Mirtilo escrita por OmegaKim


Capítulo 62
II - A caça




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Jongin encarou o buquê de flores sobre o sofá desconfiado. Franzio o cenho, mas não disse nada. Olhou em volta e como não viu ninguém, apenas limitou-se a se aproximar do buquê e pegá-lo. Levou-o em direção a cozinha e procurou um vaso vazio para colocá-lo. Estava ponderando sobre o que fazer com o cartão que encontrou entre as flores quando avistou Lu Han se aproximando pelo corredor.

O irmão mais velho foi até si ao notar sua presença, lançou um olhar nada amistoso para as flores que Jongin arrumava no vaso.

— Deveria ter jogado fora. — falou ao passar por si e ir em direção a geladeira.

— Por que? As flores até que são bem bonitas. — tocou nas pétalas da flor. — Quem as mandou? — olhou para Han.

O ômega pegou uma lata de refrigerante e abriu, bebeu um pouco antes de fita-lo de volta. Jongin notou que ele ainda usava a roupa social de mais cedo, deveria ter chegado a pouco tempo da reunião no Conselho, o que significava que Junmyeon deveria estar na Sede da Alcateia e por um momento, se perguntou porque o marido não lhe avisou da sua chegada. Deve estar ocupado, pensou, afinal bem sabia como os assuntos naquele clã estavam um pouco fora de controle desde a fuga de Minseok.

— Sehun. — o nome escapou da sua boca com desprezo suficiente para que Jongin engolisse em seco.

O tom de desprezo não costumava ser usado raramente. Lu Han quase sempre o utilizava para se referir a alfas, mas desde que haviam se mudado para o território Kim aquilo estava se tornando menos frequente, o que achava um bom sinal afinal nem todos os alfas eram maus. Junmeyon, seu marido, era um exemplo disso e Baekhyun também. No entanto, havia Oh Sehun, que Jongin não conhecia, mas que era o nome no topo da lista de desafetos do irmão mais velho. Sabia que isso era mais culpa da forma como Henry terminou em sua casa, encurralado em um quarto como um animal depois de uma noite de bebedeira, do pela classe alfa dele. Na verdade, a classe alfa era apenas um adeno para que a antipatia do irmão fosse maior.

Lu Han não lhe contara os detalhes daquele dia, mas o ômega não precisou insistir muito para descobrir sobre o encontro de Henry com o dono da sua marca e a forma como o mais velho achava que tudo não passava de uma armadilha para capturar Henry. Mas se era isso mesmo, por que Sehun ligou pedindo ajuda?

— Ele está aqui? — perguntou cauteloso, escondeu o cartãozinho na manga da sua camisa.

Não queria ser o tipo de guarda segredos, mas lhe incomodava terrivelmente a forma como o Han se tornava cada vez mais superprotetor com Henry. Sufocava-o. E quem sabe, fosse por isso que o outro não queria mais trabalhar como secretário do seu noivo apesar da insistência deste e de Lu Han. Uma parte sua concordava que seria mais seguro para Henry ficar ali quando aquele lobo estivesse solto e pronto para captura-lo, mas também sabia que o irmão não estava feliz com esse tratamento. Ele não era um garotinho de indefeso, não era nenhum pouco fraco, mas ninguém parecia ver isso, principalmente Lu Han.

— Graças a Deusa, não. — respondeu e foi em sua direção, olhou as flores mais de perto. — Mas ele me abordou no fim da reunião e me entregou isso. — o desprezo estava ali novamente, escorrendo em cada detalhe da sua expressão.

Jongin imaginou-o recebendo as flores com um sorriso congelado no rosto apenas para não provocar qualquer desgosto em Junmyeon, afinal Sehun era da família Kim Principal e tudo que irmão não queria era causar qualquer atrito com o alfa ainda mais naquele momento em que estavam vivendo. Então, era de se esperar que ele trouxesse aquelas flores para casa, apenas para joga-las no lixo na primeira oportunidade.

— Lu Han. — usou o tom de repreensão e o chinês ergueu a sobrancelha na sua direção.

Não era sempre que aquilo acontecia. Era papel dele ser o mais responsável ali, aquele que cuidava de todos. Jongin mordeu o lábio, encolheu os ombros, de repente muito envergonhado do tom que havia usado. Não tinha autoridade alguma para enfrentar o mais velho.

— Preciso que tome conta de Henry enquanto eu estiver fora. — o chinês ignorou o momento, afastou-se e fitou o relógio sobre a geladeira. — Estou indo buscar Yixing.

O Lu jogou a lata vazia no lixeiro embaixo da pia e começou a se afastar.

— O que aconteceu com Henry? — Jongin perguntou ao mesmo tempo que sentia a ponta do cartão arranhar seu pulso por baixo da manga.

— Ele está no cio... de novo. — Han suspirou, o tom de lamentação tão evidente que Jongin se compadeceu.

Os cios do irmão não eram fáceis, pois a marca funcionava como uma barreira ao repelir qualquer aproximação de outro lobo, principalmente alfa, além de fazê-lo implorar por aquele que fizera a marca, então, eram obrigados a mantê-lo dopado durante todo o tempo. Contudo, daquela vez estava sendo mais difícil que o esperado quando Henry não estava melhorando.

O cio ia e vinha de uma forma que nenhum deles conseguia entender e mesmo o inibidor da marca não estava funcionando da forma que deveria. Han havia aumentado a dose desta para tentar estabilizar os hormônios do irmão, mas nada durava por muito tempo e Henry não podia continuar aumentando as doses com o risco ter de uma overdose. Por isso, haviam começado a depender apenas do supressor. Duas doses por dia serviam para mantê-lo livre dos sintomas por algum tempo, mas em algum momento sempre acabavam daquela forma: com um Henry febril trancado no quarto.

E ver o irmão naquele estado sempre fazia o peito de Jongin afundar em dor, porque sabia que nada daquilo passaria até que seu lobo e a marca tivessem o que pediam, o toque infame daquele que provocara tudo isso.

Assentiu para o mais velho. Lu Han continuou a se afastar em direção à saída. A porta fechou e enfim, Jongin soltou o ar que estava segurando, apanhou o cartão na sua manga e foi em direção ao quarto do irmão verificar seu estado. O cartão parecia pequeno demais na sua palma e por um momento, ficou curioso sobre o que estaria escrito ali, mas forçou-se a não olhar. Aquelas palavras pertenciam ao Lu e não a si. Mordeu o lábio ao ficar de frente para a porta, segurou na maçaneta e girou devagar.

Esperava encontrar o irmão dormindo, dopado o suficiente para não saber onde estava, no entanto, Henry estava sentado na beira da cama. Sem camisa, a pele brilhando em suor e o cabelo escuro colado na testa. Ele levantou o rosto na sua direção quando o notou, os olhos estavam brilhando em violeta e castanho, a mistura esquisita que fazia Jongin perceber que Henry estava lutando contra os desejos do seu lobo.

— Oi. — Jongin se viu sussurrando, tão baixinho que Henry sorriu, como se entendesse todo o seu nervosismo em se aproximar.

— Oi. — a voz dele pareceu grossa para si, arranhada em incerteza sobre o que responder.

— Vim ver como estava. — a porta fechou-se atrás de si a medida que se aproximava de onde o irmão estava.

— Estou com dor. — deixou-o saber.

— Você quer mais remédio? — perguntou ao sentar ao seu lado.

— Hannie disse que posso ficar pior se tomar mais. — suspirou, ergueu a mão e afastou os cabelos escuros da testa.

Ele cheirava a lírio-do-vale, forte o suficiente para que Jongin abrisse a boca para conseguir respirar. Em geral, não se incomodava com os cheiros de outros lobos, mas tinha que admitir que o cio de qualquer pessoa deixava-o desconfortável por conta do cheiro extremamente forte. Tinha um olfato sensível, afinal.

— Um banho gelado então? — sugeriu.

— Acha que consegue encher a banheira de gelo? — Henry devolveu com uma pontada de divertimento e mesmo que Jongin tenha sorrido, sabia que o outro estava sugerindo aquilo à sério.

— Está me desafiando? — resolveu brincar e Henry riu soprado.

A pior parte não era o cheiro forte, afinal, pensou. Era a dor. Ver a pessoa que amava se contorcendo em dor, pedindo por alguém que não deveria, deixava-o terrivelmente triste. Henry parecia longe desse estágio, mas Jongin sabia que era só uma questão de tempo até que o calor o tragasse de vez. Mais algumas horas ele se tornaria aquela bagunça de resmungos e pedidos cheios de lágrimas. Lançou um olhar para a marca em seu ombro, se destacava rosada na pele, um tanto avermelhada nas bordas e por isso, sabia que o ômega havia arranhado-a novamente.

— Tenho algo para você. — achou melhor mudar de assunto, quem sabe distraí-lo servisse para alguma coisa. Abriu a mão quando teve os olhos de Henry sobre e lhe estendeu o cartão de Sehun. — Veio com as flores.

O Lu piscou os olhos na sua direção, confuso demais para esconder e Jongin entendeu que ele não sabia sobre as flores e quem sabe, não soubesse sobre Sehun. E quase sentiu raiva da forma como Lu Han poderia ter escondido isso de si assim.

— Sehun lhe mandou flores. — contou.

Henry demorou a pegar o cartão da sua mão, mas quando o fez, os dedos tremiam. Segurou-o com firmeza e numa delicadeza que Jongin não entendeu, o irmão levou o cartãozinho ao nariz e aspirou o cheiro de olhos fechados. Piscou os olhos para o ato, abriu a boca para perguntar, mas deixou as palavras morrerem na sua língua quando percebeu o que acontecia. Henry estava no cio e Sehun era um alfa. Quem sabe, toda aquela mistura de remédios havia o feito reagir a alguém. 

Ele abriu o cartão, leu as palavras do Oh em silêncio e Jongin inclinou-se em direção ao irmão, queria saber o que estava ali. Não tinha muita coisa. Um pedido de desculpas, uma proposta de emprego. Mordeu o lábio para segurar a risada, porque aquilo parecia um tanto surreal, no entanto, Henry tinha os olhos completamente violeta enquanto fitava cada uma das palavras.

— Você deveria preparar aquele banho para mim. — escutou-o pedir.

— Eu posso chama-lo. — teve coragem de sugerir. — Soube que ele está solteiro.

Henry riu, balançou a cabeça em negação e ficou de pé. Deixou o cartão sobre o criado mudo e foi em direção à saída.

— Banho. — mandou ao mais novo e Jongin assentiu, ficou de pé e foi em direção ao banheiro ao mesmo tempo que Henry saia do quarto.

Demorou a preparar o banho que o irmão queria quando teve que pedir ajuda aos outros lobos da aldeia para trazer os sacos de gelo para casa. Despejou tudo na banheira, misturou com água e enfim, ajudou Henry a se despir. O viu mergulhar na banheira, esperou-o na porta com os olhos preocupados e segurando um roupão. O Lu mais velho pareceu mais relaxado quando dentro da banheira, aquele gelo todo ajudava o calor do cio a recuar por tempo suficiente para que a mente se acalmasse, o lobo seguia o exemplo e o seu cheiro até mesmo ficava fraco novamente.

Jongin o medicou mais um pouco e quando a água na banheira tornou-se morna, o mais novo o ajudou a sair dali. Enxugou-o, vestiu roupas em si e o levou para cama. O cobriu. Ficou ao seu lado até que dormisse por conta do remédio. Deixou um beijo na sua testa e saiu do quarto. Trancou a porta para impedi-lo de sair caso o cio o voltasse mais forte e fizesse sua sanidade ir embora.

Encarou o vidrinho de remédio que tinha em mãos. Não havia mais do que uma dose. Não duraria. Comprimiu os lábios, preocupado. Sabia que devia fazer alguma coisa, mas o que? Aqueles supressores não eram supressores normais. Precisava de uma receita para poder compra-los e na verdade, nem sequer achava que aquilo era vendido por aí quando aquele remédio costumava ser mandado pela Organização.

Pensou em ligar para a Organização, mas Lu Han nunca o perdoaria se fizesse isso, afinal tudo o que o irmão queria era que ficasse longe daquelas pessoas. Por isso, terminou colocando o casaco e saindo de casa em busca de Oh Sehun. Lu Han nunca aprovaria aquela atitude, mas podia perdoa-lo depois que Henry estivesse bem novamente, se assegurou.

Precisou ir até Junmyeon e pedir um passe para poder sair do território, pois desde antes da fuga de Minseok aquele lugar estava fechado, só lobos autorizados podiam sair e entrar sem maiores problemas. Jongin achou que como Ômega Principal não teria problemas em sair dali, mas acabou sendo barrado pelos guardas e obrigado a ir até Junmyeon atrás de um passe. Não costumava ser orgulhoso, mas a constatação de que o seu cargo não lhe dava tantas liberdades assim o deixou chocado, contudo, não teve muito tempo para pensar sobre isso. Tinha que chegar até os Oh’s logo, antes que Lu Han desse por sua falta ou voltasse para casa.

Junmyeon designou um guarda para acompanha-lo fora do Clã Kim coisa que Jongin não contestou porque não sabia como chegar até os Oh’s e o guarda parecia saber muito bem, porque dirigiu até lá sem fazer nenhuma pergunta, coisa que o Lu apreciou e apreciou ainda mais quando o deixaram entrar no território sem maiores problemas. O guarda acompanhou-o para dentro da cada de Sehun depois de estacionar o carro. Jongin esperou algum tempo do lado de fora da casa até o momento em que viu a porta se aberta revelando a figura séria de Kim Joohyun. O ômega encarou-a e forçou um sorriso, estendeu a mão na sua direção em um cumprimento:

— Olá, senhora Kim. — havia visto fotos dela no álbum de família dos Kim’s e por isso sabia que aquela era a irmã de Jungsoo. — Eu sou Lu Jongin, marido de Kim Junmyeon.

A mulher apertou-lhe a mão, mas o rosto continuava contorcido em desconfiança. Jongin imaginou que ela fecharia a porta na sua casa no minuto seguinte, mas apesar da expressão azeda a mulher deu um passo para trás e abriu mais a porta para que entrasse, coisa que o ômega não hesitou em fazer. A mulher o levou direto para a sala e quando se sentou em um dos sofás, se questinou se não teria sido melhor trazer algum presente a beta. Lançou um olhar nervoso para o guarda que o seguia, o homem não o olhou de volta, estava concentrado em verificar o lugar.

— A que devo sua visita? — Joohyun perguntou e Jongin sentiu as orelhas ficando quentes, não tinha bem pensado nessa parte do plano.

Acreditara que poderia simplesmente aparecer ali e levar Sehun direto para o território Kim sem maiores problemas. Mordeu a parte da interna da bochecha, nervoso o suficiente para que a beta desconfiasse, mas logo soltou o ar com um suspiro. Quem sabe, se contasse a verdade tudo não se resolvesse da melhor forma possível.

— Eu preciso da ajuda do seu filho, senhora. — pronunciou.

Joohyun ergueu as sobrancelhas, a postura ereta e as mãos apoiadas sobre as coxas. Ela era bonita de um jeito elegante, os olhos grandes puxados o fizeram lembrar de Minseok, mas então os outros detalhes do seu rosto se pareciam demais com Sehun para que a associasse apenas uma pessoa, contudo mesmo com a familiaridade dos seus traços não se sentia confortável. Jongin suspirou mais um pouco e contou o resto da história, quando terminou, Joohyun estava com os olhos arregalados na sua direção.

A beta colocou-se de pé, havia alguma coisa no seu rosto que Jongin não sabia ler, todavia quis acreditar que estava prestes a receber a ajuda que tanto ansiava. Observou quando a mulher chamou uma empregada, mas antes que pudesse fazer qualquer pedido, a porta da casa foi aberta e Sehun entrou acompanhado de Jisoo, sua secretária. Jongin ficou de pé, os olhos brilhantes enquanto sorria. Sehun devolveu para si um franzir de testa.

— Jongin. — disse seu nome um pouco baixo como se não tivesse certeza se deveria chama-lo assim.

— Oi. — o ômega afastou-se do sofá e foi até o outro, estendeu a mão na sua direção. Sehun a apertou ainda com o rosto todo contorcido em surpresa e confusão. — Preciso de ajuda. — falou de uma vez, não tinha tempo para fazer rodeios. — É o Henry. — e na menção do nome do ômega, Sehun arregalou os olhos.

— Do que você precisa? — não hesitou e Jongin relaxou os ombros, soltou a mão do alfa.

— Disso. — procurou no bolso do casaco o vidrinho de remédio, mostrou-o a Sehun. — E de você. — demandou para surpresa do outro.

— O que? — o Oh piscou os olhos.

— Preciso que venha comigo. — demandou, firme.

Sehun corou.

***

Kim Jungsoo ajeitou a gravata no pescoço, havia exagerado no nó e agora sofria com o aperto. Na verdade, não entendia porque estava com aquilo no pescoço quando nem sequer era uma ocasião especial, também não era como se tivessem exigido aquele traje de si. Mas ainda era um evento social, do tipo em que ele não conseguia não se vestir daquela forma. Heechul estava a alguns metros de si, junto de Ryewoook e Siwon. Os três formavam um pequeno grupo, um grupo distante de si.

Jungsoo ergueu o rosto e tentou ver alguma coisa do céu, mas a copa da árvore em que se reuniam o impedia de fazê-lo. O outono estava ali, amarraronzando as folhas, fazendo-as cair, mas ainda assim o impossibilitando de ver alguma coisa decente. Tornou a abaixar o rosto, olhou em volta e se perguntou se Baekhyun apareceria junto de Jongdae ou mesmo se algum Park apareceria, contudo, já fazia bastante tempo que estavam ali, o que significava que ninguém mais chegaria. Eram só eles quatro. Suspirou.

Desejou ter um cigarro em mãos, na boca. Queria ter algo para segurar, essa era a verdade. Não era muito de fumar, apesar de ter feito isso no passado. O problema era que de vez em quando se via naquela situação, meio preso em um nervosismo bobo, do tipo que o obrigava a querer algo nas mãos. Sentiu um braço passar por baixo do seu paléto, cincundar-lhe a cintura, assustou-se, todavia logo se tranquilizou ao notar o cheiro de Heechul. Soltou o ar pela boca como se estivesse fumando, o ômega deitou a cabeça sobre seu ombro e Jungsoo esperou que ele dissesse alguma coisa, mas naquele dia, Heechul parecia estar praticando o silêncio, porque não disse nada.

— Achei que seriamos só nós dois. — o alfa se obrigou a dizer, por fim.

Heechul cheirava a bergamota, doce assim. Mas desde quando a marca começara a fazer parte dos dois, Heechul cheirava a si. Era estranho, porque nem ao menos passavam tempo juntos. Não como antes, ao menos.

— Se eu dissesse a verdade, você não viria. — o Kim sussurrou contra seu pescoço e o arrepio daquilo viajou por seu corpo inteiro.

Era sempre difícil se manter indiferente quando se compartilhava uma marca. Achava que Heechul se sentia do mesmo jeito, por isso, alguma coisa em si se sentia um pouco vingada. A marca pertencia aos dois, então não sairiam ilesos.

Esboçou um sorriso, Heechul afastou a cabeça do seu ombro e olhou para frente. Não havia muito o que dizer, não havia nada mais que nenhum deles quisesse falar naquele momento. Era um dia de silêncio. Um dia de contemplação, contudo a necessidade de não se deixar engolir pelo silêncio era algo comum entre os dois.

— Eu ainda sinto saudades. — o ômega disse baixinho, o braço dele escorregou da cintura do alfa, as mãos juntaram-se a frente do seu corpo e Jungsoo segurou um suspiro, porque também sentia.

Na verdade, Jungsoo confessava a si mesmo que sentia saudade de muitas coisas. Dos maridos, dos filhos, da rotina que tinham, de ser o líder do Clã... Mas enquanto olhava a lápide com o nome do irmão mais velho escrito, entendeu bem ao que Heechul se referia. Quis dizer alguma palavra de consolo, mas já tinha gastado todas elas no decorrer daqueles anos e o marido não parecia esperar por qualquer consolo, então só permaneceu. Fitou-o de canto de olho por um breve momento, pegou o exato momento em que Heechul limpou uma lágrima dos olhos.

— Eu acho que deveríamos começar. — o ômega falou ao piscar os olhos bem rápido.

Jungsoo assentiu e pela primeira vez desde que chegara ali, lançou um olhar para Siwon. Não era preciso externar mais do que aquele olhar para se entenderem. O alfa aproximou-se junto de Ryeowook, ambos pararam ao lado de Heechul. A mão de Ryeowook encontrou a do outro ômega e Jungsoo encarou o buraco na terra, em frente a lápide. No fundo, o caixão preto estava bem fechado, brilhante. A madeira era de boa qualidade, acolchoado por dentro, preto azeviche. Custara bastante dinheiro, mas o seu irmão merecia aquilo. Um lugar decente para descansar depois de tantos anos abandonado no território Byun.

— Alguém quer dizer alguma coisa? — Siwon perguntou, a voz estava oca, não havia ali nem a firmeza que Jungsoo se acostumara a ouvir ao longo dos anos de brigas.

Os olhos do Byun procuraram os seus e por uma fração de segundos, Leeteuk perguntou-se porque Donghae não estava ali, afinal ambos pareciam nunca se desgrudar ainda mais em momentos como aqueles, que envolvia o passado dos dois. Siwon tornou a olhar para frente, Jungsoo fez o mesmo. Ninguém disse nada enquanto o coveiro jogava a terra em cima do caixão.

Era meio-dia quando terminou. Jungsoo afrouxou a gravata no pescoço, Heechul despediu-se de si com um beijo na bochecha e Ryeowook não olhou-o na cara. Siwon lhe mandou um simples balançar de cabeça, que o Kim não sentiu vontade de devolver. Então, terminou sozinho encarando a terra mexida em frente a lápide de Kyuhyun.

A ideia do enterro havia sido de Heechul e depois de alguns dias fugindo da ideia, Jungsoo se viu obrigado a aceitar. Precisava fazer aquilo em algum momento, era melhor que fosse logo, afinal nem conseguia imaginar como o espírito do irmão estava inquieto depois de tantos anos sem um lugar para descansar. No entanto, não conseguia fugir da estranheza de tudo aquilo.

Haviam sido anos velando um corpo que não estava realmente lá e agora... Jungsoo ergueu o rosto para o céu e fechou os olhos bem apertados. Já havia passado da hora de chorar, disse a si mesmo. Respirou fundo e tornou a abaixar a cabeça, olhou para a lápide e balançou a cabeça. Deu um passo para trás. Estava na hora de ir para casa, pensou. Todavia, não foi. Continuou ali encarando a terra mexida, as nuvens no céu, as folhas secas nos galhos e ao seu redor, as outras lápides próximas. Permaneceu ali mais do que deveria, reunindo palavras na ponta da língua apenas para não dizê-las.

Quando deu por si já passava das quatro da tarde e por isso, resolveu que não podia mais enrolar. Precisava ir embora antes que Heechul viesse busca-lo. Afastou-se com as mãos nos bolsos da frente da calça, caminhou de cabeça baixa em direção a saída daquele cemitério humano. Era sempre tão estranho pensar no porquê acabou enterrando Kyuhyun naquele lugar e não junto dos seus pais e outros lobos do seu sangue no território Kim.

Lembrava-se que na época, mesmo sendo o líder, não podia mudar a lei. Toda aquela baboseira que impedia que lobos mortos em duelos fossem enterrados no próprio Clã e além do mais, se tivesse conseguido ir contra isso, não haveria o que enterrar quando Siwon havia levado os restos do seu irmão como um troféu. Um doloroso troféu que esfregou na cara de Jihyun durante anos até que ela não aguentasse mais.

Então, lhe sobrou aquele cemitério humano, uma lápide vazia e um coração pesado em arrependimento. No começo, não costumava ir ali com frequência, mas desde o casamento de Minseok se via indo ali mais do que o necessário como se esperasse algum consolo do irmão. Não havia. Não havia nada além de mais amargor.

— Senhor Kim. — escutou ser chamado e virou o rosto para trás.

Estava perto da saída. O porteiro na guarita lançou-lhe um olhar através do vidro da janela, mas Junsoo não correspondeu, estava ocupado demais em fitar a figura quase alegre de Park Jongdae que se aproximava de si. Usava um conjunto de roupa social parecida com sua, mas sem a gravata e o paletó. Por um segundo, o alfa se perguntou se o outro havia abandonado aquelas peças de roupa em algum lugar, porque a forma como seu cabelo estava bagunçado denunciava um pouco da sua impaciência para aquilo e quase riu com isso, porque aquele pequeno detalhe era algo típico do seu irmão.

De repente, o coração doeu.

— Senhor Kim. — Jongdae chegou mais perto, ajeitou os óculos escuros no rosto e mostrou-lhe um sorriso amigável, mas a marca na bochecha esquerda estragava toda aquela pose de bom moço.

— Jongdae. — o nome dele escorregou da sua boca baixinho, cheio de estranheza como se não tivesse nunca pronunciado aquele nome durante os anos. — O que... o que faz aqui? — a situação como um todo era estranha, se deu conta.

O sorriso no rosto do mais novo pareceu vacilar, tremeu no canto da boca. Ergueu a mão e ajeitou os óculos no rosto e Leeteuk continuou esperando uma resposta, apesar de já conseguir formar uma na mente.

— O senhor Donghae me contou sobre a lápide dele. — Jongdae respondeu, incerto.

Leeteuk comprimiu os lábios. Ambos estavam mergulhados em estranheza, se deu conta. Algum tempo atrás não passavam de patrão e empregado, agora eram tio e sobrinho. Compartilhavam a mesma marca sanguínea e quem sabe, tenha sido isso que moveu Jongdae até ali. O pobre garoto sem família estava procurando maneiras de se conectar com o pai morto, o pai que nem ao menos conseguia chamar de pai ainda. Leeteuk piscou os olhos, olhou para o caminho que havia vindo e começou a refazer os passos, não precisou dizer nada a Jongdae para ser seguido e também não precisou perguntar porque ele não veio mais cedo para o enterro dos restos mortais de Kyuhyun. Jongdae não sabia e essa constatação, o deixou um tanto irritado com Siwon.

Mas a raiva não permaneceu. Dissipou no momento em que parou em frente a lápide e observou o rosto de Jongdae. Não havia nada ali que pudesse aproveitar, nenhuma emoção realmente interessante. Ele parecia impressionado, depois, melancólico. Esboçou um sorrisinho mínimo como se não acreditasse na sua má sorte, puxou um maço de cigarros do bolso e ofereceu um para Leeteuk. O Kim não recusou, acendeu um para si. Fumaram os dois, em pé, diante da lápide não mais vazia enquanto o sol se punha. Era um evento importante, merecia algumas palavras, mas nenhum dos dois parecia saber o que dizer. Era a mudez típica de Kim’s, quis compartilhar isso com o garoto, mas não fez, deixou pra ele o silêncio. O mesmo silêncio que sempre recebeu de Kyuhyun durante aqueles anos de saudade, quem sabe, Jongdae conseguisse fazer algo melhor com aquilo do que se lamentar.

— Eu achava que meu pai era um Byun. — Jongdae falou no exato momento em que o céu começou a banhar-se em laranja, o cigarro preso no canto da boca e as mãos nos bolsos da frente da calça. — Na verdade, acho que só quis acreditar nisso porque era mais fácil admitir que eu só queria ter para quem voltar.

Leeteuk fitou-o de canto de olho. Era complicado ler suas emoções com aqueles óculos escuros, mas a forma como os lábios se comprimiam deixavam claro seu desagrado com situação atual. Baforou um pouco de fumaça.

— Às vezes, é o caminho até lá que importa. — tentou.

— Acredita mesmo nisso? — o garoto fitou-o por cima das lentes dos óculos e foi só então que o Kim notou o olho roxo.

— Não. — confessou apenas para escutar o outro rindo, acabou rindo também. — Mas se quer saber, Kyuhyun era um bom homem. Teria dado um ótimo líder. — segurou o cigarro entre os dedos. — Quem sabe, você leve jeito também.

— Náh. — jogou o cigarro no chão e apagou-o na sola do sapato. — Passo. — encarou os dizeres na lápide.

O Kim fumou o cigarro até o fim enquanto Jongdae não acendia mais nenhum. O sol se pôs e eles se despediram na saída do cemitério. Jungsoo queria lhe dizer mais coisas, mas Jongdae não tinha lhe perguntado nada, o que o fazia pensar que ele não queria saber ou talvez, já soubesse até demais sobre tudo. Não era uma história feliz e muito menos secreta, ainda vivia na língua dos mais velhos. Mas Leeteuk como testemunha principal de todos os acontecimentos, sentia a necessidade de falar sobre tudo.

— Quer beber alguma coisa? — teve coragem de convidar quando chegaram na calçada.

Jongdae tirou os óculos escuros, pendurou-os no bolso da camisa, sob o peito esquerdo. Daquele jeito, com o rosto limpo, Leeteuk via mais de Kyuhyun do que conseguia admitir. Enquanto Baekhyun revivia a Jihyun até no modo de respirar, Jongdae era uma belíssima mistura de ambos e quem sabe, tenha sido por isso que não conseguiu reconhecê-lo mais cedo.

— Tudo bem. — ele concordou e Leeteuk balançou a cabeça.

No fundo, queria acreditar que Kyuhyun finalmente estava o consolando. Dando tapinhas imaginários no seu ombro e pedindo para parar de se lamentar, seguir em frente de uma vez.

***

Zhou Mi despencou na cadeira ao lado de Sungmin na sala de reunião sem muita cerimônia, estava visivelmente cansado. Um suspiro escapou dos seus lábios apenas para dar lugar a um sorriso de gratidão quando Kibum surgiu de lugar nenhum com um copo de expresso quentinho na mão. Sungmin os observou com certa desconfiança no olhar, afinal não estava acostumado com Kibum sendo gentil com alguém, mas deu de ombro para aquilo quando ele mesmo ganhou um copo de expresso.

Relaxou a postura contra o encosto da cadeira, lançou mais um olhar para os dois antes de beber o primeiro gole do café. Kibum puxou o relatório da última reunião na sua direção, leu por cima sem muito interesse, as lentes dos óculos de leitura embaçaram quando aproximou o copo de café destampado da boca. Zhou Mi soltou uma risadinha, Sungmin desviou o olhar até ele, os lábios comprimidos em uma desaprovação engraçada que passou despercebida para o ômega. Estava com ciúmes, admitia para si mesmo. Mas o ciúmes era tão sem sentido, que deixou-o triste no minuto seguinte.

Ômegas sempre preferiam alfas, pensou amargo ao beber mais do café.

— Até quando precisamos ficar aqui? — o beta se escutou perguntar depois de vários minutos em silêncio.

Desviou os olhos para a janela, a cortina ainda estava aberta deixando que visse como estava escuro lá fora. Que horas seriam? Oito da noite?

— Até chegarmos em um veredito. — Zhou Mi se pronunciou, deixou o copo pela metade sobre a mesa. — Precisamos decidir isso o quanto antes.

— Achei que todos concordavam que ele é culpado. — Sungmin disse.

— Ele é culpado. — Kibum fitou-o. — Mas teve intenção de matar ou foi legítima defesa? Além do mais, Kim Minseok está grávido, por que ele sairia por aí matando alfas indefesos? — ironizou e Zhou Mi revirou os olhos antes de puxar para perto de si uma das várias pastas amontadas no meio da mesa.

— Mas de uma coisa sabemos, Minseok tem treinamento para isso. — abriu a pasta e empurrou para o meio da mesa, os dois homens inclinaram-se em direção à ela, os olhos cada vez mais arregalados enquanto liam aquele dossiê. — Esse garoto era um dos ômegas da Organização.

Kibum crispou os lábios e se afastou, o desgosto evidente no rosto. Largou o copo quase vazio sobre a mesa e levou a mão direto para os cabelos escuros curtos, arrumou os fios para trás com impaciência. Sungmin assobiou, impressionado com aquela informação. Kim Minseok não tinha cara de assassino assim como não tinha cara de quem escondia tantos segredos assim, notou ao verificar o tanto de folhas que havia naquele dossiê.

— Aqui diz que ele estava em Chicado durante aquele incidente. — comentou.

Zhou Mi franzio a testa e puxou o papel que Sungmin lia para perto de si. Os olhos se arregalaram quando constatou o que o amigo dizia. Kim Minseok estivera em Chicado durante A Caça — nome dado a uma importante operação de captura a lobos desgarrados que colocavam a vida dos humanos em risco. Levou o dedão esquerdo a boca e mordeu, uma mania do qual não conseguia se livrar todas as vezes que ficava apreensivo com algo. E aquilo, aquela informação, lhe deixava apreensivo o suficiente, principalmente porque apesar do seu casamento desfeito, Kim Minseok ainda era um Ômega Principal.

— Onde conseguiu isso? — Kibum perguntou, por fim, os braços cruzados, parecia ser o único a não querer chegar perto daquele dossiê e Zhou Mi sabia que isso tinha mais haver com Hyuna do que com o fato de não estar curioso, porque Kibum escorria em curiosidade na frente do beta e do ômega.

— Hyuna disse que queria nos ajudar. — respondeu e Kibum bufou.

— Aquela ômega não ajuda ninguém. — demandou e trouxe o copo de café para perto, bebeu o resto em um gole só.

Sungmin puxou o resto do dossiê para si e continou lendo.

— Se querem saber, isso é no mínimo suspeito. — falou e empurrou a folha que lia para o meio da mesa. — Por que Hyuna nos daria informações sobre seu modus operandi?

— Ela está tentando provar que ele realmente matou Jaehyun. — Kibum falou e deixou seu orgulho de lado ao puxar o restante das folhas do dossiê na sua direção, passou os olhos rapidamente ali. — Deve estar tentando conseguir a pena máxima.

— Por que? — Zhou Mi soltou, confuso. — Minseok faz parte da Organização, o que ela ganha eliminando-o?

— Talvez, silêncio. — Kibum empurrou uma folha na sua direção e apontou com o indicador a frase. — Minseok estava fora da Organização quando casou-se com Baekhyun. Tecnicamente, ele não passa de alguém que sabe demais.

Sungmin ficou de pé, os olhos arregalados quando aproximou-se de Zhou Mi para ler o que Kibum lhe mostrava. Kim Minseok havia sido desligado da Organização um pouco antes de se casar com Byun Baekhyun, então não havia mais nenhum registro das suas missões.

— Acham que Baekhyun sabe disso? — o beta perguntou baixinho.

Kibum riu e Zhou Mi fitou-o sem entender.

— Se ele soubesse, acha mesmo que teria continuado com esse casamento? — devolveu a pergunta ao beta.

O Lee mordeu o lábio e voltou até o seu lugar, sentou-se. O corpo desabou ali com mais cansaço do que queria sentir, mas quem queria enganar. Estavam há dias trabalhando naquele caso além de ter que aturar a presença de Hyuna ao tentar encontrar pistas dos paradeiros dos lobos Byun’s raptados, rastrear os humanos envolvidos nisso e limpar o vídeo de Siwon na sua forma de lobo da internet. E aquele caso, que deveria ser simples de se resolver, estava cada vez mais se transformando em uma bola de neve. Por que aquele trabalho não podia ser simples?, se perguntou mau-humorado. Às vezes, desejava voltar para o hospital em Seul e continuar seu trabalho com os humanos ou só ir para o Santúario, no Clã Park e descansar na sua cama, compartilhar suas descobertas com Zitao, seu aprendiz.

— Tudo bem. — Zhou Mi tomou a dianteira, Sungmin e Kibum fitaram-o. — O que sabemos sobre Kim Minseok? — ergueu a sobrancelha em direção aos dois colegas de trabalho incentivando-os a falar.

— Ele fez parte da Organização. — Kibum falou ao cruzar os braços. — Estava em Chicago durante A Caça e pode ter facilitado a fuga de alguns lobos a mando de Hyuna. — continuou falando e Zhou Mi sorriu na sua direção, apontou a ponta do lápis na sua direção antes de escrever aquilo em uma folha em branco.

— Ele foi obrigado a se casar com Byun Baekhyun, mas estava anteriormente prometido a Oh Sehun. — Sungmin decidiu dizer sem muita certeza, não sabia como aquilo ajudaria o que quer que Zhou Mi estivesse fazendo. — Ah! — lembrou-se rapidamente. — Eles estudaram juntos.

O alfa e o ômega o fitaram sem entender.

— Eles? — Zhou Mi perguntou.

— Baekhyun e Minseok. — respondeu enquanto vasculhava entre os papéis sobre a mesa atrás do depoimento de Kim Junmyeon. — Aqui. — estendeu a folha para o ômega, mas foi Kibum quem pegou. — Minseok, Kyungsoo, Chanyeol e Baekhyun estudaram na mesma escola.

Zhou Mi encarou a folha que escrevia, o lápis preso nos dedos, de repente, não sabia o que deveria escrever porque uma ideia absurda cresceu na sua cabeça. Abaixou o lápis, desviou o olhar até o dossiê do Kim e puxou para perto de si. Era demais pensar que o casamento de Baekhyun e Minseok havia sido planejado pela Organização?, afinal conhecia a forma como aquele lugar agia, como recrutava ômegas e como os classificava. Ser um ômega vermelho lhe garantia uma vida manipulada por Hyuna. Balançou a cabeça, não se ateria aquilo por enquanto. Era melhor continuar traçando o perfil de Minseok, pensou.

Estudaram juntos, escreveu na folha.

— Minseok não tem histórico de agressão. — o alfa resolveu falar. — Ninguém reclamou sobre isso no depoimento, na verdade, ele foi descrito por Junmyeon como deprimido com o fim do casamento. — leu.

— Baekhyun também não estava muito feliz. — Sungmin trouxe o documento com os depoimentos para perto. — Só Hangeng acusou-o de ter matado Jaehyun a sangue frio.

— Um dos dois tinha uma arma de fogo. — Zhou Mi disse, levou as mãos as temporas e massageou. — Minseok o esfaqueou diversas vezes, havia sinais de luta no corpo de Jaehyun. — fechou os olhos para tentar pensar melhor enquanto falava. — Ninguém com sangue frio esfaqueia alguém daquele jeito bruto sem ter um motivo.

— Se fosse um assassinato planejado, a cena do crime seria mais organizada. — Kibum pareceu chegar a mesma conclusão que o ômega. — Ainda mais levando em conta tudo o que sabemos sobre esse garoto.

— Autodefesa? — Sungmin se meteu. — É isto?

— Sim. — Zhou Mi confirmou sem hesitar.

— Parece que não leu a ficha dele direito. — apontou com o queixo para o dossiê aberto perto do mais alto, Zhou Mi revirou os olhos e bufou para total desgosto do beta.

— Minseok é um ômega. — disse o óbvio e Sungmin ergueu uma sobrancelha na sua direção sem entender, afinal já sabia daquela informação. — Ele ainda é um Ômega Principal apesar do casamento desfeito, só que além disso, ele é um Ômega Principal grávido. Você acha que ele atacaria um alfa nesse estado por qual motivo? — cruzou os braços e o encarou, exigia uma resposta.

— A ficha...

— Zhou Mi tem razão. — Kibum cortou o argumento do beta. — Ômegas grávidos tendem a fazer tudo para proteger a cria assim como alfas, não faz sentido ele se por em perigo assim só porque sua ficha diz que ele sabe como agir, mas, é claro, ainda precisamos ouvi-lo. De qualquer forma, esse é o veredito por enquanto. — o alfa trouxe os papéis para perto e começou a organiza-los.

— Espera. — Sungmin chamou a atenção. — Por que Hyuna nos deu esse dossiê, então?

Zhou Mi riu, baixinho.

— Acho que não somo os únicos que precisam de Kim Minseok perto. — falou ao se aproximar da folha em que estivera escrevendo.

Hyuna está a sua procura, rabiscou. Por que?

Escutou Kibum levantar com os papéis em mãos, estava dando aquela reunião como encerrada. Sungmin inclinou-se na sua direção, estreitou os olhos para o que escrevia, mas não pareceu ter qualquer coisa para falar sobre. Zhou Mi dobrou o papel e enfiou-o no meio do dossiê de Kim Minseok, pretendia levar aquilo para casa e estudar mais sobre o caso, afinal precisava estar preparado para enfrentar a possível revolta de Hangeng quando anunciassem aquele veredito.

— Deveria se dar um descanso. — o Lee falou e o ômega fitou-o.

Às vezes, esquecia-se da presença do colega, em parte porque Sungmin nunca havia sido tão presente no Conselho quanto naquela época. O beta apesar de ter sido aprovado para aquele cargo, não costumava comparecer nos compromissos exigidos, era sempre trabalho de Kibum e Zhou Mi resolver tudo da melhor forma possível enquanto Sungmin se ocupava com seu trabalho no Santúario e no hospital humano, contudo, ali estava ele, se fazendo presente e tentando se encaixar novamente no cargo que havia abandonado.

— Não estou cansado. — disse, mas o corpo lhe traiu ao fazê-lo bocejar na frente do beta.

Sungmin riu e balançou a cabeça.

— Vocês não vêm? — Kibum tornou a se aproximar da mesa, já não tinha os documentos nas mãos.

Sungmin se pôs de pé primeiro que Zhou Mi.

— Pode deixar que eu fecho a Sede. — o ômega fitou os dois.

— Deixa de ser idiota. — Kibum irritou-se e o ômega sentiu o rosto corar inteiro, em parte porque mesmo depois de anos ainda não era capaz de não se afetar com o modo desbocado do alfa. — Você não vai ficar aqui sozinho com o risco daquela maluca da Hyuna aparecer.

O ômega revirou os olhos, mas não contestou, em parte porque sabia que mesmo que negasse Kibum ainda continuaria ali enchendo sua paciência para que se apressasse. Por isso, apenas guardou os documentos que iria levar na bolsa e recebeu ajuda dos outros dois para fechar a Sede. Eles se despediram no estacionamento e marcaram mais uma reunião privada para depois da visita ao Clã Kim.

***

Yifan estacionou o carro na entrada do território Kim, lançou um olhar para o humano ao seu lado, Jeonghan, apenas para voltar a olhar para entrada do lugar. Sabia que os guardas Kim’s na guarita o estavam fitando de volta, curiosos com a aparição daquele carro. Jeonghan pareceu querer dizer alguma coisa, mas Yifan não lhe deu tempo pois deu partida no carro no minuto seguinte. Deu meia volta e se afastou dali.

Ainda não era tempo de perturbar os Kim’s, pensou. Havia coisa demais em jogo para dar um passo imprudente como aquele. Dirigiu para longe do território Kim e decidiu seguir direto para os Park’s, onde estava passando uma temporada. Jeonghan tornou a fita-lo e o alfa se irritou com aquilo.

— Eu não ia entrar. — contou.

— Estava provocando. — incrivelmente, Jeonghan o criticou e Yifan ergueu uma sobrancelha apenas para ter o outro engolindo em seco. — A senhorita Hyuna nos pediu discrição, então apenas...

— Fique quieto. — mandou e Jeoghan abaixou a cabeça.

Yifan estendeu a mão em direção ao rádio e ligou. A música preencheu o silêncio no carro e como se nunca tivesse sido criticado, o alfa começou a cantar. Jeonghan continuou quieto pelo resto da viagem, coisa que Yifan elogiou silenciosamente, pois tudo o que menos queria era alguém lhe dizendo o que não deveria fazer. Estava no comando ali, tudo estava sendo financiado por si e seus contatos, então tudo o que queria de volta era um pouco de devoção e menos criticas.

Parou na entrada do Clã Park e apertou o volante. Admitia a si mesmo que era mais impulsivo que o recomendado, mas atribuía isso a sua natureza alfa. Alfas eram assim, certo? Podiam fazer o que queriam simplesmente porque eram os primeiros na hierarquia e tudo ficava ainda melhor quando era um alfa líder, o dono consagrado de toda uma horda de lobos. Sentia que podia subir aos céus com isso.

Dispensou Jeonghan na entrada dos Park’s e voltou a dirigir para longe dali. Se sentia tão agitado com a possibilidade de estar tão perto do seu ômega que cada parte de si formigava em expectativa. Hyuna o dissera para ter calma, cultivar paciência por alguns dias mas Yifan já tinha esperado demais. Foram anos sem entender o que havia acontecido e depois, anos sentindo-se defeituoso, completamente fora de si e solitário. Estava ansioso para ser completo novamente, para se sentir como si mesmo. E quem sabe, fosse essa ansiedade toda que estava bagunçando seus sentidos.

Precisava constantemente se medicar para manter-se na linha. Não achava que supressores poderiam ser usados daquela forma, mas ao menos lhe davam algum alívio para toda a bagunça de hormônios que estava se tornando.

Refez o caminho até os Kim’s, estacionou na entrada e ficou algum tempo ali, parado. Uma parte sua não queria quebrar a confiança de Hyuna, mas a outra só estava completamente cheia de todas aquelas ordens. Odiava a forma como podia ser rebaixado a tão pouco quando estava ao lado de Hyuna, uma ômega. Uma maldita ômega.

Observou quando um dos guardas da guarita saiu do seu posto e andou na sua direção. Girou o volante e saiu dali, rápido. Não queria que ninguém o visse apesar do pouco esforço que fazia para isso, contudo mesmo que se irritasse com a autoridade de Hyuna ainda não queria estragar tudo o que tinham planejado. Dirigiu para longe, em direção a cidade. Encarou as mensagens que chegavam no seu celular durante o caminho, mas não abriu nenhuma para ler. Fez isso apenas quando entrou em Seoul. Estacionou em um posto de gasolina qualquer e leu as mensagens que recebera. Acabou sorrindo, pois quando contasse sobre aquilo para Hyuna nem mesmo ela acreditaria.

Às vezes, Dal tinha momentos realmente sombrios, pensou enquanto seguia em direção ao ponto de encontro marcado com seu colega alfa. Faziam anos que não se viam, anos antes de Yifan decidir que seria líder de uma alcateia. Deu partida no carro e seguiu até o ponto de encontro, se perguntando a cada pedaço de tempo sobre todas as coisas que haviam acontecido com seu querido colega. Soubera alguns boatos por alto, coisas que realmente faziam o seu feitio.

O bar estava quase lotado, o que de certa forma era bom porque o cheiro e o barulho de tantos humanos serviriam para máscara-los. Ninguém notaria que eram diferentes se estivessem tão distraídos se embebedando. E quando entrou no bar percebeu que nem deveria se esforçar para disfarçar sua natureza, afinal os humanos pareciam todos concentrados em um jogo de futebol na televisão do lugar.

Não precisou procurar muito para encontrar seu acompanhate da noite. Era o único que estava sentado no fundo do bar, nenhum pouco interessado em toda aquela algazarra a cerca de um jogo patético de futebol. O alfa avistou-o no segundo seguinte, ergueu o copo de cerveja que segurava pela alça como que para avisar da sua localização mas Yifan já havia visto muito tempo antes. Aproximou-se devagar, desviou de homens e mulheres. E quando sentou-se em frente ao alfa, este lhe sorriu.

— Quanto tempo, Kris. — o seu nome antigo foi dito com diversão e Yifan sorriu, pequeno.

— Digo o mesmo, Chen. — brincou de volta e o alfa aumentou o sorriso de modo que os olhos tornaram-se duas fendas bonitinhas. — Mas e então, por que me chamou? Não achei que ainda tivesse meu número.

— Pensei em apagar algumas vezes, mas se quer saber eu não sabia se funcionaria. — Chen bebeu um pouco de cerveja e abandonou o copo sobre a mesa, pela forma como o líquido não havia chegado na metade, Yifan percebeu que ele havia pedido a pouco tempo e que provavelmente chegara a pouco tempo também. — Já faz muito tempo. — confidenciou e Yifan o encarou.

— Bastante.

Ao longe, o grupo de humanos soltou um grito em comemoração, ao que parecia alguém tinha marcado um ponto no jogo. Yifan desviou os olhos brevemente naquela direção, mas voltou a fixar sua atenção no velho amigo.

— O que tem feito? — ele era simpático, parecia querer falar do passado para matar a saudade, mas Yifan não sabia ao certo o que oferecer a ele além de algumas memórias amargas. — Espero que tenha saído daquela vida.

Ah, aquela vida.

O pensamento saudoso chegou em si como um soco. Não havia sido a melhor das pessoas no passado, em parte porque não nascera entre lobos. Havia se perdido no caminho e ido parar em uma família humana, com costumes humanos e cheio de outros humanos. Não aprendera sobre a importância de um clã ou de como deveria ser devoto ao seu líder, não sabia nada sobre a deusa lua a qual todos adoravam e muito menos sobre as transformações anuais. Sabia apenas sobre as idas semanais na igreja com seus pais, as receitas da sua avó cuidadosamente escritas em um diário que a mãe escondia como se fosse feito de outro, as suas visitas a psicóloga e as receitas dos remédios para controlar seu humor que tomava periodicamente.

Mas aquela vida a qual Chen se referia, era depois que sua vida virara um caos completo. Depois que percebeu que não era exatamente humano como o resto da sua vida. E admitia que na sua busca por algo sólido a que se agarrar, acabara se metendo em muitas encrencas e em uma delas conhecera Chen.

— Eu sou um líder alfa agora. — contou com certo orgulho e o outro riu, alto.

— Quem diria. — ele bebeu mais da cerveja. — Em um dia você está em Chicago fugindo do Conselho e em outro está sendo chamado de líder Kris.

— Yifan. — corrigiu e os olhos de Chen arregalaram. — Líder Yifan.

A boca do alfa abriu-se em descrença. Já havia escutado aquele nome antes mas nunca parara para pensar que poderia ser Kris com outra identidade. E para o bem da verdade, desde que viera da China toda a sua vida tinha sido uma correria, não havia tido tempo para investigar sobre os novos afazares do seu velho amigo principalmente quando estivera atolado em tantos problemas. Contudo, aquele nome não lhe era estranho. Deveria ter escutado uma coisa ou outra da boca de Junmyeon na época em que fora seu braço direito, afinal não era incomum que o primo falasse algo de outros líderes.

— Você ganhou a liderança em um duelo. — expôs e Yifan riu, parecendo orgulhoso daquilo. — Um brinde à você. — ergueu o copo na sua direção e o alfa arrumou sua postura na cadeira, adorava ter o ego massageado.

— Não foi muito difícil. — confessou ao lembrar-se da forma como vencera o velho Choi e toda a sua família.

O gosto do sangue deles na ponta da sua língua ainda roubava lhe o sono, mas havia sido por uma boa causa. Se não fosse líder nunca conseguiria encontrar o seu ômega, não teria poder para suficiente para isso do jeito como tinha agora.

— Imagino que não. — Chen já havia bebido mais da metade do líquido do copo. — Soube que ele era um velhote.

— E era. — ambos riram.

Os humanos voltaram a fazer barulho por conta do jogo. Yifan olhou para trás e não viu ninguém prestando atenção nos dois, apenas o homem atrás do balcão os fitava de vez em quando como se desconfiasse das suas intenções, mas resolveu que não se ateria aquilo. Voltou sua atenção para Chen.

— E você? Ainda é Chen? — interessou-se.

— Park Jongdae. — contou entre um gole e outro de cerveja.

— Park? — desconfiou e o alfa deu de ombros.

— Longa história.

Yifan riu. Já devia ter imaginado que aquele alfa se meteria em alguma encrenca, quem sabe fosse por isso que havia o procurado depois de tanto tempo. Cruzou os braços e ergueu uma sobrancelha na sua direção, parecia pronto para perguntar sobre aquilo, mas Jongdae havia sido mais rápido.

— Eu sei que o está pensando. — encarou seu copo quase vazio de cerveja e ponderou sobre pedir mais um. — Acha que estou encrencado.

— E não está?

— Um pouco. — o sorriso voltou a aparecer no canto dos seus lábios e Yifan quase relaxou.

— Do que precisa? — perguntou de uma vez.

Odiava rodeios.

— De ajuda para encontrar Kim Minseok. — Jongdae disse de uma vez e o Wu sorriu.

Realmente, o mais alto pensou, Dal os conduzia por caminhos inesperados.


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