik recebeu o seu quando a lâmina de sua espada ficou completamente negra com o sangue dos demônios que ele matou.
Após a maioria dos cavaleiros sair, os quatro que viviam na fortaleza entraram e foram na direção dos escudeiros, mas Roderik foi pelos estábulos. Soren então pegou a mochila e correu para se juntar a ele. Quando alcançou-o, Roderik mostrou-se surpreso.

— Pensei que Lira te manteria no quarto até eu voltar.

— Prometi me comportar — disse Soren com um sorriso inocente.

— Imagino se manterá a promessa pelo menos por duas horas — murmurou Roderik, logo em seguida sorrindo. — Ethel já deve ter dito sobre a abertura da Academia Greyhorn.

— Sim, ela deve ter comentado… hehehe.

— Não pense em fazer nenhuma besteira enquanto estiver lá, ou serei obrigado a te trancar no castelo por um ano — ameaçou o Cavaleiro Santo.

— Estou morrendo de medo, ó Sir Roderik, Espada Negra dos Cavaleiros Santos de Bellond.

— Você não se cansa de me provocar?

— Você não cansa de me aturar?

Ambos sorriram, e Roderik desceu do cavalo. Deu as rédeas a Soren e pediu para ele amarrá-lo. O nobre assim o fez, em seguida indo até Roderik.

— A mãe disse que partiríamos logo — comentou o garoto, assobiando inocentemente. — E então: vamos agora?

— E deixar sua irmã no vilarejo? Não, vamos esperá-la.

Soren revirou os olhos e despediu-se do pai com um aceno. O jovem nobre então dirigiu-se ao seu quarto, decidido a estudar o máximo possível — tanto no quesito teórico quanto prático — antes de chegar na academia. Prometeu a si mesmo que não seria um mago comum, que se destacaria em meio a tantas pessoas dotadas desse dom especial.
“E não posso esquecer que também é uma escola para formar futuros Cavaleiros Santos além de magos”, lembrou-se ele.
Cavaleiros Santos… Seriam eles todos como Roderik? Soren sabia que não. Arkhim Streffar, Grão-Mestre dos Cavaleiros Santos de Silennar, o feudo onde se localizava a capital, era o exemplo mais conhecido do garoto.
“Você matou meu pai, e agora vou me tornar um mago feito para auxiliar o seu reino a oprimir os mais fracos”, pensou Soren amargamente. “Mas não o farei! Eu mudarei Valeran, mesmo que agora eu precise fazê-lo de dentro pra fora. Eu pensei que me vingaria de todos os valeranianos, mas Roderik, Ethel, Lira e os outros me mostraram que nem todos são ruins. Mas você entra na minha lista, Arkhim de Silennar…”

*

Havia três semanas, Soren, Roderik e Lira partiram de Dartã. Eles atravessaram o ducado de Barun, onde viviam, até chegar na torre-portal.
Uma torre-portal era uma torre encantada com um feitiço permanente de "Portal Maior", e havia uma localizada a um quilômetro de cada cidade capital de um ducado — e havia quatro ducados: Silennar, Vetciz no Norte, Barun no Sul e Konatang no leste. Uma torre-portal pode levar seus viajantes a outra torre-portal, sendo o modo mais rápido de viajar entre os ducados. Apenas a nobreza, o exército e os magos tinham permissão para usá-la.
Depois da desagradável sensação do teletransporte, o trio rumou para leste, pois era na Marca de Enomozen que se localizava a Academia Greyhorn. Viajaram por mais alguns dias, e Soren já via motivo para reclamar em voz alta a cada minuto, irritando Lira. Quando ela já estava pensando seriamente em disparar um Dardo Místico nele, Roderik gargalhou alto.

— Pronto, Soren, não precisa mais reclamar — comentou ele. — Chegamos! A cidade de Feradöhr, onde fica a Academia Greyhorn.

Soren e Lira agora viam a grande cidade. Surpreenderam-se ao notarem a falta de muralhas. Havia um rio e uma ponte, e depois deles a cidade de Feradöhr. Havia muitas e muitas casas construídas sem muito geometria, mas a rua principal — feita de pedra branca — abria um caminho perfeito até chegar à Academia Greyhorn. Normalmente, a rua principal da cidade leva ao castelo do nobre que comanda o feudo, e em Feradöhr não era diferente, pois todos sabiam que o marquês que comandava o marquesado de Enomozen era Tulin Silleskrow, que era também o diretor da Academia Greyhorn; e também o Arquimago.
Quando passavam pela cidade, a academia erguia-se com a imponência de um verdadeiro palácio. Feita de pedra cinzenta com várias torres, a ponte de pedra que levava a ela estava com um grande buraco na lateral, onde caiu o cadáver de um drake meses atrás. O portão de entrada era uma grade preta com um símbolo arcano dourado no centro. Soren imediatamente reconheceu como uma runa de proteção contra invasões.
Não podia ver exatamente o interior da academia, e sabia também que não poderia entrar agora. Em vez disso, Roderik levou os filhos até uma taverna. Quando chegaram lá, parecia mais uma casa de madeira, com um único andar e de aparência simples. Quando entraram, havia apenas meia dúzia de pessoas. Uma delas era uma mulher de cabelos vermelhos e olhos dourados, sentada no balcão — literalmente. Quando viu a entrada do trio, ergueu a caneca que bebia e falou em voz alta:

— Um brinde a Sir Roderik von Dartã, a Espada Negra que expulsou o demônio antigo Varöst de Valeran, dez anos atrás.

Os outros na taverna acompanharam-na, erguendo as canecas e puxando um coro. “Espada Negra”, “Espada Negra”. Sir Roderik sorriu de canto.

— Distinta senhora Helena de Barun! — cumprimentou ele. — Que surpresa agradável encontrá-la aqui em Feradöhr. Posso imaginar que meu palpite de anos atrás está correto?

— Sim, Rik. Minha filha despertou o Mana, como eu, minha mãe e a mãe dela antes dela. — Bebeu de sua caneca, largando-a no balcão. — Se está aqui, imagino que alguém de sua bela família também fará companhia à minha Herys.

— Os dois, Helena, os dois — respondeu ele, pousando a mão nos ombros de Soren e Lira.

— Haha! Você sempre foi um maldito sortudo, Rik! — surpreendeu-se ela. — Os dois. Bem, espero que sejam amigos da minha pequena Herys, ela anda se sentindo sozinha lá em Farandar.

Antes que Roderik fosse conversar com o dono da taverna, no entanto, Helena chamou-o novamente. Quando os três foram para perto dela, ela encarou Soren.

— Não se deixe levar, garoto — recomendou ela, com uma seriedade raramente vista.

Os três ficaram confusos, incluindo Soren. Roderik foi quem perguntou.

— O que quer dizer, Helena?

— Nada que interesse a você por enquanto, Espada Negra — respondeu ela misteriosamente, encarando Soren novamente. — Você carrega algo precioso, porém muito… perigoso. Você parece um bom rapaz, então espero que se lembre do que é melhor para você.

Soren finalmente entendeu do que Helena estava falando. Também reconheceu seu nome. Era Helena de Barun, a Invocadora de Demônios, a única no reino capaz de controlar tais criaturas. E ela falava daquilo que mais lhe era precioso.

— Não se preocupe — pronunciou ele cuidadosamente, em um momento raro em que falava com seriedade e media suas palavras. — Eu sei a diferença entre errado e certo, e também sei que existem pessoas importantes para mim que não iriam querer me ver caindo.

Helena sorriu satisfeita. Lançou a Roderik um olhar de aprovação.

— Seu garoto é uma excelente pessoa.

Mas não disse o que tanto ela quanto Soren sabiam. “Talvez não possa se tornar um excelente mago.”
Helena disse que ficou com a filha em outra taverna, e que tinha que voltar para lá. Enquanto isso, Roderik finalmente conseguiu conversar com o dono da taverna. Este disse que havia um quarto disponível para quatro pessoas. Espada Negra entregou-lhe duas peças de ouro, o que fez o dono arregalar os olhos.

— Garanta que eles não precisem… dividir o quarto com tipos suspeitos. Também espero que eles sejam tratados de maneira agradável.

— S-sim, Sir — respondeu o homem olhando com espanto e felicidade para as peças de ouro.

Roderik então se dirigiu aos filhos.

— Tenho que retornar a Dartã agora — explicou ele. — Se tudo seguir bem, não nos veremos por um bom tempo. Espero que vocês já dominem o segundo círculo quando nos reencontrarmos.

— C-certo, pai — concordou Lira, hesitantemente. Nunca ficara tanto tempo longe de casa.

— Não se preocupe, “Espada Negra” — disse Soren debochado. — Eu cuido da Lira até você voltar.

— Espero que cuide de si mesmo também — retrucou Roderik de olhos semicerrados.

— Não prometo nada — respondeu o garoto inocentemente.

— Você já não tem solução — suspirou ele, sem saber que Soren ainda ouviria muito isso no decorrer de sua vida.

— Até mais, Rode… Pai — disse o garoto, corando. — Nos vemos depois.

— Claro, claro. E se você for expulso por fazer alguma besteira eu te trago de volta amarrado atrás do cavalo — ameaçou Roderik.

— Quero ver você conseguir — desafiou Soren, mas Lira soltou um suspiro.

— Soren, apenas magos que dominam o terceiro círculo para cima podem causar algum dano a um Cavaleiro Santo — explicou ela —, e apenas um do quinto para cima tem chances de derrotá-lo.

— Ah… Bem, te derrotarei daqui alguns anos, Sir Roderik!

— Precisa se esforçar bastante para sequer me arranhar, garotinho arrogante — retrucou o Cavaleiro Santo. — Bem, estou indo. Lira, Soren, até logo.

E o Espada Negra saiu da taverna. Soren e Lira de entreolharam.

— Não vou acobertar as coisas que você fizer na academia — avisou ela.

— Como quiser, Lira. Mas lembre-se que posso te ajudar sempre que quiser.

— Como se eu precisasse da sua ajuda — resmungou ela. — Também já domino o primeiro círculo.

“Mas ainda não domina a conjuração perfeita”, pensou em dizer Soren, mas desistiu. “Isso não importa. Mesmo que eu acabe me saindo melhor no começo, estou fadado a ser um mago mais fraco que a maioria. Isso porque terei que escolher entre poder e sanidade, e escolho vocês, Lira, Ethel, Roderik…”
Os dois irmãos então foram até seu quarto. Quando entraram, viram que havia apenas quatro camas, uma em cada canto do quarto, e mais nada. Soren reclamou que queria um quarto melhor, mas Lira apenas escolheu uma cama ao fundo e se sentou. Rendendo-se, o garoto escolheu a cama ao lado da dela e se sentou também.
Notando que havia um baú de madeira perto de cada cama, Soren abriu o seu e colocou a mochila dentro, fechando-o em seguida. Quando olhou para Lira, a garota brincava com os cabelos enquanto lia “As Escolas de Magia e os Primeiros Magos”.
O jovem nobre encarou o próprio baú. Por que tinha trazido aquele maldito livro? Por que não deixou que ele queimasse em Illuminis? Aquele livro que sua tia dissera que um dia lhe seria útil, aquele livro que Röst Jyderion lhe dera.
“Mas não o usarei muito”, dissera a si mesmo muitas vezes. “É errado, e tenho que permanecer como a pessoa que sou, e não a pessoa que Röst queria que eu fosse.”
Soren, dando uma última olhada em Lira, deitou-se. Já era noite, e não tinha motivos para ficar acordado até tarde. Quando o dia voltasse, talvez explorasse a cidade… Não, agora não. Estudaria o máximo possível. Diziam que a prova de entrada na academia só era mais fácil que a prova de entrada da Guarda Real.
E assim, Soren adormeceu, pensando nos cinco dias que restavam para a prova que lhe garantiria uma vaga no local que mais desejava estar. “Ainda posso ser um mago. Não importa se não for muito poderoso, contanto que possa ajudar o povo de Dartã.”
Lira permaneceu acordada por meia hora depois de Soren adormecer, estudando. Por fim, acabou adormecendo com o livro aberto. Mal sabia ela que os dias de paz dela e do irmão estavam aos poucos chegando ao fim.

*

Em algum local, no meio de alguma caverna no ducado de Barun, um grupo estava conversando.
A caverna em si era escura e profunda, e era o esconderijo perfeito para aquelas pessoas. Depois de matarem o ogro que vivia lá, eles puderam descansar com tranquilidade.
As pessoas eram, em sua maioria, alguns soldados com armaduras de couro, e outros de cota de malha. Riam e se divertiam, vangloriando-se no meio da fogueira.

— … e quando eles perceberem, todos os reinos virarão pó. Quando o Filho da Lua retornar, nós é que seremos os reis do mundo.

Os soldados renegados deram risada e concordaram, acreditando fielmente naquelas palavras. Eram soldados que desertaram do exército, e agora tinham que se esconder. Mas não por muito tempo, pois acreditavam que logo o mundo sofreria uma mudança, e eles seriam responsáveis por isso.

— E onde está o Adrian? — perguntou um deles, e os outros resmungaram irritados.

— Ele é só um líder de uma gangue de bandidos, deve estar atormentando viajantes indefesos por aí. O que deveria perguntar é onde o Alastair está. O nosso Mago Dourado é o verdadeiro salvador da humanidade.

— Mas — disse uma voz nas sombras —, enquanto Alastair está fora, deveriam ficar calados e planejar nossos próximos passos.

— Isnar! — exclamaram eles, sobressaltados.

Isnar, ainda nas sombras, tinha uma voz severa, feroz e não humana. Também era muito alto.

— Alastair e eu nos conhecemos há muito tempo, e ele abandonará vocês se não condizerem com as expectativas dele — ameaçou Isnar. — Atentem-se a nosso objetivo. Adrian não é confiável, mas é a única escolha que temos. E, contanto que eu possa me vingar de Casymir Loernvel, não ligo para os meios.

Os outros concordaram animados, e Isnar sorriu nas sombras. Adrian não era de confiança, mas Alastair e seus soldados eram, então não tinha preocupações. Ainda naquele ano, o plano deveria ser concluído. E eles já tinham um alvo traçado.
Illuminis.

 


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Notas finais do capítulo

Hehehe, alguns personagens importantes apareceram e foram mencionados. Uma era de mudanças está vindo, e aparentemente os irmãos Soren e Lira têm envolvimento nela.
Qualquer erro, por favor me avisem!



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