Tome Tenência, Rapaz escrita por ArnaldoBBMarques
Na caçamba de uma das pick-up's, Caíque equilibrava-se entre os solavancos da estradinha de terra, enquanto tentava conversar alguma coisa com os demais, todos parentes e amigos de Rosana. Não ia com a cara deles, mas sabia que tinha que atura-los, afinal eram a turma de sua namorada.
— Sua tia deixou você vir? - Provocou Quinzinho, um dos rapazes.
Com certeza a história do porquê ele viera parar ali já se espalhara, Caíque pensou. Sorriu malicioso, e não respondeu nem sim nem não. Os outros rapazes ao redor riram.
— HAHA Tome tenência, rapaz!
Como resposta, Caíque enlaçou o ombro de Rosana e deu-lhe um beijo. Sempre fazia assim quando o pessoal enchia o saco demais, e tinha certeza de que isso alfinetava-os. Sobretudo aquele Quinzinho, que parece já tinha sido ou queria ser namorado de Rosana.
As pick-up's seguiram por aqueles caminhos, volta e meia trocando de motoristas, embora alguns não tivessem carteira, mas ninguém se importava. Todos ali eram gente mais ou menos da idade de Caíque, a maioria casais de namorados, e conversavam animadamente contando vantagem, estavam bem vestidos e pareciam ser mais ou menos ricos. Chegaram por fim a uma fazenda isolada, e desembarcaram. Caíque estava mais a fim de só ficar com Rosana, mas os outros toda hora o desafiavam.
— Vamos fazer um pega?
Caíque recusou, afirmando não ter carteira. Sabia dirigir, mas não estava a fim daqueles exibicionismos. Três outros rapazes se habilitaram, e deram a largada nas pickup's que deviam pertencer aos pais deles, sob o aplauso dos demais. Serpentearam sacolejando por aqueles caminhos precários, quase capotando os veículos. Na reta de chegada, o vencedor foi efusivamente saudado com beijos das meninas. Caíque recusou as bebidas e os cigarros que lhe foram oferecidos, mas andava com umas ideias.
— Ei gente, vamos fazer uma corrida de cavalo? Mais interessante do que correr de automóvel aqui!
A proposta foi imediatamente acolhida por Caíque, ante o olhar malicioso dos demais, que julgavam que um garoto da cidade não estaria muito acostumado com cavalos. Mal sabiam eles o quanto havia aprendido naqueles meses na fazenda da tia Rita, Caíque pensou, agora aquela turma de convencidos e que ia vê-lo ser beijado triunfante pela namorada!
Cavalos foram trazidos e selados por um empregado dali, e Caíque, Quinzinho e mais três rapazes se posicionaram na largada improvisada, cercados pelos demais.
— Aíííí...
— Quero ver...
Dada a largada, Caíque não teve dificuldade de manobrar seu cavalo, e logo viu que era o mais habilidoso, apesar de todos ali serem rapazes criados em fazenda. Esperou paciente sem se afobar, e quando viu um trecho reto e plano bem na sua raia, acelerou o cavalo e ultrapassou Quinzinho, rompendo a linha de chegada.
— Caíque, Caíque...
Conforme previa, Caíque recebeu um beijo de Rosana ali na frente de todo o mundo. Sentiu que sua estrela começava a subir. Mas Quinzinho não estava conformado.
— E pegar no laço, você sabe?
Quinzinho apontou um boi que pastava ali adiante, e Caíque prontamente respondeu que sim, ante o aplauso do pessoal que via o improvisado rodeio se formar.
— Quem vai primeiro?
Caíque ganhou no palitinho, e prontamente montou em seu cavalo munido de um laço, escutando os incentivos da plateia.
— Manda ver, Caíque!
Estimulado pelos gritos de incentivo e confiante com a experiência que ganhara com os peões de tia Rita lá no banhado, Caíque estava mesmo disposto a mandar ver. A recompensa viria depois de Rosana e da cara de tacho que iam fazer. Abaixado sobre o pescoço do cavalo, girando o laço devagar, Caíque calculou bem as passadas para mandar o laço no momento certo, e trouxe o boi bem laçado.
— Aíííí...
— Cinquenta e dois segundos! - Disse o garoto encarregado de cronometrar.
Caíque recebeu o beijo de Rosana, e Quinzinho apresentou-se como segundo concorrente. Caíque notou que ele já estava bastante bebido e fumado, o que não era nada bom para uma competição que exigia bastante frieza e concentração. Quinzinho acelerou o cavalo a toda, sem dúvida disposto a vencer Caíque na cronometragem. Mas o laço não pegou, o boi se assustou e correu, rompendo uma cerca e invadindo um grande canteiro de hortaliças. Vendo o boi a pisotear as delicadas plantas e querendo evitar um estrago ainda pior, Caíque prontamente pegou seu laço e montou no cavalo.
Mas Quinzinho não havia desistido, e gritou para que Caíque se afastasse. Sem querer saber de mais nada, Caíque prosseguiu, e Quinzinho foi atrás. Ao passarem por um portão estreito, os cavalos se chocaram, assustaram-se e empinaram. Caíque conseguiu segurar-se, mas Quinzinho foi ao chão.
— Corre lá, gente!
— Deu merda!
Empregados da fazenda apareceram e trataram de restabelecer a ordem. Quinzinho não conseguiu levantar-se, havia alguma coisa com a sua perna. Foi colocado na caçamba de uma pick-up, e a viagem de volta foi feita em clima tenso. Caíque sentia o silêncio hostil em volta dele, mas tinha a consciência tranquila de haver feito o que era certo. A seu lado, Rosana parecia meio desligada. Chegaram à tardinha, e Quinzinho foi prontamente encaminhado ao posto de saúde.
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