The Phantom Agony escrita por Yuma Ashihara


Capítulo 5
Possuindo Kim Namjoon


Notas iniciais do capítulo

Estou aqui mais uma vez, renascendo das cinzas hahaha' Mil perdões pela demora em atualizar esse projeto lindo e maravilhoso! Mas, bom, é um tema bem delicado e com um enredo um tanto complexo, então preciso de um tempinho especial para me dedicar a essa escrita para não dar M.

EU ESTOU MUITO FELIZ COM VOCÊS. Sério, eu estou tão acostumado a ser um autor flopado nessa categoria que eu estou realmente surpreso com a quantidade de comentários que estou recebendo de vocês, e com a maneira como a fanfic está sendo aceita! Eu sinceramente fiquei com certo receio de publicar, por se tratar de um tema tão específico como espíritos e mediunidade, mas ver a animação de vocês com o enredo está me deixando tão animado e emocionado... Nossa, eu só tenho a agradecer à todos vocês por me proporcionarem esses momentos, e espero de verdade continuar sendo um bom autor para vocês, espero continuar surpreendendo a todos com as minhas propostas de plots e com a forma com que os desenvolvo.

Bem, sem mais delongas, vamos à história! Boa leitura a todos!



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Não lembro ao certo por quantos dias fiquei daquele jeito, parado em silêncio enquanto encarava o nada pensativo, lembrando do que havia acontecido no dia em que encontramos com Taehyung e Hoseok no ponto de ônibus. Havia questionado Namjoon sobre o que havia acontecido naquele dia e, principalmente, sobre o que havia acontecido com Jimin para que ele se tornasse aquela criatura completamente desfigurada, mas aparentemente nem mesmo Namjoon conseguia explicar o porquê daquilo.

Depois daquele dia, também, passei a enxergar aquelas criaturas disformes com outros olhos. Se todo espírito pudesse vir a se tornar uma daquelas coisas, isso significava que, de alguma forma, eles poderiam voltar ao normal, assim como havia acontecido com Jimin no dia em que ajudamos Hoseok. O que me fazia levantar diversos questionamentos, principalmente sobre o que levava as criaturas disformes seguirem Namjoon até em casa, por mais que ultimamente eu às esteja afastando antes disso.

Taehyung também não voltou a aparecer, e estava preocupado com o que pudesse ter acontecido após aquele momento tão tenso. Mas o que me deixava mais tranquilo era o fato de Hoseok aparentemente estar bem, vide as conversas constantes que mantinha com Namjoon pelo celular. Naquele mesmo momento, enquanto estava em pé olhando pela janela, conseguia ver de relance Namjoon digitando freneticamente, deitado em sua cama com a barriga para cima enquanto lia as mensagens do Jung. Não percebi que acabei sorrindo com aquilo, voltando completamente os olhos para o Kim.

— Para quem não queria se envolver, até que você está empenhado em ajudar o Hoseok. - Deixei escapar, cruzando os braços e sorrindo de canto quando recebi os olhos de Namjoon.

— Ele é uma boa pessoa. - Respondeu, deixando o celular de lado para esticar os braços, resmungando um pouco no durante. Aproveitei aquele momento para me afastar da janela, aproximando-me do armário de Namjoon e atravessando a cabeça ali para olhar o que tinha dentro. - O que está fazendo?

— Procurando algo interessante ou bizarro, para que possa ficar te questionando e julgando depois. - Respondi, ouvindo uma risada mais ao longe. Bisbilhotar as coisas que Namjoon tinha acabou se tornando um dos meus hobbies de pós-morte favoritos. Por mais que eu não pudesse tocar ou segurar as coisas, uma olhada superficial conseguia revelar inúmeros detalhes sobre a personalidade de uma pessoa.

Naquele momento em específico suspirava um tanto decepcionado por não ver nada de muito interessante. O armário de Namjoon se resumia à roupas simples e sapatos jogados ao chão. Porém, quando estava prestes a desistir e procurar por outro cômodo, algo que se assemelhava à uma capa preta acabou chamando a minha atenção.

Estreitei os olhos e então me aproximei. A capa retangular estava com os caracteres "YAMAHA" bordados mais em cima, o que aguçou a minha curiosidade.

— Que capa é essa aqui dentro? - Perguntei, e enquanto aguardava a resposta consegui ouvir Namjoon se levantar da cama e caminhar na minha direção.

— Capa? - Perguntou, a voz já perto de mim. Namjoon abriu a porta do armário e então apontei para a capa que cobria o misterioso objeto que estava encostado no fundo. - Ah, é o piano digital do Jin. Ele não tinha espaço na casa dele, então pediu para que guardasse aqui.

— E desde quando o Jin toca piano? - Franzi o cenho, encarando-o um tanto confuso e surpreso.

— Essa é a questão. Ele não toca. - Respondeu, em seguida rindo da expressão incrédula que lancei à ele. - Ele comprou na esperança de aprender a tocar, mas nunca chegou a usar de fato.

— Que desperdício de instrumento... - Comentei, voltando os olhos para o piano coberto pela capa, passando a mão pela superfície e franzindo o cenho quando ela acabou atravessando o instrumento de uma vez.

Aquilo me fazia lembrar da minha juventude e de quando havia ganhado um teclado de presente de aniversário depois de muita insistência. Eu adorava compor naquele instrumento, e as letras pareciam fluir pela minha mente enquanto tocava, ao mesmo passo que meu estresse diminuía consideravelmente. Lembro que algumas vezes até mesmo tocava algumas de minhas composições para Taehyung quando este pedia após muita insistência, fazendo-me perder a paciência na maioria das vezes.

Acabei por sorrir com aquele pensamento, balançando a cabeça negativamente enquanto era observado por um Kim Namjoon curioso ao meu lado, que estava com os olhos mais abertos que o normal na minha direção. Ergui uma das sobrancelhas para ele, e então trocamos olhares por longos segundos em silêncio.

Gostaria muito de saber o que estava se passando na mente de Namjoon naquele momento, visto que não deixava de me encarar em momento algum. Os olhos escuros movendo-se lentamente pelos meus cabelos loiros e rosto, seguido por alguns suspiros, a respiração saindo com certa força de seu nariz. Era estranho, não era a primeira vez que pegava Namjoon a me encarar daquela forma, porém, não diretamente como ele estava fazendo naquele dia.

— O que foi? - Perguntei, franzindo o cenho, assim como um leve biquinho, vendo como Namjoon piscou repetidas vezes, como se tivesse saído de um transe, o que me preocupou de certa forma. - Está tudo bem, Namjoon?

— Sim, tudo ótimo! Melhor impossível! - Disse, mais do que depressa girando os calcanhares para voltar a se deitar à cama, porém, não sem antes de tossir algumas vezes. Tosse essa que estava se tornando insistente nos últimos dias.

Resolvi ignorar aquele episódio, assim como das outras vezes, e então caminhei em direção à porta do quarto, olhando uma última vez para trás em tempo o suficiente de ver Namjoon se acomodando sobre o colchão, ainda tossindo.

— Vou deixar você descansar. Está tossindo mais do que o normal. - Comentei, atraindo os olhos dele para mim mais uma vez.

— Deve ser o cansaço... Ultimamente o trabalho está exigindo demais de mim. - Respondeu, puxando as cobertas. Não consegui deixar de crispar os lábios com isso.

— Se o trabalho te faz tão mal assim, porque não procura outro emprego? - Inclinei minha cabeça para ele, levando uma das mãos aos fios para bagunçá-los um pouco. Vi Namjoon sorrir para mim, exibindo seus dentes perfeitamente alinhados.

— Está tão preocupado comigo esses dias, vou acabar ficando mal acostumado com toda essa atenção. - Ralhou. Rolei os olhos para ele.

— Você é um idiota, Kim Namjoon. - Devolvi, logo atravessando a porta sob as risadas de um Namjoon que continuou na cama.

Não consegui me conter em deixar escapar um pequeno sorriso no corredor, balançando a cabeça negativamente enquanto me dirigia à sala. Porém, aquele simples comentário de Namjoon acabou fazendo com que me perdesse em pensamentos mais uma vez. A verdade era que eu sequer havia percebido quando, de fato, passei a me preocupar tanto assim com ele. Talvez por conta dos últimos acontecimentos, após ter reencontrado Taehyung e termos passado por tudo o que passamos com Hoseok, além do fato de, supostamente, ter uma ligação espiritual com Namjoon.

Talvez essa conexão estivesse falando mais alto naquele momento, ao ponto de me fazer ficar preocupado sem sequer perceber. Porém, não encarava isso como algo ruim, muito pelo contrário. Ultimamente minha convivência com Namjoon teve uma melhora significativa, e posso até mesmo arriscar dizer que temos algo semelhante à uma amizade. Uma amizade completamente anormal, mas ainda assim uma.

E foi com esse pensamento em mente que acabei decidindo acompanhar Namjoon no trabalho pela primeira vez, obviamente sob muitas objeções do jovem garoto com o rosto em forma de coração. Porém, acabei insistindo, afinal, não havia como o Kim me impedir de seguí-lo para onde quer que ele vá. E admito ter sido uma experiência um tanto... Reveladora.

De fato, Kim Namjoon trabalhava demais, assumindo responsabilidades que de forma alguma condizem com a função que exercia dentro daquele escritório. Seu chefe exigia demais de si, as cobranças eram incessantes e seus companheiros de setor não eram as pessoas mais amigáveis para se conviver.

Pelo pouco tempo em que fiquei ali, sentado sobre uma mesa vazia em silêncio para não atrapalhar seu raciocínio, pude perceber como Namjoon era incrivelmente inteligente. Suas habilidades eram incríveis e conseguia se adaptar à qualquer tipo de informação nova e que fugia de sua rotina tão atarefada, além de possuir um auto controle impressionante. Era de se esperar que chegasse tão cansado em casa todos os dias, pois imaginava o quão desgastante era lidar com tudo aquilo sozinho.

Passei a admirá-lo após tomar conhecimento de sua história, e principalmente por descobrir que havia salvo a minha vida anos atrás. Porém, olhando-o agora fez com que essa admiração crescesse ainda mais.

E isso era estranho, muito estranho, pois sempre que pensava no assunto sentia um comichão na altura do peito, seguido por um calor reconfortante que não fazia ideia de como surgiu.

Ao final de seu expediente, tomamos juntos as ruas de Seoul, como era o costume desde o dia em que descobrimos que poderia acompanhá-lo. Namjoon colocou o seu par de fones bluetooth, para que assim pudéssemos conversar um pouco. O olhava com o canto dos olhos vez ou outra, vendo-o suspirar pesadamente e esfregar os olhos escuros cansados com as costas da mão por conta do dia cheio, e também por conta de algumas das criaturas retorcidas que o seguiam de vez em quando, mas que paravam e fugiam assim que percebiam a minha presença.

— É tão engraçado como elas correm parecendo gatinhos assustados. - Comentei, olhando para trás quando mais uma delas corria para longe de Namjoon, que acabou sorrindo de canto com isso.

— E eu estou muito feliz de te ter ao meu lado. - Ele me encarou de relance, em seguida voltando os olhos para a rua, as luzes dos postes começando a acender na medida em que começava a anoitecer. - Você está me ajudando muito ultimamente. Eu não sei se é intencional ou não, mas depois que nos encontramos estou finalmente tendo boas noites de sono.

Eu estava surpreso. Não esperava ouvir aquilo dos lábios de Kim Namjoon, que sorriu visivelmente encabulado enquanto desviava o olhar do meu. Nunca fui o tipo de pessoa que se empenhava em ajudar alguém, e estava admirado comigo mesmo por estar tão disposto a colaborar com Taehyung, e sequer havia percebido que, estando ao lado de Namjoon e expulsando aquelas criaturas de sua presença o estava ajudando. Na verdade não via nada demais no que fazia, até porque aquelas criaturas me incomodavam também, e sempre me sentia desconfortável quando Namjoon não dormia como se devia.

Acabei suspirando pesadamente, escondendo as mãos nos bolsos da calça branca enquanto continuava a caminhar, voltando os olhos para a paisagem urbana de Seoul à minha frente analisando o fluxo de pessoas e, provavelmente, espíritos trajados inteiramente de branco assim como eu, acompanhando outras pessoas e às vezes interagindo entre si. Assim que ouvi tais palavras saindo dos lábios de Namjoon, imaginei que estivesse brincando comigo quando disse que eu provavelmente seria um anjo da guarda ou o seu mentor, e admito que pensava assim até poucos dias atrás, quando, de fato, parei para observar o mundo à minha volta e constatar que ele tinha razão no que dizia. Eram raros os casos em que via alguém desacompanhado, a maioria das pessoas eram acompanhadas por essas entidades de branco, algumas que até mesmo emitiam certo grau de luz, como se a pele branca brilhasse de certa forma.

Além disso, cruzar o caminho de um desses espíritos me causavam sensações... Peculiares. Como uma onda de energia muito boa que percorria todo o meu corpo e parecia expulsar tudo de ruim que existia em mim. Por diversas vezes, enquanto esperava Namjoon deixar o trabalho, acabava por me encontrar com um ou outro espírito com essa característica, e eu sempre me sentia tão leve após o contato, como se estivesse carregando uma paz interior quase indescritível.

Obviamente, tal sensação era temporária, e poucas horas depois estava de volta ao meu deplorável estado emocional de sempre, torturando-me pelas lembranças de quando estava vivo.

Aquilo me fez suspirar e fechar os olhos por breves momentos. Nunca fui uma pessoa muito religiosa, e mesmo após tudo o que venho presenciando, duvido que um dia venha a ser. Mas, caso Deus ou qualquer entidade divina exista, e se um dia eu tiver a oportunidade de conhecê-la, não hesitarei em questioná-lo sobre o sentido de tudo aquilo e sobre onde ele queria chegar. Às vezes acabo por me pegar em tais pensamentos, pois, se Deus é essa energia tão repleta de bondade, amor, compaixão e misericórdia como todos dizem que é, por quê faz com que seus filhos sofram tanto, tanto em vida como após a morte? Por que somos obrigados a vagar pelo mundo a procura de uma resposta que sequer sabemos por onde começar a procurar? Por que existem pessoas como Namjoon, que nascem com habilidades que não fazem ideia de como lidar e passam uma vida inteira em constante sofrimento e perturbação?

De fato, é difícil para mim acreditar em Deus e, principalmente, acreditar que ele é uma entidade boa. Que tipo de Deus é capaz de punir uma pessoa boa, apenas por ela ir contra o que Ele acredita ser como certo? Por que Deus puniria os ateus, homossexuais e pessoas de religiões e seitas não cristãs, por mais boas que elas tenham sido, apenas por não serem o que Ele quer e prega como sendo o correto?

Se um Deus egoísta é o que as pessoas adoram e veneram, então eu jamais o seguirei.

— Estou sentindo que está mais pensativo do que o normal.

A voz de Namjoon acabou me tirando dos meus próprios devaneios, e então ergui o olhar para ele, que me encarava com os olhos delineados visivelmente preocupados. Demorei um pouco de tempo para responder, ainda me recompondo dos meus pensamentos.

— Ultimamente estou tendo muito em que pensar. - Respondi, erguendo as duas sobrancelhas ao me lembrar de outra questão importante. - Namjoon, você nunca teve curiosidade em descobrir o motivo por trás dessa sua habilidade de falar com os mortos?

Encarei-o diretamente, Namjoon piscando algumas vezes enquanto processava a pergunta que havia feito. Era uma das coisas que estava me incomodando nos últimos dias após ouvir a sua história.

Vi-o respirar pesadamente, levando uma das mãos aos cabelos pretos e os coçando.

— Se eu disser que não, estarei mentindo. - Disse, rindo nasalmente. - Mas... É complicado. Eu já li alguns textos sobre mediunidade e, pelo o que eu entendi, a tendência é que essa sensibilidade acabe aumentando com o passar do tempo e conforme você for alimentando isso.

— Mas se você conseguisse compreender, talvez as coisas pudessem melhorar para você. - Disse. Voltei os olhos para a rua, estávamos perto de um beco escuro que passávamos todos os dias no nosso caminho de volta para casa. - Sabe, com certeza devem existir outros médiuns como você.

— Existem diferentes tipos de médiuns, Yoongi. - Namjoon praticamente suspirou aquelas palavras. - Quando meus pais me levaram àquele centro espírita eu tive a oportunidade de conhecer outras pessoas com diferentes manifestações mediúnicas, e você não faz ideia do quanto isso é assustador.

Fiquei a encarar Namjoon por um longo período de tempo, pensativo. Não faço a menor ideia do quão traumática fora sua experiência naquele centro, principalmente por sua pouca idade e dificuldade em interpretar e assimilar tantas informações novas sendo tão novo. Porém, Kim Namjoon agora era um homem adulto e, assim como eu, precisava arcar com as suas responsabilidades e encarar os problemas de frente.

Iria fazer outro comentário se não tivesse sido tirado de meus pensamentos por um barulho que vinha do beco escuro que tínhamos acabado de passar. Até mesmo parei de caminhar, voltando-me para trás por breves momentos, o que chamou a atenção de Namjoon para mim.

— Yoongi? Está tudo bem? - Perguntou.

— Acho que ouvi alguma coisa... - Disse baixinho, aproximando-me do beco em passos lentos enquanto o som de algo se chocando contra uma superfície metálica ficava mais alto, seguido de vozes. Porém, não conseguia entender o que elas diziam por conta da distância. - Parece que estão batendo em alguma coisa...

— Essa parte é um pouco perigosa, é melhor irmos para casa logo antes de termos algum problema. - Namjoon disse enquanto gesticulava para que o seguisse, e de fato eu o iria seguir, se não fosse por um grunhido alto que me fez ter um espasmo.

Voltei a olhar para o beco, e em seguida encarei o Kim ao meu lado com o canto do olhos. Era nítida a forma como Namjoon queria sair dali, mas algo me dizia que não deveria ignorar aqueles sons.

— Namjoon... Não precisa me acompanhar, mas fique aqui para que eu possa ver o que está acontecendo. - Pedi, recebendo um olhar de reprovação do outro, que cruzou os braços. - Por favor, algo me diz que isso é importante.

— Yoongi, você é um espírito, não um vidente. - Ralhou, crispando os lábios. - Não há nada que você possa fazer. Vamos para casa.

Fechei os olhos com força, tentando organizar os meus pensamentos. Sentia como se minha cabeça estivesse girando, perdido entre ouvir Namjoon e sair correndo para dentro daquele beco e ver o que estava acontecendo. E não demorei muito para decidir pela segunda opção, girando os calcanhares e correndo apressado para dentro do beco escuro.

Ouvi Namjoon me chamar umas três vezes antes de soltar um palavrão, mas ignorei completamente o que ele dizia e continuei no meu caminho. Uma das vantagens de se estar morto é poder caminhar sem ser percebido, e desta forma eu sequer precisava me preocupar em ser visto ou não.

Não demorei para chegar ao local que se originava os sons estranho que ouvia, e arregalei os olhos em espanto com a cena que se desenrolava ali. Três homens cercavam um jovem rapaz, que era visivelmente mais novo que eu e Namjoon, prensando-o contra um grande latão de lixo enquanto o espancavam covardemente, desferindo socos e chutes no estômago e rosto do rapaz que já estava com ferimentos consideráveis abertos, bem como cuspia uma quantidade preocupante de sangue a cada novo golpe na altura do estômago.

Eu jamais conseguiria descrever o quanto aquela cena me afetou, fazendo com que voltasse há anos atrás, quando me encontrava exatamente naquela mesma situação na época de escola. As imagens de repente voltaram nítidas à minha cabeça, a sensação de inutilidade, as dores de cada golpe dado contra o meu corpo, as palavras pejorativas que eram lançadas contra mim, voltando como um turbilhão que fazia a minha cabeça girar violentamente.

Sentia meu corpo tremer, os dentes fortemente trincados um ao outro. Eu precisava fazer alguma coisa para ajudar aquele rapaz, que já estava visivelmente tonto e que poderia desmaiar a qualquer momento. Porém, uma das desvantagens de se estar morto é não poder fazer absolutamente nada para ajudar os vivos.

A menos que eu fosse capaz de convencer um dos vivos a me ajudar.

— Namjoon! - Gritei como se minha vida dependesse disso, girei os calcanhares e me lancei para fora daquele beco, as pernas se movendo rapidamente para chegar de encontro à Namjoon, que felizmente ainda me esperava encostado na parede de uma delicatessen que estava fechada.

Ele encarou os olhos quando me viu esbaforido, afastando-se da parede mais do que depressa com o seu semblante preocupado.

— O que houve? - Perguntou preocupado.

— Tem um garoto lá... Ele precisa de ajuda! Vem comigo Namjoon! Temos que ajudá-lo! - Estava tão nervoso e ansioso com toda aquela situação que não estava conseguindo sequer explicar direito a gravidade da situação para Namjoon.

Eu apenas queria chegar, dar uma surra em quem estivesse fazendo aquilo e tirar aquele jovem dali.

— Yoongi, calma! Você precisa me explicar direito! Que garoto é esse? - Ele pediu, e então fechei os olhos, respirando fundo três vezes e engolindo em seco antes de continuar.

— Eu não sei Namjoon, mas precisamos fazer alguma coisa ou então ele vai acabar morrendo ali! - Reabri os olhos, encarando os de Namjoon suplicantes. - Por favor, eu não posso deixá-lo assim e você sabe o porquê.

Ficamos a nos encarar por longos e torturantes minutos, e eu apenas ficava mais nervoso a cada segundo que passava sem ter uma resposta do Kim. Gostaria muito de saber o que estaria se passando em sua mente naquele momento.

Observei Namjoon desviar o olhar para o beco, perdido e pensativo, repousando os olhos escuros em mim vez ou outra enquanto suspirava pesado, o que apenas me deixava ainda mais nervoso.

— Eu não sou bom de briga, Yoongi. - Ele disse e eu mordi o lábio inferior com aquilo. Namjoon voltou a me encarar. - Você conseguiria lidar com uma briga, se tivesse a oportunidade?

— Eu não sei. Mas preciso tentar. - Disse firme, vendo-o suspirar pesadamente.

Namjoon levou as duas mãos aos cabelos pretos, puxando os fios com os dedos enquanto bagunçava-os ao mesmo tempo. Mordia o lábio inferior, ainda pensativo, até que finalmente estalou os dentes, deixando os ombros caírem em desistência.

— Existe uma forma de você ajudar. - Ele me disse, e franzi o cenho sem entender.

— Como assim? - Questionei, e ele suspirou, fitando-me sério.

— Você terá que me possuir, assim como Taehyung fez comigo naquele dia. - Ele disse sério, e eu arregalei meus olhos em espanto. - Mas ao contrário do que aconteceu naquele dia, eu não irei oferecer resistência alguma à você. Desta forma, você conseguirá controlar o meu corpo.

Eu estava em completo choque, afinal, não estava esperando por aquela decisão dele. Na verdade eu sequer sabia que era possível controlar uma pessoa ao possuí-la daquela maneira, e ver Namjoon sugerir aquilo, mesmo depois do que aconteceu com Taehyung e de sua relutância em aceitar e acreditar em suas habilidades era no mínimo espantosa.

Fiquei a encará-lo enquanto guardava os fones de ouvido e fechava os olhos, esperando que fizesse o primeiro movimento. O que não demorei em fazer, visto que o som de mais um grunhido sôfrego vindo do rapaz do beco me fez fazer o primeiro movimento, e mais do que depressa atravessei o corpo de Namjoon.

Era uma sensação absurdamente bizarra, como se o meu corpo estivesse sendo completamente coberto por uma armadura quente. Conseguia sentir cada mínimo sinal vital do corpo de Namjoon, o pulsar de suas veias, as batidas de seu coração, os pulmões se enchendo de ar. Porém, o mais estranho era que, de alguma forma, eu conseguia sentir a presença de Namjoon ali dentro, mas não conseguia vê-lo.

Porém, uma coisa acabou me chamando a atenção. De repente estava sentindo uma forte dor na altura do peito, e que piorava toda vez que o coração de Namjoon pulsava. Era uma dor insistente e contínua, que acabava por me tirar o ar vez ou outra, e instintivamente acabei por ter um acesso de tosse, encurvando brevemente o corpo. Era exatamente a mesma tosse que ouvia de Namjoon nos últimos dias. Aquilo não parecia ser normal.

"Foco, Yoongi. Você não pode ficar muito tempo aqui." ouvi a voz grossa de Namjoon na minha cabeça, e naquele exato momento eu abri os olhos.

Eu não via Namjoon, por mais que movesse a cabeça de um lado para o outro, e quando a abaixei e reparei que não estava com as roupas brancas em meu corpo, percebi que, de fato, estava dentro do corpo de Kim Namjoon.

Era estranho e a dor no peito continuava, mas deixaria para pensar sobre isso depois. Rapidamente me movi para dentro do beco, porém, caminhando o mais silenciosamente possível. Agora que estava no corpo de Namjoon, qualquer movimento que viesse a fazer poderia colocá-lo em perigo. E essa era a última coisa que eu queria que acontecesse.

Um pedaço de pau entrou em meu campo de visão, e mais do que depressa o segurei com as duas mãos, engolindo em seco enquanto me preparava para o que estava por vir. Assim que me aproximei o suficiente, tive a visão do rapaz de quatro no chão, com uma das mãos sobre a barriga enquanto vomitava sangue de forma incessante, e os outros três rapazes rindo à sua volta.

A fúria subiu à minha cabeça quando um deles o segurou pelos cabelos, erguendo o rosto para desferir uma joelhada ali. Trinquei os dentes de Namjoon com tanta força e fiquei tão cego de raiva que resolvi mandar a segurança para o espaço, correndo em direção aos três rapazes e dando uma paulada no que havia desferido a joelhada.

Percebi que os outros dois ficaram extremamente atordoados com a minha aparição repentina e a forma desengonçada com que corri e me aproximei, afinal, era muito difícil controlar o corpo de um homem tão grande e pesado como Namjoon. Ergui a cabeça para os outros dois, o cenho franzido e dentes trincados ou no outro, enquanto balançava o pedaço de pau de forma ameaçadora para os outros dois rapazes.

Saiam daqui...— Disse, mas até eu mesmo estranhei a forma como a voz de Namjoon saiu de meus lábios, grossa e gutural, como uma besta.

O que de certa forma fazia sentido, afinal, ele estava possuído pelo meu espírito. E se tem algo que eu aprendi nos filmes de terror, é que nenhuma pessoa age normalmente após ser possuída.

Senti alguém agarrar o tornozelo de Namjoon, e percebi se tratar do rapaz que dei a primeira paulada. Não exitei em dar uma segunda, fazendo ele me soltar, em seguida lançando o pedaço de pau na direção do outro rapaz que estava vindo na minha direção, o que me deu tempo suficiente para desferir um soco no rosto do terceiro, que cambaleou para trás.

Usei aquele momento para puxar o jovem caído no chão pela gola da camisa e erguê-lo apenas o suficiente para que se mantivesse em pé.

Corre garoto...— Disse com aquela voz alterada, e o puxei para fora dali, correndo desengonçadamente enquanto puxava o rapaz, cambaleante.

Mas estávamos indo devagar demais, e ao olhar para trás percebi os dois homens correndo atrás de nós.

"Pega ele nas costas e corre direito, Yoongi!" Namjoon praticamente gritou na minha cabeça, e foi o que eu fiz. Abaixei-me e mais do que depressa o rapaz entendeu e montou nas costas do Kim, e então o segurei pelas pernas enquanto ele envolvia o meu pescoço com os braços e saí em disparada.

Não sabia de onde estava tirando forças para aguentar o peso do corpo de Namjoon e o corpo daquele rapaz. A única coisa que eu sabia era que, de alguma forma, toda aquela confusão de possuir o corpo de Namjoon e descer três homens na porrada havia sido bem sucedida. Afinal, quando olhava para trás vez ou outra, percebia que os rapazes estavam desistindo de nos seguir.

Porém, antes que eu me afastasse por completo, consegui ouvir um deles gritar em nossa direção algo que me deixou extremamente pensativo:

— Não pense que acabamos por aqui, Jeon Jungkook! São os vivos que pagam as dívidas dos mortos!

Eu não entendi o que ele quis dizer, e Namjoon aparentemente também não entendeu. Apenas continuei a correr, deixando aquele trio para trás.


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Notas finais do capítulo

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