Mirtilo escrita por OmegaKim


Capítulo 20
XVIII - O choro do lobo




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Baekhyun fora deixado em um tipo de quarto-cela, pois a decoração era aconchegante como em um quarto de hóspedes, mas as janelas gradeadas e a porta trancada, deixavam claro que aquele lugar não era tão aconchegante assim. As mãos ainda estavam algemadas e a coleira em volta do pescoço, com espinhos voltados para a sua pele, incomodava-lhe. Fazia-o erguer as mãos e puxar constantemente a coleira, afim de afastar um pouco os espinhos, que lhe pinicavam a pele.

Acabou soltando um suspiro depois de puxar a coleira pelo, que lhe parecia, a milésima vez naquela hora. Havia se cansado de tentar afrouxar aquela coleira, porque ele bem sabia que os sentinelas Kim’s tinham-na apertado de propósito em seu pescoço. Sentou-se na beira da cama, aproveitando para verificar o horário no seu relógio de pulso.

Já era quase meio-dia, o que explicava o sol forte entrando pela janela gradeada e o seu estômago se revirando em fome. Não tinha percebido que já havia passado tanto tempo desde que fora preso e não podia deixar de sentir-se surpreso, pelo modo como ninguém tinha vindo falar consigo até o momento. Porque desde que fora colocado naquele quarto-cela, não havia acontecido nenhum tipo de movimentação suspeita.

Será que os Kim’s eram mesmo tão calmos assim? Não lhe parecia que o líder Leeteuk ia agir assim quando seu filho caçula, tinha desaparecido, a não ser que ele não soubesse do sumiço de Kyungsoo e estivesse apenas focando na ideia de que Minseok estava colaborando com o lado inimigo — os Byun’s. Pensar isso, só fez Baekhyun chegar à conclusão de que alguém havia deletado seu encontro com Minseok, alguém que não sabia do real motivo do ômega estar ali consigo.

Soltou mais um suspiro, pensando em como tudo estava uma bagunça agora, pois o líder Kim provavelmente acreditava que o alfa estava tendo algum tipo de encontro romântico com o outro Kim, o que era mentira porque não dava para pensar em Minseok dessa maneira, ainda mais quando ele próprio estava prometido em casamento à alguém e quando o loiro estava prestes a subir no altar para selar sua união com Oh Sehun. Além de que Minseok sendo um Kim, dificultava qualquer coisa que eles poderiam ter no futuro.

Não que Baekhyun quisesse ter algo com o ômega, é claro.

Fechou os olhos, pensou em deitar um pouco e tirar um cochilo enquanto ninguém vinha para leva-lo ao interrogatório, pois ele bem sabia que isso ia acontecer em algum momento. No entanto, assim que tentou deitar-se, foi totalmente atrapalhado pela coleira. Não havia uma posição confortável com aquilo a pinicar a sua pele.

Decidiu por ficar sentado mesmo, deixando que seus pensamentos fossem embora para bem longe. Dessa vez estava pensando no pai e no modo como ele reagiria quando soubesse o que estava acontecendo. Podia muito bem imaginar Siwon praticamente espumando pela boca e vindo direto para o território Kim, para acabar com sua raça em vez das dos Kim’s. O que era bem irônico, pois ele não era o seu filho? Não merecia ser protegido? Mas Baekhyun entendia, apesar dos pormenores ruins que sempre pareciam regrar a sua relação com o pai. Não era sobre o alfa ama-lo menos ou não, era sobre ele ser um bom líder o tempo inteiro. Sobre como as leis politicas era mil vezes mais importante do que os sentimentos, porque eram essas leis que mantiam toda uma raça viva, já que para cada deslize cometido, era um prenuncio de guerra, se fosse levar em consideração o gênio dominante dos líderes dos diversos clãs. Era algo que vinha no sangue, transmitido através das gerações, gravado no DNA de cada lobo: o orgulho.

E parecia se intensificar em alfas, líderes, na verdade. Que tendiam a começar guerras em vez de voltar atrás em algo dito. Reconhecia que era assim, de vez em quando. Principalmente quando alguém contrariava alguma ordem sua ou quando iam contra a sua opinião, assim como reconhecia que havia puxado esse traço do pai alfa. No entanto, para cada vez que vira Siwon sendo um alfa orgulhoso, também o tinha visto erguer sua alcateia acima de muitos objetivos seus, do mesmo modo que o havia visto seguindo as leis as riscas e tentando manter tudo na “paz”.

Era cansativo e estressante cuidar de tantas pessoas, mas Baekhyun via o esforço do pai e ficava ansioso só de pensar em como se sairia no seu lugar quando chegasse a hora, porque dado as circunstancias, acreditava que seria um péssimo líder. Afinal, tinha acabado de ir contra tudo que o pai tinha lhe dito, todos os alertas. Mas mesmo quando pensava nisso e se culpava, não conseguia evitar suspirar aliviado por ser ele ali e não Chanyeol.

Por falar em Chanyeol, queria acreditar que o irmão estava bem junto de Kyungsoo, escondidos em algum lugar porque ficar ali, seria péssimo. E Baekhyun já estava péssimo o suficiente.

Olhou mais uma vez para o horário no seu relógio de pulso. Era um bom relógio, presente de natal do seu omma, Donghae. O doce e amoroso, Donghae. Que não podia ter emoções fortes por causa do bebê que carregava... Baekhyun só conseguia desejar que o pai ômega estivesse bem, que Siwon o tivesse poupado das notícias ruins quando elas chegassem, porque o jovem alfa sabia que era apenas uma questão de tempo para que elas realmente chegassem.

Soltou mais um suspiro, os olhos se fechando durante o ato e as mãos algemadas sendo levantadas, mais uma vez, até a coleira. Puxou o couro sem muita pressa, a pele do pescoço estava ardendo, indicando possíveis escoriações causadas pelos espinhos. Estava pensando no tempo que passaria usando camisas de gola alta depois que saísse dali, quando escutou passos se aproximando.

Abriu os olhos devagar, o interesse na pessoa que chegava até o seu quarto-cela não era muita. Estava cansado e com fome, o que só contribuía para que quisesse deitar e dormir por um tempo indeterminado, mas sabia que não podia fazê-lo. Não apenas por causa da coleira, que o impedia de deitar sem ser espetado no pescoço até a morte, mas também pelo modo como aquele lugar não era nenhum pouco confiável. Alguém podia muito bem o surpreender quando estivesse dormindo e faze-lhe mal de alguma forma.

Viu a maçaneta da porta girar e logo depois a mesma estava sendo aberta, deixando que o cheiro forte de alfa de Kim Jungsoo inundasse o cômodo. Sua áurea estava forte, indicando sua irritação. Baekhyun não pôde evitar encolher os ombros diante do outro, pois sendo mais velho tendia a ser mais ameaçador. O alfa mais velho teve coragem se sorrir minimamente com o desconforto do mais novo, o seu lobo sentia-se satisfeito em se mostrar mais forte do que o outro.

Baekhyun empurrou a ameaça implícita no cheiro do Kim para baixo e recompôs a sua postura. Era um Byun, no fim das contas. E um Byun não podia se deixar rebaixar por outro alfa, ainda mais um Kim.

O mais velho virou-se de costa para o Byun e trancou a porta, apenas para no segundo seguinte voltar-se para ele mais uma vez. Os olhos estavam brilhando em castanho-escuro, mostrando ao mais novo que Leeteuk estava a um ponto de deixar que o seu lobo tomasse conta de si. Sabia disso porque reconhecia o escuro dos seus olhos... Era o mesmo que havia nas írises de Kyungsoo quando muito irritado. E nas histórias que escutava desde criança, tinha aprendido a reconhecer as tonalidades dos olhos de alguns clãs.

Os Byun eram conhecidos pelo âmbar, que costumava estar presente em maioria dos lobos da alcateia. Ele mesmo tinha os olhos dessa cor do mesmo modo que o seu pai também o tinha. No entanto, Chanyeol não os tinha. O dele era o azul-claro como o do seu pai ômega, herança dos extintos Lee’s.

Os Park’s eram donos do prateado, a cor de luar bonita como se a própria Mãe Lua tivesse iluminado os seus olhos. Fazendo com que os Park’s se considerassem abençoados pela Grande Mãe e por isso fossem seus filhos preferidos, coisa que fazia Baekhyun acha-los terrivelmente idiotas. Mas não podia negar que os Park’s eram bem sortudos em muitas coisas, mas para cada coisa que tinham feito, haviam ganhado a sua punição quando a sua preciosa princesa fora sequestrada e depois tirada do seu clã através de um casamento forçado. Era o velho ditado se fazendo presente: para tudo há uma consequência.

E Baekhyun conseguia distinguir suas consequências agora. Havia compactuado com o inimigo, ajudado um prisioneiro a fugir e o pior de tudo, havia ultrapassado todos os avisos do pai. Conseguia ver cada uma dessas coisas estampadas no olhar do Kim.

A hora do interrogatório tinha chegado. 

Sustentou o olhar do líder, afim de mostrar de onde viera e que não sentia medo tão fácil. E como se tivesse zombando de si, o alfa sorriu enquanto cruzava os braços, então balançou a cabeça e olhou para o lado, os olhos escuros avaliando o quarto como se o reconhecesse. Baekhyun se deixou observar cada passo do alfa pelo quarto e depois cada gesto deste para com os objetos, parecia estar pensando em alguma coisa. O que não fazia sentido, porque se aquilo fosse mesmo um interrogatório, ele não deveria estar fazendo perguntas? Confrontando Baekhyun? Colocado-o contra a parede e tentando fazê-lo vomitar a verdade? Baekhyun já havia participado de sessões de interrogatórios o suficiente para saber qual era a rotina.

Siwon costumava leva-lo, quando mais novo, para assistir julgamentos no Conselho de Lobos, para fazê-lo aprender a formar opinião. O Byun lembrava do modo como o pai se inclinava na sua direção e perguntava o que estava achando, se achava certo ou errado e porquê. Lembrava-se de achar divertido debater sobre isso.

No entanto, agora que não estava mais na plateia e sim, na cadeira do réu. Não conseguia achar nem um pouco divertido, ainda mais quando nem ao menos sabia o que se passava do outro lado daquela porta. Poderia ele ser o primeiro a ser interrogado naquele dia ou Minseok já havia sido? Se o ômega fosse o primeiro, o que teria dito? Contado a verdade ou sustentado que eles dois estavam em um encontro romântico para proteger o irmão caçula? O que Baekhyun deveria dizer para que sua história batesse com a do loiro?

Sua cabeça estava fervilhando com essas questões e a presença passiva de Leeteuk, andando por aquele quarto como se não soubesse de onde vierá, só estava aumentando o seu nervosismo. Mas mesmo assim segurou a sua ansiedade em terminar com aquilo de uma vez e esperou. Era melhor a se fazer, no fim das contas.

— A primeira vez que te vi, você não passava de um pedacinho de gente nos braços daquele ômega... o Lee. — Leeteuk disse contra todas as expectativas do alfa mais novo.

Parado, em frente à janela gradeada e de costas para si, Baekhyun só conseguia fitar as costas do mais velho e enrugar a testa em confusão.

— Donghae. — se escutou dizer, a voz saindo rouca devido ao tempo de desuso e a falta de água, estava com a garganta seca.

— O que? — Leeteuk perguntou, virando o rosto de lado para observar a expressão do Byun.

— O nome do meu omma é Lee Donghae. — repetiu.

— Ah. — soltou sem muito interesse, voltando a fitar por entre as grades da janela.

Estava fazendo um belo dia lá fora, bem diferente da tempestade que estava se formando dentro de si.

— Seu omma... — balbuciou, como se estivesse provando as palavras e tentando saber que gosto tinham. — Não é isso que está no seu registro familiar.

Baekhyun engoliu em seco, sem saber onde o alfa queria chegar com aquela conversa. Claro que ele sabia o que estava escrito na sua certidão de nascimento. O nome da sua mãe estava lá, Park Jihyun, se destacando para quem quisesse ver assim como o nome do seu pai também estava junto de todos os seus dados, como o seu tipo sanguíneo e a que clã pertencia.

— Tem muita coisa que não está no meu registro. — se escutou rebater e não viu o sorrisinho que surgiu no canto da boca do alfa. — Mas por que de repente o senhor parece tão interessado? — deixou que a sua curiosidade viesse à tona, porque já tinha percebido que o alfa não estava ali para interroga-lo.

— Pareço? — virou-se para fita-lo, os olhos curiosos sobre o Byun como se ele fosse uma criança boba.

Não conseguia esconder, Leeteuk sabia. Estava terrivelmente excitado com a ideia de Byun Baekhyun estar ali. Finalmente na sua frente, a sós, depois de tantos anos que tinha lhe sido negado. Pois, sim, o alfa havia enviado muitos pedidos a Siwon para que o deixasse se aproximar de Baekhyun, que deixasse que ele tivesse uma conversa privada com o garoto. Mas Siwon nunca deixou, sempre o afastou de todas as formas que podia ao cercar o filho de guardas ou nunca deixa-lo sozinho durante reuniões do Conselho. No entanto, o destino havia dado um jeito de reuni-los. A Grande Mãe Lua era piedosa, no fim das contas, ao dar-lhe aquele momento com Byun Baekhyun depois de quase vinte e dois anos.

E fitando-o agora, de tão perto, Leeteuk não conseguia evitar procurar em seu rosto traços do irmão mais velho falecido. Não conseguia encontrar muita coisa. A forma do queixo, a pintinha no canto da boca e aquela na ponta do nariz, a forma dos lábios, a curvatura do pescoço, a forma das mãos... Nada, simplesmente nada batia com os traços do irmão que tinha gravado na mente. Baekhyun era tão diferente de Kyuhyun que doía no seu peito. Era como se alguém estivesse enfiando repetidas agulhas no seu coração para cada pedaço do irmão que não conseguia encontrar na imagem confusa de Byun Baekhyun.

Porém, para cada pontada de dor que sentia, reconhecia, como num sonho, a figura tímida e pequena de Jihyun. A tinha conhecido assim que casara com Siwon. Recordava-se da primeira vez que pôs os olhos nela.

Estava sentada à mesa principal, o vestido de noiva amassado no seu corpo magro e os olhos longe. Ela não queria estará ali tanto quanto Siwon, ele sabia. Assim como soube naquela noite que seu irmão mais velho estava totalmente perdido por aquela garota condenada. Eles eram destinados ou alguma besteira dessas, foi o que Kyuhyun lhe contou naquela noite apenas para que ele pedisse no segundo seguinte que se afastasse da garota.

— Você se parece com a sua mãe. — acabou externando.

Baekhyun desviou os olhos, fitou o chão do quarto. Não gostava de falar da mãe e também não gostava quando lhe comparavam à ela. Não porque a odiasse, não. Nada disso. Era apenas que doía demais falar de alguém que o tinha abandonado tão fácil.

Leeteuk notando o desconforto dele, simplesmente foi na sua direção e segurou-lhe o rosto, obrigando-o a olha-lo.

— Não se parece em nada com seu pai. — jogou as palavras no rosto do moreno, mas não se referia a Siwon.

Estava apenas tentando fazer a si mesmo acreditar nisso, porém tudo que conseguia era machucar Baekhyun de uma maneira que nem sequer podia imaginar. E foi por ser machucado dessa maneira, que o jovem alfa simplesmente rosnou para o outro e erguendo as mãos algemadas, empurrou-o. Leeteuk cambaleou para longe, confuso pelo ato do outro.

— Qual o seu problema? — Baekhyun rosnou na sua direção, a confusão se transformando em raiva.

— O meu problema? — Leeteuk rosnou de volta, a frustração tomando conta de si. — Eu vou te dizer qual é o meu problema. — tornou a se aproximar de si, segurando-lhe o rosto novamente e fazendo questão de deixar que suas garras despontassem e arranhassem o queixo do alfa Byun. — O meu problema é que você não é um Kim. — deixou que a verdade viesse de uma vez e fosse externada com toda a sua frustração. — Esse é o meu maldito problema! — soltou o rosto do garoto e se afastou.

Baekhyun encarou as costas do líder, sem ter a menor ideia do que estava acontecendo. Claro que ele não era um Kim. Seu pai era um Byun e sua mãe era uma Park, tudo que ele não seria era um Kim. Não fazia o menor sentido que o pai de Kyungsoo estivesse chegado nessa conclusão quando ela estava mais do que exposta em cada traço do seu DNA de lobo. Então tudo que Baekhyun podia pensar sobre isso era que o outro estava terrivelmente irritado com a ideia dele ter supostamente se envolvido com o seu filho ômega, o que de uma forma indireta comprovava a sua ideia de que Minseok havia sido interrogado primeiro e mantido a mentira que eles dois estavam em um encontro romântico, o que só podia significar que não haviam encontrado Chanyeol e Kyungsoo.

O jovem Byun quase suspirou aliviado por saber que seu irmão não tinha sido feito prisioneiro em algum quarto daquela casa. O Byun mais novo estava em algum lugar, seguro ao lado do caçula Kim.

— Se está falando isso por causa de Minseok... — começou a dizer sem ter certeza se esse era o melhor momento para dizer algo.

Escutar o nome do filho ômega o fez lembrar-se do real motivo de estar ali, naquele quarto. Tinha vindo atrás de explicações sobre o que estava acontecendo em Chenggyecheon.

— Minseok. — Leeteuk pronunciou o nome do filho como se fosse um insulto. — Meu filho, Minseok. — repetiu e Baekhyun engoliu as palavras que tinha na boca. — Um belo de um traidor. — e virou-se para fita-lo. — Vocês acharam mesmo que não iam ser pegos? Acreditou mesmo que podia se envolver com um dos meus filhos sem receber nenhuma punição? Você e aquele seu irmãozinho são dois idiotas se pensaram assim.

As palavras ditas pelo alfa apenas confirmaram o que estava pensando. Minseok havia mesmo dito que eles estavam em um encontro romântico, a mentira ainda estava sendo sustentada e cabia a ele manter assim.

— Eu não pensei. — se escutou confessar, porque realmente não tinha.

Byun Baekhyun só havia agido por impulso quando armou todo aquele plano, pois não aguentava mais ver o irmão tão triste, morrendo devagar tamanha a falta que sentia do seu ômega. Ele não podia imaginar como era esse tipo de dor, mas não achava bonito vê-la estampada no maior e por isso simplesmente não pensara quando fez tudo aquilo, quando arrastou Kim Minseok para esse mar de confusão que estavam metidos agora.

Leeteuk riu diante da resposta, reconhecendo na estupidez de Baekhyun a estupidez do irmão falecido. E constatar isso fez aquela luzinha de esperança surgir em seu ser. O alfa podia não ser parecido fisicamente com Kyuhyun, mas isso não queria dizer que ele não podia ser seu filho. Sabia que era um bobo por estar pensando assim, mas queria tanto acreditar que uma parte do irmão ainda estava viva por aí, porque perde-lo daquela maneira foi tão imensamente doloroso principalmente quando nunca teve o corpo do irmão para enterrar.

No entanto, acima disso tudo, havia outra coisa borbulhando em si, alcançando a superfície devagar. Era a certeza de que já havia visto aquela atitude antes assim como já tinha visto aqueles acontecimentos antes, porque de fato já tinha visto. Havia presenciado tudo aquilo há vinte anos atrás quando ele não passava do segundo na linha de sucessão, quando o seu melhor amigo havia acabado de casar e quando seu irmão mais velho tinha acabado de ser prometido a um ômega.

— E olhe no que isso deu. — e riu mais um pouco como se aquela fosse a maior piada do mundo ao passo que Baekhyun permanecia cada vez mais confuso com a atitude do outro. — Parece que regredimos no tempo. — expôs pensativo, se aproximando da saída. — E sabe qual é a melhor parte? Dessa vez eu não vou perder nada. — sorriu mais um pouco, mas o Byun encontrou a dor estampada ali.

Leeteuk se aproximou da porta e a destrancou, abriu-a e antes que pudesse sair, olhou novamente para o alfa sentado na beira da cama. Ele tinha o cabelo escuro bagunçado e o canto da boca estava manchado de sangue seco assim como o seu queixo, onde tinha segurado em sua raiva. Seus olhos brilharam em âmbar quando os fitou, deixando claro a que clã pertencia e fazendo Leeteuk cair em si, finalmente. Não havia chance alguma daquele garoto ser o filho do seu irmão morto, as datas nunca bateriam e por mais que ele tenha se forçado a acreditar no contrário, Siwon sempre lhe disse a verdade.

E agora enquanto o observava antes de sair daquela cela bem mobiliada, só conseguia ver a imagem de Jihyun estampada nele provando para si que estava tudo se repetindo. Vinte anos depois e tudo estava acontecendo novamente, era patético, era engraçado ao ponto de Leeteuk querer chorar, porque da primeira vez tinha perdido alguém importante e dessa vez... dessa vez, não perderia ninguém.

Quem perderia seria Siwon, pensou e voltou a olhar para frente, saiu do quarto e trancou a porta novamente dizendo a si mesmo que nunca mais deixaria Byun Siwon ver Byun Baekhyun.

***

— O que está dizendo?! — Siwon esbravejou diante do chefe de segurança, Kangin.

— A carta chegou hoje de manhã. — ele repetiu, calmo do jeito que sempre era.

Empurrou o papel dobrado com a ponta dos dedos em direção ao alfa líder, mas Siwon não estava olhando para o ato. Seus olhos acabaram sendo desviados para a figura curiosa, parada na soleira da porta, os olhos preocupados sobre o marido. Era Donghae, com uma bandeja na mão, o bule com chá recém-pronto fazendo cheiro de morango inundar o local.

Kangin notando que a atenção do alfa tinha sido desviada, olhou para onde o alfa estava fitando e encontrou o ômega principal ali. Curvou-se na sua direção, em sinal de respeito e cumprimento ao passo que Donghae apenas balançava a cabeça, mas os seus olhos estavam no marido. O alfa o fitava também, como se tivesse sido pego fazendo algo errado.

— Atrapalho? — perguntou entrando no escritório e deixando a bandeja sobre a mesa do alfa, seus olhos inquiridores sobre o marido.

Conseguia saber pela marca que alguma coisa estava muito errada e que por isso Siwon estava horrivelmente irritado.

— Não, senhor. — Kangin respondeu e viu quando Donghae começou a servi-los ao passo que via o estado desconfortável do líder e sabia muito bem porquê.

O beta tinha ouvido as recomendações do alfa, quando este o procurou dizendo que não deveria deixar ninguém incomodar Donghae com noticiais ruins, devido a gravidez do ômega. Eram recomendações medicas. Não podia ter emoções fortes, pois isso aumentava o risco de perder o filhote que carregava.

— Donghae, nos deixe sozinhos. — Siwon mandou sem olhar para o ômega, os olhos fitando com demasia uma das xicaras com chá a sua frente, que tinha lhe sido oferecida.

— O que está acontecendo? — o Lee perguntou em vez de obedecer, parando de encher uma outra xícara, essa para Kangin.  

Kangin desviou os olhos para o líder e Siwon não levantou o olhar para fitar o marido.

— Donghae, saia. Isso é um assunto privado. — tornou a falar.

O Lee olhou para o marido e depois para o beta então soltou um suspiro e simplesmente puxou uma das cadeiras que ficava de frente para a mesa do marido e sentou-se ali, deixando de lado as xícaras de chá por servir.

— Chanyeol e Baekhyun sumiram. O que está acontecendo? — repetiu a pergunta, desafiando o marido diante do beta.

Kangin quis sorrir, porque sempre tinha achado Donghae doce e inocente demais para ser o Ômega Principal, mas não era como se o Lee tivesse escolhido isso quando era o segundo esposo e a primeira tinha falecido. Ele simplesmente herdara o cargo porque não havia ninguém para fazê-lo além de si e porque todo alfa precisava de um Ômega Principal para ajudá-lo com o governo junto de um Beta Principal, cargo esse que pertencia a Kangin e que continuaria a pertencer quando Baekhyun assumisse a liderança. No entanto, mesmo com uma posição tão alta, Donghae sempre fora obediente demais ao marido alfa e nunca tinha uma opinião certa sobre certos assuntos. E Siwon sempre fizera questão de deixa-lo fora dos assuntos da alcateia.

Mas aqui estava o ômega, finalmente dando um sinal de que era um Ômega Principal quando exigia do marido que lhe contasse o que se passava na alcateia.

— Donghae...

— Por favor. — pediu, os olhos brilhando em azul na direção do marido e o alfa suspirou, desistindo de tentar poupar Donghae.

— Conte a ele, Kangin. — mandou o beta o fazer, não tinha coragem de dar uma notícia dessas para o marido.

— Fomos comunicados hoje, pela manhã, que o senhor Baekhyun e o senhor Chanyeol foram feitos prisioneiros pelos Kim’s sob acusação de terem sequestrado Kim Kyungsoo.

Donghae fitou o beta, os olhos muito grandes em espanto pelas palavras proferidas. Não podia acreditar no que estava escutando. Seus filhos não podiam estar presos, não mesmo. Tinha lhes dado boa noite na noite passada e havia dito a Chanyeol que ia ajuda-lo com Kyungsoo, que ia convencer o marido a aceita-los. Eles não podiam ter sido impulsivos dessa maneira. Não Baekhyun, que sempre fora muito pensativo. Ele teria parado o irmão, se Chanyeol tentasse seguir em frente... Não, não. Aquilo estava tudo errado.

Virou o rosto muito rápido na direção do alfa líder, atrás de alguma confirmação de que aquilo era mentira, mas a seriedade estampada nas orbes escuras de Siwon mostrara-lhe que não era. E constatar isso encheu o seu peito de uma urgência que apenas ele conseguia sentir, sabia que o alfa podia sentir o seu desconforto e ver o desespero estampado no seu rosto delicado, no entanto não podia saber o que se passava no seu peito. A dor estava ali, quente e densa como se alguém estivesse o sufocando com um pano molhado.

Ficou em pé muito rápido, empurrando a cadeira para trás, o som da madeira arrastando no chão incomodando os ouvidos de Kangin, as xicaras de porcelana balançando sobre a mesa quando se apoiou, afim de firmar os pés. Siwon se pôs de pé também, temendo um desmaio do ômega ou qualquer outro tipo de mal estar. Ergueu a mão e tentou toca-lhe o braço apoiado na mesa, mas Donghae se afastou como se o toque do marido queimasse, os olhos muito azuis quando encontraram o rosto do marido, deixando que este visse a tempestade que estava acontecendo dentro de si.

— Como? — virou-se para o beta mais uma vez, exigindo maiores detalhes do que aquilo que lhe fora dito.

Pois de alguma forma queria acreditar que era mentira, que nenhum dos dois tinha feito aquilo e que os Kim’s tinham armado para pegar os seus filhotes, do jeito que vinham ameaçando há anos. Porque Siwon podia acha-lo bobo e um tanto distraído com os assuntos da alcateia, mas o ômega tinha total conhecimento sobre o que Kim Jungsoo — líder Kim — queria com seu filhote mais velho, Baekhyun, e bem podia imaginar o que ele faria com Chanyeol.

— Não há mais nada na carta além disso, senhor. — Kangin respondeu e seus olhos castanhos alcançaram o pedaço de papel sobre a mesa do líder Byun.

Donghae seguiu o seu olhar e encontrou o papel, e com os dedos tremendo pegou-o. Sobre o olhar preocupado do marido alfa, ele leu o que estava ali. Não havia nada de diferente do que Kangin estava dizendo, as mesmas palavras escritas de uma maneira delicadamente fria como se a pessoa que escreveu aquilo estivesse feito tudo muito devagar, caprichando ao desenhar as letras apenas para prolongar o seu prazer em anunciar aquilo.

Eles tinham sido pegos, era o que estava escrito confirmando o que Kangin tinha dito. Eram prisioneiros. Baekhyun tinha sido pego primeiro. Encontraram Chanyeol depois junto de Kyungsoo. Diziam que era sequestro. Estão presos sob acusação de sequestro.

O Lee abaixou o papel, os olhos perdidos. Era mentira, tinha certeza. Kyungsoo não fora sequestrado, seus filhotes nunca fariam aquilo, mas ninguém perguntaria o que tinha acontecido ao Kim, porque era mais fácil aceitar a história do seu sequestro do que a da sua fuga. E foi constatar isso que fez o ômega amassar o papel, destruindo todas aquelas palavras formais, escondendo toda aquela mentira no interior da sua mão. Ele não soltou o papel, seus olhos não se encontraram com o marido nem com o do beta no escritório, simplesmente continuou segurando aquilo, em silêncio, sentia seus braços tremendo assim como o seu estômago e sabia que isso era fruto da grande raiva que sentia, fria, abraçando o seu corpo como uma velha amiga.

Nunca foi alguém de ter emoções a flor da pele. Quer dizer, sempre fora impulsivo com seus sentimentos. Sempre fizera o que lhe dava na cabeça, sem pensar muito se era certo ou não, coisa que serviu de herança para seu filhote biológico, Chanyeol. Mas não era algo que se orgulhasse. Orgulhava-se do modo como conseguia ser calmo, como conseguia se manter firme diante das emoções do marido, quase sempre violentas. No entanto, Siwon nunca o machucara. Nunca tocou em um fio de cabelo seu que não fosse de uma maneira carinhosa, porém, as vezes o marido ficava tão transtornado com algumas questões da alcateia que era na calmaria do coração do ômega que conseguia organizar os seus pensamentos.

Mas, ali, naquele momento quando era confrontado pela gravidade da situação em que seus filhos se encontravam e a injustiça por trás de todo aquele transtorno, não pôde evitar sentir tanta, mais tanta raiva que seria capaz de gritar muito alto apenas para aliviar aquele comichão ruim no peito.

Ninguém podia fazer uma coisa dessas. Acusar pessoas inocentes apenas porque não queria aceitar a verdade. Ninguém podia prender os seus filhotes dessa maneira como se eles fossem uns sem-nomes, pessoas comuns. Ninguém podia fazer isso, principalmente Leeteuk.

Maldito Kim, não conseguiu evitar pensar. Mordeu o lábio para não dizer em voz alta.

— Donghae? — Siwon chamou, meio incerto, preocupado pelo modo calado que ele tinha ficado depois de ler a carta.

Tão quieto e com os olhos transbordando em fúria, que havia deixado Siwon e até mesmo Kangin desconfortáveis, quase com medo. O alfa ergueu a mão mais uma vez, afim de tocar no braço do marido, queria passar um pouco de conforto, contudo mais uma vez, Donghae se afastou. Dessa vez deu passos em direção a saída, a mão direita ainda fechada com força, trancafiando as palavras de Leeteuk ali, levando-as consigo.

— Donghae. — Siwon chamou novamente, saindo de trás da mesa e encontrando os olhos confusos de Kangin no caminho até a saída, o beta vindo atrás de si querendo saber o que o ômega faria.

Observou por sobre o ombro do alfa líder, o Lee se afastando, correndo ao descer a escada e fazendo o Byun, arregalar os olhos em mais preocupação. Kangin sabia que ele amava aquele ômega sem classe nenhuma, sem sangue nobre, e amava mil vezes mais por ele estar esperando seu segundo filhote e terceiro filho do alfa. O instinto de proteção alfa que sempre estava ali, tinha se intensificado por isso e fazia-o querer proteger o outro acima de tudo, poupá-lo dos pormenores estressantes dessa vida injusta que era ser líder de uma alcateia inteira, afim de preservar a saúde do pequeno ser que o ômega carregava.

Mas Donghae parecia ter esquecido disso quando simplesmente desceu a escada correndo, apressado e com as duas mãos fechadas fazendo Kangin se perguntar em qual delas a carta estaria.

Siwon correu até o topo da escada apenas para no segundo seguinte descer correndo, quase com a mesma urgência do outro.

— Donghae! — levantou a voz, mas não teve efeito algum no ômega, pois este não parou o ato de correr até a porta e abri-la num rompante, saindo logo em seguida como se estivesse avido por ar puro.

Kangin, viu do alto da escada o líder da sua alcateia correr atrás do ômega saindo atrás dele depois de apanhar o seu casaco de lã grossa sobre o sofá, a porta ficou aberta, meio balançando indicando o tanto de espanto que ela própria sentia ao ver Lee Donghae — o amoroso e calmo, Donghae — muito, muito fora de si. Mas o beta sabia muito bem o que era isso. Era o velho instinto de ômega, o instinto que acompanhava todos os animais, até mesmo os tão evoluídos, humanos. Era o instinto de proteção para com seus filhotes, que obrigava qualquer omma lutar por seus filhos, ir até o inferno se fosse preciso para recuperar um dos seus. E alguém havia mexido com os filhotes de Lee Donghae, então agora só restava a essa pessoa que enfrentasse a fúria de um omma protetor.

O beta desejou que Leeteuk tivesse um bom plano de saúde, porque estava mais do que claro que aquele ômega ia quebra-lo inteiro.

***

Quando Leeteuk parou à sua frente, o rosto sério demais para alguém que tinha rugas de riso no canto dos olhos e já tinha-lhe contado histórias antes de dormir, Minseok sentiu medo. Era um tipo estranho de pavor que não deveria estar ali, sendo personificado na imagem do pai que tanto amava mas para cada vez que o alfa lhe lançava um olhar amargo, o Kim mais novo só conseguia ver o título de pai sendo cada vez mais enterrado dentro do alfa e deixando apenas o título de líder a mostra, deixando claro que apesar do laço sanguíneo que tinham, ele não era mais do que um líder de uma alcateia, encarregado de fazer o interrogatório de um traidor.

Traidor.

A palavra ainda soava estranha nos seus pensamentos e para cada vez que tentara dizer, quando trancado no seu quarto-cela, Minseok só engasgara com as letras como se elas queimassem seus lábios. Mas não havia como fugir dela agora, era a verdade. E nunca dava para fugir da verdade, no fim das contas. Pois tinha sido assim com a Organização da qual fizera parte e estava sendo assim com o pai, com a sua alcateia. Era um traidor nas duas ocasiões, mesmo que os motivos tenham tido seus fundamentos, no entanto era contra as regras e qualquer coisa contra as regras, era traição.

Traidor.

Era a palavra que transbordava dos olhos do seu pai, acertando o seu rosto a cada vez que era obrigado a encara-lo. Tentava desviar a todo momento, mas o alfa o estava obrigando a olhá-lo. “Olhe para o seu superior”, ele parecia dizer o tempo inteiro, quando segurava-o pelo queixo e forçava seus olhos a encontrarem os dele, apenas para no segundo seguinte, ele mesmo desviar como se a visão do filho ômega fosse demais para o seu coração de pai e líder.

— Então confirma que armou com Byun Baekhyun o sequestro do seu irmão? — Leeteuk perguntou, os olhos relampejando em negro sobre o loiro.

Minseok, reuniu a coragem que não tinha para encarar o pai atrás de algum sinal de que o que ele estava dizendo era mentira, uma brincadeira de mau-gosto para fazê-lo confessar o paradeiro do irmão mais novo. Mas o que encontrou no olhar do Kim mais velho, foi apenas a pura raiva. Ele não se importava de dizer aquele tipo de coisa, se importava apenas em humilha-lo mais um pouco ao mostrar a mentira que estava mantendo Baekhyun ali.

— Você o encontrou? — se empertigou em direção ao pai, o corpo indo para frente, avido por alguma informação do irmão. Ignorando de propósito a pergunta inicial do mesmo.

As mãos estavam presas, amarradas nos braços da cadeira, bem firmes com fitas e cordas grossas, os pulsos machucados de tanto que se mexia, desconfortável com a posição que foi deixado. Podia senti-los molhados, indicando que havia sangue ali além, de talvez, suor, o que explicaria a ardência na sua pele. Os olhos estavam arregalados, o avelã brilhando por trás do costumeiro castanho indicando todo seu desespero por informações de Kyungsoo.

Leeteuk percebeu, tinha total conhecimento do modo como os filhos eram ligados, melhores amigos e como aquela falta de informações estava acabando com os nervos do loiro. Se odiava por fazer isso com o filho, mas era necessário porque sempre seria mais fácil conseguir algo de alguém quando este estivesse desesperado, e Minseok estava à beira do desespero, apesar de se mostrar mais forte que qualquer um que ele já tenha visto.

— O encontrei na rodoviária, junto de Chanyeol. — acabou contando, as palavras saindo amargas da sua boca. — Separei os dois. — o loiro suspirou, tentando organizar as emoções ruins no seu peito, todas se acumulando e começando a incomodar. — Nunca mais vão se ver. — decretou e Minseok engoliu em seco. — Do mesmo jeito que você e aquele Byun.

O ômega abriu a boca levemente, segurando a língua no último segundo quando a vontade de negar se tornou forte demais. Ele não tinha coisa alguma com Baekhyun, aquele encontro não tinha sido romântico, havia sido apenas um encontro de negócios. Eles tinham se encontrado para armar o pequeno encontro do irmão gêmeo. Era apenas isso, mas Minseok não podia abrir a boca para negar ainda. Seus instintos gritavam que aquela era uma informação que podia usar, não para se libertar, mas para encontrar a pessoa que causara tudo aquilo.

— Não pode fazer esse tipo de coisa. — falou entre dentes, segurando o lábio inferior ali, logo em seguida, precisava se portar como um ômega sério. — Kyungsoo e Chanyeol...

— São traidores! — Leeteuk esbravejou com sua voz de alfa, fazendo o loiro encolher-se minimamente, era impossível não fazê-lo quando seu lobo sabia que era inferior ao outro.

O alfa líder passou a mão nos cabelos, puxando os fios enquanto ficava de costas para o filho. Tentando respirar fundo, não podia perder o controle justo com o filho, seus ômegas nunca o perdoariam se isso acontecesse.

Na cadeira, Minseok também fechou os olhos. Estava tão cansado daquilo tudo, daquele interrogatório, de olhar para a face do pai... Estava terrivelmente cansado, sua mente estava cansada e sabia disso porque nem ao menos sentia mais dor nos pulsos amarrados ou nos calcanhares, também, amarrados nos pés da cadeira. A coleira de espinhos em volta do pescoço, também não incomodava tanto assim, o que só fazia o sinal de alertar crescer na sua mente, mostrando a si mesmo que a qualquer momento ele poderia cometer um deslize. Ele só esperava que alguém entrasse pela porta e o salvasse.

Já tinha olhado para a mesma tantas vezes durante o tempo que estava dentro daquela sala, que uma parte sua já havia desistido de esperar. Perguntava-se onde Sehun estaria. Ele era o seu alfa, deveria ter vindo atrás de si quando soube que tinha sido preso, mesmo que ele tivesse escutado a acusação, deveria ter vindo, movido por algum tipo de orgulho alfa afim de demarcar o seu território, que era aquele ômega. Mas não viera. Juntamente com seus pais. Simplesmente ninguém havia vindo lhe ver, além do líder alfa.

— Eles são traidores apenas por que se amam? — teve coragem de perguntar, a língua pesada na boca e os lábios secos e machucados, de tanto que havia os mordido.

O alfa virou-se para o filho, a face contorcida em alguma coisa entre espanto e repulsa.

— Se amam? Aquilo não é amor, é desobediência. Seu irmão sempre foi um tanto rebelde, mas você, Minseok, você sempre foi tão submisso e agora olhe só. — soltou, os olhos cada vez mais escuros. Minseok abaixou os olhos, de repente sentia-se envergonhado pelo que tinha perguntado.

Ficou em silêncio. Não tinha vontade e nem coragem de dizer nada.

— Eu vou te dizer porque eles são traidores. — disse, a voz saindo calma demais para alguém com tanta raiva. — E porque você também é.

Minseok viu a movimentação do pai pela visão periférica, não tinha coragem de encara-lo diretamente. Alguma coisa em si estava acuada, com medo demais de provocar aquele alfa e receber alguma punição e o pequeno ômega sabia que era o seu lobo, sua natureza de ômega sentindo a vibração ruim daquela sala, pegando no ar o cheiro forte do alfa mais velho e transformando isso em um alerta para se manter quieto. O pai puxou uma cadeira e sentou-se à frente do filho, a postura mais séria que o Kim mais novo veria em sua vida inteira.

— Sabe, Minseok, você sempre foi o meu preferido. — confessou e o loiro engoliu em seco. — Sempre tão bonito, tão obediente, tão inteligente... todos da vila gostam de você e mesmo quando você ainda não tinha tido um cio, os alfas vinham até mim querendo marcar encontros. Olhe pra você agora, dormindo com um Byun durante as madrugadas como um qualquer. O que te ensinaram naquela escola, afinal? — havia magoa ali e muita raiva, a raiva se sobrepondo a qualquer outra emoção.

O loiro não respondeu, o que só fez os olhos do pai se estreitarem na sua direção e um suspiro pesado sair por seus lábios.

— Seu irmão sempre foi um caso perdido. Totalmente diferente de você, nunca obedeceu regras. Eu esperava casa-lo com Sehun, mas ele quis você desde o começo. — contou e dessa vez o Kim mais novo fitou o pai. — Eu tinha outros planos para você. Há um Choi na costa leste da Ásia, com algo que eu quero, você seria um ótimo par para a sua filha alfa. Mas a aliança com Sehun era mais importante, então realmente não havia escolha. — suspirou mais um pouco, como se realmente estivesse resolvendo um problema matemático. — No entanto, dado as circunstancias da descoberta do seu namorico com Byun Baekhyun, acredito que terei que cancelar o seu noivado com Oh Sehun.

— Não. — se pronunciou, alarmado com a ideia de perder o seu casamento assim.

Será que era por isso que Sehun não tinha aparecido? Havia desistido de si tão fácil assim, sem nem ao menos escutar a sua versão da história? Era injusto, Minseok pensou, quando eles tinham se divertido tanto juntos.

— Não? — Leeteuk ergueu as sobrancelhas, desconfiado. — Ainda quer continuar enganando aquele pobre coitado? Pelo amor da Deusa, Minseok, que tipo de ômega dissimulado você se tornou? — provocou o filho.

— E que tipo de alfa ditador você se tornou? Decidindo o destino das pessoas dessa maneira. — devolveu e subitamente, o líder Kim sorriu admirado pelo modo como o loiro podia enfrenta-lo.

— Deveria ter nascido alfa, sabia? — inclinou-se em direção ao filho e segurou-lhe o queixo. — Uma pena que toda essa força tenha sido desperdiçada em um corpo de ômega.

— Ser ômega é sinal de fraqueza?

— Sempre foi. — disso sério. — Vocês são a classe mais baixa por algum motivo e não é porque são fortes. 

Num ato totalmente involuntário de irritação pelas palavras do pai, Minseok rosnou em direção ao mais velho. Os olhos brilhando em avelã tamanha a raiva que sentia do modo como o pai estava falando de si, desdenhando de toda a sua classe. Do seu irmão gêmeo, dos seus ommas, dos seus amigos... Mas antes que pudesse externar mais o seu desgosto por aquele ato, teve a bochecha esquerda acertada em um tapa. O barulho ressoou pelo escritório inteiro, assustando o ômega apenas para no segundo seguinte sentir a ardência e o indescritível gosto de sangue na boca. Não pôde evitar que o choque tomasse conta do seu rosto e seus olhos se arregalassem em direção ao pai, incrédulo demais com o tapa que levara. Nunca tinha apanhado antes daquele homem.

— Não rosne pra mim! — brandou, o dedo indicador erguido firmemente em direção ao rosto do filho. — Nunca rosne pra mim, seu traidorzinho! — as narinas inflaram em raiva enquanto ele se forçava a fechar a mão erguida, para evitar deixar outro tapa na face do filho.

Minseok ficou quieto, assustado demais para dizer ou fazer qualquer coisa. Nem ao menos conseguia respirar direito, a bochecha ardendo deixava cada vez mais claro o tanto de força que aquele homem mais velho, à sua frente, tinha.

— Pronto, não foi tão difícil, não é? — ergueu a mão novamente e o loiro achou que seria machucado novamente e por isso fechou os olhos e virou o rosto para o lado, mas tudo que teve foi a mão carinhosa do pai tocando-lhe os fios loiros. — Aí está o meu garoto obediente. — divertiu-se. — Acho que eu deveria fazer a mesma coisa com Kyungsoo, talvez assim ele me escutasse. Sabe, isso tudo é culpa de Ryeowook, que nunca conseguiu colocar limites naquele garoto.

— Fique longe dele! — Minseok tornou a rosnar em direção ao pai, esquecendo totalmente o motivo pelo qual levara um tapa e diante da desobediência do filho, Leeteuk se viu obrigado a levantar, mais vez, a mão e acertar a outra face do loiro.

O barulho inundou o cômodo, fez o rosto do ômega virar para a esquerda, tamanha a força aplicada. Pareceu-lhe mais forte dessa vez. O ardor veio para provar que sim, não mexeu o rosto, afim de reprimir o impulso de cuspir no chão todo o sangue que se acumulava sobre sua língua. Porém, não foi preciso segurar muito porque logo o pai estava acertando a sua outra face, mais uma, mais duas, mais três, mais quatro vezes. A dor vinha cada vez mais forte e o sangue cada vez mais fresco em sua boca, descendo por seus lábios, manchando a sua camisa ao pingar do seu queixo.

— Pare! — ele praticamente gritou e o pai segurou-lhe o rosto, as garras a mostra perfurando as suas bochechas já machucadas, manchando-as mais de vermelho.

O alfa rosnou contra o seu rosto, totalmente raivoso fazendo o filho fechar os olhos em forma de proteção.

— Por que, Minseok?! O que há de errado com vocês dois?! Por que tinham que gostar justo daqueles alfas?! Há tantos outros no mundo! Vocês podiam ter qualquer um!

— Por que o senhor gostou do Ryeowook se já tinha Heechul?! — Minseok gritou de volta, os olhos se enchendo de lágrimas. — Por que magoou Heechul dessa maneira?! — Leeteuk recuou, soltando o rosto do filho, surpreso pelas palavras gritadas. — Eu não sei! — respondeu por si mesmo e pelo pai. — Eu não sei. — disse mais baixo.

Leeteuk voltou a se sentar, encarava as mãos enquanto Minseok fechava os olhos e virava a cabeça para o lado, cansado demais dos tapas que tinha levado para tentar fazer algum esforço para ver o arrependimento no rosto do pai alfa. Fitou as pontas dos seus dedos, as unhas sujas com o próprio sangue do filho. Não conseguira se controlar, deixara que o seu lobo tomasse conta da situação quando bateu no filho. Levantou o olhar para o mesmo, as mãos e pés amarrados na cadeira, a coleira de espinhos machucando o seu pescoço e o seu rosto caído para o lado esquerdo.

Uma parte sua queria pedir desculpas, mas a outra sabia que isso era necessário. Se você não podia fazer alguém te obedecer por respeito, deve fazer isso pelo medo, era o que seu pai costumava dizer. Mas Leeteuk sempre acreditou que não seria assim no seu governo, ele seria bondoso e consciente. E agora quando olhava para aquele ômega loiro preso a uma cadeira, não era isso que via.

Mas era tarde demais para voltar a atrás. Precisava ensinar uma lição aos filhos e aos garotos Byun’s. Precisava puni-los por aquela transgressão e não havia como uma punição não doer. Sempre doeria, em quer que fosse. Por isso ficou de pé e sem olhar para o filho, foi até a porta quando abriu-a, saiu sem cerimônia alguma, deixando o corpo do filho para trás. Avançou pelo corredor, o corpo leve demais para o que tinha feito com Minseok. Sentia que os pés não estavam tocando no chão enquanto as mãos pareciam dormentes, as pontas dos dedos latejando pelo modo como segurara o rosto do filho.

Estava distraído, a imagem de Minseok com as bochechas machucadas piscando na sua mente, a voz dele o confrontando, o modo como parecia disposto a apanhar pelo irmão até o fim. Estava tudo uma bagunça, concluiu. Tudo aquilo era uma bagunça, ele próprio se sentia o mais bagunçado de todos. E foi justamente por essa bagunça toda estar ali, o distraindo, adormecendo os seus sentidos de alfa, que ele não percebeu quando alguém se aproximou correndo de si.

A pessoa simplesmente veio pelo corredor, correndo como um maluco, as mãos fechadas em punhos apenas para acerta-lhe o rosto, depois de chutar o seu joelho e subir sobre si.

Leeteuk ergueu os braços tentando defender-se dos golpes, fora tudo tão de repente que ele nem ao menos conseguia pensar em outra maneira de se defender além daquela. Escutava alguém gritar alguma coisa, depois reconheceu como sendo a sua voz, mas esta estava sendo abafada por outra. Mais aguda e raivosa, gritava impropérios contra o seu rosto a cada vez que sua mão fechada encontrava o seu queixo.

— Devolva! — ele reconheceu a palavra que saia da boca do outro acima de si, em meio ao ataque reconheceu que era um homem. — Devolva agora!

Mas o cheiro do seu próprio sangue dificultava que ele descobrisse se era um ômega ou alfa. Podia ser Heechul em seu ataque de raiva depois de descobrir o que fez ao seu filhote Minseok e o que faria ao seu outro filhote, Kyungsoo. Mas se era ele, por que estava gritando aquilo? Devolva? Devolver o que? E havia mais alguém gritando por sobre tudo. Tentando puxar o homem de cima de si e por breves segundos conseguiu. Foi o suficiente para que Leeteuk abrisse os olhos e visse a imagem descabelada e fora de si de Lee Donghae, sendo segurado por Byun Siwon.

Mas que merda, ele chegou a pensar quando virava-se no chão para tentar levantar. No entanto, teve o gesto impedido quando recebeu um chute na costela esquerda. Foi tão forte e repentino que o alfa perdeu o ar e encolheu-se todo no chão.

— Devolva os meus filhotes, seu merda! — Donghae gritou antes de erguer o pé mais uma vez e acertar a costela do alfa.

Siwon avançou no marido, com uma calma que não pertencia a aquele momento. Os olhos estavam divertidos sobre o modo como o alfa Kim se encolhia de dor no chão da sua própria sede. Contudo, segurou Donghae pela cintura, o puxando para longe do alfa enquanto ele rosnava e esbravejava palavrões em direção ao outro no chão e alguns ao próprio marido por não deixa-lo acabar com aquele alfa maldito.

— Calminha. Shiii. — Siwon tentou, abraçando o corpo do marido, prendendo os braços dele durante o abraço, segurando forte para que ele não se soltasse e corresse mais uma vez em direção ao alfa líder. — Donghae, o bebê. — alertou. — Pode machucar o bebê, amor. — sussurrou no ouvido do marido e Donghae fungou.

— Eu quero meus filhotes de volta. — demandou, a raiva deixando o seu corpo devagar e sendo substituída por frustração e tristeza.

— Eu sei. — disse baixo. — Também os quero de volta. — confessou.

No chão, Leeteuk segurou a dor e tentou respirar fundo apesar da costela latejando. Virou-se de barriga para baixo e usou os braços para impulsionar o corpo para cima, afim de se levantar. Escutou passos e achou que fosse Donghae outra vez, para espanca-lo mais um pouco, mas quando sentiu um toque no seu braço para ajudá-lo a levantar, percebeu que era alguém do seu clã. Era Kim Jongdae, seu chefe de segurança.

— Quer que eu os prenda? — perguntou depois que o ajudou a ficar de pé.

Leeteuk olhou para o casal, ainda abraçado. Siwon de costas para si, abraçando Donghae que lançava um olhar totalmente azul para si por sobre o ombro do marido. Ele estava com raiva e não era pouca. Engoliu em seco diante de toda aquela fúria que era direcionada si enquanto balançava a cabeça em negação para o Kim, ao seu lado.

— Apenas tire Minseok do meu escritório. — mandou, reprimindo os gemidos de dor que queriam sair quando falou, o queixo estava latejando em dor pelo tanto de socos que tinha levado naquela área.

Seu queixo incharia mais tarde do mesmo modo que o seu rosto e suas costelas. Donghae tinha uma mão pesada e um chute certeiro, pensou amargo.

Jongdae assentiu e em silêncio se afastou em direção ao escritório do líder.

— Qual o problema de vocês?! — perguntou entredentes, encostando-se na parede, antes que sucumbisse a dor e voltasse ao chão. Tinha quase certeza que Lee Donghae quebrara-lhe uma costela.

— Qual o seu problema?! — Donghae devolveu, firme, enquanto ainda era mantido nos braços do marido. — Sempre sai por aí inventando mentiras e roubando os filhotes dos outros?! — o azul tornou-se mais intenso sobre o alfa e Leeteuk temeu que ele se transformasse em lobo e avançasse em si mais uma vez, não estava pronto para uma luta ainda mais com uma possível costela quebrada.

— Não sei do que está falando. — Leeteuk teve coragem de dizer.

— Não vem com essa pra cima de mim, seu alfa de merda! — Donghae debateu-se nos braços de Siwon, rosnando e deixando as presas a mostra. — Me solte, Siwon! — mandou.

— Chega! — Siwon demandou usando sua voz de alfa e fazendo o Lee encolher-se nos seus braços. — Pare com isso, Donghae! — segurou-o pelos ombros e o sacudiu levemente, afim de trazer alguma razão para o marido.

Siwon queria evitar que Donghae se transformasse, porque isso prejudicaria o filhote que carregava. Era uma das regras em gestações de lobos: a transformação era proibida porque afetava a sua forma, exigia esforço e isso acabava trazendo sequelas aos bebês. Então, o Byun apenas queria evitar que o marido tivesse um aborto por causa de um descontrole emocional.

O líder Kim ergueu uma sobrancelha ao mesmo tempo que via pelo canto de olho Jongdae com Minseok nos braços, levando-o por outro caminho, fazendo questão de evitar aquele onde ele estava reunido com o casal. Apreciou isso, gostava da discrição do alfa mais novo.

Siwon soltou o marido e se só então virou-se para o alfa, como se só agora estivesse lembrado da sua existência, ato que fez o Kim comprimir os lábios em desagrado.

— E você, vamos conversar. — disse sério demais.

— Por aqui. — Leeteuk fez as honras ao se desencostar e ir em direção ao seu escritório, meio mancando e causando um sorrisinho no rosto do Byun.  

Fingiu que não viu o modo que o alfa estava olhando para si, tentou manter sua postura reta, mas a costela latejava tanto que se viu obrigado a inclinar-se um pouco para o lado como que afim de amenizar a dor, o que só fez a satisfação brilhar nos olhos do alfa e ser refletida nos olhos de Donghae, quando este fitou o marido. Seus olhos já tinham voltado ao velho castanho café, que Siwon tanto gostava. Estava mais calmo, mesmo que ainda sentisse como se fosse explodir de tanta raiva, mas sabia que não podia. Seu descontrole podia prejudicar o filhote que carregava e tudo que menos queria era perder o seu bebê.

Leeteuk mancou até o seu escritório, com o rosto impassível apesar da vermelhidão que se espalhava por seu queixo e pela face esquerda, onde levara os socos. Abriu a porta, girando a maçaneta lentamente desejando que Jongdae tivesse tirado a cadeira, onde Minseok tinha estado amarrado, dali mas não. Quase soltou um suspiro de desagrado quando encontrou o objeto ali, mas não o fez porque os olhos de Siwon já estavam sobre o mesmo. Avaliando as gotas de sangue sobre o assento de madeira e as amarras soltas nos braços e pés. Donghae também olhou, os lábios se comprimindo ao temer que aquele vermelho pertencesse a um dos seus filhotes.

— Podem se sentar. — O Kim disse, a piada implícita na sua sentença deixando o rosto do Byun mais sério, e fazendo-o segurar a mão do ômega com mais firmeza, num pedido mudo para que não se afastasse de si.

Não concordava com aquela conversa ainda, mas a impulsividade de Donghae tinha o guiado até ali. E agora, simplesmente não podia fugir do inevitável. Queria ter se preparado melhor, ter trazido Kangin consigo ou simplesmente estudado melhor os acordos que podia propor e as melhores armadilhas para o Kim.

— Ou podem ficar de pé. — Leeteuk terminou de dizer quando nenhum dos dois se mexeu, aproximou-se da cadeira que havia deixado em frente a cadeira onde tinha prendido o filho e a levou de volta para trás da sua mesa de trabalho.

Sentou-se ali, calmamente e só então voltou a observar os Byun’s, parados, em pé, a sua frente.

— Vejo que receberam a minha carta. — decidiu alfinetar e recebeu um olhar cortante do ômega enquanto Siwon não demonstrava emoção alguma.

— O que realmente aconteceu? — escutou o Byun perguntar e Leeteuk abriu a boca para contar a velha mentira que vinha repetindo desde sempre. — A verdade. — mandou e viu o alfa fechar a boca logo em seguida, prendendo as palavras.

Donghae soltou a mão do marido e cruzou os braços, enquanto o Byun olhava-o pelo canto de olho, com medo que ele voltasse a avançar no líder da alcateia Kim. Mas não o fez. Manteve-se de braços cruzados e com os olhos começando a azular diante da visão totalmente mentirosa de Kim Jungsoo. Sabia muito bem o que tinha acontecido ali, conseguia ler pelo modo como seus olhos pareciam envergonhados, que o líder tinha inventado uma mentira qualquer para manter os seus dois filhos ali.

— Devolva-os. — o ômega se pronunciou quando o outro ficou tempo demais em silêncio. — Não tem razão para mantê-los aqui.

— Não tenho? — se fez de ofendido apenas para lançar no segundo seguinte um olhar inquirido para o marido do Lee. — Pergunte ao seu marido se eu não tenho.

— O seu problema é comigo e não com meus filhos, solte-os.  

— Do mesmo jeito que você soltou o meu irmão? — soltou uma risada incrédula. — Eu posso soltar o garoto mais novo, mas Baekhyun fica e você sabe muito bem porquê.

Siwon avançou em direção a mesa do alfa, apoiou as mãos ali então inclinou-se em direção ao outro.

— Deixe Baekhyun em paz. Ele não é a merda do seu sobrinho. — o olhar de Leeteuk tornou raivoso diante do outro, ele levantou-se da cadeira com dificuldade e inclinou-se em direção ao inimigo, a ponta das presas começando a despontar para fora dos lábios. — Baekhyun é meu, sempre foi e sempre vai ser.

— Isso é o que você diz.

O Byun ergueu uma sobrancelha, achando graça do modo como Leeteuk era idiota.

— Quer um teste de DNA? — perguntou divertido. — Quer que ele se transforme e mostre a cor dos seus olhos de lobo? O que você quer Leeteuk?

O alfa Kim rosnou contra o rosto do outro e Siwon segurou-se para não erguer a mão e acertar um soco bem no seu rosto de líder.

— Baekhyun não é seu. — Donghae disse e teve os olhos do alfa virados na sua direção mais do que rápido, sentiu-se corar pela atenção repentina. — Ele é dois anos mais velho do que primeiro bebê de Jihyun. Quando ele nasceu, o seu irmão, Kyuhyun, já estava morto, não há chance alguma dele ter o seu sangue.

Jungsoo sentia-se tão traído, traído por si mesmo e suas falsas esperanças. A única parte do irmão que acreditara que podia ter não existia mais. Estava morto do modo que tinha escutado por seus informantes. Havia sido tão burro por se alimentar dessa maneira, por deixar que essa loucura chegasse tão longe, mas agora que estava aqui não podia simplesmente ficar com as mãos vazias.

— Isso não muda nada. — se escutou dizer e pegou os olhos escuros de Siwon confusos sobre si. — Baekhyun fica, como sinal de paz entre nós. Ele vai ser meu eterno hóspede.

— Está louco se acha que vou aceitar isso. — o Byun disse ao passo que o marido ômega abria a boca em descrença, os olhos começando a marejar.

Não queria perder o filho assim. Seu precioso Baekhyun, que estava a um passo de escolher uma noiva/noivo para construir sua própria família, que herdaria o cargo de líder do pai, que seria tão competente quanto este. Seu filho tinha um futuro incrível pela frente, ele não podia terminar os seus dias dentro de uma alcateia que nem ao menos era a sua.

— Você vai. — Leeteuk decretou fitando o alfa com a mesma intensidade. — Você vai aceitar e sabe por que? Porque você me deve. — sussurrou essa última parte, o rosto próximo o suficiente do outro para que apenas ele escutasse.

— Eu não devo nada a você. — Siwon sussurrou de volta. — Eu devo a Kyuhyun e a Jihyun, mas não devo nada a você. — balançou a cabeça em negação, meio rindo do modo como Leeteuk queria puni-lo e começou a se afastar da mesa. — Devolva meus filhos ou podemos começar uma guerra agora mesmo. Realmente não me importo de acabar com esse seu territoriozinho.

— Não tem poder de fogo para me enfrentar. — rebateu.

— Mesmo? Duvide. — desafiou. — Duvide mais um pouco que eu mostro pra você porque o meu clã saiu vencedor da última vez.

Leeteuk engoliu em seco e lançou um olhar para Donghae, ainda em pé e sem saber o que fazer diante da briga dos dois. Estava assustado com o modo como as presenças dos alfas estavam fortes, esmagando o seu frágil lobo ômega. O outro alfa percebendo para onde ele olhava, colocou-se em frente ao marido e acabou arrancando um sorrisinho do seu rosto.

— Vou esmagar o seu maldito clã. — acabou demandando, aceitando o desafio do Byun.

Haveria guerra, pensou com uma ponta estranha de prazer.

— N-não façam isso. — O Lee conseguiu gaguejar, colocando a mão sobre o ombro do marido e olhando por sobre o seu ombro para o outro alfa. — Não sejam assim. A última guerra não foi boa para ninguém. Minha alcateia foi extinta e os pobres Lu’s sumiram no mundo. — argumentou. — Não podem fazer isso de novo.

— E o que propõe? — Leeteuk desdenhou. — Que eu devolva seu Baekhyun e fique por isso mesmo? Seus malditos filhos sequestraram meu caçula e ainda fizeram meu outro filho ômega compactuar com isso.

— Não foi sequestro e você sabe muito bem disso. — ainda disse por trás do ombro do marido, sabia que Siwon não o deixaria passar e por isso se manteve ali, tentando argumentar com outro alfa. — Seu filho está apaixonado pelo meu, foi por isso que fugiram.

— Não ouse...

— Eles são parceiros escolhidos. — continuou e Leeteuk rosnou em direção ao ômega, fazendo-o se encolher atrás do marido ao passo que             Siwon, rosnava de volta.

Siwon protegeria Donghae até o fim, estava a um ponto de avançar em Leeteuk e acabar com toda aquela pose de homem injustiçado que ele estava exibindo.

— Não fale besteiras! — sua voz estava muito firme e os olhos muito escuros.

— Sabe que é verdade. Você tem os seus ômegas para provar isso e eu tenho Siwon. — Donghae arranjou coragem para continuar, os olhos brilhando em azul por sobre o ombro do marido. — Deixe-os se casar, então ficamos de acordo.

— Um casamento? Apenas isso? Acha que pode me comprar com um casamento, ômega? Não sabe de nada.

— E o que pretende fazer? Começar uma guerra apenas porque não aceita que seu filho gosta do meu ou por que Baekhyun não é seu sobrinho? Arranje motivos melhores, senhor Kim. — rebateu.

E subitamente, o Kim estava rindo enquanto voltava a se sentar. Conseguia ver onde o ômega queria chegar e achava-o tão idiota por isso. Era tão bobo esse ômega com quem Siwon se casara, pensou. Lembrava-se de Donghae quando chegou na alcateia Byun, tão magro e pequeno, ainda com seus quatorze anos e sem sinais de que já tinha tido um cio. Seus informantes contaram como o pai de Siwon teria expulsado o ômega se Siwon não tivesse se intrometido. Contaram também como se casaram contra as ordens do mesmo e como ele não passava de um Lee sem nada, um pobre coitado que Siwon encontrara na rua. Não apresentava ameaça alguma para ninguém, porque não passava de um ômega idiota com a cabeça cheia de vento. Mas agora, quando o fitava a determinação estampada no seu rosto, achava engraçado o modo como ele continuava o mesmo idiota de sempre.

— Você quer um motivo melhor, Lee? — colocou as mãos sobre a mesa, as unhas afiadas despontadas e manchadas de sangue seco, o sangue de Kim Minseok. — Eis o seu motivo melhor: Siwon tirou algo de mim e agora vou tirar algo dele. — e sorriu.

— Você quer a porcaria dos ossos de volta? Eu os devolvo pra você. — Siwon disse. — Se quiser os de Jihyun também, pode pega-los. — atrás de si, Donghae retesiou o corpo diante do nome da Park, desconfortável demais para conseguir disfarçar sem se encolher mais atrás do marido e não deixar que Leeteuk visse sua expressão.

— Eu quero os ossos. — o Kim pareceu quase animado. — Eu quero um ressarcimento por todo esse transtorno.

— Quanto? — Siwon perguntou, podia pagar quanto Leeteuk quisesse.

— Eu quero a criança. — não era dinheiro que queria.

— Aquela criança está morta.

— Então me dê seus restos, ela merece mais do que ficar trancafiada na sua alcateia. — pediu.

Siwon engoliu o bolo de raiva que havia se formado na sua garganta e assentiu.

— Os ossos do seu sobrinho e do seu irmão. — disse em voz alta apenas para ter o prazer de ver o castanho dos olhos do ex-amigo vacilar, enquanto que atrás de si Donghae sentia-se enjoado por toda aquela conversa, desconfortável demais para que Siwon conseguisse ignorar, mas acabou atribuindo isso as presenças fortes de ambos na sala. — Feito.

— E um casamento. — Leeteuk completou e o alfa estreitou os olhos para cima dele. — Baekhyun vai casar com Kyungsoo. — pronunciou e em sua mente quase pôde ver os olhos grandes do filho marejarem diante disso.

Ele sabia o que estava fazendo. Sabia como aquilo machucaria o seu filho para sempre, obriga-lo assim a um casamento com alguém que não queria. Mas o que podia fazer? Precisava ensinar uma lição aquele garoto, precisava ensinar uma lição aos Byun’s, precisava mostrar como mesmo com todo o argumento que teriam, eles sempre se curvariam aos desmandos e mandos do líder do clã ao qual pertenciam. Era uma punição, para Kyungsoo, para Chanyeol, para Baekhyun e para, seu tão preferido, Minseok. Ia deixar que o loiro ainda casasse com Sehun, apenas pra mantê-lo longe de Baekhyun. E obrigaria o irmão a casar com o seu amante, ia fazê-lo construir uma vida com ele apenas para puni-los.

— Não faça isso. — Donghae sussurrou, os olhos brilhando em castanho escuro como se estivesse ao ponto de chorar. — Case-o com Chanyeol. — pediu e Leeteuk apenas se limitou sorrir, como se nem ele pudesse acreditar no que estava dizendo.

— Jungsoo... — Siwon chamou-o pelo nome, querendo argumentar pelo que ele tinha dito.

— Você vai se curvar pra mim. — continuou, ignorando o que o alfa ia dizer. — Esses são os meus termos.

O Byun fitou o ex-amigo sem conseguir acreditar na loucura dos seus atos. Claro, achava a ideia de se curvar uma falta de respeito, feria o seu orgulho, mas casar Kyungsoo com Baekhyun parecia-lhe mais cruel de tudo. Mas o modo como o alfa estava com o rosto sério, tinha conhecimento que ele não voltaria atrás. Eles se conheciam há muito tempo, tinham compartilhados muitos momentos como amigos de infância. Conhecia aquele homem que agora era o líder de uma alcateia e sabia como ele poderia ser tão maldoso quanto si próprio. Estava vendo isso agora.

— Jungsoo. — tornou a chamar, mas Leeteuk permaneceu parado, fitando-o impassível.

— Se não aceitar, não vou devolvê-lo.

Siwon comprimiu os lábios e podia escutar o fungar baixo de Donghae atrás de si. O ômega sabia o que o marido faria e isso enchia-o de dor, porque não podia fazer coisa alguma para amenizar a dor que Chanyeol sentiria quando descobrisse.  

— Tudo bem. Feito. — se escutou dizer, as palavras sobre sua língua.

— Ajoelhe-se. — Leeteuk mandou e fitando-o com tamanho ódio, o alfa o fez.

Ficando de joelhos diante da mesa do outro, Donghae fazendo a mesma coisa. Esse último com a cabeça baixa, chorando baixinho com a mão em frente a boca. Siwon sentia-se confuso com a situação, não sentia como se fosse ele ali fazendo aquelas coisas, concordando com tudo aquilo.

— Feito.

Jungsoo concordou, os olhos muito brilhantes de satisfação sobre o inimigo. No fim, um líder sempre conseguia o que queria. Mas mesmo quando chegava a essa conclusão, o alfa não se sentia tão bem assim. O sentimento que havia no seu peito não era de satisfação, na verdade não passava de um puro vazio. Vazio esse que fazia seu lobo chorar baixo, dentro de si. O som reverberando por suas veias e sob sua pele, mas mesmo que quisesse... era tarde demais para voltar atrás.  


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