Um pequeno problema escrita por Celso Innocente


Capítulo 9
Roupas novas.




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Escolher roupas para meninos é muito fácil. Todas as bermudas e camisetas que Luciana tomava nas mãos e perguntava a ele se gostou ele adorava, arregalando encantado os olhinhos, fazendo com que Maysa até achasse engraçado.

            — Regis, assim fica difícil comprar suas roupas! — Ria a menina. — Você gosta de todas! A gente só vai comprar algumas.

            — Pode ser qualquer uma! — Deu de ombros o pequeno.

            — A gente só vai comprar duas bermudas — decidiu Luciana. — Escolha as duas que você mais gostou!

            — Só duas, mãe! — Protestou a menina. — Tadinho! Vai ter que usar uma em um dia e outra no outro, depois volta pra primeira. Que ridiqueza!

            — Não é ridiqueza! — Negou a mulher. — A gente não sabe o que vai acontecer. Imagine a gente comprar um montão de roupas e daqui a um ou dois dias ele desaparecer pro seu tempo. Quem vai usá-las? Seu pai grandão é que não vai ser!

            — Compre pelo menos quatro! — Insistiu Maysa.

Enquanto mãe e filha decidiam o que fazer, o menino já teria escolhido quatro peças de roupas: uma calça em tecido grosso tipo jeans marrom, que através de zíper soltava as pernas na altura dos joelhos se transformando em bermuda. A outra peça era só bermuda em lycra azul marinho, também com as pernas chegando aos joelhos, o que o deixava encantado.

Ele teria se encantado com estas, justamente pelo fato de uma ser calça e bermuda, além de um montão de bolsos, inclusive nas pernas, já que todos os shorts que sempre tivera na curta vidinha de menino pobre, sempre foram muito curtos, mal lhe cobrindo as coxas, contendo apenas dois bolsos laterais e que inclusive um dia o fizera passar vexame na escola, pois um dos bolsos rasgara o forro e como ele não usava cueca, seu símbolo de machinho resolveu sair para tomar ar justamente quando uma das coleguinhas de sala estava olhando para ele.

            As outras peças eram camisetas, uma de malha fria verde limão, com algumas palavras escritas em inglês sobre ela; a outra, de lycra nas cores azul e amarela.

            — Duas camisetas, mamãe! — Protestou a filha. — O coitado não vai poder nem se suar senão vai precisar ficar pelado!

            — Pelado! — Franziu o nariz o pequeno. — Eu hem!

            — Pelado só da camisa! — Explicou a menina. — Ou ficar fedendo cecê, igual os meninos de minha classe quando voltam do recreio.

            Então voltou-se para a mãe e reclamou:

            — Não vai querer comprar só duas cuecas também, não é?! Senão ele vai ter que usar e virar do avesso pra continuar usando a mesma. E acho que não vai estar cheirando bem!

            — Você tá caçoando de mim! — Reclamou o menino. — Vou te deixar de castigo também!

            Maysa beijou-lhe de leve a face e explicou:

            — Não estou caçoando de você! Estou defendendo você contra a pão-durisse de minha mãe!

            — Concordo! — Convenceu-se Luciana. — Levaremos quatro cuecas e quatro camisetas.

            Foi fácil, pois as camisetas já estavam selecionadas. Bastou escolher as duas mais bonitas entre elas: uma cinza clara sem cavas, com faixas azul marinho nas bordas e a palavra “transvision” em vermelho na altura do tórax e a outra também sem cavas, nas cores laranja com faixas pretas na lateral.

            Cueca como fica escondida no corpo, não há muito o que escolher; todas em tamanho infantil “p”, sendo uma de cada cor.

            — Posso vestir uma cueca agora? — Pediu o menino.

            — Não é bom, Regis! — Aconselhou a mulher. — Estas roupas quando novas precisam passar por uma água antes.

            — É que não gosto de ficar assim!

            — A gente não sabe nas mãos de quem estas roupas passaram. Pode causar alergia em você.

            — Tá bem! — Deu de ombros. — Eu espero.

Dois pares de meia acabavam de completar suas compras naquela loja.

            A demora veio depois. A menina que sempre fora muito mimada por ser a caçulinha, acabou enciumada com tantas roupas para o “irmãozinho inesperado” e com isso perderam-se um baita tempão em escolherem a mesma quantidade de roupas para ela. E convenhamos que escolher roupas para mulheres, mesmo sendo de onze anos de idade, não é tão fácil igual escolher a dos homens. Elas se atrevem em separar uma tonelada e por fim, acabam por não encontrar nenhuma favorita.

            Enquanto a filha escolhia demoradamente suas compras, Luciana resolveu lavar ali mesmo no banheiro da loja, uma das cuecas do menino, escolhendo a de lycra, assim em poucos minutos estaria seca.

            Enfim, conseguiram sair da loja.

            Só que o pequeno precisava de um par de tênis e um de sandálias, afinal de contas estava andando descalço desde o dia anterior. Não que ele se importasse; era habituado a ser mesmo assim, com os pés livres para sentir o frescor da terra. Só que agora estava vivendo em um mundo de concreto, piches e asfalto, fazendo com que a sola dos pés sentisse até se desgastarem, pelo atrito diferente que sentia em tal mundo moderno.

            Claro que não foi difícil à escolha. Quer dizer, foi um pouco, devido à quantidade de cores e modelos que ele adorou. O escolhido era o mais lindo que ele já vira na vida: azul marinho com faixas brancas e solado branco com amortecedores, digno de causar inveja a qualquer um de seus amiguinhos de sua época.

            Quanto às sandálias nem há mistérios, ele preferiu optar por chinelas tipo Havaianas toda colorida e estava resolvido.

            E mais uma vez o mimo da caçulinha de casa (além dele) fez a demora acontecer. Ela decidiu que seus vários pares de tênis já estavam muito surrados e precisava de um novo.

            Enfim, ao final das compras, resolveram dar uma passada na casa da sogra, para que ela ficasse ciente do que seria então a vida do pequeno hóspede neste tal mundo novo.

            Antes, porém, como planejado, Luciana parara o carro bem de frente à pastelaria central e, deixando às crianças no mesmo, foi até o homem do caixa, onde insinuou:

            — Ontem por volta do meio dia o senhor alimentou um certo menininho peralta que deixou a conta sem pagar. Estou certa?

            — Estou lembrado dele — concordou o pasteleiro. — Mas… Primeiro que ele não me parecia peralta, só parecia perdido, e segundo, que a conta já está paga. Tem notícias dele?

            — Pode ser aquele que está lá no carro? — Esboçou leve sorriso Luciana apontando para a rua.

            — Que bom que ele foi encontrado! E que esteja bem! Ontem parecia tão abatido.

            — É! Realmente ele estava perdido — fez uma pausa. — Foi ele quem pediu que eu viesse pagá-lo.

            — Já disse que a conta já foi paga — insistiu o homem. — Mesmo assim gostei que tivesse vindo. Fiquei deveras preocupado com ele.


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