Sempre Em Minha Vida escrita por Sill Carvalho, Sill


Capítulo 1
Capítulo 01 — O Pedido


Notas iniciais do capítulo

Oi, pessoal!
A princípio seria uma one-shot, acabou que ficou maior que o esperado se tornando assim uma Short-fic. Terá em média de 15 a vinte capítulos, pode ser que tenha mais ou pode ser que tenha menos.
Espero que gostem.



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A fileira de carros se estendia por toda a rua onde ficava a escola primária, num bairro tranquilo de New Bern. Rosalie esperou pacientemente até chegar sua vez de receber Joshua, o filho a quem tem dedicado todo seu amor.

O garoto estava com quase oito anos. Crescendo sem a presença e o amor do pai. Seu relacionamento com o pai de Joshua começou no ensino médio, embora tenham se conhecido bem antes disso. E acabou no dia seguinte ao baile de formatura, quando, cada um, seguiu seu caminho para a vida adulta por estradas diferentes.

Rosalie abriu mão de algumas coisas, para ter ao seu lado a criança que transformou sua vida. Jamais se arrependeu de ter escolhido ter o filho. Joshua era hoje o maior amor de sua vida. Não conseguia imaginar um futuro onde ele não existisse.

Joshua era uma criança feliz. Apegado a mãe e aos avós maternos, de quem nunca esteve longe por muito tempo. Mas já tinha algum tempo, vinha fazendo perguntas, demostrando o interesse em saber cada vez mais a respeito do pai.

Em momento algum, durantes anos de conversa, Rosalie escondeu dele quem era seu pai. Omitindo apenas o fato de o pai não saber que ele existia. Se Emmett hoje não sabia que era pai de um lindo e esperto garotinho, foi porque escolheu assim.

Acreditando estar fazendo a coisa certa, escondeu a gravidez para que ele não desistisse de correr atrás do futuro o qual planejou a vida toda.

Um sorriso involuntário marcou presença em seus lábios ao avistar Joshua caminhando na direção do carro, após ser liberado na entrada da escola.

Apesar de os cabelos serem louros como os seus, Joshua tinha muito do pai; o azul de seus olhos, as covinhas marcantes ao sorrir. E muitas vezes, lembrava no modo de caminhar.

Vê-lo sorrir era sempre a sua parte favorita do dia.

Joshua se aproximou, com a mochila nas costas, e a lancheira na mão. O sorriso que ela amava, estampado no rosto.

— Oi, mamãe — ele parou ao lado da porta do veículo. A voz soando animada, como sempre acontecia.

O que Rosalie mais desejou, foi pegá-lo no colo enchê-lo de beijos e apertos de carinho. Ela abriu a porta, do lado do carona, para ele entrar no carro.

— Como foi o seu dia? — pediu, vendo-o entrar, pronto para receber seu abraço. — Hummm… — murmurou ela. — Que abraço mais gostoso, vida. — O apertou um pouco mais, com mochila e tudo. — Te amo! — declarou quando Joshua saiu do abraço.

— Eu também amo você — respondeu o menino. E imediatamente passou para o banco de trás.

— Põe o cinto. — Instruiu que fizesse, assim que o menino se colocou no assento elevatório. Ele obedeceu prontamente.

Embora quisesse sair dali com o carro logo que Joshua se acomodou, teve de esperar a via de acesso à entrada da escola ser liberada por outros pais que, assim como ela, pegavam seus filhos. Ao transitar naquela área o veículo se movia devagar.

— Como foi o seu dia? — tornou pedir.

— Foi bem legal.

— Que ótimo, vida. Você já começou distribuir os convites para o seu aniversário? — Ela olhou para o filho através do espelho retrovisor interno, assim que ouviu a resposta que deu.

— Ainda não.

— Por que não?

— Estava pensando… Esse ano eu não vou querer uma festa de aniversário.

— Você sempre gostou de comemorar seu aniversário na companhia de seus amigos. Por que está querendo fazer diferente esse ano? — O desejo repentino de cancelar a festa de aniversário a deixou preocupada. Analisando o rosto dele no reflexo do espelho retrovisor, tentou encontrar a origem da mudança.

— Eu tenho um pedido para te fazer — emendou Joshua, olhando propositalmente para o lado de fora pela janela.

— Pode fazer, meu amor.

— Posso falar sobre isso depois?

— Claro. Só lembre que não podemos entregar os convites em cima da hora, para que seus amigos não marquem outro compromisso para a data e horário. — Percebeu soltar um suspiro, aliviado.  — Olhou novamente o reflexo dele no espelho. Por alguma razão, Joshua havia ficado preocupado. — O que houve vida?

— Mamãe, eu não quero te chatear. Também não quero que fique triste por minha causa.

— E por que isso aconteceria? — Lentamente o veículo fez uma curva à direita, saindo da área da escola.

Joshua se distraiu olhando um homem de meia-idade passear pela calçada com o cachorro, um pastor-alemão. Por um momento, imaginou que ter um cachorro fosse ser seu pedido. Joshua, assim como ela, já tinha demonstrado amor aos animais. Ela realmente pensou que pudesse ser isso.

— O vovô e a vovó virão jantar com a gente hoje?

— Não. O seu avô está indisposto. Sua avó disse que foi porque ele comeu porcarias na rua. Ela está cuidando dele agora.

— Então, se eles não vão jantar com a gente, podemos comer uma pizza?

— Bom, hoje não é dia de pizza, você sabe disso. Mas — ela pensou que por ele não está animado com a festa de aniversário que estava se aproximando, pudesse abrir uma exceção. —, eu posso pensar no assunto.

— Você tem de decidir antes de chegarmos em casa.

— Tentarei me decidir antes disso.

O som do riso de Joshua lhe trouxe um pouco de tranquilidade.

[…]

Joshua correu para junto da porta levando a mochila nas costas e a lancheira na mão. Enquanto Rosalie punha a chave na fechadura, perguntou:

— Já decidiu mamãe? Vamos poder comer pizza hoje?

— Ainda estou me decidindo.

A porta foi aberta. Joshua entrou na frente, deixando a mochila e a lancheira no sofá da sala. Sem dar tempo de a mãe falar qualquer coisa, correu pelo corredor até seu quarto.

Rosalie recolheu a correspondência ao pé da porta. Em sua maioria, contas a pagar.  Deixou tudo no aparador junto com as chaves.

— Josh — chamou. — Já me decidi.

O menino voltou até a sala correndo, trazendo com ele um de seus dinossauros da coleção que mantinha desde muito novinho. O sorriso que ela amava, estava outra vez marcando presença em seu rosto.

— Pizza — disse ela.

— Uhull — Joshua comemorou, erguendo os braços no alto. Sem esconder o sorriso vitorioso. — Pizza!

— Como posso resistir a esse sorriso. — Chegou perto do menino, cutucando sua barriga. Joshua se contorceu sob suas mãos, rindo cada vez mais. — Vamos comer pizza, então. Menino levado.

Entre risos e gargalhadas, Joshua se pronunciou.

— Eu faço o pedido. Pode deixar que eu ligo, mamãe.

Rosalie o deixou ir.

Joshua pulou no sofá, para depois pegar o telefone fixo e digitar o número da pizzaria cujo sabia de cor.

— Estou na cozinha, se precisar — Rosalie avisou, desaparecendo no cômodo ao lado.

— Não se preocupe mamãe. Eu sei qual a sua favorita.

— É claro que sabe. — Ela sorriu. Até hoje poucas pessoas sabiam, com certeza, o sabor de pizza que mais gostava. Entre elas estavam seus pais, Joshua e Emmett.

— Você não tem saído muito com amigos desde que eu nasci.

— Espertinho. Como sabia disso?

— Eu adivinhei — ele tinha o sorriso zombeteiro no rosto. — Eu sou bom em adivinhar.

— Adivinhou? Ahan… Sei…

Joshua deu uma gargalhada. Em seguida, ouviu que falava com a atendente da pizzaria.

[…]

Nova York

Emmett deixou o elevador, levando o celular na mão. O terno italiano, impecável. Os cabelos escuros ondulados, olhos azul-claros, estilosa barba por fazer. Hoje, um executivo bem-sucedido. Tinha quase tudo o que desejou construir, exceto uma família.

Durante sua trajetória, muitas mulheres passaram por sua vida. Porém, nenhuma delas permaneceu tempo suficiente. Ele foi incapaz de esquecer Rosalie, e construir uma vida a dois, com quem quer que fosse. Até hoje, não sabia com certeza se o que disse quando terminaram, era verídico.

Tentou se comunicar com ela durante o primeiro ano na faculdade, sem sucesso. A última informação que teve foi de que havia se mudado de Raleigh, cidade onde cresceram com pais. Não teve qualquer informação dela depois disso.

Foi somente no segundo ano de seu curso na universidade de Columbia, depois de inúmeras tentativas fracassadas de contato, que desistiu de tentar. Não funcionou como gostaria, porque Rosalie sempre esteve presente em suas memórias e coração.

Entre o termino de uma relação e outra, sempre se pegava voltando a época do enésimo médio, vivendo um amor adolescente que ficou no passado. Por alguma razão que desconhecia sentia-se ligado a ela.

Deixou o carro na garagem, e foi a pé encontrar com os amigos num bar moderno do Upper West Side. O local tinha um imenso bar de granito e uma iluminação teatral. A concentração de pessoas tornava o local o reino dos yuppies.

Não diferente dele, a maioria dos clientes, parecia ter vindo direto do trabalho, na Wall Street ou Madison Avenue: paletós, ternos italianos e gravatas hermês. Homens que pareciam não querer nada além de observar as mulheres que frequentavam o local. Mulheres que trabalhavam em editoras ou agências de publicidades. Usavam roupas de grife e saltos absurdamente altos. Bebericando seus drinks, fingindo não vê-los.

[…]                                               

— Mamãe, a pizza chegou — Joshua fazia a lição de casa, na mesa da sala de jantar, quando a campainha avisou para a chegada do entregador.

— Pode deixar que eu atendo. — Ela saiu da cozinha para atender a porta. Joshua largou o material escolar na mesa para ir atrás da mãe. Pagava pela pizza, quando ouviu Joshua comemorando atrás de suas costas.

— Pizza! Alguém me segura ou como até explodir.

Quando virou, após fechar a porta, ele dançava de um jeito maluco. Foi impossível não sorrir.

— Pizza! — disseram os dois ao mesmo tempo.

— A vovó não ia gostar nada de ver isso.

Rosalie deixou a caixa da pizza na mesinha de centro. Os dois se sentaram no tapete, ao lado um do outro, para comer pizza com as mãos.

— Bem, não podemos deixar que ela fique sabendo — lembrou Rosalie, fazendo do momento um segredo entre os dois.

— Com certeza, não — Joshua afirmou de boca cheia. — Isso é bom demais.

Juntos, comeram mais da metade da pizza. E assistiram há um pouco de televisão.

— Hora do banho. E nada de dormir tarde — Rosalie lembrou, com um tapa amistoso na perna de Joshua. — Amanhã é sábado, não tem aula, mas é dia de treino de futebol.

Joshua não apresentou dificuldade em aceitar. Futebol era uma das coisas que mais gostava de fazer.

— Tá bom. Indo pro banho.

Rosalie se levantou, recolhendo as coisas deixadas na mesinha de centro, após a pizza.

— Daqui a pouco passo no seu quarto para lermos um pouco antes de dormir. E não se esqueça de escovar os dentes, também.

— Tá bom — tornou a dizer.

Joshua deixou a sala. Ela soube que estava no banho quando ouviu o barulho de água correndo.

— Lave atrás das orelhas — gritou, esticando o pescoço na direção do corredor de acesso aos quartos, se certificando que ouvisse.

— Eu sempre lavo.

— Vou verificar depois.

— Você sempre faz isso — ele soou indignado. Ela não se preocupou em disfarçar o sorriso, Joshua não estava perto para ver.

— Não quero ser mãe de um porquinho. Apesar de achá-los uma gracinha.

Ouviu Joshua imitar um porquinho dentro do banheiro.

— Te amo! — ela falou para ele, achando graça.

— Eu sabia que diria isso — respondeu convencido.

— Você é muito esperto, vida.

— Não precisa ser muito esperto para saber que você me ama. Você diz isso o tempo todo, com palavras e gestos.

Rosalie balançou a cabeça. Chegando à cozinha, guardou o que sobrou da pizza na geladeira e jogou a caixa no latão de lixo ao lado da porta.

[…]

— Pronto para a leitura de hoje?

Joshua penteava os cabelos quando entrou no quarto. Ele atirou a escova de cabelos no pufe, com estampa que lembrava bola de futebol, correndo para deitar-se na cama.

Rosalie pegou o livro na estante.

— Você começa, ou eu começo? — Ela sentou junto dele, usando algumas almofadas para se recostar a cabeceira da cama. — Vamos iniciar um novo hoje.

— Então é melhor que eu comece. Por que se eu dormir enquanto você ler, não terei lido nada.

— Você tem razão. É importante que pratique a leitura.

Joshua recebeu o livro. Rosalie chegou ainda mais pertinho, depositando um beijo no alto de sua cabeça.

— Que cheiroso.

— Lavei do jeitinho que você me ensinou — comentou orgulhoso de seu desempenho.

— Você aprende rápido.

— Uhun. — Joshua balançou a cabeça. — Já posso começar?

— Quando quiser. A mamãe está ao ouvindo.

Não pôde deixar de notar como Joshua estava cada vez melhor na parte da leitura. No começo, ele tinha muita dificuldade. Isso a fez pensar no pai dele. Pelo que sabia, no início da vida acadêmica, Emmett também apresentou dificuldades com a leitura. Mas, assim como muita coisa, isso também passou e ele acabou se tornando um dos melhores alunos da turma.

— Mamãe — Joshua a chamou, um instante depois.

Rosalie acariciava os cabelos dele, afastando os fios para longe dos olhos.

— Sim?

— Você pode continuar agora? Estou cansado.

— Claro, meu amor.

Ela pegou o livro, dando continuidade do ponto onde ele havia parado. Joshua prestava atenção e, de tempos em tempos, arguia a cabeça para olhar no rosto dela. A cena se repetia praticamente todas as noites desde que Joshua nasceu. O momento da leitura havia se tornado uma das partes favoritas do dia, tanto para ele quanto para a mãe. Ainda assim, algumas vezes, se pegou imaginando como seria ter o pai lendo para ele antes de dormir.

No decorrer da leitura, Rosalie notou que seus pensamentos vagueavam para longe. E não era por estar vivendo os acontecimentos descritos no livro.

— Vida, já está com sono? — Fez uma pausa na leitura. — Quer que a mamãe apague a luz?

— Não quero que fique chateada comigo.

— Por que eu ficaria chateada com você? Não tem problema algum você querer dormir.

— Não é isso — Joshua soou preocupado.

— Não estou entendo.

— É que quero te pedir uma coisa. Na verdade, já tem muito tempo que estou querendo fazer isso. Sinto que não consigo mais esperar.

— Sabe que pode me pedir qualquer coisa.

— Estou com medo de te magoar, mamãe. Eu sei que me ama muito. Também sei que nada no mundo irá mudar isso.

Rosalie sentiu que o coração pudesse explodir com tanto amor por aquele garotinho. Jamais se arrependeu da decisão de telo, ainda que sozinha.

— Ah, Josh… Só existe uma coisa que pudesse fazer para me magoar. E eu sinto, com todo meu coração, que não vai acontecer.

— Eu sei o que é — contou de um jeito que demonstrava esperteza.  — A vovó me disse uma vez. E vovô, também.

O olhar de Rosalie encontrou o seu. Joshua viu que os olhos delas marejaram.

— Jamais vou deixar de te amar, mamãe. Nunca, nunquinha. Ainda que me peça para fazer isso. Em nenhum momento de minha vida.

Rosalie não conteve a emoção diante a declaração de amor do filho. Lágrimas lhe molharam o rosto facilmente.

— Mamãe — Joshua ficou preocupado. Mudando de posição, ficou de frente para ela. Erguendo a mão para secar as lágrimas em seu rosto.

— Não se preocupe vida. Não estou triste.

— Tem certeza?

— Sim, eu estou bem. — Ela segurou nas mãos dele e as beijou. — Então, o que queria me pedir?

— Eu quero… — ele hesitou.

— Pode falar Josh.

— Como presente de aniversário, quero poder conhecer meu pai. E eu nem preciso ganhar uma festa.

A revelação do desejo de Joshua fez seu coração gelar dentro do peito. Imaginou por muitas vezes, mesmo durante a gestação, que esse momento pudesse acontecer só não esperava que fosse agora.

Como não respondeu, Joshua se preocupou.

— Magoei você?

Estava assimilando o que ouviu. Balançou a cabeça, e piscou os olhos para afastar as lágrimas que se acumulavam outra vez. Não estava magoada por Joshua querer conhecer o pai. Só ficou preocupada que tivesse errado com ele quando tomou a decisão de escondê-lo de Emmett.

— Não, querido. Você não me magoou. Eu só não esperava que esse momento fosse chegar tão cedo.

— Você sempre disse que meu pai é uma boa pessoa. Que ele te amava muito. E que você também o amava. Mas nunca me disse por que se separaram. Nem porque meu pai nunca veio me ver.

Rosalie o abraçou.

— Ah, Joshua… — ela lamentou.

— Meu pai não me ama como você me ama?

Ela reconheceu o tremor na voz do filho, e isso fez doer seu coração. Joshua estava com medo do pai não amá-lo, e, em parte, era culpa sua. Como diria a Joshua que o pai dele nem mesmo sabia de sua existência sem ferir seus sentimentos?! Foi incapaz, mais uma vez, de contar a verdade.

— Mamãe?

— Eu sei, no fundo do coração, que seu pai te ama Joshua. Ele te ama. Não precisa se preocupar com isso. Eu sei que ele te ama.

— Não é a mesma coisa de eu saber.

— Seu pai te ama, filho.

— Então por que nunca veio me visitar?

— É que ele mora em outro estado.

— O pai do Nicolas, da minha turma, também mora em outro estado. Isso nunca impediu de ele visitar o filho. E eles também estão sempre juntos durante as férias escolares de verão.

— É que seu pai é muito ocupado.

— Está dizendo que meu pai não tem tempo para me conhecer? Como isso é possível?

Notou, com tristeza, que suas palavras mal colocadas havia magoado Joshua.

— Não, não é isso.

— É o que, então? — Joshua se afastou indo parar na beirada do colchão, aos pés da cama, onde Rosalie não pudesse tocá-lo.

— Josh…

Joshua abaixou a cabeça. Os ombros tremeram, e um soluço lhe escapou.

— Meus amigos zombam de mim, porque não tenho um pai. — Estava chorando agora. E sua tristeza era sentida profundamente por Rosalie.

— Mas você tem um pai.

— Onde que ele está então? Porque eu sei que não está morto. Você nunca mencionou que ele morreu.

— Eu não sei filho. Eu não sei… — Estava se esforçando para não desabar na frente dele. — Mas, eu juro. Aqui — pediu —, olha para mamãe. — Joshua ergueu a vista, embora não quisesse fazer isso. O tom do azul de seus olhos, realçado pelas lágrimas. — Eu vou encontrá-lo para você. Eu prometo.

Joshua viu nos olhos dela que estava falando a verdade. Voltou para perto e a abraçou, chorando. Ela o amparou.

— Desculpe mamãe.

Afagando suas costas, ela respondeu:

— Está tudo bem, querido.

— Eu ainda te amo, tá bom?

Rosalie sorriu, por detrás de uma cortina de lágrimas.

— Eu sei.

— Amo a vovó e o vovô também.

— Eu sei. E eles também sabem.

— Mas eu quero ter um pai, mesmo que ele more em outro estado. Quero conhecê-lo. Não quero mais ter de esperar.

— Eu sei… — murmurou, dando um beijo em seu pescoço. — Por que não tenta dormir um pouco agora? Precisa estar descansado amanhã.

— Tá bom — Joshua murmurou, saindo do colo dela para deitar-se na cama. Abraçando o dinossauro de pelúcia. Ela o cobriu com o cobertor de estampas infantis.

— Boa noite, vida — murmurou com os lábios tocando a testa dele.  — Eu te amo.

— Boa noite, mamãe.

Rosalie se afastava, quando ele segurou seus braços tornando a falar:

— Quando encontrar o meu pai, não se esquece de dizer que vou fazer oito anos. Que já não sou mais um bebezinho.

— Eu direi.

Joshua se virou de lado, buscando finalmente sua posição de dormir. Rosalie apagou a luz e o deixou sozinho.

Respirou fundo, enxugando as lágrimas no rosto.

— O que foi que eu fiz? — sussurrou para si mesma, já no corredor.

Minutos mais tarde, estava no sofá da sala contando para a mãe, por telefone, a conversa que teve Joshua.

— Você sabia que isso iria acontecer, mais cedo ou mais tarde — Esme soou firme naquilo que acreditava. — Ainda mais que sempre falou tão bem dele para o menino.

— Eu sei. — Rosalie fungou, enxugando o nariz com um lenço de papel. — Eu fiz tudo do jeito errado.

— Querida, não sei como vai fazer para dizer a verdade ao pai dele. E ao próprio Joshua.

Rosalie voltou a chorar.

— Quer que eu vá dormir aí com vocês essa noite? Parece que precisa de um colinho de mãe.

— Não é necessário. Joshua já foi dormir. E eu, bem, não acho que conseguirei dormir depois disso. A verdade é que preciso de um tempo, sozinha, para pensar.

— Se prefere assim. Só não esqueça que estou aqui, para o que precisar.

— Está parecendo eu falando com o Joshua.

— Talvez tenha aprendido comigo.

— Te amo, mãe.

— Eu também te amo querida. Vai ficar tudo bem, acredite.

— Tomara.

— O pai do seu filho sempre foi um bom rapaz. Tenho certeza que tudo irá se resolver da melhor forma.

— Eu escondi dele que esperava um filho. Eu menti.

— E agora terá de lidar com as consequências de sua decisão. Como a mulher madura que é.

— O fato de eu ter tomado a decisão que tomei, para não atrapalhar o futuro dele, não conta?

— Isso somente ele poderá te dizer.

— E que Deus me ajude.

— Sempre — Esme respondeu.

— E o papai, está melhor?

— Está aqui dormindo no sofá, com a baba caindo.

Rosalie acabou rindo. Sabia que era exagero da mãe em dizer o que disse sobre o pai. Após a ligação ser encerrada, ficou um tempo pensando no que fazer. Então, levantou e foi para o quarto.

[…]

Emmett saiu do carro no estacionamento do edifício, depois de ficar um tempo no bar com os amigos. Não teve tempo de pensar no que fazer quando entrasse no apartamento, foi surpreendido ainda na garagem por uma visitante.

— O que faz aqui, Gwen?

A jovem mulher caminhou em sua direção. Os cabelos escuros ondulados alcançavam a cintura. Parecia ainda mais alta do que era usando salto alto.

— Fiquei com saudades. Ah, que cara é essa? Foi você mesmo quem deu permissão para passar pela portaria e subir para o seu apartamento quando eu quisesse.

— Eu pensei que isso tivesse acabado.

Emmett seguiu para o elevador, com Gwen seguindo seus passos. Os saltos de seus sapatos fazendo barulho em contato com o chão.

— Gwen, estou cansado.

— Isso não é problema, posso cuidar de você. — Ela se aproximou. As portas do elevador se fecharam. Gwen encostou seu corpo no dele, com intenção de beijá-lo.

[…]

Rosalie não resistiu ao impulso de reviver algumas lembranças. Respirando fundo abriu o closet e pegou, na parte mais alta, atrás de alguns cobertores, uma caixa branca onde guardava pequenas lembranças do tempo em que esteve com o pai de Joshua.

Sentou na cama com a caixa no colo. Retirou a tampa devagar. Encontrou o canhoto de um ingresso para o show de uma banda de rock, que nem mesmo era fã. Foram mais por influência da irmã dele, Isabella, que na época não pensava em outra coisa. Riu dessa lembrança.

Remexendo mais um pouco, encontrou o papel da primeira bala que Emmett lhe deu. Era apenas uma menina de dez anos quando o conheceu. Durante as férias de verão quando os pais dele se mudaram de Beltimore para Raleigh. Balançava-se no balanço do parque, quando Emmett se aproximou e sentou no balanço vazio logo ao lado. Aquele sorriso maroto a acompanhou por toda adolescência.

Hoje via o mesmo sorriso, todos os dias, no rosto de Joshua.

Recordou de Emmett retirando a bala do bolso, estendo em sua direção com a palma da mão aberta. E então as palavras que vieram junto com a bala.

“Porque você é a menina mais linda que já vi”.

Colocou de volta o papel de bala na caixa. Encontrando, dessa vez, o canhoto de um ingresso de cinema. Isso havia sido três anos após o encontro no parque. Foi na sala de cinema onde deram o primeiro beijo. Ainda recordava como ficou nervosa quando segurou sua mão, apenas alguns minutos após o filme começar e deram o primeiro beijo. As velhas borboletas reviraram no estômago.

Foram tantos os momentos que viveram juntos: aniversários, festas de dias das bruxas, passeios, viagens de férias. Baile de formatura do ensino médio.

Encontrou um botão lilás no fundo da caixa. O mesmo botão que caiu de seu vestido, na noite que fizeram amor pela primeira vez. No porão da casa dos pais dele, onde, na época, funcionava como salão para ensaios de instrumentos musicais e também uma sala de jogos. Ela recolheu o botão antes de ir embora, dizendo que ficaria para sempre na caixa das lembranças. Lembrava-se de Emmett ter sido tão perfeito. Doce. Não fazia muito tempo tinham completado dezesseis anos. Dois jovens descobrindo o amor e também suas armadilhas. Depois daquele dia nunca mais conseguiram controlar os instintos. Bastava ficar sozinhos para tudo se repetir.

[…]

— Do que me chamou? — Gwen o empurrou, se enrolando em seguida no cobertor, na cama de Emmett.

— De Gwen — ele tentou disfarçar.

— Não, você me chamou de Rose. — Ela deu um tapa nele. — De Rose. Você me chamou de Rose. Quem é Rose?

— Gwen, pare com isso.

— Quem é Rose? — insistiu.

— Ela foi minha namorada na época do ensino médio.

— E você não conseguiu superar ainda? — Ela levantou enrolada no lençol. Catou as roupas no chão e foi se vestir no banheiro. — Isso é demais para mim.

— Gwen, pare de drama. Nem mesmo somos namorados.

Ela apareceu na porta do banheiro furiosa.

— Obrigada por me lembrar disso, que nossa relação se resume a sexo.

— Eu disse, desde o começo, que não me sentia preparado para ter uma relação fixa com alguém. Nunca menti para você.

Gwen mostrou o dedo para ele.

— Vai se danar.

Emmett vestiu a bermuda e foi atrás dela.

— Não vá embora assim. Vamos conversar. — Ele segurou seu braço, enquanto ela abria a porta para sair.

— Agora não dá.

Emmett a deixou ir. Fechou a porta. A caminho do quarto, passou a mão na cabeça.

— Por que tenho pensado tanto em você nos últimos meses? — falou consigo mesmo. Voltou a subir na cama e, na gaveta do criado-mudo, encontrou a fotografia, tirada há muito tempo numa cabine de parques de diversões. Sua imagem e a de Rosalie fazendo caretas para as lentes. — Droga, Rose — se queixou pondo a fotografia de volta na gaveta.

[…]

— Que droga, Emmett — ela fez o mesmo, guardando o botão de volta na caixa das lembranças. Levando de volta para seu esconderijo no closet.

Houve uma leve batida na porta, antes de ela ser aberta.

Rosalie saiu do closet, para encontrar Joshua no quarto.

— Tive um pesadelo — explicou o menino num murmúrio, coçando um olho com uma mão, na outra, segurando o dinossauro de pelúcia.

Rosalie estendeu a mão para ele, e o levou com ela para cama.

— Quer falar sobre isso?

— O meu pai, ele não tinha interesse em me conhecer.

Ela o cobriu com seu cobertor. Deitando-se ao lado dele em seguida.

— Foi só um sonho ruim. O seu pai nunca faria uma coisa dessas.

— Tá bom — Joshua murmurou, fechando os olhos.

— Dorme. A mamãe está aqui com você. — Ela afagou o rosto do filho, e ficou observando ele dormir. Pensando, onde estaria Emmett agora? Será que ainda pensava nela? Os pensamentos tomaram forma e acabaram deixando seus lábios. — Onde você está? Será que vai me perdoar quando souber a verdade? — percebendo o que tinha acabado de fazer, deu graças a Deus por Joshua está novamente dormindo e não ter percebido nada.

 


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Notas finais do capítulo

Se quiser deixar um comentário, responderei com muito gosto. Seria bacana saber quem está aí do outro lado lendo.

Obs: Para quem acompanha “Um Caminho Para O Coração”, estou indo atualizar por lá também.
Beijo grande

Sill