´´ ...quantos homens você já teve que esquecer? Quantos sonhos já teve que perder e quantas pessoas já teve que enfrentar para que isso não acontecesse novamente? Quantas vidas já teve que esquecer e quantas vezes teve que chorar escondida no quarto? ...isso é ela,  a repetição infinita de todos esses sentimentos. A frustração eterna de sempre perder o que quer.... as esperanças perdidas e a falta de fé... isso é ela.... a garota que fugiu de casa para viver com o cara que a largou no meio da estrada em alta madrugada por causa de um briga idiota... a menina que, depois de uma noite de desespero, foi atropelada por uma bêbada desequilibrada e acabou parando em Alvinópolis....

Natasha... a pessoa que tem medo do futuro, porém não tem forças para lutar contra ele, por isso, simplesmente se deixou levar . Simplesmente se sentou e esperou para ver qual era a infeliz surpresa que o destino prepararia para ela desta vez..... felizmente esse destino era eu.... felizmente eu estava lá para impedir que as coisas piorassem... muito....

A garota de vidro bateu na minha porta numa tarde azul e triste para pedir comida... enxugou minhas lágrimas e sorriu para mim. Não perguntou por que eu chorava nem pediu para que eu parasse... apenas sorriu e entrou na minha vida com seu ar doce, sua pele pálida e seu olhar duvidoso, voluptuoso,... o mesmo olhar que lhe salvou a vida...

Nenhum homem pode conservar a lucidez ao passar toda uma vida sem presenciar ao menos um sorriso seu....

Ela tocou a campainha // eu abri a porta // ela sorriu e disse:´´preciso comer ou fico louca``  // eu pensei em dizer:´´azar seu´´, mas, ao invés disso, abri a gaveta da hipocrisia, sorri e disse:´´entre´´ // ela entrou...estava com o braço e perna engessados... ignorou minhas lágrimas, meus hematomas e minha dor aparente...os ponteiros do relógio mudaram de posição e ela continuou ali........ mesmo depois de comer,de ter minha ajuda para tomar banho, de vestir roupas novas e limpas e ter minha companhia por horas... ela continuou ali.... na minha casa..... e, até hoje, não perguntou por que eu estava chorando.... por isso eu a amo tanto... pelo fato de ela ainda estar aqui... e nunca ter me pedido para que eu parasse de chorar...

Já esqueci muitos homens e enterrei milhares de sonhos... já perdi muitas esperanças e toda a fé... mas Natasha eu jamais esquecerei...`` 

...

 (Pierre)—Me conte como foi quando foi à casa de Fip pela primeira vez.

(Natasha)—Senti fome e fui até a casa dele. Ele estava com a cara inchada, tinha chorado um pouco. A gente conversou um bocado. Passamos a tarde inteira conversando, foi quando percebi que ele era um cara legal e decidi confiar nele. (ficou pensativa por alguns instantes) É muito fácil confiar nas pessoas quando somos adolescentes. E, exatamente por isso, quebramos muito a cara nessa época.

 (Pierre)— O que estava fazendo no meio da estrada em alta madrugada?

(Natasha)—Bem, minha história é um pouco complicada. Eu fui parar naquela estrada por pura burrice. Tinha fugido da casa dos meus pais com um namoradinho que arrumei. Brigamos no meio do caminho e ele me deixou no meio da estrada.

(Pierre)—Por quê vocês brigaram?

(Natasha) –Eu não me lembro bem, estava meio bêbada. A gente vivia brigando, eu tenho um gênio meio explosivo e ele também tinha, então brigamos. Ele me deixou no meio da estrada e foi embora. Eu fiquei lá meio tonta gritando quando fui atropelada.

(Pierre) –E o que você se lembra do atropelamento?

(Natasha) –Nada, só me lembro de acordar naquela praça com uma baita dor no corpo. Minha cabeça não estava funcionando direito, não conseguia pensar e colocar as lembranças em ordem, me lembrei de quando era criança e vi o Chico me olhando da janela do quarto dele, depois eu só lembro de acordar no hospital. Só fui saber quem me atropelou meses depois.... foi um barraco só... (risos)

(Pierre) –E sua família?

(Natasha) –Eu liguei para a minha mãe para dizer que estava tudo bem, mas meu pai não me queria de volta em casa. Achei ótimo porque eu também não queria voltar.

(Pierre) –E como era sua relação com seus pais?

(Natasha) –Péssima! Eu não tinha um gênio fácil e nunca admiti os limites que eles queriam me impor, por isso fugi! Não fugi por que queria ficar com o Diogo, teria fugido com qualquer um para sair de casa. Na verdade eu já tinha pensado em uma forma de despachar o Diogo.

(Pierre) –Fale-me desse Diogo. Como o conheceu?

(Natasha) –Não.

(Pierre) –Então me fale mais sobre sua relação com Fip.

(Natasha) – (ficou um tempo calada)Nós ficamos muito amigos, passamos o dia e a noite inteira conversando. Eu dormi na casa dele aquela noite e então decidimos que, a partir de então, eu moraria lá com ele até me recuperar por completo. E passamos a morar juntos.

(Pierre) – E vocês mantinham relações sexuais?

(Natasha) –Me diga uma coisa: com quem o Chico NÂO mantinha relações sexuais?

(Pierre) —Mas Fip não era apaixonado por Flavius?

(Natasha) –E desde quando o fato de ele estar apaixonado influenciava alguma coisa? Arf, por favor! O Chico transava com qualquer pessoa que ele achasse razoavelmente interessante, bastava respirar.

(Pierre) –E quando vocês se relacionaram pela primeira vez?

(Natasha) –Na primeira noite que eu dormi na casa dele. O Chico tinha esse dom. Ele fazia você se sentir à vontade bem rápido.

(Pierre) –Mas você não estava com o braço e a perna quebrados?!

(Natasha) —E daí?

(Pierre) –Quanto tempo você morou com Fip?

(Natasha) –Até eu tirar o gesso, uns três meses depois.Desde então passei a morar na casa da frente.Durante esse tempo compramos roupas e móveis para que eu me instalasse na cidade.

 (Pierre) –Você ainda mora em Alvinópolis?

(Natasha) –Não.