Sutil escrita por Minerva Lestrange


Capítulo 3
There's a Radiant Darkness upon us




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 - Café?

Encarou o copo de café e subiu os olhos em direção à pessoa que o estendia, em um gesto de paz.

— Com leite desnatado, açúcar duplo, chantilly e canela? – Barry confirmou e Caitlin finalmente pegou o copo, meneando a cabeça em agradecimento.

— Como médica, sabe que não deveria ingerir essa quantidade de açúcar a essa hora da madrugada, não é? – Cisco adentrou o laboratório utilizando óculos escuros e, praticamente, jogando-se contra a uma das cadeiras da mesa de operações.

— Como ser humano que sou, concedo-me o luxo de possuir um vício.

Ambos sorriram ferinamente um para o outro e Caitlin tomou o líquido, fechando os olhos e praticamente gemendo ao sentir a açúcar derreter-se em meio ao gosto de café. Deus, nunca deveria ter experimentado aquele café.

— Ei. – Barry inclinou-se em sua direção, diminuindo o tom para que a conversa ficasse particular. – Podemos conversar?

Caitlin respirou fundo, considerando que esperançosamente supôs que nunca mais fosse revisitar aquele olhar caloroso demais ao sair do flat dele. No entanto, ali estava aquele brilho novamente, naqueles olhos verdes, claramente cuidadosos dessa vez, mas repletos de algo a mais que não sabia/queria identificar.

Felizmente, passos e vozes apressados soaram pelo corredor, chamando a atenção dos três primeiros habitantes do laboratório naquela manhã. Segundos depois, Iris adentrou o córtex seguida de praticamente toda a sua família e seguiu exatamente em direção à Caitlin.

— Caitlin, ainda bem que está aqui. – A negra pareceu aliviada, retirando o casaco e guardando a bolsa.

— Onde mais poderia estar?

— O que está acontecendo? – Barry questionou lentamente, encarando Iris, Joe, Cecile e então Caitlin, que deu de ombros.

— Não tenho um horário decente para vir aqui por toda a semana que vem e todos insistem que não devo procrastinar mais.

— Mas... Não faz um mês que fizemos os primeiros exames. – Pegou i-pad a fim de verificar a data correta. 

— Eu sei! – Somente sua constatação fez Iris encher os olhos de lágrimas, o que fez Barry e Joe franzir o cenho em completo estranhamento, pois Iris nunca chorava. No entanto, a mulher respirou fundo, levando as mãos à têmpora e quase a encarando em súplica. – Será que você pode, sei lá, apenas... Ver como as coisas estão? Para deixá-los mais tranqüilos, sobre a questão do bebê herdar ou não os genes meta-humanos e...

— Claro que sim.

Apontou seu laboratório, deixando Iris seguir à frente e voltando-se rapidamente para encarar a todos muito incisivamente, como que avisando que se comportassem. Viu Cisco sorrir, observando muito tranquilamente o desenrolar da cena típica dos West, enquanto Barry apenas os seguia, pois também não estava esperando a invasão de sua ex-esposa grávida. A relação entre eles parecia melhor, passadas algumas semanas. Mais natural, talvez, e sem tantos tatos quanto antes.

Iris se deitou na maca acolchoada, levantando a blusa e exibindo a barriga de pouco mais de três meses. Caitlin seguiu os procedimentos normais, perguntando a ela sobre os sintomas sem realmente escrevê-los, pois gravava tudo que fazia ali, mesmo quando se tratava de uma emergência.

— Os enjôos estão sumindo, gradativamente, mas me sinto constantemente fraca e sonolenta.

— Bem... – Caitlin conjecturou consigo mesma, lançando um olhar a Barry.

— O quê?

— Está esperando um filho de Barry, precisará dormir e se alimentar melhor. Ingerir mais calorias por dia será importante para que mantenha a você e ao bebê saudáveis nos próximos meses. – Declarou de forma genérica, sem realmente adentrar a fundo a questão que o próprio pai da criança notara. Iris a encarou com o cenho franzido por um momento, incrivelmente conseguindo ostentar sua aura autoritária mesmo deitada naquela mesa, onde deveria parecer mais frágil.

— O que quer dizer com isso?

— O metabolismo de Barry é muitas vezes mais rápido do que o de que uma pessoa comum e, possivelmente, está gestando um bebê que, talvez, herde essa característica. – Espalhou o gel pela barriga da mulher, voltando a olhá-la, incisivamente. – Mas é uma análise preliminar. Agora que podemos fazer isso sem riscos e entramos na época propícia, vou realizar um exame não-invasivo. Então, terei resultados concretos sobre tudo que podem querer saber.  

— Tem certeza de que isso é seguro? – Joe perguntou, cruzando os braços de maneira preocupada, enquanto Caitlin sorriu.

— Fetos são mais fortes do que as pessoas pensam e já ultrapassamos o período de maiores cuidados. – Ligou o computador, relevando a imagem confusa do útero de Iris. Todos encararam tentando ver algo, embora soubesse que certamente não conseguiriam enxergar mais do que um ponto borrado. – Além disso, o material é colhido assim como em um exame de sangue.

Apontou a eles o pequeno pontinho que era o bebê West-Allen, deixando-os encantados e fez todos os procedimentos necessários, a fim de determinar a normalidade de desenvolvimento do feto. Joe parecia aflito e Barry, simplesmente, sem palavras, agora que estava ali. Iris, no entanto, parecia somente irritada por ter tido seus planos mudados para ir ao laboratório fora da data que haviam combinado somente porque comentara com Joe que poderiam verificar as questões práticas assim que ultrapassasse os três meses.

— Então, Caitlin, está tudo certo com o bebê? – Cecile questionou, tentando conter a ansiedade. A mulher tinha Iris praticamente como uma filha, além de ter tido alguns imprevistos na própria gravidez.

— Na análise pelo ultrassom, os dados aparentam estar normais. Mas podemos considerar, devido à situação extraordinária, que são informações preliminares. O que irei descobrir com esse novo exame é muito mais valioso. – Pegou um lenço de papel e limpou o creme gelado da barriga de Iris, enquanto Barry a ajudava a sentar-se e Caitlin afastava-se a fim de pegar o material correto para colher o sangue da mulher.

— Sabe, é ótimo que estejam preocupados com a saúde do bebê. – Barry começou lentamente enquanto Caitlin aproximava-se com os materiais sobre uma bandeja. – Mas seria bom que mantivéssemos os ânimos mais calmos.

— Iris não pode sofrer picos de estresse ou adrenalina. – Informou Caitlin, limpando a área do braço, onde encontraria uma veia adequada. – E, enquanto ela gesta uma vida, é nossa parte fazer com que os problemas não cheguem a ela.

— Ouviram isso? – Iris perguntou de maneira presunçosa à sua família, no instante em que enfiou a finíssima agulha, perfurando as camadas de pele, até sentir que atingira uma veia e retirar lentamente o sangue.

— Acho que não precisa utilizar isso para vantagem pessoal. – Constatou Joe, no que a outra revirou os olhos.

O êmbolo do estojo se encheu e Caitlin retirou a agulha, pressionando o algodão molhado no pequeno furo. Barry anunciou que assumiria dali em diante, o que pareceu ter deixado Iris um pouco retraída, mas não poderia simplesmente expulsá-lo dali. Então, enquanto depositava seu material em um frasco e o lacrava, Barry limpava o braço de Iris e colocava um algodão com esparadrapo.

— Bom... – Iris pigarreou enquanto ajeitava suas roupas. – Já que estou aqui, acho que devemos... Começar a planejar algumas coisas.

De costas, organizando seu material pós-consulta, não viu Barry concordar, mas pôde ouvir os passos de ambos saindo da sala. Antes que pudesse conter-se, percebeu-se encarando-os insistentemente pela parede de vidro, enquanto saíam do córtex e adentravam o corredor lado a lado. Era estranho vê-los juntos naquele ambiente novamente, como se tivessem voltado a ser o que eram.

Observando-os, não pôde deixar de sentir aquela sensação, que não deveria ser sua, de superproteção quanto ao velocista. Como no começo, Caitlin ficava aflita quando ele saía para combater um meta qualquer, bem como quando pisava em ovos ao redor de Iris, exatamente como naquele instante. As coisas pareciam ter melhorado, mas ver os dois juntos era como ler na testa de Barry que pertencia à outra, incondicionalmente.

Então, seus olhos recaíram em Cisco, sentado à mesa de operações, analisando-a sem disfarçar. Era como se lesse seus pensamentos, o que a fez voltar tremulamente à sua própria tarefa.

*

Caitlin encontrava-se displicentemente encostada à parede daquele beco mal cheiroso e estupidamente claro para aquele horário, encarando o celular, que mostrava uma réplica quase exata dos mapas da cidade. Cisco estava praticamente debruçado em seus ombros, por sua vez, também encarando o celular e ditando instruções.

— Não, Barry, você não pode tentar atingi-lo com sua força. Ele é forte o suficiente para contê-lo, em retorno. E duas forças colidindo...

— Eu sei. Astúcia, já entendi, Cisco. – A voz ofegante e irritada soou nos ouvidos de ambos. – Isso está uma merda.

— Podemos ir até aí, se quiser. – Sugeriu displicentemente, mudando o peso do corpo de lado. Fazia praticamente uma hora que saíra de casa, com a intenção de chegar ao Jitters no horário marcado para o chá de bebê de Iris, mas o alarme de ataque meta soou e precisaram agir antes de sequer chegar à porta do café, que fora fechado justamente para a ocasião. 

— Não. – Ele cortou. – Assim, todos chegaremos atrasados.

Levantou as sobrancelhas para Cisco, como que dizendo que isso era o esperado de Barry Allen, mas não falou nada e somente encarou os pontinhos na tela que representavam o Flash e o meta que ele combatia no momento. Ele estava incrivelmente mais centrado e cauteloso em seu trabalho de super herói. Ainda era o Flash destemido que conheciam, mas Caitlin percebia que seus passos estavam diferentes em comparação há dois meses antes.

— Você e Barry estão muito próximos nesses últimos tempos, não é? – Percebeu a tentativa de Cisco em soar displicente ao seu lado e sequer esforçou-se para encará-lo.

— É, acho que sim. Por quê?

— Eu não sei, talvez porquê...  – Encarou-o em seu rodeio, vendo-o dar de ombros. – Vocês parecem estar sempre alimentando uma piada interna qualquer, comunicando-se sem necessidade de palavras, e há todo esse cuidado e... Oh meu deus, ele a toca em qualquer ocasião possível...

— Do que está falando?

— Caitlin... – Cisco a segurou pelos ombros, encarando-a com seriedade e falando lentamente, como se estivesse explicando algo a uma descerebrada. – Olhe o que está bem à sua frente.

Somente o encarou, considerando o que dizia, o que poderia estar realmente diferente e o que era parte da imaginação do engenheiro. Barry havia, realmente, ficado mais próximo após o divórcio, mas sempre fora tão normal para Caitlin tê-lo por perto que somente o recebera sem questionar muito. Além disso, havia o ajudado em algumas ocasiões, aconselhado em outras, abraçado-o tantas vezes que sequer se lembrava. Era meramente o modo como funcionavam.

— Estou aqui. – Barry anunciou, trazendo o vento para fazer com que seus cabelos esvoaçassem. Tanto Cisco, quanto Caitlin se mantiveram em silêncio, somente encarando-o no uniforme vermelho enquanto tentava recuperar o fôlego, encostado à parede. – Eu estou aqui.

— Bem, estamos somente meia hora atrasados, o que é um recorde, mesmo para aqueles que não têm super velocidade.

Viu Barry sorrir falsamente para Cisco, antes de  sumir por milésimos de segundos e voltar com uma roupa casual. Então, os três seguiram em direção a cafeteria, enquanto os dois homens comentavam sobre o meta que agora se encontrava detido em Iron Heighs, um dos poucos lugares preparados para receber pessoas com poderes.

— Ei, você está bem? – Sentiu-o segurar seu cotovelo, suavemente, tão próximo quanto possível, lembrando-se imediatamente do que Cisco lhe dissera. Ainda hesitou, praticamente sentindo o olhar quente do porto-riquenho em suas costas. Por isso forçou um sorriso e confirmou.

— Sim, claro. Eu só... – Desvencilhou o braço com a desculpa de abrir a porta de vidro. – Estou com frio. Preciso de algo para beber.

O viu franzir o cenho ligeiramente, antes de voltar-se ao outro como que para tentar entender o que acontecia, mas Caitlin já os deixara para trás para cumprimentar todos os conhecidos, que haviam sido convidados para o chá de bebê. O local estava perfeitamente decorado em verde e branco para a ocasião. Iris havia insistido que não queria saber o sexo do bebê até a festa para revelá-lo, enquanto Barry quase a torturara para falar. No entanto, fizera um compromisso com a outra e, exatamente devido a isso, tinha em sua bolsa uma caixinha de madeira contendo sapatinhos que representavam fictamente o sexo do bebê.

Horas depois, tamborilou os dedos pelo balcão, considerando que pagaria caro por alguma gota de álcool naquele momento. Todos pareciam notar que havia algo errado – não com ela e Barry, simplesmente com ela, pois Cisco a pegara completamente desprevenida. Houvera aquela noite, em que quase se deixara levar pelas luzes, pelo clima, pelo olhar, e então... Nada. Não havia nada sobre o que Cisco pudesse estar conjecturando.

Observou o velocista conversar com Cisco, Wally e Jesse, empolgados e sorrindo, provavelmente falando sobre Star Wars ou algo muito mais nerd, como se aquele fosse o estado mais normal de todos ali, como se não colocassem suas vidas em risco todos os dias, como se o engenheiro não estivesse colocando coisas na sua cabeça. Somente uma sugestão a fizera repensar os últimos dois meses inteiros e não deveria estar tão suscetível assim.

— Está distraída. – Harry Wells da Terra 2 colocou uma xícara de café à sua frente e sentou-se ao seu lado. –Você nunca fica muito distraída.

— Fiquei muito melhor nisso depois de Killer-Frost.

— Não é desse tipo de distração que estou falando.

Ele ajeitou os óculos, encarando-a incisivamente, o que a fez respirar fundo e desviar os olhos para a janela logo ao lado, onde o sol se punha e as pessoas passavam com calma, somente aproveitando o dia de dezembro que mostrava-se mais frio do que qualquer outra coisa.

— Estou pensando no meu discurso.

— Snow. – Voltou a encará-lo em sua resignação. – Me incomoda saber que possam realmente querer vir até mim, por isso detesto ter de dizer isso, mas me sinto na obrigação considerando... Nossas vidas complicadas. Estou disponível, se quiser conversar.

— Por que todos acham que preciso de uma sessão de terapia hoje? – Perguntou a si mesma em tom baixo, como se houvesse feito algo errado, antes de voltar-se a Harry, que a encarava criticamente. – Eu estou bem, não preciso de conselhos.  

— Tenho certeza disso.

Da mesma forma sorrateira que chegou, ele pegou seu copo de café e levantou-se, sem querer levar a discussão adiante. Revirou os olhos e voltou a encarar a janela, mas não havia exatamente muito o que fazer, pois a todo instante alguém se aproximava para puxar assunto e não estava realmente a fim de manter uma conversa naquele dia. Levou uma das mãos à cabeça, sentindo o início da enxaqueca se aproximando.

Assim, momentos depois Iris aproximou-se, perguntando se finalmente poderiam fazer a revelação do sexo do bebê, afinal todos já haviam chegado. Em seus cinco meses de gestação, a mulher encontrava-se claramente nervosa. Essa não era a linha do tempo que conheciam, o futuro parecia em constante mudança agora e não sabiam o que faziam após a descoberta daquele dia. À Caitlin, soava como se Barry e Iris estivessem em constante adaptação, principalmente nessa etapa, afinal as coisas não deveriam acontecer daquela maneira.

Todos se aglomeraram ao redor de uma pequena mesa decorada com motivos infantis em tons de verde e branco e Caitlin levantou-se, ajeitando o vestido azul em seu corpo, pegando a pequena caixa de madeira, que continha o que eles queriam saber. Vinha guardando o segredo há semanas, pois descobrira o sexo do bebê com o exame de sangue, mas Iris fora reticente em não querer saber naquele momento. O chá fora uma insistência de Cecile, que argumentara que a outra não estava aproveitando sua gravidez como deveria, pois passava mais tempo pensando sobre os problemas que poderiam advir disso.

—Então... Estamos fazendo isso mais cedo do que esperávamos. – Seus dedos correram pela caixa em suas mãos e levantou os olhos para encarar Barry e Iris, lado a lado, ambos em expectativa. – Vocês estão fazendo isso antes da hora, na verdade, mas isso não deve significar que este é o momento errado. Pelo contrário, talvez esse seja o tempo certo. O tempo onde vocês recebem somente a recompensa, não a lição mais complicada. Cecile estava certa quando insistiu para que fizessem essa reunião e investissem nessa formalidade e celebrassem esse bebê, com todas essas pessoas que são importantes para vocês. Além disso, ela a conhece como uma filha, Iris, e este momento é tudo que você desejaria, caso não estivesse preocupada com o futuro. E todos nós estamos, mas... Não haverá outro momento como esse. Ou outra chance como essa para, talvez, fazer escolhas diferentes com o que têm nas mãos, sabendo o que já sabem agora.

Aproximou-se, entregando a caixinha a ambos, que a encararam de forma temerosa, como se somente seu olhar pudesse dizê-los qual era o sexo do bebê. Sorriu de forma encorajadora para Barry que, finalmente, abaixou os olhos para o objeto em suas mãos e o abriu. Iris levantou as duas mãos à boca, os olhos lacrimejando, enquanto Barry hesitou encarando o minúsculo par de sapatinhos.

— É uma menina. – Ele a olhou, quase sem entender. O abraçou antes que a hesitação fosse percebida por todos e ficasse ainda pior. Ele a abraçou de volta, um pouco perdido, uma das mãos ainda segurando a caixinha e Caitlin sussurrou rapidamente antes de se afastar.

— Olhe para Iris.

A mulher ainda encarava o minúsculo par de sapatos em um misto de emoções, sem saber como reagir ao fato de estar esperando uma menina, uma vez que deveria ser Nora em seu tempo correto, mas ali estavam eles bagunçando a linha do tempo. Caitlin a entendia, pois Iris, às vezes, quando ia às consultas ou a ligava para perguntar alguma coisa sobre a gravidez, conseguia falar sobre o que vinha sentindo. Era como se não tivesse direito a sentir-se feliz pelo bebê, pois sabia como tudo terminaria.

— É Nora. – A mulher encarou Barry, que já se esforçava tanto para sorrir. – É nossa filha, Barry.

Ela o abraçou, como há muito não acontecia, o que já soava um pouco estranho aos seus olhos e, passado os momentos de felicitações, afastou-se um pouco. Também estava com medo por eles, mas, como dissera a própria Iris, dias antes, esse não podia ser seu estado quando o bebê nascesse.

Apesar das inseguranças serem naturais naquela fase, Iris e Barry não deveriam pautar sua vida inteira e a relação que teriam com seu filho com base no que acontecera. Momentos depois, quando já se encontrava realmente implorando por qualquer álcool, Iris aproximou-se para agradecê-la.

— Ei, obrigada pelo que fez por mim. – A viu levar uma das mãos à barriga ainda pequena. – Por nós, na verdade.

— Realmente desejo que viva esse momento de verdade, Iris. – Segurou a mão dela sobre o balcão do Jitters, apertando-a. – Não podemos continuar deduzindo o futuro, não é?

— Viver em função disso é suicídio, eu sei. – Iris meneou a cabeça, sorrindo levemente. – Mas estou indo àquela terapeuta novamente, sem Barry agora. Para tentar... Me entender realmente, contornar traços de personalidade que possam vir a me tornar uma pessoa amarga.

— É bom que esteja se planejando para essa nova etapa.

A mulher concordou e passou a dar atenção a uma de suas amigas do jornal, que a abordara no balcão, dando espaço para que Cait se afastasse e subisse as escadas com um copo de café irlandês. Minutos depois da revelação, já se sentia mais leve pelo álcool naquele café em específico e por ter conseguido relaxar após o discurso. Por mais que a pequena intervenção de Cisco e Harry houvessem lhe retraído, estava realmente nervosa pelo que diria, pois sabia como aquilo seria importante para Barry e Iris, como deveria ser delicada, mas realista, como deveria deixá-los à mercê desse novo sentimento de paternidade e maternidade.

O notou muito tempo depois, sem mover um pé do lugar, quando adentrara a escuridão da noite de sábado no terraço do Jitters. Percebera que o ruído dos convidados lá embaixo diminuíra gradativamente com o passar dos minutos, mas, não se sentia no clima para ser simpática por educação com qualquer pessoa. Barry bateu a porta que dava para a sacada e aproximou-se com calma, apoiando-se ao seu lado e colocando um novo café irlandês à sua frente, pois acabara com o seu há muito.

— Obrigada. – Ele lhe sorriu e voltou-se à cidade, como ela, que continuou observando-o. – O que está havendo?

— Eu só... – Começou, abrindo a boca várias vezes para dizer, mas nada saiu até que suspirou e voltou-se à Caitlin. – Eu estou... Pirando.

— O que quer dizer?

Deixou o café sobre o parapeito e o encarou com atenção redobrada. A “atenção médica”, que Cisco dizia receber quando precisava ser cuidado.

— Não consigo me concentrar em lutar contra os metas enquanto minha mente está inteiramente focada em uma criança que será minha responsabilidade. – O viu expirar, frustrado. – Hoje quase nos atrasamos e tenho a impressão de que sempre será assim, sempre terei de estar em alerta, preocupado com o que posso vir a perder.

— Barry...

— Nós já perdemos demais, Cait. Essa é a verdade. – Ele deu de ombros, abaixando os olhos e Caitlin segurou seu braço, fazendo-o olhá-la após alguns momentos.

— Estamos construindo um mundo melhor para Nora. Todos nós. Essa é a verdade. – O viu abrir a boca para discordar. – Nora, claramente, sabia o que fazíamos e por que, ainda que fosse dolorido e complicado. Ninguém se coloca em risco por diversão, apesar de haver bastante negligência, às vezes...

— Por favor, não vamos entrar nisso novamente, não é?

— Não. – Ele franziu o cenho levemente, quase que surpreso que seu apelo infantil houvesse surtido efeito.

— Eu só quero que as coisas voltem ao normal, mas, a cada dia que passa, tudo que fazemos parece nos colocar cada vez mais nessa teia envolta pela Força da Aceleração. – O tom dele foi rancoroso dessa vez, sugerindo algum tipo de manipulação de seu destino.

— Barry. – Voltou-se completamente a ele, escolhendo as palavras certas sob os olhos verdes, que as esperavam de maneira frustrada e amargurada. Era possível perceber os pedaços dele a partir daqueles olhos, pois Barry era sempre tão transparente quanto ao que pensava e passava. – Esse é o futuro. Estamos nele, não somente pensando sobre, estamos vivendo ele. Está diferente, é claro, porque coisas diferentes ocorreram e continuarão a ocorrer, por que... Isso é normal. Coisas e fatos que não gostamos, que nos machucam, continuarão a acontecer. O fato de lidarmos com realidades diversas, viagens no tempo e poderes sobre-humanos pode complicar tudo, mas não podemos viver paranóicos com relação ao futuro.

— Tudo pode ter sido mudado, Caitlin.

— Eu sei, provavelmente foi. – Aproximou-se, levando uma das mãos ao rosto dele, vendo-o lentamente fechar os olhos e inclinar a cabeça em direção à sua mão. – Nada que façamos pode garantir esse futuro certo e imutável que você deseja. Estamos escrevendo-o o tempo todo.

— Inclusive quando Nora veio para o nosso tempo. – Barry concedeu em um murmúrio, abrindo os olhos doloridos, enquanto Caitlin confirmava.

— Prometa que não vai abrir o jornal do futuro para verificar o que o aguarda.

— Cait...

Ele hesitou, parecendo atordoado por pedir algo do tipo. No entanto, não fazia sentido que continuasse buscando um futuro que achava que conhecia em nome de um jornal perdido no tempo. A manipulação continuaria existindo, se Barry não conseguisse seguir em frente por e para si mesmo.

— Não pode continuar a jogar com a Força de Aceleração agora que precisa se preocupar com uma criança. – Então, ele voltou-se a sacada novamente, encarando a cidade, parecendo dividido, pois Barry havia se acostumado a manipular o tempo. – Tudo que fizer poderá afetar sua existência e sei que não quer conviver com algo que...

— Que possa vir a dar errado com ela. Eu sei.

Ele ficou em silêncio por algum tempo, provavelmente considerando todas as variáveis, inclusive sua própria vontade volúvel, pois Barry sabia que poderia querer manipular algum evento futuro ou passado, caso as coisas dessem errado. Ele era um bom homem, isso era inegável, mas podia ser egoísta como um ser humano comum enquanto possuía poderes extraordinários, que o faziam ter de lidar com escolhas difíceis: como não usá-los exatamente para sua satisfação pessoal só porque podia.

Enquanto o via conjecturar com suas escolhas, encarou os olhos verdes que refletiam as luzes de Central City por todos os lados. Apesar de ser mais novo que ela, Barry já havia visto e passado por tanto que isso parecia doer em sua alma e refletir exatamente ali. Gostaria que a vida deles não fosse aquela miríade de problemas e perdas, porque se lembrava de como ele era no começo, sem a carga do que lhe acontecera com o passar do tempo, a começar por Thawne. Depois disso, nada foi como antes.

— Vou tentar deixar o jornal do futuro de lado. – Ele pegou sua mão sobre o parapeito e a levou aos lábios, encarando-a entre receoso e agradecido. – Eu prometo.

Caitlin meneou a cabeça e sorriu, minimamente, abraçando-o. Lembrou do que Cisco dissera mais cedo, mas escolheu ignorar as sensações dos braços dele ao redor dela e como adentrava essa espiral de sentimentos conflitantes quando estava com Barry.


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