Mirtilo escrita por OmegaKim


Capítulo 32
VI - Sobre beijos e outros golpes




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Junmyeon estava com insônia.

Andava de um lado pro outro em seu quarto, alguns papeis em mãos e os óculos de leitura no rosto. Não vestia mais do que o seu pijama de algodão, mas mesmo com a chuva que o céu anunciava lá fora, não sentia frio. Essa era uma das vantagens de ser um alfa, o seu corpo não sentia tanto as mudanças climáticas da forma de ômegas sentiriam. Alfas eram fortes e isso era comprovado quando se olhava para o modo como seus corpos eram moldados depois da puberdade, com músculos e uma força extrema em seus golpes, além de que seu metabolismo era mais melhorado do que o de ômegas e betas.

Não ficavam doentes com tanta facilidade, quando feridos podiam contar com uma cicatrização rápida dependendo da gravidade do golpe, e a temperatura corporal era regulada para que seu corpo pudesse realizar as atividades biológicas essenciais. Contudo, mesmo com tudo isso Junmyeon não se sentia tão privilegiado assim, quando tinha que ser o alfa líder daquela alcateia tão cheia de problemas. Problemas esses, que agora eram seus.

Olhou mais uma vez para as folhas que segurava e soltou um suspiro, ao mesmo tempo que levava a mão aos cabelos. Sentia-se cansado de buscar uma solução para aquilo que não fosse pedir ajuda para outra alcateia. Havia tentado um empréstimo com a Alcateia Kim da China, mas eles também não estavam no seu melhor momento financeiro. E seu tio Hangeng, o líder Kim chinês, o aconselhou pedir ajuda aos únicos parceiros que tinham, os Byun’s. Contudo, mesmo que Junmyeon quisesse fazer isso, estava fora de cogitação.

Sua Alcateia estava rejeitando de todas as formas qualquer ajuda dos Byun’s. Era um fato, que Kim’s nunca se deram bem com a Alcateia de lobos brancos antes, pois mesmo antes da morte do seu tio, Kyuhyun, as duas alcateias andavam sobre uma linha tênue. Junmyeon tinha conhecimento de que o pai de Siwon, tentou casar o filho com sua tia Joohyun, atrás de um acordo de paz, mas isso fora logo deixado de lado quando Park Jihyun entrou em cena com seu sangue puro de princesa da alcateia mais orgulhosa. E, é claro, fora aí que os problemas começaram, porque Kim’s e Byun’s podiam muito bem apenas se tolerar em todos esses anos de competição de quem era o melhor, mas Park Jihyun conseguiu fazê-los se odiar com um afinco, que Junmyeon ainda se surpreendia por nunca ter sido contaminado com esse sentimento.

No entanto, tudo isso havia piorado depois do Festival da Lua, quando Oh Sehun fora atacado por um Byun e quase morrera. Sua Alcateia ficara com mais raiva que o normal e tudo havia piorado circunstancialmente quando Minseok casara com Baekhyun e depois do desaparecimento de Kyungsoo. Muitos dos seus lobos acusavam os Byun’s de terem raptado Kyungsoo. “Podiam até mesmo tê-lo matado”, alegavam e por isso pediam por uma retaliação. Junmyeon estava fazendo o possível para segura-los onde estavam, fazê-los se acalmar e perceber que Baekhyun era seu aliado agora. Contudo, mesmo sua paciência com os lobos não estava mais tão alta quanto antes, pois constantemente estava sendo procurado por alfas e betas, líderes de pequenos motins, que pediam por uma retaliação.

A recente quebra da aliança com os Oh’s e os Choi’s, só servia para inflama-los mais e deixar a Alcateia Kim na miséria. Os negócios não estavam indo bem e não havia ninguém para cobrir o prejuízo que foi a safra de girassóis não ter amadurecido no tempo certo. Isso fez com que Junmyeon perdesse alguns compradores e agora tinha que torcer para que a safra de trigo e milho vingasse no tempo certo, para poder conseguir se estabilizar financeiramente por alguns meses, até tudo voltar ao normal.

Os Kim’s eram agricultores, diferente dos Byun’s que tinham um nome de peso no ramo de entretenimento, ao estarem sempre por trás de grandes comerciais de marcas famosas e nos agradecimentos de algum álbum de um idol qualquer. Junmyeon tinha que admitir que para uma Alcateia que tinha sido condenada à morte por outras mais ricas, os Byun’s tinham construído um império e tanto. Ele só esperava conseguir se fazer o mesmo também.

Sentou-se na beira da sua cama e largou os papeis ali em cima. Retirou os óculos e respirou fundo. Talvez, precisasse só relaxar um pouco antes de seguir procurando uma solução. Na verdade, procurando uma solução que não o levasse para o território Choi atrás de reatar o acordo. O Kim não queria ter que enfrentar a figura de Choi Yifan, o novo líder do clã. Não confiava no chinês, depois do modo como ele fora capaz de eliminar a família principal Choi antes de assumir a liderança, pois existia uma diferença entre matar em um combate e matar uma família inteira por diversão. E o que aquele lobo tinha feito, definitivamente fazia Junmyeon querer se manter longe.

Pôs-se de pé e resolveu ir até a cozinha, pegar alguma comida ou tomar um remédio para dor de cabeça e tentar dormir, afinal precisava descansar para conseguir pensar em uma solução. Retirou os óculos do rosto e deixou sobre a cama antes de sair, pisando devagar porque não queria acordar seus pais ômegas e porque sabia como Heechul estava doente. Não queria incomodar o pai, queria deixa-lo descansar em paz mesmo que uma parte sua precisasse de um abraço demorado do progenitor. Não gostava muito de admitir, mas se sentia solitário. Terrivelmente solitário desde que Kyungsoo sumiu e Minseok casou. Não gostava da posição de filho único, preferia quando eles eram três, preferia quando eles eram uma família completa...

A casa estava escura e silenciosa, denunciando como os mais velhos estavam dormindo. Foi até a cozinha e devagar abriu a geladeira. Pegou uma caixa de leite e serviu-se de um pouco em um copo. Voltou a guardar a caixa de leite, apenas para se encostar na bancada da cozinha, apoiou os cotovelos ali enquanto o copo de leite estava à sua frente sobre a bancada. Fechou os olhos por um momento e respirou fundo, queria se distrair um pouco de toda aquela pressão que o cargo de líder carregava e sem realmente perceber, se viu lembrando do que acontecera mais cedo no dia. De repente, seus pensamentos se preencheram com a imagem de olhos cor-de-violeta.

Tinha que admitir que nunca havia visto aquela tonalidade antes, nem mesmo no seu clã, que era conhecido por não ter um padrão de raça. Isso era facilmente visto pelo modo como seu pai tinha as iríses avermelhadas enquanto Ryeowook as tinha esverdeadas mesmo sendo ambos Kim’s. Mas poderia apenas fazer parte de algum clã que não estava conseguindo lembrar agora, porque estava ocupado procurando cheiro daquele ômega em sua memória. Era maravilhoso, Junmyeon tinha que confessar isso à si mesmo. Em todos esses anos convivendo com ômegas e passando cios com estes, não tinha realmente encontrado um cheiro tão atraente como aquele. E nos seus pensamentos, ainda de olhos fechados, sorriu minimamente. Estava achando graça de si mesmo e do modo como seu lobo ficava agitado apenas com a lembrança de alguém que sequer sabia o nome. No entanto, tinha uma lembrança da sua existência...

Havia um sapato no seu quarto. Sobre sua mesinha de estudo, ao lado do computador, que servia para comprovar que realmente tinha encontrado aquela pessoa.

Quem sabe um dia te devolvo, teve coragem de pensar antes de suspirar e abrir os olhos. Bebeu mais um pouco do leite, antes de se cansar e colocar o copo meio cheio na pia. Virou-se para sair da cozinha e realmente saiu, mas antes que pudesse dobrar o corredor e voltar para o seu quarto, notou uma figura esbranquiçada no sofá da sala. Parou onde estava, deu dois passos para trás e piscou os olhos antes de olhar novamente para o sofá. Andou até lá, devagar, ao mesmo tempo que procurou no ar o cheiro da pessoa ali. Era Ryeowook.

Parou atrás do sofá e observou o modo como o pai estava embolado em um lençol branco, sentado, com a cabeça baixa, parecia chorar. Mas era tão baixinho, que Junmyeon achou que estava imaginando coisas.

Omma? — chamou suavemente, fazendo o mais velho dar um pequeno pulo tamanha sua surpresa.

— Ah, Junie. — Ryeowook disse, limpou o rosto rapidamente e levantou o rosto logo em seguida para fitar o alfa, um sorriso tremulou nos seus lábios finos.  — Por que está acordado ainda? Já está tarde.

O alfa meio tombou a cabeça pro lado e o fitou por sobre toda aquela escuridão, ignorando o que o ômega tinha lhe perguntado. Lobos tinham uma ótima visão noturna e por isso podia muito bem olhar para cada canto do rosto de Ryeowook e avaliar sua expressão triste. Deu meia volta no sofá e sentou-se ao lado dele, colocou o braço por sobre seu ombro e o trouxe para perto num meio abraço desajeitado. Ryeowook o abraçou de volta, afundou o rosto na curva do seu pescoço e começou a chorar novamente, esquecendo-se do que tinha perguntado antes.

Junmyeon sabia como estava sendo difícil para Ryeowook, porque além de se separar de Leeteuk havia perdido os dois filhos. Kyungsoo que desaparecera e Minseok que fora obrigado a se casar com alguém desconhecido. O alfa não sabia o tipo de coisas que costumavam passar pela cabeça do ômega, mas sempre podia ver no seu olhar a tristeza de ter pedido tantas pessoas em tão pouco tempo.

— Pode me contar, se quiser. — falou, mas o pai só o trouxe para mais perto.

Se limitou a afagar os cabelos do pai, tentando dar-lhe algum conforto. Não sabia o que poderia dizer para melhorar aquilo, então só ficou em silêncio esperando que o mais velho soubesse como não estava sozinho e que Junmyeon estava tentando ao menos encontrar Kyungsoo, já que não havia jeito de trazer Minseok de volta, pois não existia divórcio na sociedade de lobos, nem mesmo o Conselho — que era capaz de ditar cada ação destes — aprovava algo como isso.

— Heechul está doente.  — escutou Ryeowook dizer, abafado pelo modo como estava escondendo o rosto em si.

— Ele vai melhorar, pai. Está tomando todos os remédios no horário certo, o médico da Alcateia está o acompanhando de perto. — apertou o pai de leve. — Vai ficar tudo bem.

— Isso não vai adiantar. — Ryeowook chorou mais um pouco. — Nenhum remédio vai cura-lo, Junie.

Junmyeon franzio a testa, confuso com o que escutava. Seu pai estava mesmo tão doente assim? Poderia ser algo grave, como câncer que os humanos costumavam ter? Parecia loucura pensar assim, quando Heechul sempre fora um ômega forte, com a saúde em dia. Nem mesmo durante esses anos, o Kim o tinha visto ficar doente.

— O que? — afastou o pai o suficiente para que pudesse olhar em seus olhos, mas quando Ryeowook desviou do seu olhar, Junmyeon sabia que havia algo de errado. — O está acontecendo? O que você sabe? — segurou-o pelos ombros, preocupado demais para ser delicado.

Estava com medo. Não queria perder seu pai Heechul. Não podia perde-lo.

— A marca. — Ryeowook confessou, o lábio tremendo. — A marca o está matando e eu não posso fazer nada. — então escondeu o rosto nas mãos e chorou enquanto Junmyeon sentia o peito afundando em impotência.

Já tinha escutado sobre as propriedades de uma marca, sabia muito bem ao que seu pai ômega se referia e por isso, não conseguia evitar aqueles os arrepios nada agradáveis contra a sua nuca. Uma marca servia para ligar duas pessoas, era um vínculo inquebrável que os transformava em um só. Era a marca de amor incondicional, era a prova de que duas pessoas se pertenciam o suficiente para compartilhar até mesmo pensamentos, em alguns casos. Mas em ômegas, a marca sempre seria mais forte porque como o corpo destes era mais frágil, a marca serviria como forma de transporte de suprimentos, como vitaminas e energia, que vinha do alfa. Mas para isso acontecer, eles precisavam trocar fluidos constantemente. Seja na forma de beijos ou abraços. Era essencial que os dois ficassem juntos para que a Marca pudesse agir da forma certa, contudo, quando isso não acontecia, os dois começavam a enfraquecer até a morte.

Junmyeon já havia escutado casos de ômegas que foram abandonados depois de receberem a marca e morreram, da mesma forma como veio a acontecer com os alfas que os marcaram. No entanto, alfas sempre seriam mais fortes e por isso duravam mais que um ômega, quando longe de seus parceiros.

Soltou Ryeowook e ficou de pé, passando a mão no cabelo. Nervoso demais para pensar em outra forma de salva-lo sem ter que ir atrás de Leeteuk. Olhou para Ryeowook e o ômega o fitou, como que entendendo o que ele ia fazer e não aprovasse, mas também não via escolha. Não havia nenhum remédio no mundo que pudesse salvar Heechul naquele momento.

— Eu vou atrás dele. — externou e o ômega olhou para baixo, uma parte sua se sentia culpado por não ter dito antes ao filho, mas estava sendo tão orgulhoso ao não querer ver mais Leeteuk, que não pensara que Heechul fosse piorar tanto.

Sempre tinha escutado história sobre marcas e como elas eram o símbolo de um amor eterno, no entanto, ela estava matando Heechul de uma forma lenta quase como se quisesse ensinar uma lição, não só ao ômega, mas para si, também.

Junmyeon não esperou que ele dissesse qualquer coisa, apenas começou a ir em direção a saída. Ainda estava de pijama e pouco se importava com isso, só queria ir até o pai e exigir que viesse consigo para que pudessem salvar Heechul. Contudo, assim que abriu a porta, de um jeito totalmente abrupto que deixava claro seu estado emocional, deu de cara com Kim Jongdae. A mão estava levantada, pronta para ir de encontro a porta e chamar o alfa.

— O que há? — Junmyeon perguntou, um tanto surpreso. A explosão de antes, parecia ter sumido de si.

— Temos um problema. — Jongdae tratou de dizer, a mão abaixou-se e foi se juntar a outra, entrelaçou os dedos daquele modo que mostrava ao alfa que o Kim estava nervoso. — Um dos lobos está solicitando um combate pela liderança.

— O que? — quase deu um passo para trás, contudo apenas manteve o aperto na maçaneta da porta.

— Um lobo veio até mim solicitar um combate contigo. — mordeu o lábio, como se ele mesmo não pudesse acreditar nisso, mas por dentro Jongdae tinha conhecimento de todas as palavras que havia gastado até conseguir que um lobo desafiasse Junmeyon.

O alfa líder comprimiu os lábios e fechou a porta, sem dizer qualquer outra coisa ao Kim mais velho, pegando-o totalmente desprevenido. Mas o líder simplesmente foi até o pai ômega, ainda sentado no sofá.

— Você precisa ir até Leeteuk e trazê-lo aqui. — quase mandou, mas controlou sua voz de alfa no último segundo.

Ryeowook piscou e franzio a testa para o que o filho pedia. Não queria encontrar com o outro alfa, não queria nem ao menos olhar na sua direção.

— Eu não...

— Por favor, appa. — tentou mais um pouco. — Eu preciso resolver um problema urgente, não posso ir lá e meu pai não pode esperar. — resolveu que era melhor não contar ao ômega sobre o combate, não queria preocupa-lo mais.

O ômega mordeu o lábio e olhou pra baixo enquanto assentia. Sabia que não tinha escolha, precisava engolir o orgulho e toda a decepção e ir lá, precisava ajudar a salvar Heechul porque não aguentava mais perder as pessoas que amava. Observou quando o filho ficou de pé novamente e foi em direção a porta, abriu-a e saiu. Então, ele próprio abandonou o lençol a qual se enrolava e ficou de pé. Precisava fazer isso por Heechul. Ele só esperava que Leeteuk fosse receptivo consigo.

No entanto, fora da casa, Junmyeon seguia Kim Jongdae até a Sede oficial dos Kim’s, onde ficava localizado seu escritório. Estava descalço e ainda de pijama, quando avistou uma pequena roda em frente à Sede. Franzio a testa e fechou as mãos em punho, pois aquilo não podia estar acontecendo quando estava fazendo de tudo pra colocar a Alcateia nos eixos, quando tinha sido ensinado a vida inteira para assumir aquele lugar de líder. Era totalmente injusto que alguém o desafiasse por achar que podia fazer um trabalho melhor, como se ser líder fosse apenas sentar uma cadeira e esperar.

— Diga o que sabe. — mandou a Jongdae, que subitamente engoliu em seco com o tom extremamente sério que Junmyeon havia tomado.  

— Ela se chama Kim Sooyoung, 21 anos, alfa. É líder de um pequeno grupo de lobos que são contra a aliança de Kim’s com Byun’s. — deixou que Junmyeon soubesse e esperou alguma reação, mas o alfa líder apenas comprimiu os lábios e continuou andando.

Jongdae observou quando Junmyeon afastou as pessoas para entrar na roda e parou, os braços cruzados, em frente à alfa Kim.

— Soube que queria me ver. — falou simplesmente e a garota, sorriu.

— Não achei que viria tão rápido. — ela segurou o seu cabelo e amarrou com uma liga que havia no seu pulso. — Mas é melhor assim, vamos acabar com isso logo. Pronto para perder? — teve coragem de perguntar e Junmyeon esboçou um pequeno sorriso enquanto seus olhos tornavam-se vermelhos.

— Está pronta para morrer? — devolveu, usando a voz de alfa, mesmo que baixa e que trouxe um certo arrepio ao corpo da garota.

Sooyoung não era burra, sabia muito bem que Kim Junmyeon era um oponente forte demais. Contudo, não podia evitar pensar que faria um trabalho melhor que o Kim, além de que sabia que ficaria linda sentada na cadeira do líder, com o poder escorrendo por entre os dedos. Era ambiciosa demais para alguém tão nova, e por isso, quando Jongdae aparecera falando-lhe coisas nos ouvidos, sussurrando ideias revolucionárias, não pôde se conter. Gostava demais da ideia de ser uma alfa líder. Foi pensando nisso que fechou as mãos em punho e colocou-se em posição de ataque enquanto o líder apenas lhe oferecia um sorriso, como que achando-a adorável como um cãozinho. Isso a encheu de raiva o suficiente, para querer acabar com ele. Iria mostrar para si como podia ser perigosa.

Correu em sua direção com o punho erguido, pronta para acerta-lhe o rosto, mas Junmyeon desviou no último segundo, quase revirou os olhos quando segurou o seu braço e a jogou de encontro ao chão. Tão forte e repentino que a alfa gritou, e gritou ainda mais quando ele dobrou o seu braço até o meio da costa, torcendo o músculo e fazendo-a pensar que o outro o quebraria.

— É assim que pretende ser líder dessa Alcateia? Caindo no primeiro golpe? — provocou, então soltou-lhe o braço e deu um passo para trás.

À sua volta, haviam uma pequena roda de outros Kim’s, todos torcendo por seu favorito, que não era Junmeyon. Estavam torcendo pela garota, admirados demais com sua audácia em desafiar o líder para realmente prestar atenção no que acontecia, pois era bem óbvio que o alfa estava brincando com a garota. Jongdae, encostado na entrada da Sede encarava a cena de braços cruzados, a boca se enrugando no canto em desagrado pelo modo como a garota alfa se deixava ser irritada tão fácil. Ela deveria lutar com toda a sua força e fazer Junmyeon mostrar do que era capaz, porque Jongdae só a tinha manipulado até ali porque precisava avaliar a técnica de luta do Kim.

Sooyoung rolou no chão e ficou de pé novamente, seus olhos estavam escuros quando encontraram os de Junmeyon. Jongdae viu quando o alfa fechou a mão em punho e esperou que ela viesse novamente, era interessante olhá-lo lutar, sempre esperando pelo primeiro passo do seu oponente para poder dar o seu. Era o tipo de coisa irritante, que o alfa odiava em toda a Alcateia Kim. Quer dizer, entendia que eles eram lobos de defesa e não de ataque, como os Byun’s, mas a passividade que eles adquiriam em lutas, sempre o fazia pensar como era irritante vê-los esperar o primeiro passo, em vez de dar.

Mas naquele momento, enquanto a garota corria em direção ao alfa líder, Jongdae realmente pensou que ele recuaria pelo modo como posicionou o pé atrás de si. No entanto, deixou que a garota viesse e pulasse sobre seu corpo, o derrubasse no chão e acertasse um soco no seu queixo. Desencostou-se da entrada da Sede e deu um passo em direção ao duelo, louco de curiosidade para saber se ela derrotaria mesmo Kim Junmeyon. Só que no minuto seguinte, o alfa segurava os braços da garota e girava com ela, de modo que pudesse ficar por cima. Jongdae viu as presas dele despontarem e antes mesmo de acontecer, sabia que fincaria os dentes no pescoço da garota.

Junmyeon mordeu-a com tamanha força, que imediatamente sentiu o gosto de sangue na língua. Então trouxe a cabeça para trás, muito rápido, puxou, levando consigo um pedaço da carne da garota. Sooyoung gritou, levou a mão até o pescoço, mas havia sangue demais para que ela pudesse conter, mesmo que usasse as duas palmas. O alfa se ergueu acima dela, cuspindo o pedaço de carne para longe e a observou morrer bem diante dos seus olhos. Ergueu a mão e limpou o sangue dos seus lábios, manchando a bochecha no processo, virou-se para os lobos ali e os viu darem um passo para trás. Estavam assustados com o modo como Junmyeon havia a derrotado em menos de quinze minutos de luta. Abaixaram a cabeça e logo estavam se pondo de joelhos, reconhecendo que o Kim era o lobo mais forte entre eles e que merecia estar no cargo mais alto.

— Alguém mais quer duelar?  — perguntou sarcástico e Jongdae meio sorriu onde estava, não tinha conhecimento dessa faceta do alfa.

Ninguém se manifestou, apenas se colocaram de pé, sem olhá-lo e deram mais um passo para trás, afim de deixa-lo passar. Não olhou para trás, estava irritado demais por ter perdido tempo com aquela garota e com aqueles lobos que a estavam apoiando, agindo como se ele não fosse nada importante. Mas tinha que voltar para casa e ajudar seu pai, porque sabia muito bem como Kim Heechul ia resistir a presença de Leeteuk ali, então tratou de se acalmar devagar.

— Devo dizer, que acabou com ela mais cedo do que eu esperava. — Jongdae confessou, surgindo ao seu lado como se nunca tivesse saído dali, o fitou de canto de olho, sem parar os seus passos.

Às vezes, ficava pensando no que seu pai Heechul dizia, sobre como Jongdae era estranho. Contudo, não achava realmente sentido quando o mesmo era sempre tão receptivo consigo. Eles conversavam sobre muitas coisas, até mesmo saiam juntos para beber. E Jongdae podia ser facilmente encontrado em sua casa, durante as refeições porque Ryeowook adorava a sua companhia gentil e calorosa, assim como os outros lobos da alcateia. Todos pareciam ter um grande apreço por aquele alfa que veio de longe atrás de alguma coisa que Junmyeon não sabia, e não era porque nunca havia perguntado. Era apenas que Jongdae sempre dava um jeito de desviar o assunto. Talvez, fosse isso que irritasse tanto Heechul ao ponto dele ter avisado o filho para se manter sempre com um pé atrás com esse alfa de sorriso fácil.

— Ela era inexperiente. — disse enquanto voltava a olhar pra frente. — Tire o corpo de lá, sepulte-a no cemitério dos lobos.

— Mas Junmeyon, ela é uma traidora. — Jongdae argumentou, afinal um lobo que desafiava o seu líder era considerado um traidor e por isso deveria ser sepultado longe da alcateia, como um ninguém.

— Era só uma garota confusa. — ditou. — Faça o que mandei.

Jongdae engoliu em seco, odiava ser sempre o subordinado. Não servia pra isso. O sangue que corria em suas veias servia para mostrar que estava muito acima de Junmeyon. No entanto, mordeu o lábio e parou de andar. O líder olhou na sua direção, como se não entendesse porque o outro estava agindo daquela maneira, e realmente não entendia.

— É contra as regras. — Jongdae continuou.

O Kim deu um passo em direção ao outro alfa, olhou-o de cima abaixo e disse, na sua voz profunda de alfa: 

— Está indo contra uma ordem do seu líder? — Jongdae fechou as mãos em punho, era mais velho que o outro, merecia respeito, mas Junmyeonera o líder, tinha mais autoridade. — Faça. — mandou, por fim, quando o amigo não respondeu mais nada.

Tornou a se afastar, o gosto metálico de sangue ainda estava em sua boca e o seu interior vibrava em irritação. Já tinha problemas demais para resolver, não queria ter que lidar com o choro de uma família que não sabia o que se passava na cabeça da própria filha. Não olhou para trás, deixou que o outro Kim decidisse por si mesmo se o obedeceria ou levaria uma reprimenda depois, porque Junmyeon podia muito bem encontrar outra pessoa para ser responsável pela segurança da Alcateia, haviam lobos capacitados o suficiente para substituir Kim Jongdae, se ele começasse a ter um ataque de estrelismo apenas porque Junmyeon havia lhe dado algumas liberdades, indicando para si que seu pai tinha um ponto de verdade no que dizia sobre o outro.

Continuou caminhando até que avistou as luzes da sua casa acesas. Isso significava que Ryeowook havia conseguindo trazer Leeteuk? Correu para dentro da casa, entrando abruptamente e chamando pelos pais. Mas quando não houve resposta, Junmyeon sentiu o peito pesar. Então correu em direção ao quarto dos pais ômegas, abriu a porta em um supetão apenas para encontrar Kim Heechul sentado no meio da cama, com Leeteuk em pé a sua frente. Ryeowook estava parado, perto da janela. Não olhava para nenhum dos dois, mas olhou para Junmyeon quando o escutou entrar.

— Pai.  — disse, meio arfando, foi em direção ao ômega, ignorando por completo a presença do alfa mais velho.

Leeteuk abaixou os olhos, entendia perfeitamente porque o filho já não olhava na sua direção, mas não conseguia evitar a dor que sempre aparecia no seu peito quando via Junmyeon pela vila e não podia se aproximar, sem receber aquele olhar de “você é a pior pessoa do mundo”. Por isso, preferia se manter longe, seja do filho ou dos maridos. Ryeowook, que parecia o mais machucado, nem ao menos olhava na sua direção e Heechul, com quem compartilhava um vínculo, só o evitava o máximo possível. Era estranho, porque algum tempo atrás eles eram uma família, se amavam. Agora, eles estavam brincando de pique-esconde entre si. No entanto, Ryeowook o havia encontrado, havia ido atrás de si, não porquê queria, mas sim, porque Heechul precisava de si.

O ômega estava morrendo, ele sabia, porque estava também. Cada dia sua memória estava mais confusa, além dos espasmos que tinha nas mãos. Em algum momento, havia dor no seu estômago, que o fazia vomitar sangue. Jongdae, o garoto alfa que cuidava da segurança da Alcateia, costumava ir até sua casa e ajuda-lo com alguns afazeres. Mas era apenas ele, mais ninguém. Leeteuk estava totalmente esquecido naquela velha casinha, onde tinha construído um lar com Heechul. E achou que continuaria assim se não fosse pelo modo abrupto que Ryeowook surgiu na sua casa, o cabelo bagunçado e os olhos brilhando naquele verde assustado, que já foi amoroso.

Heechul. Foi tudo o que disse, antes que Leeteuk começasse a acompanha-lo. Era uma necessidade, percebeu. Não o estavam procurando porque sentiram falta ou porque queriam conversar, estavam o procurando porque ele era o único que podia colocar a saúde de Heechul nos trilhos novamente. E Leeteuk não sabia se isso era bom ou ruim, mas preferiu pensar que estava tudo bem, pois ao menos podia ver as pessoas que amava novamente.

— Vamos deixá-los sozinhos. — era Ryeowook falando, fazendo-o sair dos seus pensamentos e levantar o rosto para observa-los indo embora, mesmo que Junmyeon tenha resistido por um milésimo de tempo.

Leeteuk os viu sair, fechar a porta silenciosamente e então desviou os olhos para Heechul, ainda sentado no meio da cama, o lençol cobria suas pernas e mesmo com a camisa de mangas compridas, o alfa sabia que sua pele estava cheia de hematomas escuros, do mesmo modo que havia na sua pele.

— Heenim. — tomou coragem para chamar, dessa vez usando a sua voz, em vez de pensamentos. Quase deu um passo em direção a cama, quase.

O ômega não se mexeu, continuou olhando para baixo. Estava tremendo levemente e o seu estômago estava se revirando em dor.

— Só vamos logo terminar com isso. — resolveu dizer, levantando o rosto devagar para fitar o ex-marido, os olhos castanhos estavam duros.

O alfa assentiu e se aproximou da cama, o trouxe pra perto, segurou-lhe o rosto devagar e o beijou. Era leve, era delicado, era o primeiro passo para que o lobo de Heechul entendesse que agora estava com seu parceiro e que não precisava mais ficar triste. A chuva começou lá fora, como se entendesse que aqueles dois precisavam ser lavados de seus pecados e quando Leeteuk se separou de Heechul, o mesmo tinha lágrimas nos olhos. Não era para ser desse jeito, não era assim que tinha imaginado, não era aquele alfa que deveria estar ali... Quis chorar, pela primeira vez em tanto tempo, mas não o fez. Afinal, era orgulhoso demais para fazê-lo na frente de alguém e Leeteuk sabia, por isso só o trouxe para perto em um abraço forte.

Havia sentido saudade. Uma saudade avassaladora, que fazia seu peito doer e seu lobo chorar todas as noites, mesmo que soubesse que o ômega não o queria ali. Nunca o quis, na verdade. Sempre soube que o ômega nutria um amor não correspondido por seu irmão mais velho, Kyuhyun, assim como sempre soube que nunca seria amado da mesma forma. Mas ele mesmo não podia reclamar sobre isso quando também não havia sido capaz de amar Heechul mais do que amou aquela pessoa. Eles dois estavam no mesmo barco, no fim das contas. No entanto, seus lobos tinham se apaixonado. Seus lobos os tinham manipulado até ali, até aquele breve momento em que Leeteuk percebia que não importava quantas vidas vivesse ou quanto pudesse voltar no passado, nunca amaria Heechul do jeito certo.

Mas mesmo que não pudesse fazer isso, não iria embora mais, mesmo que ele o expulsasse, não se afastaria. Eles compartilhavam um vínculo agora, precisavam ficar juntos se quisesse sobreviver e Leeteuk nunca quis viver tanto quanto naquele momento, porque queria ficar bem para que Heechul ficasse bem. Então, enquanto a chuva molhava o vidro da janela e se derramava por toda a vila Kim, o alfa se encorajava a continuar ali.

***

— Senhor, devemos entrar agora? — um dos seus guardas perguntou, mas Yesung, sentado no banco do motorista apenas se limitou a recarregar a pistola em sua mão.

— Vamos apenas esperar que o líder apareça. — o humano disse calmamente. — Não vê como eles estão desorganizados? Isso nos mostra que o líder não está entre eles ainda.

O garoto, ao seu lado, olhou através do vidro da janela do carro onde eles estavam. Quietos, como era de se esperar do seu pelotão. Agiam desse modo silencioso, sempre observando de longe e reunindo informações sobre seu oponente antes de atacar, mas mesmo quando o ataque vinha, era tão lento, que a vítima não percebia até estar totalmente imersa. No entanto, com aqueles lobos era diferente. Precisavam ser mais cuidadosos, afinal não queriam que tudo fosse por água abaixo como aconteceu na América do Sul. E foi pensando justamente nisso que Yesung teve coragem de separar sua equipe em duas: os peões e as peças raras. Ele fazia parte desse segundo, justamente por ser o líder, enquanto que os primeiros eram apenas os estagiários.

Era uma pena ter que usá-los dessa maneira, mas o Chefe sabia o que fazia. E afinal, o que seria da ciência sem alguns sacrifícios, não é?

— Vocês sabem o que devemos fazer, não é? — perguntou aos outros que estavam no carro. Os viu assentir através do espelho retrovisor. — Então não esqueçam das suas balas de prata e não atirem para matar, precisamos de um espécime vivo.

Todos assentiram mais uma vez ao passo que o homem observava o caos se instaurando lá fora. Era até bonito de se ver, lhe trazia lembranças amargas. Por um milésimo de segundo se viu novamente com sete anos de idade, enquanto via seus pais serem mortos por um daqueles monstros de três metros de altura. Mas hoje, era a vez deles de perecer.

— Senhor? — foi tirado dos seus pensamentos, olhou para trás, procurando a voz de quem o tinha chamado. — O líder do setor 07. — então estendeu na sua direção um walk talk.

— Diga. — falou aproximando o aparelho da boca.

Nós o avistamos. O líder deles acabou de entrar em cena. — Shin Donghee, o líder do setor 07, avisou, a voz quase exultante como se tivesse acertado os números da loteria. — Devo mandar meus homens?

— Não. — Yesung ditou. — Deixe-me ir ao seu encontro. — não era um pedido.

Como o senhor quiser. — o outro concordou mesmo assim.

Então a ligação foi encerrada. O Chefe devolveu o aparelho ao seu soldado e abriu a porta do carro. Agora era a hora, ele sabia. Se conseguisse pegar o líder, teria a alcateia inteira a seu favor.

— Me sigam. — disse ao seu pelotão antes de sair do carro.

Estava na hora de caçar alguns lobos.

***

Lu Han respirou fundo, fechou os olhos por um momento e capturou todos os cheiros possíveis. Encontrou o de Jongin, depois o de Henry e só então sentiu aquela mistura de colônia e suor, que fazia seu nariz formigar. Firmou Yixing em seus braços, já que estava fora de cogitação deixa-lo quando sabia que a criança denunciaria sua localização ao chorar.

— Precisa ficar bem quietinho, tudo bem? — sussurrou para o pequeno lobo e este assentiu enquanto enfiava o rosto na curva do seu pescoço.

Sentia-se melhor quando estava nos braços do pai, pois sabia que o mais velho o protegeria a todo custo além de que seu cheiro familiar era capaz de acalmar seu estômago se revirando em medo. Yixing nunca havia sentindo tanto medo quanto naquele momento, nem mesmo os monstros que viviam embaixo da sua cama ou dentro do armário o faziam sentir tanto medo.

Percebeu quando o pai olhou para trás, estava verificando Jongin, que trazia Henry em suas costas. Encostou-se na parede novamente, tentando pensar em como pegaria a rota de fuga quando tudo estava um caos e quando não podia mirar muito bem com Yixing nos braços. Virou-se novamente para fitar o irmão:

— Você vai na frente. — demandou e os olhos de Jongin esbugalharam-se. — Eu te dou cobertura.

Jongin mordeu o lábio enquanto sentia Henry pesar nas suas costas, o ômega já estava quase sem forças por causa de todo o sangue que estava perdendo. Por ser um ômega marcado, ele não tinha mais as defesas biológicas que outros lobos tinham, pois se tornava dependente do parceiro pra isso. Só que Henry não tinha um parceiro, era por isso que deviam se apressar com os cuidados para com ele. Contudo, mesmo que soubesse disso tudo não queria ter que deixar Lu Han para trás assim, ainda mais com o pequeno Yixing nos braços.

— Lugie. — chamou, como que implorando para o irmão pensar em outro modo.

— Vocês precisam pegar a rota de fuga, quando conseguirem sair da Alcateia, peçam ajuda à Minseok. Está entendido? — ignorou o olhar triste do irmão.

O ômega mais novo assentiu, abaixando o rosto porque sabia que não havia escolha. Não podia deixar Henry morrer apenas por teimosia.

— Eu te encontro lá fora. — o líder Lu prometeu, mas mesmo quando Jongin assentiu, ele sabia que era mentira.

Contudo, respirou fundo e fez o que irmão mandou. Pegaria o a rota de fuga da Alcateia e chamaria Minseok, afinal o Kim era a única esperança de que os Lu’s ficassem bem, incluindo Yixing e Lu Han. Jongin correu para fora do pequeno prédio, onde o escritório do irmão ficava. Não olhou para os lados ou para trás, enquanto que na janela do primeiro andar, Lu Han lhe dava cobertura suficiente para chegar até a pequena creche. De lá, ele sabia que o ômega não poderia mais o proteger e foi por isso, que reunindo todas as suas forças, Henry sacou sua arma e protegeu Jongin.

— Agora somos eu e você. — Lu Han confessou ao filho.

— Nini volta? — o pequeno lhe perguntou, os olhos puxados lagrimosos quando encontraram os do pai.

— Vai sim. — Lu Han beijou-lhe a testa. — Nós vamos encontra-los logo. — voltou a abraçar o filho, guardando o seu cheiro na memória, enquanto pedia a Grande Mãe Lua que os protegesse.

Saiu de frente da janela e encostou-se na parede ao lado, respirando fundo e colocando suas emoções em controle. Não podia simplesmente desmoronar agora. Tinha que proteger seu filhote e acima disso, precisava descer e lutar com seus lobos, pois pelo que tinha visto ali de cima, tudo estava um grande caos. Algumas casas pegavam fogo e havia tantos humanos, vestidos de preto com um emblema em vermelho bordado sobre o peito. Era uma Organização, Lu Han reconhecia uma operação de longe e aqueles humanos, se moviam de um jeito organizado demais para ser só um ataque aleatório de policiais afim de destruir uma favela — não era incomum esse tipo de operação. Contudo, ali, aqueles humanos, tinham um objetivo traçado, tinham plena consciência do que eles eram.

Colocou Yixing no chão e logo o filho estava agarrando-se à sua perna, chamando por si, pedindo colo na sua linguagem de criança. Mas Lu Han o ignorou quanto recarregava sua arma. Ele precisava colocar Yixing em um lugar seguro, não podia lutar com uma criança nos braços.

— Escuta. — abaixou-se na altura do filho, de joelhos contra o piso gelado, segurou-o pelos ombros. — Quer jogar um jogo com o papai? — o filho fungou antes de abrir os braços e tentar agarrar-se contra o pescoço dele, mas o chinês o afastou. — Vai ser divertido, Yixing.

Baba. — ele chorou, os braços tentando se estender na direção do pai.

— Vamos brincar de pique-esconde, ok? — Lu Han tentou mais um pouco, usando seu tom suave. — Papai vai te esconder, então você tem que ficar bem quietinho. — deixou que o filho o abraçasse e o pegou no colo novamente. — Você precisa ficar bem quietinho, senão não ganharemos o jogo e o papai fica triste. Não quer ver o papai triste, né?  — Yixing soltou seu pescoço e o fitou, os olhos estavam sérios agora. A criança amava o pai o suficiente para não querer vê-lo triste.

Tisti?

Lu Han assentiu ao passo que o chinesinho deitava a cabeça sobre seu ombro. Começou a andar em direção a saída do cômodo. Havia um lugar em que ele sabia que podia esconder Yixing. Seguiu, silenciosamente, até a sala de almoxarifado. Empurrou a estante de materiais e procurou o pequeno armário, que eles tinham fechado algum tempo atrás, quando esse lugar não passava de uma cozinha abandonada. Colocou Yixing ali dentro, sentado, as costas contra o fundo do armário. Fez um sinal de silêncio para o filho e Yixing repetiu, os olhos pequenos cintilaram em violeta, deixando claro para Lu Han qual era o sangue que corria em suas veias. Então, o mais velho estendeu o dedo mindinho na direção do filho. Era uma promessa. Voltaria para busca-lo. Yixing estendeu o seu e enlaçou o do pai.

O líder mordeu o lábio, seu peito doía tanto por ter que deixar o filho para trás assim. Mas sabia que não tinha escolha, precisava lutar ao lado dos seus lobos, precisava guia-los. Desfez o enlaçar de dedos e fechou o armário, voltou a colocar a estante na frente e então, depois que fechou a porta, sacou sua arma e saiu daquele prédio.  

Lá fora estava um caos. Avistou alguns dos seus em forma de lobo. Erguiam-se sobre os humanos e os estraçalhavam em uma mordida, os corpos retalhados jogados no chão. Mas também havia pessoas da sua alcateia ali, mortas. Deitadas em sua forma humana, tiros como causa da morte. Reconheceu a garota que costumava tomar conta de Yixing, quando ele estava trabalhando demais e Jongin estava na cidade. Ela não passava de uma adolescente. Foi até o seu corpo e abaixou-se ali, fechou-lhe os olhos. Balbuciou uma pequena oração pra ela, mas antes que pudesse se pôr de pé novamente, alguém atirou em si. Conseguiu desviar no último segundo, se jogando para o lado.

Sacou sua arma e sem hesitar, acertou bem na testa do humano que se aproximava de si. Ficou de pé novamente, olhou em volta. Havia um lobo com problemas, não muito longe dali. Sem hesitar correu até lá, fez alguns disparos no caminho, acertando o humano até que ele caísse. Mas antes que pudesse dizer a mulher para correr, uma faca acertou-lhe o braço. Gritou de dor, enquanto se virava para trás, puxou a faca com a mão livre enquanto via o homem ajeitar o cabelo escuro, colocando-o atrás da orelha.

Jogou a faca no chão e engoliu a dor antes de correr em direção ao homem. Saltou sobre si, fazendo pressão com os pés no seu peito ao mesmo tempo que segurava-lhe a cabeça e girava, quebrando o pescoço. O corpo do homem caiu, levando-o junto consigo, rolou para o lado, ficando de peito para cima, observou por um breve momento o modo como o céu estava cheio de estrelas. Havia faíscas subindo para o céu, denunciando o fogo que consumia as residências dos seus lobos.

Está tudo destruído, pensou por tempo suficiente para um cano de arma encostar-se na sua testa. Ele fechou os olhos, se recriminando por não ter escutado-o se aproximar, contudo não seria pego tão fácil assim. Lu Han fora ensinado a nunca ser pego facilmente. Por isso, estendeu as mãos até os tornozelos do homem e os puxou, quando este caiu, subiu por cima do seu corpo e acertou-lhe um soco no rosto. Então pegou sua arma e atirou nele. Ficou de pé e avistou mais dois vindo na sua direção, atirou na perna do que vinha pela direita e o viu cair antes de virar-se para esquerda e atirar no outro, contudo o maldito jogou-se no chão, fazendo-o errar o tiro.

Porcaria.

Jogou a arma no chão e decidiu que estava na hora de parar de brincar. Correu na direção do outro, gritando como se assim pudesse lhe dar mais força e no último segundo transformou-se em lobo. Abocanhou-lhe a cabeça e separou-a do corpo, jogando em um canto qualquer. Sentia o gosto de sangue na língua, quando firmou as patas no chão e uivou. Alto. Forte. Raivoso.

Viu quando seus lobos transformaram-se e começaram a se organizar. Não era mais uma simulação, disse a si mesmo mentalmente. Estava na hora de mostrar à aqueles humanos que não deviam mexer com os Lu’s. Seus lobos correram na sua direção e formaram um tipo de roda à sua volta. Lu Han uivou mais uma vez, chamando todos que podia. Então, bateu as patas de trás no chão e os outros lobos repetiram o gesto, mostrando que o estavam escutando e que todos estavam ali. O líder inclinou-se minimamente nas patas da frente e latiu. Essa era a deixa para que os outros atacassem.

Eles haviam treinado isso milhares de vezes. Todos os tipos de ataques e simulações, seja em forma de lobo ou humana. E quando todos correram em direção ao seu oponente, Lu Han quase riu quando viu o pavor adornar a face dos homens vestidos de preto. No entanto, não havia como fugir. Nem nos melhores sonhos daqueles humanos, eles conseguiriam fugir de um ataque de um lobo com três metros de altura. Principalmente de Lu Han, que era uma montanha peluda acinzentada.

Se movia numa rapidez incrível para alguém tão grande. Segurava seus oponentes pelo meio, sacudindo até que escutasse todos os ossos quebrando sob seus dentes. Depois jogava o corpo e corria em direção a outro. Recebeu alguns tiros, mas por estar em sua forma de lobo, as balas não tinham tanto efeito em si, afinal não eram feitas do material certo. Havia apenas uma coisa no mundo que podia ferir lobos com bastante intensidade e pelo que Lu Han percebia, eles estavam despreparados no quesito ‘conhecer seu oponente’. No entanto, como se alguém estivesse lendo seus pensamentos, sentiu sua pata esquerda queimar.

Olhou para trás, um tanto assustado pela dor repentina e viu um homem vindo na sua direção. Haviam mais dois atrás de si, como que lhe dando cobertura, mas aquele homem... aquele homem vestido de preto, estava olhando diretamente para si. O cano da arma estava mirado na sua cabeça, Lu Han sentia. Ele andava calmamente, como se não lhe assustasse em nada os lobos lutando a sua volta. Atirou mais uma vez, fazendo o chinês desviar para o lado e arrancando um sorriso do outro. Lu Han olhou para sua pata e viu a mancha de sangue escuro no seu pelo, além da queimação na pele que aquilo causava.

Aquele homem não podia estar... usando prata, não é?

Mas o humano mirou mais uma vez em si, o canto da boca estava enrugado daquela forma sádica que fazia o líder perceber que aquele não era um humano qualquer. O jeito como ele andava em sua direção, a forma firme que segurava a arma, denunciava que ele era bem mais do que alguém mandado. Talvez, fosse o mandante, Lu Han cogitou antes de ver outra bala vindo em sua direção. Rolou para o lado, ainda em forma de lobo e irritou-se por estar sendo atacado, quando deveria estar atacando. Por isso sem hesitar, colocou-se de pé novamente, ignorou a dor na pata e correu na direção daquele homem.

Os outros dois que estavam à sua volta, atiraram em si, mas Lu Han ignorou o modo como as balas rasparam em sua pele. Pulou por sobre o homem, tentou morde-lhe, mas este segurou-lhe o pescoço, mantendo-o afastado. A arma tinha caído da sua mão, mas não se deixou abalar por isso, pois no minuto seguinte estava tentando puxar uma faca da bainha da manga do seu pulso, mas Lu Han sobre si, era bem mais forte. E conseguiu fincar os dentes no seu ombro, sacudiu ao passo que o homem gritava abaixo de si, no entanto antes que pudesse finaliza-lo, sentiu seu corpo ser empurrado para o lado. Foi tão repentino, tão forte, que tudo que Lu Han conseguiu fazer foi soltar o homem e se deixar ser esmagado por um carro.

Ele caiu contra o chão de terra, sentia suas patas dormentes e tudo começou a ficar embaçado. Tentou ficar de pé, mas ganiu quando notou o jeito estranho que sua pata esquerda estava. Havia quebrado-a. Então, acabou voltando a sua forma humana, achando que assim podia conseguir fugir ou lutar, mas estava tonto demais para ficar em pé. Levou a mão à cabeça quando percebia que estava sendo cercado por vários homens de preto, todos com armas apontadas para si. Olhou para o modo como sua mão estava manchada em vermelho, seus dedos tremeram. Não podia morrer, tinha que voltar para buscar Yixing. Afinal, tinha feito uma promessa.

No entanto, não tinha mais forças para ficar de pé. Havia batido a cabeça seriamente, porque tudo estava rodando e seu pé estava quebrado, e a bala de prata ainda na sua carne, estava fazendo-o perder muito sangue. Olhou em volta, mostrou-lhe os caninos afiados, numa tentativa de intimida-los, mas não teve efeito quando um dos homens mirou em si.

— Tenha bons sonhos. — falou e Lu Han não desviou o olhar.

Mas antes que o tiro do tranquilizante pudesse acontecer, um vulto caramelado surgiu de lugar nenhum. Segurou o homem pela cabeça e o sacudiu como se fosse feito de papel. Então outro vulto estava ao seu lado, manchado de preto e branco, fez questão de se ajoelhar nas patas da frente em direção a Lu Han enquanto a coisa caramelada estraçalhava os outros homens. O Lu entendeu o que era aquilo. Era o resgate, pensou. Jongin havia conseguido sair da Alcateia com Henry. Seu estômago se revirou em um sentimento que ele não conhecia enquanto se arrastava até o lobo malhado, subiu em suas costas e foi levado dali. Ainda olhou para trás, finalmente reconhecendo a figura violenta de Kim Minseok em sua forma de lobo. Era tão bonito lutando, que não pode se impedir de meio sorrir antes de desmaiar nas costas do outro lobo.

Acordou algum tempo depois, havia alguém em cima de si, com a ponta dos dedos tocando-lhe o pescoço. E por puro reflexo, ao não reconhecer o cheiro, segurou a mão da pessoa e dobrou o suficiente para escutar o grito da mesma.

— Quem é você? — perguntou, a voz saindo firme e os olhos brilhando no tom de violeta mais bonito que Baekhyun, não muito longe dali, viu.

— Somos a Alcateia Byun. — ele mesmo respondeu. — Solte-o. — mandou, a voz de alfa se destacando no seu timbre e fazendo Lu Han afrouxar o aperto.

A pessoa se afastou, segurando a mão e lançando um olhar raivoso na direção do ômega líder ao passo que Baekhyun se aproximava, devagar, como se estivesse com medo que o Lu fosse saltar sobre si a qualquer momento. O ômega ergueu a sobrancelha, os lábios estavam crispados afim de mostrar-lhe que não gostava daquela situação mais do que o alfa.

— Minseok disse que você é o líder. — Baekhyun expos e foi então que o Lu o reconheceu das fotos que sempre saiam nos jornais e revistas.

A Família Byun era muito conhecida por sua fortuna em meio aos humanos. Aquele era Baekhyun, o líder da Alcateia Byun e marido de Kim Minseok.

— E você é o líder dos Byun’s. — falou e olhou para o seu braço, encontrando uma agulha de soro enfiada ali. Suspirou antes de arranca-la de si.

— Não faça isso. — o alfa quase pediu. — Está machucado, precisa de repouso agora. Meus lobos estão colocando a situação sob controle, não precisa se preocupar mais. — assegurou, mas Lu Han estava sentando na maca e se preparando para ficar de pé. — Seu pé está quebrado, não pode sair por aí assim.

— Não estou pedindo permissão. — rebateu sem levantar o rosto, mas no momento em que encostou os pés no chão, caiu.

Baekhyun suspirou onde estava, passou a mão no cabelo. Não sabia como lidar com esse lobo teimoso. Quer dizer, entendia a necessidade dele de estar junto da sua alcateia em um momento como aquele, mas o outro deveria ter noção de que não estava mais em condições de tal ato quando havia sido atingindo por um carro em alta velocidade. Mas na pouca luz daquela madrugada, Lu Han parecia sombrio para Baekhyun. O lábio estava cortado e havia um curativo malfeito no seu braço, onde uma faca lhe acertara e mesmo o pé quebrado, não servia para fazer Lu Han fraquejar, pois sua queda não entregou nenhum rastro de dor em seu rosto, na verdade, tudo que Baekhyun via era uma determinação impressionante.

— O que pretende com isso? — perguntou, nem ao menos sairá do seu lugar para ajudar o outro.

— Preciso encontrar meu filho. — deixou claro enquanto conseguia ficar de quatro no chão daquele pequeno acampamento armado pelos Byun’s na fronteira do território Lu.

— Não está em condições de ficar em pé, como pretende ir busca-lo? Apenas me diga onde está e posso ir eu mesmo lá.  — assegurou, mas o ômega balançou a cabeça em negação.

— Não está entendendo. — Lu Han disse e dessa vez, se apoiando na maca, conseguiu ficar de pé apenas em um pé. — Eu tenho que ir lá. — era uma promessa, completou mentalmente, eu fiz uma promessa.

Baekhyun o fitou, não sabia ao certo o que deveria dizer diante daquilo, pois era óbvio que Lu Han estava sendo guiado pelo instinto primitivo de ômega, aquele instinto que o obrigava a ir atrás do filhote até no inferno, se pudesse. Cruzou os braços e ergueu uma sobrancelha, avaliando a situação. Então desviou os olhos dele e observou a situação fora daquele pequeno acampamento.

O caos ainda estava acontecendo, seus lobos ainda estavam batalhando. E em meio a massa esbranquiçada dos seus, encontrou a pelagem caramelada de Kim Minseok. Correndo tão rápido entre os outros, destruindo corpos humanos com uma mordida. Lutava tão violentamente que Baekhyun se perguntou onde aprendera aqueles golpes, porque era óbvio que aquilo era mais do que só autodefesa. Aquilo era treinamento de ponta, mas mesmo ao constatar isso não podia evitar a ponta de irritação que surgia em si todas as vezes que se dava conta de que o outro estava se expondo ao perigo. Então, voltou a olhar para o líder ômega, descruzou os braços e foi até si. Virou-se de costas e se apoiou nos joelhos.

— Suba em minhas costas, eu te levo até seu filhote. — disse.

Lu Han esboçou um sorriso que Baekhyun nunca veria, antes de subir nas costas dele e se deixar levar. Baekhyun solicitou alguns lobos para o acompanharem, lhe darem cobertura. Mas como, o próprio líder Byun tinha deixado claro, a situação já estava praticamente controlada quando eles conseguiram chegar bem até o pequeno prédio onde Lu Han escondera Yixing. Baekhyun deixou os guardas na porta do lugar e encontrou com Lu Han, o levou até o local indicado e depois de ajuda-lo a empurrar a estante, esperou, encostado na porta, que o ômega pegasse seu filhote.

Ele viu, surpreso quando um garotinho saiu de dentro de um armário de trás da estante e se agarrou ao pescoço do pai. Era uma cena até bonita, se a criança não tivesse franzido o nariz na sua direção quando o notou ali, antes de tentar se esconder no colo do ômega. Baekhyun acreditou que a reação da criança fosse por causa do modo como ele era um desconhecido, mas quando Lu Han lhe confessou que Yixing nunca tinha visto um alfa até aquele dia, Baekhyun entendeu que o garotinho só estava se sentindo intimidado pelo cheiro que este exalava.

— Levem-os até o acampamento. — disse aos seus lobos, depois que conseguiu ajeita-los na costa de um dos guardas. — Cuidem para que fiquem seguros.

Os lobos assentiram antes de se afastarem, Lu Han ainda o observou mas não disse coisa alguma, estava preocupado demais em tentar acalmar Yixing, que estava assustado com o tanto de alfas no lugar. Eram cheiros fortes demais para assimilar quando a criança estava sendo criada em volta de tantos ômegas e betas, os únicos cheiros que conhecia eram os adocicados de ômegas. De repente, sentir o cheiro e ver pessoas estranhas, estava o assustando.

Baekhyun olhou em volta, atrás do marido. Não tentou entrar em nenhuma luta, já tinha feito o suficiente desde que chegara, contudo, mesmo que devesse estar cuidando dos seus lobos quando tudo parecia no fim, não conseguia simplesmente ir enquanto o outro estava no meio daquele caos. Tinha mantê-lo perto, pois se algo acontecesse com o loiro, sabia muito bem como seria punido por isso. Seu pai tinha deixado isso bem claro para si depois da cerimônia de casamento. Minseok é responsabilidade sua. Ou seja, mantenha-o seguro, para evitar conflitos futuros com os Kim’s. Por isso, quando o avistou, lutando como um demônio contra uma dupla de homens, Baekhyun não pôde evitar ir em sua direção. Transformando-se em lobo no processo e fazendo questão de pegar um dos oponentes pelo meio, mordendo com força e sacudindo o corpo até que se tornasse inanimado.

Sentiu-o se quebrar sob seus dentes enquanto o grito se esmaecia, ao mesmo tempo que via Minseok acertar um chute no rosto do outro, fazendo-o cair no chão. O ômega subiu sobre seu corpo e acertou repetidos socos no seu rosto até que desmaiasse, só então segurou sua cabeça e girou, deixando que Baekhyun escutasse o som de osso quebrando, o som que decretava a morte. Soltou o corpo do homem e encostou o focinho no topo da cabeça do marido, Minseok levantou o rosto e enlaçou seu pescoço com os braços, num abraço desajeitado antes de montar em suas costas.

— Está terminado. — falou e Baekhyun já sabia. — Peça para seus lobos se organizarem.

O Byun uivou, chamando todos para perto, e por telepatia, demandou as ordens. Deveriam dividir-se em dois grupos, um reuniria os humanos sobreviventes para um interrogatório na Alcateia Byun e o outro, levaria os lobos sobreviventes da Alcateia Lu para o território Byun. O lugar era grande o suficiente para abriga-los por um tempo, tempo suficiente para que Baekhyun entendesse o que diabos tinha acontecido ali. Depois disso, ele começou a se afastar com Minseok ainda sobre suas costas. O levou em direção ao local onde tinham deixado seu carro, o Kim desceu das suas costas quando chegaram perto e procurou no porta-malas roupas para o marido e para si. Eles se vestiram, de costas um pro outro, como se nenhum se recordasse de já ter visto a nudez do outro.

— Deixe-me ver suas mãos. — Baekhyun pediu subitamente, surpreendendo Minseok, queria avaliar os estragos, afim de saber quanto escutaria quando chegasse em casa.

O ômega estendeu as mãos em sua direção, as segurou com uma delicadeza que não pertencia ao momento. A luz das chamas, que se esmaeciam aos poucos, alcançou os fios do cabelo do alfa, fazia-os parecer mais escuros e a sombra que se apossou do rosto, enquanto os olhos brilhavam naquele tom bonito de âmbar, quando fitava os punhos machucados do loiro, fez Minseok pensar que aquilo parecia algum tipo de sonho. Porque não parecia possível que eles tivessem lutado juntos naquela noite, sob aquelas estrelas tão brilhantes. Era surreal o suficiente para que o loiro quisesse deitar-se no asfalto gelado e pensar na reviravolta que a sua vida dera.

— Deveria ter ficado no carro, como mandei. — o Byun disse, quebrando o seu momento de contemplação, havia um tom de irritação na sua voz que incomodou Minseok o suficiente para que ele puxasse as mãos para longe do alfa.

— Eu não ia ficar aqui, parado, esperando. Meus amigos estavam em perigo. — rebateu.

— Mas não precisava se pôr em perigo também. — suspirou, irritado com a teimosia de Minseok em nunca escutá-lo. — Se você se machucasse, tem noção da reprimenda que eu levaria do seu líder e dos meus pais. — expos e isso foi o suficiente para que o loiro se irritasse de vez.

— Eu não sou uma donzela indefesa, não estou preso no alto de uma torre. Não preciso da sua ajuda. Se eu cair posso muito bem me levantar sozinho. — e fez menção de ir embora, mas Baekhyun segurou-lhe o braço, mostrando para si que ele ainda não havia terminado consigo. O loiro olhou para o modo como o alfa lhe segurava, os dedos finos fechados perigosamente no seu braço, tentou puxa-lo, mas Baekhyun sempre seria mais forte. — Então, por favor, me deixe em paz antes que eu quebre seu braço. — ditou com os dentes apertados, mas teve seu pedido ignorado quando Baekhyun o empurrou de encontro ao carro, fazendo suas costas se chocarem na superfície metálica.

— Acha que isso é brincadeira? — Baekhyun devolveu igualmente irritado. — Você não tem ideia da grande bagunça que seria se você morresse. Por que não pode se comportar como qualquer outro ômega e ficar onde seu alfa manda?!

— Você não é meu alfa. — rebateu ao mesmo tempo que tentava acertar o rosto de Baekhyun com a mão livre, mas teve seu movimento parado com uma rapidez que nem mesmo ele entendeu como aconteceu.

— Você é meu ômega, nada além disso. Então se comporte como tal. — estava segurando seus pulsos juntos, o aperto um tanto forte demais, fazendo-os doer. — É responsabilidade qualquer coisa que aconteça contigo. — soltou-lhe os pulsos e deu um passo para trás, o rosto denunciando como não estava no seu melhor humor.

Minseok o encarou, era teimoso demais para desviar o olhar assim. Ele não era feito de porcelana, não tinha nascido para ser subordinado de um alfa, não era por isso que havia se casado com Baekhyun. Estava aqui para salvar o irmão desse destino, estava aqui porque não queria que Kim’s e Byun’s se enfrentassem em uma guerra. Tinha deixado Sehun para trás por um bem maior, sabia disso. Mas naquele momento, quando a chuva começou, fraquinha, sobre eles dois, Minseok percebeu que no fim, não importava os seus motivos para ter vindo parar aqui, ele não passava de uma moeda de troca. Era só um ômega. Um ômega, que agora pertencia a Alcateia Byun e aquilo doía mil vezes mais do que a água descendo por suas feridas abertas.

Baekhyun afastou-se mais um pouco, deu a volta no carro e abriu a porta. O abandonou ali, enquanto se acomodava no banco do motorista. Ele socou o volante, com raiva demais para conseguir se conter. Não queria ter sido rude, mas o loiro sempre era capaz de tira-lo do sério tão rápido. Fechou os olhos e respirou fundo, então os abriu novamente e dessa vez abaixou o vidro da janela e colocou a cabeça para fora, chamou pelo loiro, mas quando não teve resposta, saiu do carro e quando não viu ali fora, não pôde deixar de se culpar por ter perdido o controle. Enquanto que, correndo como um maluco pelas ruas de Seul, Minseok foi a procura do único local no mundo inteiro que já o tinha o conhecido de verdade. Aquela única pessoa, que estava presa no seu passado e que parecia ser a única coisa que sobrou de um Minseok adolescente que sonhava em ser feliz.

No meio daquela chuva, com a roupa mais molhada que tudo a sua volta, Kim Minseok bateu à porta da casa de Kim Jongdae e pediu abrigo para algo que não entendia, assim como não entendeu porque atirou-se sobre o alfa e o beijou. Mas estava tão desesperado por alguma coisa, algum tipo de sinal que provasse que não era aquilo, que era mais importante do que parecia... que simplesmente se deixou cair nas garras do lobo.


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