Tome Tenência, Rapaz escrita por ArnaldoBBMarques


Capítulo 6
As Regateiras




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Caíque desligou o telefone após terminar a conversa com a mãe, que consistia basicamente de prestar contas do que ele vinha fazendo - sim, estou obedecendo a tia, sim, estou fazendo o serviço direitinho, sim, sim - e sentiu o tédio se apossar de seu ânimo. Já estava acostumado à dureza do trabalho e já não ia mais para a cama com os músculos doendo, mas agora já começava a sentir falta da badalação a que estava tão acostumado na cidade. Parecendo ler seus pensamentos, tia Rita veio a seu encontro com um sorriso.

— Por que você não vai dar um pulo na cidade ver a sua prima Márcia?

Caíque não se animou muito, mas não havia muitas alternativas naquela cidadezinha, onde ele, aliás, não conhecia quase ninguém. Afinal, era sábado, e era raro da tia libera-lo para sair.

— Mas quero você de volta até as oito horas, viu, rapaz?

Caíque ficou mais animado ao poder vestir uma roupa mais transadinha, ao invés das roupas de trabalho na fazenda. Já estava assobiando enquanto percorria o caminho até a cidade. Lembrava-se da prima Márcia, filha da tia Judite, dona da única pensão do lugar. Um ano mais velha que ele, era muito bonita, e diziam, muito inteligente. Como estaria agora, depois de tanto tempo? Caíque ia saber. Impressionava-o a quantidade de primos que tinha naquela cidade, a maioria dos quais ele não via desde criança, e alguns ele nem sabia que tinha. Sentia não ter muito a ver com eles, nem com os demais habitantes dali, mas de qualquer modo, seriam sua única companhia por um bom tempo.

Caíque percorreu a rua principal da cidadezinha, olhando ao redor e só vendo uns poucos botequins sem graça, e tomou o rumo da pensão da tia Judite. Ela estava na porta, parecendo já saber que ele viria. O rosto não mudara nada desde a última vez que a vira. Caíque ficou meio acanhado por um instante, lembrando-se do motivo que o fizera mudar-se para ali, mas a tia recebeu-o efusivamente.

— Márcia, vem ver, seu primo está aqui!

Lá dos fundos veio uma moça bonita e desenvolta, trazendo um sorriso largo. Estava mais alta desde a última que a vira, e não tinha mais o jeito de moleca de outros tempos.

— Oi, Caíque, quanto tempo, hein?

Sentaram-se na mesa e conversaram alguns assuntos gerais, mas Caíque não se sentia muito à vontade. Preferia estar ali em outras circunstâncias, ou melhor, preferia nem estar ali. Uma adolescente de olhar sapeca veio servir-lhes alguns bolinhos e suco. Olhando ao redor, viu três meninas da idade dele ocupadas em fazer um serviço ou outro comandadas por Isabel, a empregada. Notando o interesse dele, Márcia explicou:

— Essas são as regateiras!

Caíque lembrava-se que o povo dali chamava de regateiras as moças consideradas muito oferecidas, e de pronto entendeu: elas haviam sido mandadas vir morar com tia Judite porque andavam fazendo muita besteira na casa delas. Esse era o costume da parentada, e Caíque agora conhecia-o muito bem. Para marcar bem a diferença, elas tinham que vestir roupas de trabalho bem batidas, que as deixavam com as pernas de fora, e tinham que estar descalças. Márcia apresentou-as: chamavam-se Ju, Karol e Neusinha. Caíque achou-as bem interessantes, cheias de corpo, e continuou a acompanha-las com os olhos enquanto prosseguia conversa com a prima. Quando não estavam fazendo alguma tarefa, elas trocavam olhares maliciosos e cochichavam uma com a outra. Estariam falando dele?

— Por que você não vai dar uma volta com elas?

A proposta de Márcia veio acompanhada de um piscar de olhos que sinalizava: tome cuidado! Caíque achou boa a ideia. Tia Judite liberou para elas uma roupa melhor para vestir, e Caíque acompanhou-as até a rua, onde a tarde já caía e já começavam a aparecer grupinhos nas esquinas. Caíque teve a impressão de que olhavam para ele. As três regateiras agora pareciam mais desinibidas, e faziam-lhe muitas perguntas sobre a vida dele na cidade grande. Caíque respondia com prazer, e teve certeza de que elas estavam interessadas nele, mas ainda achava aquela situação um tanto inusitada, embora divertida. Um mês atrás, quem poderia apostar que ele estaria ali?

Foram até a pracinha e conversaram de grupo em grupo, sempre com muitas risadas. Em determinado momento, Caíque perguntou:

— O que tem para fazer aqui, de noite?

As três se entreolharam um instante, e Karol respondeu:

— Tem o baile...

Caíque achou o tom meio misterioso, mas de qualquer maneira não poderia ir ao tal baile, pois já estava na hora de regressar. Despediu-se das três e rumou de volta à fazenda pela estrada, agora escura. Na porta encontrou tia Rita a espera-lo de braços cruzados.

— Meia hora atrasado! Semana que vem não me sai, rapaz! E pode entregar o celular!


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