Uma Canção de Sakura e Tomoyo: Finalmente Juntas escrita por Braunjakga


Capítulo 54
Sem querer, eu ainda quero ser mãe da Sophia




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Capítulo 52

Sem querer, eu ainda quero ser mãe da Sophia.

 

I

Madrid, Espanha

20 de julho de 2016

 

Palácio Real de Madrid

 

O professor Ramón Gaspar era um senhorzinho de 60 anos, de barbas e cabelos branquinhos, que tinha muito a ensinar sobre a língua espanhola para aquelas duas meninas da realeza. Apesar de ser velho, suas aulas não eram com quadro negro. Ele segurava um livro nas mãos e mostrava as ilustrações para as meninas. 

— Então, meninas, digam pra mim o nome de sete cores em espanhol que. a bicho preguiça aprendeu hoje…

— "Azul, gris, rojo, amarillo, verde, blanco y naranja" (azul, cinza, vermelho, amarelo, verde, branco e laranja)! — respondeu Carmen. 

— Muito bem! — O professor aplaudia. Ele olhou para Sophia e viu que estava desanimada, olhando para a cortina balançando numa janela próxima.

— Alteza? Algum problema? — perguntou o professor, sorridente. 

— Nada não, perdão Senhor Marquês de Alcorcón… — disse Sophia, escondendo o celular que tinha na mão debaixo do pufe. 

Carmen e o professor Ramón olharam para a princesa com surpresa, mas logo prosseguiram com a aula. 

— Meninas, continuando com as aventuras da preguiça… 

 

II

 

No corredor do palácio, terminando a aula, Carmen correu para ver como estava a amiguinha. Ela andava cabisbaixa, com o celular na mão.

— Al-te-za… — disse Carmen, tentando provocar Sophia para ver se ela reagia. Nada. — Sophia… Você tava distraída na aula… O professor viu você mexendo no celular… 

— Faz cinco dias que ela não fala comigo… 

Carmen entendeu logo que ela falava de Tomoyo.

— Mas não foi você quem falou que ela não era sua "mare" (mãe) mais? — perguntou Carmen. Sophia desabou em lágrimas no corredor mesmo.

 

III

Sant Joan Despí, Catalunya, Espanha

20 de julho de 2016

 

Nas oficinas do Barça, Tomoyo olhava para a fotografia de Sophia que havia tirado com Felipe e ela. Já faziam cinco dias que não falava com a menina e estava preocupada. Estava decidida a enviar uma mensagem o quanto antes para ela, nem que fosse um simples “oi”. 

“Como ela vai reagir? Será que ela vai gostar?”, pensou a costureira, lembrando-se da fúria que a menina demonstrou quando gritou que Tomoyo não era mãe dela. 

No fundo, aquele sentimento de dor dentro de si ainda latejava dentro do peito. Por conta disso, não sabia como reagir, nem como começar a falar.

Enquanto olhava a tela do telefone, ele tocou. Era Sakura.

— Alô, Tomoyo? Já tá saindo? 

— Sim, Sakura. Só estou pensando besteira aqui… 

— Tô com o carro aqui no estacionamento. O Felipe também deve estar esperando na oficina… 

— Está bem, estou descendo… — disse Tomoyo, desligando o celular. O retrato de Sophia ainda persistia na tela do aparelho. 

 

IV

 

Barcelona, Catalunya

Mesmo dia

 

Numa oficina de automóveis do bairro de eixample, Felipe olhava por baixo de um carro. Estava deitado numa prancha de rodinhas com algumas chaves de fenda nas mãos. Havia uma mulher de cabelos castanhos loiros do lado dele, preocupada. 

— Então, seu mecânico, o negócio é grave mesmo? — perguntou a mulher.

— Dona Laura… É problema da injeção. Vamos ter que trocar a peça… — disse Felipe, saindo debaixo do carro. 

— Que droga! Mal tinha feito a revisão! — disse Laura. 

— Talvez não demore tanto… Dá pra pedir a peça hoje mesmo e, em três dias, eu consigo trocar. 

Laura agarrou as mãos de Felipe com uma súplica no olhar.

— Obrigada mesmo, Felipe! Não posso ficar sem carro! — disse a mulher, não deixando de reparar na tatuagem em forma de árvore que ele tinha no braço. O olhar dela azedou na hora.

— A-ha! Então é isso que o Felipe faz quando tá fora da nossa vista! — disse Sakura, brincando.

— Oh, Tomoyo! Chegou, hein? O Felipe tava agoniado aqui, achando que você não ia vir… — disse um senhor fortinho de cabelos brancos que se aproximava das duas desde os fundos da oficina. 

— Que é isso, seu Toni! Eu que não consigo me afastar do Felipe! — disse Tomoyo, sorridente.

— Não consegue se afastar do Felipe, é? Desde quando isso, Tomoyo? Eu não te conheci assim… — disse Laura, sorridente.  

— Laura!? — disse Tomoyo, surpresa. Sakura e Felipe não deixaram de reparar na reação da morena.

— Vocês já se conhecem, é? — perguntou Sakura, animada por conhecer mais gente. 

— Todo mundo conhece a Laura Rovira de Vic! Ela é deputada no parlamento da Catalunha pela Convergència i Unió! — disse Toni, o senhorzinho de cabelos brancos. 

— Toni Soler! Você por aqui! — disse Laura, entrando no clima de reencontros. — Não sabia que era dono de uma oficina em Barcelona… 

— Os tempos mudaram… — disse Toni. 

— É, estou vendo. Estou vendo também que a Tomoyo mudou muito ou tava me escondendo coisas! — disse Laura, olhando maliciosamente para Tomoyo. A roxinha tentava disfarçar a vergonha.

— Laura Rovira… Agora me lembrei… Você foi colega de classe da Tomoyo na faculdade, não foi? Vocês fizeram parte da mesmo clube de Castellers, não é? Até viajaram para o Japão uma vez… — disse Felipe. Sakura sentiu uma lâmpada se acender na cabeça. 

— Puxa vida, é mesmo! Agora tô me lembrando! Você é aquela menina que tava sempre perto da Tomoyo, né? — perguntou a Cardcaptor. 

— Bem, vou deixar vocês à sós! Amanhã a gente se vê, Felipe! — disse Toni, saindo de cena. 

— Vejo que vocês sabem muito de mim… Até mesmo se lembram quando eu fui pro Japão…  — disse Laura, olhando atentamente para Sakura.

— Tomoyo nunca teve segredos comigo… — disse Felipe, num tom firme para Laura. 

— Só lamento ela ter me escondido esse tempo todo que arranjou um criminoso de guerra como namorado… — disse Laura. 

— Eu não sou um criminoso de guerra! — respondeu Felipe, muito irritado.

— Essa tatuagem me diz outra coisa! — retrucou Laura.

— Essa tatuagem diz que eu lutei, sim, pelo meu país, Catalunya, pelo meu pai e a minha mãe, vítima dos terroristas bascos e pela sua segurança também, passando frio e fome, dormindo ao relento. Enquanto você tava aqui, segura nos braços da sua mãe, tentando destruir nosso reino! — disse Felipe.

— Ora quem fala… — disse Laura.

O clima de tensão estava no ar. Sakura logo ficou entre eles.

— Calminha, gente, calminha aí! Acho que tenho muito a aprender com vocês esse tempo todo, né? Quero saber com quem a Tomoyo passou esse tempo aqui em Barcelona! Eu vim de tão longe só pra isso! Não vamos estragar tudo com uma discussão boba, né? — disse Sakura. Todo mundo se olhou e concordou com a trégua oferecida pela Cardcaptor.   

 

V

 

Os quatro foram andar pelas Ramblas de Barcelona. Passavam pela multidão de pessoas, mesas e cadeiras daquela avenida cheia de obras de arte, onde não passava um carro sequer. 

— Então, Laura, você era colega de faculdade da Tomoyo, é? — perguntou Sakura, andando ao lado de Laura.

— Sim. A gente teve uma vida juntas na faculdade … Dormíamos no mesmo dormitório e também… Tivemos uma história só nossa… — disse Laura, olhando para Tomoyo, que estava logo atrás dela, junto com Felipe.

— Uma história juntas… — disse Sakura, imaginando o que seria. Ela até ficou vermelha só de pensar o que era.

— A Tomoyo nunca quis levar nada pra frente… — disse Laura.

— Eu sempre deixei claro pra você que não estava preparada ainda pra assumir um namoro! Você me propôs um noivado quando eu só tinha 20 anos! Vinte! Você acha que eu vou embarcar numa loucura dessas sem me preparar direito? — disse Tomoyo, um pouco estressada.

— Tudo o que dava a entender era que a gente se dava bem. Por isso, eu dei esse passo e quebrei a cara. Mas eu entendi com o tempo que você tinha dúvidas se era lésbica ou não. Mas fico feliz que você tenha encontrado seu lado heterossexual, e também… — Laura olhou para Sakura. — Eu entendo que eu cheguei tarde demais quando outros já tinham chegado na frente antes… 

— Laura… — disse Tomoyo, tentando chamar a atenção dela. 

Dois homens de farda azul passaram na frente dos quatro. Felipe reconheceu quem era de imediato.

— A Guarda Real? — disse El Rey.

— Onde? — perguntou Tomoyo. 

— Seus amigos, Felipe? — comentou Laura.

Em poucos segundos, os homens de terno azul se aproximaram e falaram em catalão fluente com o monarca.

— Ma… Senhor Felipe. Sou o Ramon Espádaler e esse aqui é o Roger Montanyola… Venha conosco! A senhora também! — disseram os soldados, puxando Sakura.

— Hoe! O que é isso? 

— Depois explicaremos! Por favor! — disse Ramon, preocupado. Ele puxou Sakura e Felipe pelas mãos e os arrastaram pelas ruas de Barcelona. Tomoyo e Laura olharam a cena preocupadas, a costureira mais ainda, pois pensou em Sophia, mas não falou nada para não estragar o disfarce de Felipe.

— E agora? — perguntou Laura.

— Agora, a gente vai ter uma conversinha só nossa… — disse Tomoyo. 

 

VI

 

As duas se sentaram num restaurante-livraria das Ramblas mesmo. Havia estantes de livros nas paredes e refeições leves, como tapas, eram servidas nas mesas. Haviam muitas pessoas que iam até o local com seus notebooks para trabalhar também. 

— Se lembra, Laura. Eu sempre vinha estudar aqui depois das aulas… — disse Tomoyo.

— Eu não sei pra quê! Você sempre foi uma CDF! Você sempre teve facilidade pra pegar as coisas… Isso me encantava, sabia? — disse Laura, suspirando. 

— Foram essas coisas que aproximaram a gente, não é? — perguntou Tomoyo, agitando o açúcar dentro da taça de café gelado.  

— E ao mesmo tempo, afastou nós duas… — disse Laura, melancólica. — Quando eu vi, o Felipe já tinha aparecido na sua vida e… Em menos de um mês, vocês se beijaram. Eu fiquei tão pê da vida quando vi aquele beijo! Nunca mais quis saber de nada, mas, daí, meu carro quebra e me poe de volta na frente da pessoa que roubou seu coração de mim… 

— Laura, você fala como se tivesse alguma culpa nisso. Não se sinta culpada. Eu estava com vinte, vinte e um anos na época. Você entende que eu precisava me conhecer mais? Que eu precisava saber quem eu era de verdade? — disse Tomoyo. — Passei a minha adolescência toda trabalhando, ajudando minha mãe em casa. O tempo que eu tinha era pra estudar e entrar na faculdade. Só quando eu entrei na faculdade, eu passei a entender melhor quem eu era. Você já sabia disso faz tempo. Por isso que a gente não deu certo… 

— Você tinha que se conhecer com um homem de quarenta anos, Tomoyo? Pela cara dele, ele deve até ter filhos… 

— E daí? Qual o problema nisso? Agora tem que ter idade para as pessoas se conhecerem? — disse Tomoyo.  

— Não… Você tá certa… Mas você sempre estava tentando esquecer. 

— Laura, não é bem assim… 

— Não minta pra mim, Tomoyo! Eu me lembro do que você me disse quando tava bêbada! Você me pedia “desculpas, desculpas” e se lamentava por me usar pra esquecer. Esquecer quem, Tomoyo? Me diz? — perguntou Laura. Tomoyo olhou séria para ela, tentando não transparecer que estava encurralada. 

 

VII

 

Os dois soldados levaram Sakura e Felipe para perto do mar, no monumento a Colombo, no fim das Ramblas. 

— Soldados, o que está acontecendo aqui? Eu exijo uma explicação! — disse Felipe. 

— Majestade… Já sabemos que o Senhor anda se ausentando do palácio e tá vivendo uma vida dupla em Barcelona. Isso é, enquanto o senhor espera pela sentença… — disse Ramon. 

— Mas… Eu não disse isso pra ninguém! — disse El rey, agitado. — Meu irmão… 

— Dom Jordi não tem nada a ver com isso. Fazemos isso porque queremos, pois o Senhor é o nosso rei. Somos os responsáveis por manter a vossa segurança, até mesmo quando o senhor não quer… — disse Ramon, sorridente. 

El Rey aceitou as explicações deles, pois não queria prolongar o assunto. Precisava entender por que eles estavam lá. 

— Eu sou o soldado encarregado de manter a vigilância ao redor do senhor sob controle. Lembra-se de mim, majestade? O Roger? — perguntou o soldado Roger. 

— Sim, agora que você falou… 

— Fico feliz, majestade, que tenha se lembrado. Agora, preciso falar uma coisa urgente… — disse Roger.

— Hoe! Por que vocês tem que me trazer junto? — perguntou Sakura.

— A princesa Sophia desapareceu do palácio. Ninguém sabe disso, mas acreditamos que seja com magia. O rastro dela veio até aqui, Barcelona. — explicou Roger. 

Sakura e Felipe arregalaram os olhos. 

— Precisamos da sua ajuda, Sakura, pra encontrar ela! — explicou Ramón. 

 

VIII   

 

 De volta ao restaurante-livraria, Laura confrontava Tomoyo olho no olho.

— Me diz, Tomoyo: você tava me usando pra esquecer quem? Você ainda está usando esse pobre Felipe pra esquecer também? 

Tomoyo respirou fundo antes de responder.

— Laura… Você está certa. Você não é a primeira. Antes de sair do meu país natal, o Japão, eu conheci uma garota. Eu me apaixonei por ela, eu me declarei por ela, mas ela não sentia o mesmo amor que eu sentia por ela. Então, eu me mudei e fiquei longe. Fiquei longe pra pensar o que eu queria da minha vida, se era isso mesmo, se não era nada passageiro… 

Laura começava a chorar.

— E o que você pensou, Tomoyo?

— Eu pensei que… Toda vez que eu beijava uma menina, toda vez que eu me deitava com uma menina… Eu, na verdade, tentava encontrar ela em outra pessoa… Os olhos puxados, os cabelos curtos, a burrice dela, os carinhos, os medos, as lágrimas…

— E você encontrou, Tomoyo? 

— Não. Eu percebi que… Toda vez que eu me relacionava com meninas, eu estava querendo ela na verdade. Ela, no fundo, eu nunca conseguiria ter. Só partes dela espalhadas por aí… 

— Qual parte dela que eu tenho, Tomoyo? 

— Hum… — Tomoyo parou para respirar e sorriu um pouco. — O pavio curto…  

Laura e Tomoyo sorriram.

 

IX

 

Nas ruas de Barcelona, Sakura, Felipe, Ramon e Roger corriam no meio das pessoas.  

— Como é que vocês, Guarda Real, conseguem perder uma menina de cinco anos de vista? — berrou a Cardcaptor. 

— Sakura, por favor, fala baixo! Vai revelar nossa identidade! — disse Felipe.  

— Não é mistério pra ninguém, mas nós quatro somos magos. Você sente isso, Sakura. Sua majestade também. — disse Ramon.

— É difícil de acreditar mesmo que a Sophia tenha pegado um livro mágico e viajado até aqui! Como ela pôde ter feito isso sem ajuda dos outros? — perguntou Felipe.

— A princesa sabe falar com fantasmas. Ela perguntou pra um fantasma travesso e ele explicou.

— Hoe! Arrepiou aqui só de pensar como ela fez isso! Deve ser nojento! Yuck! — disse Sakura, quase chorando. 

 

X

 

No restaurante-livraria, Tomoyo e Laura continuavam a conversa que há muito tempo precisavam ter tido. Nesse instante, Tomoyo pediu um café gelado para o garçom e Laura não queria mais nada.

— Agora eu te entendo… Por isso que você não aceitou meu pedido de namoro? Nem de noivado?

— Eu não queria ser falsa com você e continuar um namoro onde o que eu mais buscava eu não tinha mais. Eu precisava de um tempo para esquecer esse meu primeiro amor e não te usar só para esquecer dela. Eu precisava amadurecer, sabia? Eu precisava gostar de você pelo que você era, e não por ter uma qualidade que esse meu primeiro amor tinha. Eu precisava desencanar de vez e olhar pra frente, esquecer essa minha obsessão pela… pela… 

— Pela? — perguntou Laura, insistindo. Tomoyo calou-se. — Não precisa responder mais nada. Eu já entendi. — disse Laura, pedindo uma lata de chá verde gelado. — Tá vendo isso? Eu aprendi a beber chá com você. No começo era ruim, mas eu me acostumei quando comecei a emagrecer… Eu, pelo menos, ajudei a esquecer o seu primeiro amor, Tomoyo?   

— Sim… Muito… Depois que eu pedi um tempo pra você e você me deu um fora, o Felipe apareceu e me mostrou um lado meu que eu nem sabia que tinha… 

— Imagino… Esse cara tem filho, né? 

— Uma filha. A Sophia. Conheci ele viúvo. Ele acabou de perder a mulher dele. Como eu não levava nada a sério, eu só fui saber da menina depois de um ano. No começo foi “estranho”, sabe? A gente que é lésbica nunca imagina que vai ter filho na vida, vai se relacionar com homem, mas… A Sophia apareceu na minha vida sem eu pedir, já me chamando de “mare” (mãe), sabe?

— Ela te chamou de mãe? 

— Sim. Você não sabe como aquilo me irritou no começo. Eu odiei. Fiquei durante uma semana tendo pesadelos com aquela menina de cabelo cacheado me chamando “mãe, eu quero isso”, “mãe, eu quero aquilo”, “mãe, me dá papinha”, “mãe, minha fralda tá suja”. — disse Tomoyo. Laura sorria. — Sabe? Eu nunca me preparei para ser mãe e aquela menina me veio como um carma para eu pagar na vida! Só de ouvir os relatos da Sakura cuidando do menino dela, eu já via que aquilo não era para mim. — disse Tomoyo. As duas gargalhavam.

— Quem disse que toda mulher tá pronta pra ser mãe, tá é muito enganado! — disse Laura. 

De repente, uma cadeira atrás delas rangeu. Um fino som de lágrimas saiu do nada, mas logo desapareceu. O coração de Tomoyo congelo.

— O que foi? — perguntou Laura.

— Meu coração ficou pesado de repente… — disse Tomoyo, com um semblante triste. 

 

XI   

 

Depois de tanto correrem, Sakura, Felipe e os guardas se cansaram. Agacharam-se e tomaram um pouco de ar.

— Calma aí, gente! Esse negócio de correr sem ter pra onde ir não dá certo! — disse Sakura.

— Mas foi você quem começou a correr primeiro, Sakura! — disse Felipe, chamando a atenção da cardcaptor.

— Oras, eu tava seguindo uma presença fraca que eu senti agora pouco e é muito parecida com a da Sophia… — disse Sakura, tentando disfarçar que corria aleatoriamente pelas Ramblas.

— Receio, Dona Sakura, que a magia dentro da princesa seja fraca demais pra que a gente consiga localizá-la apenas com uma sugestão. Precisamos que a senhora se concentre mais pra gente ter alguma pista mais sólida. — disse Ramon.

— Mas por que sempre eu com esse negócio de concentração, hein? — perguntou Sakura.

— A senhora tem um poder mágico fascinante! Desde Madrid, deu pra sentir aquela explosão de energia em Bilbao… É uma honra ter a senhora como aliada de sua majestade. — explicou Roger.

"Hum… Tô começando a entender um pouco do medo daquela Dona Beatriz", pensou Sakura.

— Bem, vamos lá! — disse a Cardcaptor. Ela fechou os olhos e uma aura arco-íris envolveu o corpo dela. Um pequeno fio de luz guiou os sentidos de Sakura até o local onde estava a pequena Sophia. Então, a cardcaptor abriu os olhos.

— E por alí! — disse Sakura, indicando o caminho.

— Mas, por ali… — disse Felipe, surpreso.

 

XII

 

De volta ao restaurante-livraria, a conversa de Tomoyo e Laura continuava.

— Mesmo você não querendo essa responsabilidade de mãe, você meio que virou uma mãe pra essa menina. Mesmo você não querendo se relacionar a sério, você se relacionou… — disse Laura. 

— Então… Essa minha relação com a Sophia e o Felipe… Foi uma coisa que eu não pedi, mas só foi depois que eu conheci eles que… Que eu finalmente pude amadurecer e encarar meus sentimentos de uma forma mais objetiva… 

— Mais objetiva? — Laura sorriu. — Como colocar objetivos numa coisa que nasce sem clareza, como os sentimentos?

— O Felipe me decepcionou muito por não me dizer um segredo dele do passado dele que eu só fui descobrir depois… 

— Segredos do passado ninguém merece… 

— Então… Só depois disso ele foi sincero comigo a ponto de me contar tudo, só que, mesmo assim, eu dei um tempo do Felipe…  

— Ficou longe? Mas logo se reencontrou com ele, né? O que te fez sentir tanta saudade assim?

— O "Moyo Mare" que ela disse na primeira vez que a gente se viu me tocou! Eu nunca tinha me imaginado como mãe, sabe? Foi meio que um desafio que eu aceitei… 

— E quando começou esse desafio?

— Da mesma forma que você encontrou o Felipe. Meu carro pifou e eu encontrei ele aqui, na oficina do seu Toni em Barcelona… 

— Você não sabia que ele era mecânico da primeira vez? 

— Até que sabia, mas nunca me aprofundei, nem quis saber. Meu interesse sempre foi com mulheres e sempre encarei o Felipe como coisa passageira… Que engano! Lá vem o destino juntar a gente de novo… O pior de tudo é que a Sophia estava junto dessa vez… 

— Estava, é?

— Sim… Ela estava tão bonitinha com aquele vestido de babados e lacinhos… Eu não resisti e comecei a tirar fotos dela, olha só! — disse Tomoyo, tirando o celular. Ela acessou na nuvem as primeiras fotos da princesinha e mostrou para a colega de faculdade.

— Que surpresa! Você sempre gostou dessas coisas, não é? Ela te chamou de "mare" quando vocês se viram?

— Ela se aguentou quanto pode quando a gente se viu de novo. O Felipe deve ter falado com ela e ela não me chamou mais de "mãe". Ela até chorou quando eu me despedi dela da primeira vez. Ela não me disse nada quando a gente se reencontrou. Eu fiquei incomodada, sabe? — disse Tomoyo. Laura sorriu. De repente, ouviram uma mesa atrás delas se mexer. As duas estranharam, mas depois voltaram a conversar.

 

XIII

 

Debaixo da mesa, a pequena Sophia chorava. Ela enxugava os olhos com os braços e de vez em quando dava cotoveladas nas pernas da mesma. 

— Sophia! Você fez barulho de novo! Não consegue ficar quieta?

— Disse uma voz, vinda de uma pessoa invisível aos olhos. 

— É que não dá, Neus! Eu não aguento essas histórias minhas! — disse a princesa. 

— Mas tem que aguentar! Não foi você quem quis ouvir? 

— Sim, mas… 

— Sem mais! Seu pai já tá vindo atrás de você! Você não vai escutar tudo se ficar atrapalhando!

— Meu pai? — surpreendeu-se a princesa.

 

XIV 

 

As duas se levantaram, mas alguma coisa as fazia se sentar de novo. Sentiram um arrepio na espinha e acharam melhor não investigar o que havia debaixo da mesa.

— Você ficou incomodada por que ela não te chamou de mãe, é isso? 

— Fiquei sim. Isso foi em fevereiro de 2011. Mesmo eu não querendo, eu sentia que eu tinha um coração de mãe. Como meu carro demorou pra arrumar, papo vai, papo vem e… 

— E vocês reataram?

— Reatamos nosso rolo! 

As duas gargalharam. 

— Então, no dia de Sant Jordi de 2011, a Sophia me chamou de "mare" e nunca mais parou. Nem eu quis que ela parasse. A gente nunca deixou de se falar por tanto tempo assim e… Eu sinto muita falta disso… — disse Tomoyo, já chorando. — Sem querer, eu ainda quero ser mãe da Sophia.

— Mas você é a minha "mare" ainda, Tomoyo! — disse Sophia, saindo debaixo da mesa com tudo. Ela derrubou a mesa e deu um abraço forte em Tomoyo. Nenhuma das duas se importava com cadeiras caídas, mesas reviradas e olhares do povo. Nem sequer Tomoyo questionou o porquê de ela estar debaixo daquela mesa. Aquele abraço recheado de saudades era o único mundo delas. 

Sakura, Felipe e os dois guardas reais entraram no restaurante-livraria e olharam a cena surpresos.

— Ah, olha só! A gente encontrou elas! Viu? Já se entenderam! — disse Sakura.

 

XV

 

Depois da bagunça, Felipe e Sakura levantaram as mesas e cadeiras que Sophia derrubou. El Rey, inclusive, se ofereceu para pagar pelos talheres quebrados e a conta de qualquer um que tenha se sentido incomodado. 

Enquanto isso, Laura, Sophia e Tomoyo conversavam.

— Tomoyo, promete que nunca vai deixar de falar comigo? — perguntou Sophia, apertando o pescoço dela. 

— Mesmo que você não case com o papai, promete que não vai me deixar? — perguntou Sophia.

— Calma, calma! Um pouco de cada vez, está bem? — disse Tomoyo, sorrindo.

— Tô vendo que essa menina é muito esperta pra idade dela! Até que você tem jeito de mãe… — comentou Laura. 

— Foi a Sophia quem me ensinou… — disse Tomoyo, fazendo um afago na menina e recebendo outro de volta.

— Agora eu te entendo, Tomoyo. Tem coisas que não acontecem na nossa vida pra acontecer coisa melhor mais tarde, né?  — refletiu Laura, olhando para Sakura e Felipe, discutindo na mesa com os dois guardas reais. — Só quero ver qual dos dois você vai escolher no final, pra sua nova etapa de mulher comprometida. — disse Laura, sorrindo. Sophia acompanhava tudo com o olhar.

— É claro que a Mare Tomoyo vai ficar com o meu pai! — disse Sophia. Laura riu e deu um beijo de leve nos lábios de Tomoyo, para espanto da princesa.

— Saiba, Sophia, que antes disso, ela conquistou o coração de muitas pessoas… Tchau, Tomoyo. — disse Laura, saindo do restaurante. 

 

XVI

 

Perto de Tomoyo, Sakura e Felipe viram o que Laura fez. E não olhavam com olhares amistosos para aquele beijo.

— Amiga da Tomoyo, e? — perguntou Sakura.

— Laura Rovira de Vic, deputada do Parlament de Catalunya… Ela namorou a Tomoyo antes de eu aparecer… — disse Felipe.

— Essa Tomoyo tá cheia de ex-namorada… Soltinha essa aí, hein? — disse Sakura. — Essa cara de Santinha nunca me escondeu nada. 

— Agora vou falar com outra "santinha" que me deve uma explicação… — disse Felipe, indo até Tomoyo. Sophia percebeu e saltou do colo da mãe de coração, correndo para fora do restaurante. 

— Sophia, volta aqui! Que história é essa de vir pra Barcelona com a ajuda de fantasmas, hein? — disse Felipe, correndo atrás da filha. Ramon e Roger, os guardas reais, seguram El Rey. Tomoyo sorria.

 

Continua… 




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