Anne With an escrita por Donna K2O


Capítulo 3
O Resgate de Ka'Kwet - Parte 1


Notas iniciais do capítulo

Capítulo novo...



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Rubi estava muito triste! Por ser tão sensível e motiva já tinha muitas linhas de expressão na testa mesmo com dezesseis anos. Um silêncio se fez no quarto e todos os olhos estavam na direção de Anne. Josie Pay com seu olhar sarcástico e seu sorriso malicioso estava pronta para lançar seu veneno.

— Ora, ora, ora... Anne Shirley-Cuthbert, a amiga “fura olho”.

— Eu não “furei o olho” de ninguém! A Rubi nem gosta mais do Gilbert. E o que você tem a ver com isso Josie?

Rubi se segurava para não chorar, fazendo caretas e respirando fundo. A porta do quarto estava aberta, e a Sra. Blackmore apareceu nela. Todas as meninas percebendo isso se calaram e tentaram se recompor.

— Anne, tem um rapaz querendo falar com você. – Ela estava com uma cara séria, como quem diz “Alguém esqueceu a regra sobre o horário dos pretendentes.” – Se não me falha a memória, é o mesmo rapaz que veio aqui na semana passada. – Rubi irrompeu em lágrimas. Assustando a Sra. Blackmore que ainda não estava acostumada com seu temperamento. Suas amigas se achegaram e tentaram consolá-la sem sucesso.

— Eu vou falar com ele. – Prontificou-se Diana. Ao sentir o olhar confuso da dona da pensão se justificou. – Vou lembrá-lo do horário correto de se visitar uma Senhorita do pensionato.

Sra. Blackmore sentiu-se satisfeita com o comentário de Diana, e antes de sair pela porta deu uma encarada em Anne do tipo “Aprenda com sua amiga”. Sra. Blackmore tinha esse costume como Matthew, de falar coisas com os olhos sem usar as palavras. Diana saiu logo atrás dela.

— Meninas, podem me deixar conversar com Rubi a sós? – Pediu Anne.

— Pra quê? Para você magoá-la mais? – Lançou o veneno, Josie.

— Por favor! Eu preciso falar com Rubi. – Obedecendo Anne, Jane, Tillie e Josie saíram do quarto. Não antes de Josie olhar a ruiva os pés a cabeça com ar de reprovação. Rubi correu até a porta aos prantos na tentativa de sair, mas Anne se atravessou na sua frente e a segurou pelos ombros. – Por favor, Rubi eu preciso falar com você.

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No pátio do pensionato

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Gilbert aguardava sua querida Anne do lado de fora, enquanto sorria timidamente sozinho, olhando para o nada. Ouviu passos na porta da frente do pensionato, e se virou para ver quem era abrindo um sorriso sem se dar conta, de que havia dado esse comando ao seu corpo. Ao ver Diana, seu sorriso foi sumindo a cada passo que se aproximavam.

— Você tinha que vir no pior momento não é Gilbert Blythe! – Protestou a menina chegando onde Gilbert estava. Ele tentou pronunciar algo, mas foi interrompido. – Vem comigo, vamos conversar! – Disse ela passando por ele e caminhando rumo ao banco do jardim. – Vem! – Insistiu ela, vendo que o amigo ainda estava confuso com o que estava acontecendo, e encontrava-se parado olhando para a porta, analisando por que Anne não havia vindo encontrá-lo.

— Por que a Anne não veio? – Perguntou ele chegando ao banco onde Diana estava.

— Ela está resolvendo um assunto importante. Não te falou que o horário de visitas é aos sábados, das 14:00 às 16:00?

— Ela falou alguma coisa na carta que me enviou, mas pensei que fosse uma brincadeira!

— Bom não era! E agora você precisa ir embora. Anne recebeu uma bronca da Sra. Blackmore por sua causa!

— O quê? Por quê? – Diana jogou um olhar para Gilbert, que fez com que ele junta-se as peças do quebra-cabeça, e visse o que havia ocorrido. Ficou levemente acanhado.  – Ahh!... Entendi.

— Pois é, mas você pode voltar amanhã para falar com ela... – Disse vendo o desanimo de Gilbert, vendo que a viagem foi perdida, mas então lembrou o plano para resgatar Ka’Kwet. – Bom, não sei se você pode... Eu tenho que ver com Anne primeiro.

— Como assim? Eu não entendo. Ela está brava comigo? Eu fiz alguma coisa?

— Não, não. É que como eu te disse, ela está resolvendo um problema. – Deu um sorriso vendo a preocupação do garoto. – Ela estava ansiosa para receber uma notícia sua, e ficou feliz em saber que você veio. Só não foi no momento certo. Onde você vai ficar? Peço para ela te ver assim que terminar de falar com a Ru... Com uma pessoa.

— Eu não vi um lugar ainda para ficar, queria primeiro ver a Anne.

Diana pensou por um instante, e logo resolveu o lugar perfeito para Gilbert ficar.

— Já sei onde você vai ficar! Vem comigo!

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Na casa do Bash

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Delphine estava no colo de Elijah, seu irmão mais velho. Ele cantava para ela uma canção que Mary cantava para ele quando era pequeno. A cada dia sua irmãzinha ficava mais parecida com a mãe, e mais esperta. Estava começando a se sentir conectado com ela. Nunca havia tido uma irmã, mas estava se tornando um ótimo irmão mais velho apesar disso.

Havia rumores na cidade de que Bash e Muriel estavam namorando, rumores estes que haviam começado com Rachel Lynde obviamente, e seus olhos apurados que não deixavam nenhuma informação passar despercebida. Entre o “casal” em questão, não havia nada além de uma boa amizade, mas claramente Rachel duvidava disso, segundo ela não existia amizade entre um homem e uma mulher solteiros. Espalhara para toda a cidade que eles estavam muito próximos, coisa que era verdade de fato, mas temperou o assunto com o comentário “Embora eu não acredite que isso seja apenas amizade, isso é que é!”.

A cada pessoa que a fofoca passava algum detalhe era acrescentado, “Muriel e Bash estão muito próximos, se é que me entende”, “Muriel e Bash estão sempre ‘juntos’, se é que me entende”, “Muriel e Bash estão juntos”, “Muriel e Bash estão namorando”, “Muriel e Bash estão praticamente noivos”, e por aí vai. Não surpreenderia se com o tempo o povo de Avonlea “casasse” os dois sem eles serem avisados, e começassem a chamar Muriel de Sra. Lacroix.

Bash se aproximou de Elijah com um sorriso no rosto, gostava de vê-lo com a irmã. O observou por um tempo até que ele o notou.

— Olha só o seu papai Delphine! – Disse Elijah. – Babando por você.

— Gosto de ver como você está ficando mais próximo da sua irmã.

Sentaram-se juntos no sofá, e por um tempo ficaram brincando com a bebê, até que Elijah por fim perguntou o que queria.

— Bash, eu ouvi rumores de que você e a Srta. Stacy estão juntos, é verdade?

— Não.

Bash não queria gastar sua saliva com um assunto que já havia respondido diversas vezes, para diversas pessoas. De fato, praticamente todas as pessoas que eram seus amigos o perguntavam sobre sua relação com Muriel, e mesmo após responder, elas o encaravam não acreditando muito em sua resposta, assim como Elijah agora o encarava.

— Tem certeza? Por que a cidade inteira está falando que...

— Eu sei o que estão falando. – Interrompeu Bash, pegando Delphine nos braços. – Eu e Muriel somos amigos. Ela ainda ama seu Jonah intensamente, e eu a Mary. Gosto de falar sobre Mary quando estou com ela, e ela gosta de falar sobre Jonah. E nós gostamos de passar tempo com Delphine. É isso.

— Bom, e não se incomodam com Avonlea falando o contrário?

— Eu e Muriel já falamos sobre isso. Quando dizemos que não estamos juntos as pessoas não acreditam, como você. E mesmo que nos afastemos agora, irão dizer que “terminamos nosso relacionamento”. Então, não há o que fazer. Resolvemos não ligar.

Elijah ficou mais tranquilo após ouvir aquilo, ainda não estava pronto para ver outra mulher assumir o lugar de Mary, tinha medo de que sua irmã não se importasse com a memória da mãe quando crescesse, já que com a idade que tinha, se lembraria apenas da mãe que a criasse e não teria nenhuma memória de Mary. Ele gostava de Muriel, e sabia que ela seria uma ótima mãe para sua irmã, mas ficou feliz em saber que não havia nada entre ela e Bash.

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No pensionato, no quarto de Anne

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— Rubi, eu não entendo! Você ainda gosta do Gilbert?

— Não, eu não gosto mais dele. Após 5 anos desisti de qualquer coisa entre nós dois. Eu não sou uma idiota!

— Então por que está brava comigo! – Indagou Anne. – Se você não gosta mais do Gilbert, qual é o problema?

— O problema é que EU o vi primeiro! É antiético namorar um garoto que sua amiga já gostou. Você não sabia?

— Não, não é! É antiético namorar um garoto que sua amiga já NAMOROU, e você nunca namorou Gilbert. E para falar a verdade eu não estou muito certa se concordo com essa ideia, - Começou a viajar. - Por que supondo que uma amiga sua tenha namorado no passado com o grande amor da SUA vida, e eles tenham terminado. Ela encontra o grande amor da vida DELA. Você vai deixar de estar com o grande amor da sua vida só por que algumas pessoas acham antiético? Eu jamais desistiria do grande amor da MINHA vida por uma questão de ética, que a propósito, é relativa de acordo com a sociedade onde você vive.

— E se ele fosse casado? – Insistiu Rubi. – Você arruinaria um casamento para ficar com ele?

— Deus, Rubi! – Riu Anne indignada. – Isso seria diferente por que não seria antiético, seria proibido! E você e Gilbert não eram casados, nem eram namorados, ele nem era sua corte se quer!

— Bom, ele não namorava comigo, mas para mim era como se namorássemos! Eu agia como se estivesse namorando ele.

— Rubi, tem certeza que está brava por que estou com o Gilbert? Por que parece que não se trata disso.

Anne encarou a amiga por um tempo, que estava e braços cruzados, balançando-se inquieta. Ela não estava mais chorando, e não tinha exatamente uma expressão de raiva. Parecia que estava chateada com outra questão. Após alguns segundos, Rubi cedeu. Descruzou os braços em desapontamento com um suspiro. E se confessou:

— É que... Eu gostei dele por 5 anos Anne! 5 ANOS! E ele nem notou que eu existia. Depois, comecei a gostar de Franck e embora ele tenha jogado uns olhares para mim, nunca soube nada sobre ele gostar de mim. E você... Bom, a quanto tempo VOCÊ gosta de Gilbert? Quanto tempo demorou para você ficar com ele? O que eu preciso fazer para ser atrativa para os garotos? Eu preciso ser mais alta? Parar de chorar tanto? Ser mais esperta ou ousada como você? Quer dizer... Você é...

Rubi parou de falar antes que insultasse Anne sem querer. Ane ruborizou com o comentário de Rubi. Não estava acostumada a falar sobre seus sentimentos com alguém que não fosse Diana, e se sentia incomoda comparando uma coisa com a outra. Aquilo não era uma competição. Sabia que embora Rubi fosse sua amiga, sentia que Anne era inferior a ela secretamente, mesmo não demostrando, pois era mais bonita que a “Órfã ruiva”. Anne não se incomodava mais com isso, se sentia muito confiante com quem era agora, mas ao que parecia, Rubi não era tão confiante quanto parecia.

— Não se trata de tempo. Quando duas pessoas sentem o mesmo uma pela outra, simplesmente acontece. Você é linda demais Rubi, e pode ter certeza que todos os rapazes concordam comigo, mas não se trata apenas do físico nesses assuntos. – Rubi não parecia satisfeita. Então ela respondeu o que a amiga queria, afinal, ela merecia isso, precisava disso, e se não a respondesse ela não ficaria em paz, e Anne tinha muita coisa para fazer então seria mais rápido fazer as vontades de Rubi. – Eu percebi que sentia algo por Gilbert após o nosso ensaio de dança. Ele confessou que gostava de mim na noite após os exames, e eu percebi que o amava de fato dois dias depois disso. Nós pensamos que um não gostava do outros por alguns inconvenientes, então na semana passada quando Diana chegou aqui eu soube que ele me amava, ele soube que eu o amava, e nos encontramos no pátio. Nos beijamos e ele foi para Torronto. O motivo pelo qual não te contei, é que não sabia como te contar, e também não sabia “O que” contar, por que não houve um pedido oficial de namoro.

— Eu acho que, o beijo já é meio que a oficialização do namoro. - Tranquilizou-se rubi completamente.

— Bom, então Josie Pay tem vários namorados. – Ambas riram com o comentário de Anne. – Então, tudo bem entre nós duas?

— Sim, é claro. Senão quem vai me ajudar nas provas?

As duas se abraçaram. Anne sem querer havia desenvolvido um sentimento de proteção com Rubi, talvez por ser a menor da turma ou a mais sentimental e sensível das meninas, mas sentia muita ternura por ela, um instinto te protegê-la, algo muito especial pela amiga, não sabia como era ter uma irmã mais nova, mas pensava que era isso que se sentia quando tinha uma. Enquanto ainda se abraçavam, ouviram a voz de Diana vindo do corredor ao longe: “O que estão fazendo aí?” ela disse. Em um instante souberam com quem Diana estava falando, pois a porta se abriu e Jane, Tillie e Josie caíram no chão. Estavam apoiando os ouvidos na porta para ouvir a conversa, mas Diana abriu a porta e as fez cair no chão de súbito.

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Na casa da Tia Jô

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Anne encontrou Gilbert na sala de estar, tomando chã com Tia Jô. Eles estavam se divertindo e rindo quando ela chegou, Coule estava em pé atrás de um cadeira na qual apoiava suas mãos. Eles falavam de Anne antes dela entrar, sobre suas travessuras de infância, seu gênio e sobre os sentimentos que Gilbert descobrira que sentia por ela. Todos a olharam de repente.

— Boa tarde? – Disse ela timidamente abrindo um sorriso ao ver Gilbert. Ele rapidamente foi até ela e lhe beijou o rosto. – Desculpe não ter ido falar com você, mas estava...

— Tudo bem, Coule me contou o seu plano para salvar Ka’kwet até depois de amanhã. Eu posso ajudar?

— Claro! Tia Jô, a senhora vai me ajudar no meu plano?

— Com certeza Menina-Anne!

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No Internato

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Cada parte do plano era o mais preciso possível, mas não era nem de longe garantido de sucesso. Cada uma das partes dele contavam com sorte, pois podia facilmente dar errado, mas Anne acreditava que daria certo. Tinha que acreditar, caso contrário uma guerra se iniciaria. Já havia escutado várias histórias de cidades que declararam guerra aos selvagens, e tinha medo de que isso ocorresse. Tinha que tentar.

Tia Jô, Diana e Coule foram até o internato naquela tarde, enquanto as crianças estavam ensaiando para o Coral. Tia Jô disse que faria uma gorda doação para reparos no internato. Eles surpreendentemente eram ótimos atores. É claro que tiveram uma ajudinha com um texto que Anne havia escrito. Tia Jô fez o papel de uma mulher rica e preconceituosa. O “rica” estava fácil de convencer, já que na cidade as pessoas conheciam ela por seu dinheiro e bom coração. Sempre ajudava orfanatos e quermesses quando pediam, ela resmungava um pouco, mas não deixava de ajudar. Coule e Diana fizeram o papel de seus netos, no qual Coule era o rapaz já formado em engenharia que anotaria os defeitos do lugar para os consertos, e Diana a neta patricinha que teria nojo de tudo e reclamaria de tudo. O real propósito dela era entregar um bilhete para Ka’kwet dizendo “Janela, conversando”. (No caso o que ela queria dizer era, “Vá para a janela para conversar”), escrito na língua no povo de Ka’kwet para que se alguém encontrasse não conseguisse entender. Como a língua deles não funcionava com verbos, e sim com as coisas que viam, a frase acabou ficando confusa para quem não estava acostumado. Além disso, Anne não sabia muitas palavras na língua de Ka’kwet e torcia para que ela entendesse seus “chutes”, pois não tinha exata certeza de que sua escrita estava correta.

Por sorte deu certo. As crianças estavam cantando quando Tia Jô, Diana e Coule entraram no internato. Como o planejado. As freiras e o padre apontaram diversos consertos e coisas que estavam faltando ali. Ka’kwet se surpreendeu ao ver Diana ali, que era a única pessoa que conhecia das três. Continuou cantando já que viu Diana sorrir para ela e depois disfarçar. Quando Diana imaginou que era o momento certo, se aproximou de Ka’kwet e entregou o papel em sua mão, fingindo que estava apenas passando pelos corredores dos bancos com nojo. Ka’kwet o leu sem fazer muito alarde e entendeu. Conseguiu trocar de lugar com seus amigos rápida e silenciosamente até chegar a uma janela. A essa altura, Diana, Coule e Tia Jô já estavam em outra sala com as irmãs.

Gilbert, Jane e Tillie estavam do lado de fora. Aguardando Gilbert reconhecer Ka’kwet (Já que ele era o único dos três que conhecia ela). Haviam 4 janelas daquela sala para vigiar, duas em cada lago, já que não sabiam em qual delas ka’kwet apareceria. Quando a reconheceu em uma janela, Gilbert correu até lá e ficou embaixo da janela sentado, de costas para a parede. Escondido, com alguns papeis pequenos para colocar contra a janela e Ka’kwet ler. Jane, ficava de frente para a janela, mas bem ao longe atrás de umas árvores, e Tillie ficava de olho se alguém vinha mais distante ainda.

Gilbert colocou o primeiro papel da largura e comprimento de um dedo contra a janela. Nele estava escrito “Adultos machucar crianças?”. (Novamente na língua de Ka’kwet, com o intuito que ela respondesse se as crianças ali eram machucadas). Ka’kwet que em nenhum momento parava de cantar, apenas cruzou os braços para disfarças e fez um sinal positivo com a mão, em direção à janela. Jane viu o sinal ao longe, atrás das árvores e o repetiu para Gilbert, já que ele estava de costas na parede e não podia ver.

Gilbert então colocou o próximo papel “Ka’kwet escreve maus-tratos?”, assim que Jane viu que Ka’kwet havia lido fez sinal para o garoto tirar o papel da janela. Eles queriam saber se Ka’kwet podia escrever o que acontecia ali, mas a frase ficou confusa até para ka’kwet entender. Ela ficou pensativa, havia entendido se ela tinha uma espécie de diário onde ESCREVIA o que acontecia ali, e não se era possível ela ESCREVER o que acontecia ali. Problema comum de quem não é acostumado com uma língua sem verbos, como Anne. Jane deu um sinal para Gilbert colocar outro papel. Ela fez um sinal de confusão para que ele entendesse que a menina não havia compreendido a última frase. O sinal consistia em girar o indicador direito em volta do ouvido direito.

Gilbert ouviu as vozes de Diana se aproximando, e ficou com medo de não dar tempo, então pegou um lápis que havia guardado em seu bolso para essa possível emergência, e escreveu atrás do papel “Pode escrever os maus-tratos?” em inglês. O motivo pelo qual não estavam usando a língua deles, era o medo de serem descobertos. O plano todo poderia ir por água a baixo, além do fato de que não sabiam se Ka’kwet já tinha domínio sobre a leitura da língua inglês. Falar ela conseguia. Mas com esse imprevisto acabaram mudando de estratégia, e deixando este cuidado da linguagem de lado, o importante agora era conseguir terminar de falar com Ka’kwet. Anne estava certa, ela não entendeu o que significava a palavra “Maus-tratos”.

A voz de Diana já estava novamente na sala do coral, e vendo o bilhete na janela e a cara de Ka’kwet, viu que precisava ganhar mais tempo. Ela fingiu estar passando mal, foi a primeira coisa que lhe ocorreu. Ka’kwet viu uma garota atrás de uma árvore fazendo sinal de socos na cara, e depois apontando pra o internato, era Jane. Então entendeu o que estava escrito e fez sinal positivo com a mão. Jane repetiu o sinal para Gilbert.

Tillie, que estava mais adiante vigiando, fez sinal para que Jane e Gilbert fossem embora, pois Tia Jô, Diana e Coule já estavam na porta se despedindo das freiras. Gilbert colocou o último papel pela janela escrito “Escreva e jogue pela janela à noite”. Uma freira apareceu ajudando a carregar Diana “desmaiada” até a carruagem.  A freira não viu Gilbert, que saiu correndo junto com Tillie e Jane. Diana agarrou o pescoço da freira para que ela não se virasse, e a agradeceu por ajudá-la enquanto via seus amigos corriam.

Após já estarem fora do alcance das freiras, pararam para recuperar o fôlego.

— Ela respondeu? – Perguntou Gilbert sem ar para Jane, que estava mais sem ar ainda.

— Sim. Ela disse que sim.

Anne, Josie Pay e Rubi foram até o jornal falar com o amigo de Tia Jô, para ver se ele emprestava sua prensa para escrever cartazes durante a noite, e distribuir durante a manhã.

Ele de bom grado aceitou, pois tratava-se do Girassol que Anne havia conhecido na festa de Tia Jô, e feito amizade.

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De volta à casa da Tia Jô

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Todos estavam reunidos na mesa, ouvindo os resultados da operação.

— Então, esta noite vamos voltar lá para buscar o bilhete da Ka’kwet. – Disse Anne. – Já falamos com o Girassol (Este era o apelido que ele amigavelmente, aceitou que Anne o chamasse). Assim que lermos o que aconteceu lá dentro, vamos até o jornal arrumar o artigo e fazer os panfletos para espalhar na cidade durante a noite.

— Será que vai demorar muito? – Josie Pay já estava entediada.

— Bom, vai depender da Ka’kwet e quando ela vai conseguir jogar o texto pela janela. Agora precisamos tomar um bom café, e nos preparar para essa noite.

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À noite no internato

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Todos se espalharam pelos arredores do lugar. Isso por que não sabiam de qual janela seria jogado o texto, já que não sabiam em que quarto ka’kwet dormia. Esperaram por cerca de 2 horas. Estava escuro, pois já era quase 21:00 e as freiras passavam de cômodo por cômodo apagando as luzes. Anne e Gilbert se olhavam toda hora, e sorriam. Aquele não era exatamente o primeiro final de semana juntos dos sonhos, queriam estar passeando, conversando, mas sabiam que era mais importante salvar sua amiga. Teriam muitos outros finais de semana juntos, não antes das aulas começarem, mas não havia muito que fazer. Até que, por fim, ouviram Jane chamar a todos. Ka’kwet havia aberto a janela com a ajuda das outras crianças que dormiam no mesmo quarto que ela. Não era possível abrir muito, havia uma trava que possibilitava a janela de ser aberta apenas 15 cm, mas era o suficiente para colocar o braço para fora e jogar algumas folhas dobradas em forma de avião de papel, para que não ficasse preso no telhado já que era no segundo andar.

Coule correu para buscar o avião. Anne por um instante pode ver Ka’kwet, e acenou para ela. A menina tinha um olhar triste, mas esperançoso. Com um movimento rápido, as meninas na janela olharam para trás e sumiram para dentro do quarto, ao que indicava alguém estava vindo, então decidiram ir para o jornal logo e sair dali.

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No jornal

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Todos estavam na sala da prensa, já sabiam como se utilizava então o amigo de Anne apenas abriu a porta para eles e se retirou.

— Vamos ver o que está escrito aqui. – Anne abriu as folhas e começou a ler. Várias frases tinham palavras erradas, e as concordâncias não estavam corretas, mas ela lia atentamente e conseguia compreender as coisas que ocorriam lá. Eram duas folhas escritas em frente e verso, mas não precisou acabar o primeiro lado da primeira folha, para que seus olhos enchessem de lágrimas. Até terminar as duas folhas várias lágrimas já haviam escorrido pelo rosto de Anne. Seus amigos olhavam com curiosidade, mas em silêncio. Ao terminar, Anne levantou os olhos dos papeis e encarou Diana. – Eles estão sofrendo muito! – Disse com a voz embargada.

Ela passou a folha para que Diana lesse também, e aproveitou para secar as lágrimas. Gilbert se aproximou a passou a mão nas costas da ruiva, para acalmá-la.

— Fica tranquila. Ela vai sair logo-logo. Isso já vai acabar. – Disse ele.

Anne pagou novamente o papel das mãos da amiga, com uma expressão séria.

— Vamos começar a fazer o artigo. Eu vou ditar a carta que ela escreveu por que tem vários erros, escrevam as coisas que acharem interessantes, e então vamos começar juntos a escrever os parágrafos. Essa tem que ser a melhor matéria que já fizemos.

Assim foi durante boa parte da noite e da madrugada. Cerca de 3 horas foram necessárias para escrever o artigo perfeito, já que a todo tempo eram feitas alterações para melhoria. Quando terminaram de fazer os panfletos, resolveram não espalhar nas casas, pois demoraria muito tempo, mas ao invés disso, colaram panfletos nas paredes e postes das ruas, deixaram cópias na frente de cada loja, mercearia, padaria e comércio que fosse.

As 05:00 chegaram novamente a casa da Tia Jô, estavam tão exaustos que acabaram dormindo na sala dela. Nos sofás, poltronas e tapetes. Tia Jô havia ido a cozinha pedir um chá, e quando voltou se deparou com aquela cena. Um dormindo apoiado sobre o outro. Achou graça da situação, a muito tempo não via tanta juventude em sua casa. Pegou algumas cobertas para cobri-los, e os que podia, levantava a cabeça para pôr um travesseiro em baixo.

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Na manhã seguinte...

Em uma sala desconhecida

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Daniel Lerg entra em uma sala onde se encontrava uma mulher. Ela estava bebendo um chá. E o convidou para se sentar com um gesto das mãos. Seus pulsos tinham pulseiras brilhantes e elegantes, que tilintavam ao mexer com as xícaras.

— Conseguiu? – perguntou ela.

— Sim. Acredito que com isso será possível. – Sr. Lerg entregou uma pasta para ela com vários papéis com informações de Anne e as coisas que a envolviam.

— Perfeito! – Pronunciou entre um sorriso com seus vermelhos lábios, após ler algumas linhas. – É hora de agir. Vamos buscar nossa Lyla.


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