Uma Nova Alvorada escrita por MoonLine


Capítulo 20
Capítulo 20- O Julgamento




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Nossa pequena reunião melancólica é interrompida quando Shizen nota três grandes imperatrizes caminhando em nossa direção. Pelas leis antigas de Yami, nosso crime era definido como alta traição e nossa sentença seria a morte, mas à essa altura, nada mais importava para mim. Eu finalmente havia me vingado, porém isso não diminuiu o peso que eu sentia em meu coração, ao contrário, ver o olhar de Suna se tornar mais vazio enquanto observava o corpo frio de sua ex mentora apenas aumentou a dor que eu nutria em meu peito.

—Lordes. – Yume, a Imperatriz dos Bons sonhos, inicia – Espero que estejam cientes sobre os atos cometidos hoje.

—Desnecessário explicar à eles. – um rosto e voz familiar nos defende, Sakkaku Uso, interrompia o discurso de sua companheira – Assim como é desnecessário explicar a você o inferno que eles passaram enquanto estavam sob o comando da Imperatriz dos Sentidos.

—Eu entendo sua posição, mas isso não justifica a terrível covardia que foi feita nesse ambiente! – Yume se exalta – Chikaku foi brutalmente assassinada por três lordes, um soldado e uma simples fugitiva. Isso é um absurdo!

Uma discussão entre as duas Imperatrizes se inicia, enquanto a outra apenas observava calada, semelhante a mim, que não prestava mais atenção ao diálogo, mas sim em como as três maiores Imperatrizes se apresentavam a nossa frente. A Imperatriz da Ilusão e Mentira usava um kimono vermelho nos ombros e que aos poucos se transformava em pétalas de rosa vermelha em um fundo branco, com seus longos e finos cabelos negros envolvendo seu delicado rosto, o total oposto da Imperatriz dos Bons Sonhos, que vestia um delicado vestido azul, que apesar de justo no busto, se tornava bufante ao passo que se aproximava do chão, seu cabelo castanho cacheado era preso em duas tranças laterais, mas possuía lindas mexas azuis nas pontas. E então, a Imperatriz da Morte, Shi, que permanecia em silêncio enquanto suas parceiras continuavam a discutir sobre um pequeno grupo de criminosos, se destacava de todas as mulheres que já havia visto antes. Seus olhos eram de um tom de azul tão claro, que se aproximava do cinza e contrastava com sua pele alva, seu cabelo era ondulado, mas o que realmente se sobressaia era sua cor completamente branca, sem uma mancha sequer, seu rosto, embora delicado, demonstrava uma firmeza longe de ser algo frio e sua roupa, diferente das outras duas, se assemelhava a de um príncipe: finas, elegantes e masculinas.

A discussão se encerrou quando Shi finalmente decidiu se pronunciar. Alegando que não havia como nenhuma decisão justa ser tomada de forma apressada e em um momento tão delicado como aquele, sendo assim, sugeriu que eu e meus amigos fôssemos presos nas celas do castelo até que a decisão correta fosse tomada. Fomos levados por soldados, nosso cansaço mental e físico nos impediu de tentar lutar contra os recentes acontecimentos, todos estavam muito abalados.

As celas eram espaçosas apesar de tudo, não era no mesmo lugar que havíamos resgatados os reféns, parecia menos assustadora e mais segura de se estar. Inicialmente todos iriamos ficar juntos, mas temendo uma possível fuga, fomos separados em duplas: Shizen e eu, Suna e Kuroi, e Kasai havia ficado sozinho.

—Como você está? – indaguei para Shizen, que alternava em passar a mão ora em seu cabelo ora em sua cicatriz na bochecha esquerda que formava uma lua – Seus pais...

—É. – ele me interrompe – É com isso que estou preocupado, mas não me arrependo. – ele me olha e sorri timidamente, como se tentasse se convencer de que estava tudo bem agora.

—Eu não consigo imaginar qual seria a decisão daquelas mulheres. – Kasai dispara em um tom de descaso do outro lado do corredor, na cela de frente a minha – De todas as Imperatrizes, elas são as mais misteriosas, mas também eram as mais próximas à Chikaku. Pensar que elas poderiam ter interferido à qualquer momento, mas optaram por não o fazer... O que elas querem a final?

—Não adianta pensar nisso. – ouço a voz de Kuroi da cela ao lado da minha – Independente do que seja decido, minhas ações foram feitas pensado em todos que estariam livres dela e, sinceramente eu...

—E se não matamos o problema? – a voz de Suna tremula enquanto as palavras são ditas como um corte de navalha – E se matamos uma pessoa que fazia parte desse sistema, mas que não era o verdadeiro problema? Se for realmente esse o caso, tudo que fizemos foi... – sua voz falha – Egoísmo.

—Pode ser várias coisas Suna, mas aquilo não foi egoísmo e ela não era inocente. – antes que pudesse perceber, as palavras saíram naturalmente, em uma tentativa de confortar não somente o loiro, mas a mim também – Eu entendo seu ponto, no entanto, você fazia parte do sistema, mesmo assim não sentia o prazer em ver todas aquelas jovens meninas morrerem uma a uma para manter uma hierarquia cruel. Mesmo que matá-la agora não tenha resolvido o problema, nós começamos algo e mostramos que essas atitudes não estão certas e com isso, resultados drásticos são adquiridos. – o lorde permanece em silêncio, ao mesmo tempo, luto contra minhas lágrimas e meus próprios pensamentos e sussurro – Eu te entendo...

Não sei ao certo quantas horas passamos nos nossos novos aposentos, a lua não estava sobre nós enquanto lutávamos contra Chikaku, mas estava bem próxima, e agora o sol brilhava com toda força, anunciando um novo dia. Meu desejo de olhar para o céu e observá-lo enquanto as cores se transformam e o colore não era possível de ser realizado, já que em nossas celas havia apenas uma pequena janela no alto da parede, perto do teto empoeirado preenchido com algumas teias de aranha, que permitia entrar apenas alguns feixes de raios solares. Ninguém conseguia dormir, a ansiedade inundava nossos pensamentos. Se tornava cada vez mais difícil pensar em possibilidades minimamente positivas para concluir aquela situação a qual tomamos responsabilidade.

Lutar contra meus sentimentos e segurar minhas lágrimas estava se tornando mais comum do que eu gostaria, meus esforços de me aproximar de Shizen eram fracassados, já que minha boca se mexia, mas não era possível ouvir sequer um som e mesmo que eu tentasse me mexer, meu corpo não obedecia mais, era o cansaço, a fome e a sede me dominando.

Escutei alguns passos se aproximando em ritmo de marcha, o que causou uma crise de ansiedade em todos nós, especialmente em Suna, que, de acordo com as frases soltas de Kuroi, estava tremendo e suando frio. Havia seis soldados ao todo, sendo que dois estavam de frente a minha cela, um de frente para Kasai e três para a cela restante. Nos avisaram que nossa presença era requerida pelas Imperatrizes e que deveríamos ser direcionados ao salão de reunião algemados e acompanhados pelos mesmos. Entendi que um soldado a mais estava sendo responsável ou por Suna ou por Kuroi e deduzi que seria para Kuroi, já que dentre todas as opções, ele seria o mais capaz e bem sucedido em uma fuga.

Enquanto caminhávamos em direção ao tal salão, meus olhos não conseguiam fitar algo além do chão, o que fez com que o longo caminho parecesse maior ainda. Minha fé de que tudo poderia ser resolvido com um perdão era nula e o medo conseguia me dominar facilmente a essa altura. Ao entramos no local definido, percebi que todas as Imperatrizes estavam ali, desde as menores à maiores e mais poderosas, todas sentadas em lindos tronos prateados, que contornavam todo o salão, sendo que ao fundo do mesmo, haviam três tronos dourados, lado a lado, e neles estavam as Imperatrizes que nos receberam após a batalha. O silêncio era predominante, no entanto, alguns sussurros eram audíveis (não o suficiente para poder dizer ao certo do que se tratavam). Os soldados nos direcionaram até ficarmos de frente para os três imponentes tronos, se afastando em seguida.

—O julgamento irá começar. – Shi ponderou e todos que estavam sentados se levantaram, fizeram uma reverência em direção a ela e tomaram seus assentos novamente quando a imperatriz acenou positivamente com a cabeça – Será feito uma divisão em minha fala: primeiro irei falar dos crimes cometidos por cada um, individualmente, para então, logo em seguida, abordar seus atos como um grupo. Serei aconselhada pelas duas Imperatrizes que estão ao meu lado: Imperatriz dos Bons Sonhos, Yume, e a Imperatriz da Ilusão e Mentira, Sakkaku Uso. O veredito que será dado foi decidido com base em discussões confiáveis e passiveis de contestação, todas as Imperatrizes presentes e os soldados mais próximos do soldado Shizen, que aqui se encontram, foram ouvidos e suas opiniões têm uma grande relevância. – seu olhar nos fita por segundos, passando por todos que estavam presentes e recaindo sobre nós.

—Muito bem. – Yume inicia – O primeiro a ser julgado: Lorde Suna.

—Suna, você possuía o mais alto cargo que algum homem poderia ter em nosso Império, concedido pela Imperatriz dos Sentidos, Chikaku, que o acolheu e ensinou tudo que sabe. – embora Shi narrasse seu discurso com firmeza, era possível perceber desconforto em sua fala, além de uma sensação estranhamente reconfortante – Foi designado a orientar e dirigir o treinamento das novas possíveis imperatrizes e por anos se mostrou eficiente, no entanto, no ultimo campo de treinamento, sua conduta foi inapropriada e você não apenas desafiou sua superior como fugiu com uma das novatas. Não bastante, a treinou em específico para derrotar a Imperatriz de maior poder até então.

—Dando continuidade: Lorde Kasai.

—Lorde Kasai de igual história ao lorde anteriormente citado, com a exceção de não ter fugido com a prisioneira, mas acusado de ter conhecimento sobre as intenções do mesmo, e em uma tentativa de proteger seu amigo, ocultou essa informação de sua superior, além de ter ajudado a enfrentá-la na batalha final.

—Lorde Kuroi.

—Foi acolhido pela mesma Imperatriz e treinado pelos lordes citados anteriormente, com um grande poder, ajudou os, já então fugitivos, a escaparem da força tarefa estabelecida pela superior, se recusando a entregar a posição dos mesmos e ajudando a trazer aquele que seria responsável pelo tiro fatal em Chikaku.

—Soldado Shizen Sasaki.

—Sasaki veio de uma família militar, foi permitido a atuar no Castelo Imperial graças à fama que seu pai carrega como um excelente soldado, entretanto, auxiliou Lorde Suna e a novata a fugirem, além de ter treinando a mesma e sido o verdadeiro responsável pela morte da Imperatriz dos Sentidos.

—E por fim: Amaya Tsuki, a novata que fugiu junto ao Lorde Suna.

—Tsuki foi recrutada como uma imperatriz em potencial, e desperdiçou suas chances ao atacar a Imperatriz Chikaku ainda no campo de treinamento, sendo este incidente o responsável por sua fuga juntamente ao lorde já mencionado. Treinou em segredo para derrotar a Imperatriz e voltou para concluir seu objetivo, libertando prisioneiros e até mesmo imobilizando lorde Mizu.

Houve uma pausa para que Shi recuperasse sua voz com um pouco de água. Tentei olhar para meus companheiros e tudo que pude ver foram olhares vazios, Shizen estava com o rosto vermelho, segurando suas lágrimas, acredito que mencionar sua família fez com que o abalasse mais do que o esperado. Kuroi continuava com sua expressão cansada e de dor, mas não tirava os olhos de seus dois mestres (e amigos) devido sua preocupação com os mesmos. Kasai estava com o rosto contraído em uma expressão de raiva e angustia, como se ouvir todos seus erros fosse maior do que qualquer tortura que já passou, além da ansiedade que apenas crescia e transparecia em seu corpo conforme o tempo passava. Já Suna... Os lindos olhos de esmeraldas que sempre me fizeram ficar perdida em um mar de pensamentos e sentimentos, estavam sem brilho, acredito que para sempre seria assim.

Meu tempo de preocupação foi cortado com a bruta fala da Imperatriz dos Sonhos, anunciando que seriamos julgados como um grupo a partir desse momento. No entanto, a Imperatriz da Morte demorou a se pronunciar, nos observando com cautela e suspirando em seguida.

—Como um grupo, agiram deliberadamente com a intenção de, não somente atacar, mas assassinar uma das maiores Imperatrizes que este Reino já teve. E isso, por si só, é o bastante a ser falado.

—A sentença... – Yume tenta prosseguir, mas percebe o olhar petrificante de Shi – Deseja dizer mais algum detalhe antes da sentença ser dada Imperatriz da Morte?

—Obrigada por perguntar. – Shi sorri e se curva para sua parceira, logo em seguida abrindo os braços e falando com todos que estavam ali – Todas essas ações são cruéis e devem, sim, serem julgadas, no entanto, não devem ser feitas antes de todos saberem a verdade a respeito do que cada um desses jovens tiveram que passar para chegarem a essa desesperada solução. A começar pelos três lordes aqui presentes e já mencionados: foram arrancados de suas famílias quando jovens, torturados e forçados a lutarem contra si para conseguirem a aprovação de Chikaku, que nunca estava satisfeita com uma luta inocente, era preciso que alguém ficasse gravemente ferido, além disso, eram obrigados a lidar com várias jovens morrendo todos os dias enquanto ocorria o treinamento das potenciais imperatrizes. E aqui podemos falar sobre Amaya, que estava nesse treinamento contra vontade, acredito que eu não preciso sequer lembrar todas vocês de como foi esse momento. Sua amiga foi morta em sua frente por Chikaku, que ficou com inveja e medo dos poderes semelhantes que a mesma vinha demonstrando e em um ato de desespero, atacou a Imperatriz no campo. O jovem Shizen apenas tentou lutar por aquilo que julgou certo e justo na devida situação.

—Isso não diminui nada Shi! – Yume se altera e esquece de toda formalidade que apresentava minutos atrás – Eles mataram Chikaku e podem nos matar!

—Vamos dar a eles a chance de se defenderem. - Sakkaku Uso rompe o silêncio que havia estabelecido para si desde o início do julgamento.

Foi nesse momento que percebi que todos que estavam comigo estavam quebrados demais para conseguirem se defender, assim como todos os reinos estavam por anos, aprisionando as mulheres em um sistema injusto e cruel. Alguém deveria lutar por eles. Não. Eu deveria lutar por aqueles que me importam.


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