Magia Literária escrita por Emiko


Capítulo 8
Prova de União


Notas iniciais do capítulo

São tempos sombrios, é verdade...mas a ficção também pode dar vazão à realidade.
Aproveite!
Recomendação de música: twenty one pilots - Ride



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Era 16 de março de 2020, Hogwarts continuava sendo uma fortaleza robusta, suas altas paredes de pedra, escadas em mármore polido e janelas brilhantes como cristais, não demonstravam o período crítico que vivera há 21 anos. Porém, nem mesmo os tempos pacíficos, ou a aparência de segurança, poderiam camuflar o que se passava fora do castelo. 

Desde fevereiro, os ares haviam mudado. Uma atmosfera de desconfiança e ansiedade se perpetuou no mundo trouxa, e se alastrou para o mundo bruxo no início de março. Muitos trouxas e bruxos ficaram perturbados, não sabiam o que se esperar, somente especular. E não havia positividade alguma nisso. Ou pior, sorte, pois, sem demora, o primeiro caso de infecção foi relatada, no Hospital St. Mungus e, dali por diante, a situação começou a piorar.

Rapidamente, a doença se espalhou entre os pacientes em estados mais críticos, os curandeiros também não passaram despercebidos. Ninguém estava imune daquilo, e o Ministério da Magia teve de intervir drasticamente. Todos os comércios deveriam ser fechados, os trabalhadores deveriam ficar em casa, ou, caso fosse necessário sair, realizariam uma minuciosa rotina de higienização. Mas, e quanto os estudantes? Eles estavam isolados em fortalezas afastadas, porém, quem iria garantir que, cedo ou tarde, não seriam também vítimas daquela silenciosa doença?

Assim, em um reunião extraordinária, os professores de Hogwarts e a diretora McGonagall, procuravam, ou tentavam, pensar na melhor solução. Neville sugeriu que todos fossem mandados para casa, imediatamente, mas Flitwick logo constatou que poderiam estar mandando as crianças para “a boca do dragão”, pois não teriam certeza se os familiares já estavam infectados, e seria insensatez reunir várias famílias em King’s Cross em um momento como aquele. Hagrid concordava com ambos, porém se mostrava infeliz com a possibilidade de todas as aulas serem canceladas e sugeriu que as matérias fossem passadas pelo correio, ou até mesmo por outros meios de comunicação bruxa, algo que Slughorn achou pouco viável, tendo em vista a complexidade dos assuntos, e também de que alguns alunos não teriam acesso a todos os materiais requisitados para cada aula.

Repassando todas aquelas informações, e pensando consigo mesmo, Severo Snape esboçava uma cara de preocupação. Não imaginava que passaria por uma situação tão estressante novamente. Muito menos que sua “salvação” estivesse sendo, naquele momento, um peso nas costas. Ser um herói de guerra tinha suas vantagens, porém, o fato de também ter sido um comensal da morte não lhe deixava completamente com a “ficha limpa”. Os colegas de trabalho o olhavam, por alguns momentos, desconcertados, parecia até que ele era culpado por aquela repentina pandemia.

 De certo, era nesse momentos que ele concordava com os mexericos e desejos dos colegas, e também de outras pessoas da comunidade bruxa que o odiavam. Teria sido melhor ter encontrado o próprio fim na Batalha de Hogwarts. No entanto, seria um total descaso, por parte dele, desconsiderar os sentimentos e sacrifícios de Margot. Ela estava sentada ao lado, e como colega de trabalho, soube disfarçar suas afeições, contentando-se em, apenas, segurar a mão do marido por baixo da mesa. 

Eram incomuns os rumos que a vida tomou depois do dia 2 de maio de 1998. Quando Snape acordou, não acreditou que estava vivo. Parecia que estava passando por um teste, se iria para o céu ou inferno, ou se continuaria a vagar por aquele mundo como um fantasma. Mas, após longas e repetitivas explicações de Margot, ele entendeu, ou melhor, teve de engolir o que aconteceu. 

Quando ela soube que o Lorde das Trevas estava com planos para matá-lo, não pensou duas vezes, colocaria o próprio pescoço em risco para salvar a vida do homem que aprendeu a amar, mesmo que ainda houvesse cicatrizes no passado deles. Sorrateiramente, após presenciar o frio jeito com que Voldemort atacou Snape e abandonou o corpo, e ver os últimos esforços do homem para com Potter, ela se pôs ao lado do moribundo e, colocando toda determinação e força do vontade, utilizou de magias ancestrais da família Gryffindor para dar a Severo uma segunda chance de viver.

A princípio, o homem pareceu desgostoso com a decisão da ex-aluna. Por que ela escolhera salvar justo ele, entre tantas outras pessoas que eram, na opinião de Snape, mais merecedoras? Como que uma antiga Intragável-Sabe-Tudo deixou ser dominada pelas emoções, depois dele tê-la ensinado a fechar a própria mente? Ou melhor, de ela ter demonstrado, anteriormente, que não sentia algo de especial por ele, a não ser repúdio e ódio? 

“Porque eu estava vivendo uma completa farsa.”, foi a resposta que Margot o deu, e percebendo que não fora o suficiente, a mulher se desmanchou em lágrimas. Nada daquilo era esperado por Snape, e ele não soubera como reagir, somente permanecer calado, com os olhos vidrados na mulher que soluçava e chorava sobre seu colo. 

— Eu...eu...não sabia em quem, ou no que, confiar, depois da morte de Dumbledore - disse, finalmente, Margot quando conseguiu se recompor. - Você foi embora, sem dar qualquer explicação. A maioria das pessoas de Hogwarts, e do Ministério, se voltaram contra mim, pensando que fiz parte daquela infeliz trama. Eu passei maus bocados, Severo...fiquei em terríveis condições...pode imaginar como vivi naquela época, esperando a sua volta, ou, pelo menos, alguma ajuda? A Ordem me manteve isolada do mundo, e isso foi o suficiente para que aquelas coisas acontecessem.

— Você poderia ter falado com Moddy, ou com Minerva - alegou Snape, sentindo uma leve ardência no pescoço a cada palavra dita.

— E você sabe muito bem como eles reagiam quando não confiam em alguém. Francamente, acha que eu não tentei procurar amparo? Ninguém, Severo, ninguém apareceu para ajudar. Foi assim que eu e minha mãe fomos sequestradas. Simplesmente não se importaram, e nem fizeram questão em nos resgatar!

— Naquela época, se eles tivessem feito algo, poderiam ter colocado muita coisa a perder - relatou o homem, notando um rápida mudança no humor da mulher.

— MAS EU NÃO TERIA PERDIDO A MINHA MÃE NAQUELE DIA! - Gritou Margot, alguns fios de cabelo espalhados no rosto, em meio às lágrimas e maquiagem borrada. - VOCÊ SABE O QUE É PERDER ALGUÉM, E FICAR A SALVO POR ISSO?!

— Você quer mesmo saber!? - Exclamou Snape, colocando uma das mãos sobre o pescoço, sentindo uma grande pulsação e dor. - Olhe com quem está falando! Há 17 anos, eu tenho pedido para que tudo acabasse. Uma vida de espião duplo, nem se pode chamar de vida! Eu aguentei esses anos todos, indo de um lado para outro, para redimir meus erros. E o que descubro no fim? Que Dumbledore criou Potter como um porco para o abate! Uma completa perda de tempo e agora, você, veio querendo se intrometer no que não era da sua conta, e se colocar com a única vítima! Pois bem, sinto em lhe informar, mas essa é a realidade da vida adulta, ela não é justa...então, coloque-se no seu lugar, e não venha me falar dos seus arrependimentos. Já bastam os meus que, graças a sua boa ação, terei que conviver por mais algum tempo.

Isso foi o bastante para fazer com que Margot derrubasse mais lágrimas e gritasse lamentações incompreensíveis, o que deixou Snape extremamente impaciente, depois com pena. Parecia que já vivera aquela mesma situação, mas com os lugares trocados. Margot estava se portando como ele, quando Dumbledore o notificou sobre a morte de Lílian. Como ele ficou arrasado, e com remorso. Por que teve de transmitir a maldita profecia ao Lorde das Trevas? Não devia ter esperado e pensado antes de agir? Se tivesse interpretado aquelas palavras cuidadosamente, talvez as coisas teriam sido completamente diferentes. Mas, quem poderia afirmar que a vida pudesse ter sido melhor? Até ele não sabia, ao certo, se seria feliz. Só que, naquele momento, também não havia algo para se contentar.

Estavam em meio a uma guerra, e Snape considerava-se, praticamente, um peso morto, enquanto Margot parecia uma cachoeira de tristezas e lástimas. Porém, Severo teve de refrear a vontade de vociferar contra Margot, optando por um silêncio compreensível, semelhante ao de Dumbledore, e um olhar compadecido, que nem a mulher lembrava que o bruxo poderia fazer. 

— Eu sinto muito… - começou Margot, retornando a tranquilidade. - Não é que eu tenha esquecido do que você passou, nem do que você sente. Mas...eu não sabia o quão horrível é sentir isso...só depois que mat...depois da morte da minha mãe, eu entendi o que você sentiu quando perdeu a Lílian. E sobre ter interferido na sua morte, eu não me perdoaria se deixasse você ir, sem que soubesse de uma coisa. Sei que está sendo egoísmo meu e lamento por isso, não queria causar ainda mais dano a você, pensei que estaria ajudando-o...não o contrário.

— E o que de tão importante que você tem para me falar, para que fizesse toda essa tragédia grega? Se for algo relacionado sobre daquela época em que vivemos juntos, aconselho que se esqueça disso e preocupe-se com outras coisas. Como, por exemplo, a guerra que está acontecendo neste exato momento e estamos conversando, em vez de ajudar a derrotar o Lorde das Trevas.

— Por que eu esqueceria de algo que faz parte de mim, que me fez amadurecer? Nossa convivência pode não ter sido uma das melhores, e confesso ter sido grande culpada por isso, mas, quero que saiba que não arrependo de absolutamente nada. Tivemos nossas brigas, obviamente. Só que nosso relacionamento não se resumiu em só isso.

— Relacionamento? Acho que já está sendo presunçosa demais, Margot.

— Você pode negar quantas vezes quiser aquela noite que tivemos, é da sua natureza se manter fiel em um único pensamento. E enquanto Lílian estiver nele, dificilmente você irá mudar - os olhos de Margot voltaram a se encher de lágrimas. -  Porém, uma última coisa que quero te dizer é que isso, indiretamente, está te fazendo mau. E há tempos que notei isso, e não pude falar nada, pois, como você diz, não é da minha conta. Então…se estou parecendo estúpida...ou intrometida...não me importo...pois sei que é verdade o que sinto...e quero que saiba...eu sentiria-me duplamente culpada, se tivesse morrido, Severo Snape.

— Por quê? Já não havia declarado seu ódio por mim quando nos encontramos na última vez?

— Eu já disse, o que estava vivendo era uma farsa...não sabia direito o que estava fazendo com a minha vida - sem aguentar mais, Margot tornou a chorar. - Pensei em direcionar toda a culpa em você, mas percebi o grande erro que cometi, e a tempo de tentar me redimir…fui uma ingrata com todos os seus esforços...uma egoísta por não considerar seus sentimentos...e uma intrometida por ter tomado uma decisão que não cabia a mim. Então, se quiser ainda que tudo isso tenha um ponto final, eu não vou me opor em ajudá-lo. Minhas mãos já estão manchadas, e meu coração só deseja o melhor, mesmo que seja não ter os sentimentos correspondidos pela pessoa que ama.

Ao ouvir aquilo, Snape manteve-se sem reação por um longo tempo. Não conseguia expressar nenhuma feição de desagrado, ou palavras secas e diretas. O máximo que pode fazer foi aceitar o abraço molhado de Margot e, já sem forças, adormecer. Somente acordou na semana seguinte, com aurores vigiando seu quarto no St. Mungus e sem qualquer visita. Porém, como sempre, Margot conseguia algum jeito de se aproximar dele, e não desistiu de ajudar na reabilitação dele, nem em livrá-lo de Azkaban, o que não foi um completo sucesso, pois ele teve de passar um ano recluso na prisão de bruxos. 

Após ser solto, Severo Snape recebeu tratamentos diferentes na comunidade bruxa. Alguns, como Margot e Potter, o viam como um homem que fez dentro do possível para salvar o bruxo, enquanto outros, como Rony e a maioria dos estudantes de Hogwarts, o consideravam o carrasco e indigesto mestre de poções, que só havia atuado conforme as necessidades, sem se importar com as consequências. Contudo, até a equipe de professores de Hogwarts  teve de tomar partido, e, por algum tempo, estabeleceram um vínculo de confiança, e de respeito, pelo antigo diretor da Sonserina, fazendo com que ele fosse readmitido como professor de Defesa Contra as Artes das Trevas.

E durante aquela reunião, Snape tinha duas coisas em mente. A primeira, era incredulidade por estar vivo, e na companhia de Margot. O que se passava na cabeça daquela mulher para que ela se casasse com ele e constituíssem uma família, era um verdadeiro mistério. Como ela, após tantos anos, se manteve insistente e demonstrava estar racionalmente, e emocionalmente, atraída por ele? Era o que Severo gostaria de saber, pois ainda tinha uma certa desconfiança no relacionamento entre eles. Assim como as demais pessoas ao redor deles.

A segunda coisa, era buscar a melhor possibilidade de combate para aquele doença. Ele acreditava naquele ditado, “melhor prevenir, do que remediar”, mas, como iria convencer todos os presentes que poderiam, em Hogwarts mesmo, realizar pesquisas e reunir informações suficientes para alertar toda a população? Margot poderia apoiá-lo, e até sugerir algumas ideias que o complementasse, porém, os demais iriam garantir a mesma confiança e proatividade? Dificilmente dariam um passo à frente, se não começassem a escutar uns aos outros e falassem de forma mais objetiva e prática possível.

— Desse jeito, não iremos a lugar algum - concluiu Minerva, ao perceber a dispersão dos professores. - Precisamos de soluções que caibam na nossa realidade. Hogwarts possui muitos recursos, mas eles não serão eternos. Temos de usá-los na medida do possível, e da forma produtiva. Assim, o que nós, como bruxos e bruxas capazes, podemos fazer para nossos alunos e alunas, e também para as pessoas que estão fora desse castelo? 

Imediatamente, Margot ergueu a mão direita, se posicionando de maneira que todos pudessem escutá-la:

— Penso que são nessas horas que devemos ter mais união...não é somente Hogwarts, nem a Inglaterra, que está passando por essa calamidade. Precisamos contactar com o maior número possível de instituições bruxas, ou até mesmo com ex-alunos, curandeiros de renome, mestre de poções, e jornalistas, para que possam nos auxiliar - um murmúrio de concordância instaurou-se na mesa. - Assim, poderemos montar duas equipes, uma responsável por estudar a fundo essa doença, e outra que ficará ocupada no modo como as informações serão passadas para todos. E acredito que nossos alunos também deverão fazer parte disso, cada um ajudando como pode.

— Apoiada - disseram os professores, e Snape não conseguiu disfarçar a satisfação de ter ouvido, quase que as mesmas propostas que tinha pensado, da boca da esposa.

— Além disso, também temos de falar com as pessoas em Hogsmeade - complementou Severo. - Eles devem se atentar que o comércio não pode funcionar como antes, sendo necessário que todos os comerciantes se reunam para decidir como conduzirão seus negócios. O correio coruja poderia ajudar na questão das encomendas. E Hogwarts, faria compras ocasionais, bem como vigiaria a tabela de preços e ajudaria a administrar a melhor maneira de distribuição dos itens. Por exemplo, kits de emergências ou cestas básicas. 

— E para quantas pessoas esses kits e cestas atenderiam? - Questionou Minerva, mostrando-se levemente interessada. - Cada grupo ou família possui necessidades diferentes. Não poderemos colocar itens para um grupo de cinco pessoas, que só atenderia a três.

— Para tudo há de se pensar e organizar. Antes de tudo, é preciso de uma análise das necessidade básicas, não iremos considerar luxos, como também não deixaremos que alguém passe por situação de miséria. Todos deverão ser atendidos, cada qual a emergência e a realidade. Vale lembrar que outras áreas da comunidade podem ajudar, seja com doações ou apoios voluntários.

— Isso irá demandar muito tempo...e esforço - constatou Minerva, ficando em silêncio enquanto os murmúrios aumentavam. - Mas é o que mais parece que atenderá a todos, e também pode ser adaptada quando tivermos mais apoiadores...então, como iremos começar a fazer tudo isso?

— Pelo básico - disse Margot - reunir o que temos no castelo, conversar com os alunos e com as famílias, e revisar as informações. E sendo uma urgência, para agora. Os demais detalhes poderão ser revisados na prática, ou em reuniões mais curtas. Precisamos de ação, e não de discussão.

Sem a necessidade de repetir as mesmas palavras de Margot, Minerva assentiu para que todos fossem se reunir no Grande Salão, os diretores de cada casa iriam chamar seus alunos, e, assim que possível, dariam andamento na primeira etapa do plano. Assim que deixaram a sala dos professores, Snape e Margot deram uma última troca de olhares, era significativa a preocupação de ambos, estavam cientes da nova tempestade que estaria por vir, e não poderiam falhar, nessa nova prova de união.


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Notas finais do capítulo

Até a próxima!



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