Pokémon - Laço Eterno escrita por Benihime


Capítulo 14
Pai




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Dehlia encarava Calista, parecendo prestes a pular no pescoço de sua filha mais velha.

— Eu te disse para deixar esse assunto de lado, Caly. — A matriarca dos Ketchum declarou friamente. — Seu pai está morto, aceite isso!

— Não, mãe. Eu preciso saber o que aconteceu. A senhora talvez tenha aceitado que o papai morreu, mas eu não. Quero respostas, e vou consegui-las.

A jovem morena encarou sua mãe. Pela expressão naqueles olhos castanhos, não sabia se Dehlia queria chorar ou dar-lhe uma surra.

— Tem razão, Caly. — A mulher de cabelos castanhos disse enfim, baixinho. — Não posso impedi-la. Mas quero que me prometa que vai tomar cuidado, filha.

— É claro que sim. — Calista assegurou gentilmente. — Eu sei me cuidar, mamãe. E, além do mais, Mira, Arya e Fire vão tomar conta de mim. Ninguém vai conseguir me ferir com essas três por perto.

Dehlia simplesmente assentiu, sem opções. Mãe e filha sentiram o peso do silêncio. A escolha estava feita, não havia mesmo mais nada a ser dito.

— Voltarei para Kanto hoje no final da tarde. — A jovem informou. — Vou direto para Viridian, e prometo dar notícias assim que chegar.

Sem saber o que dizer, Dehlia simplesmente assentiu. Calista saiu em igual silêncio.

No final da tarde a morena esperava em uma cafeteria quase escondida entre uma livraria e uma loja de presentes no aeroporto. Cynthia entrou menos de cinco minutos depois, sorrindo ao ver sua amiga.

— Oi, Cal. — A loira disse, e Calista notou que ela estava ligeiramente sem fôlego. — Me desculpe pelo atraso.

— Imagine. Chegou bem na hora. — A morena sorriu. — Pedi um expresso com leite e uma pitada de chocolate em pó para você. Acabou de chegar. Acertei?

— Em cheio. — Cynthia admitiu enquanto Calista deslizava uma xícara fumegante em sua direção. — Como sempre.

— Bom, você faz mesmo o tipo café com chocolate. Doce e amarga ao mesmo tempo.

— E você ... — A loira se interrompeu, tomando um pequeno gole de seu café. — Faz o tipo expresso duplo. Tão amargo que ninguém consegue suportar.

— Engraçadinha. — A irmã de Ash riu. — Mas essa você acertou. É mesmo minha bebida preferida.

As duas amigas ficaram em silêncio depois da breve troca de amenidades, cada qual perdida nos próprios pensamentos.

— Cal, sobre o que você me disse ontem à noite ... — A campeã enfim quebrou o silêncio. — Tem certeza de que vai valer a pena?

Calista hesitou antes de responder, considerando aquela pergunta.

— Não, eu não tenho certeza de nada. — A jovem confessou enfim. — Mas é do meu pai que estamos falando. Uma possibilidade, por menor que seja, é o bastante para mim. Tentar ainda é melhor do que desistir.

— Concordo. Eu faria o mesmo pelos meus pais. — Cynthia sorriu melancolicamente. — Boa sorte, Cal. E tenha cuidado.

— Você é a segunda pessoa a me dizer isso hoje.

O comentário ácido era uma tentativa de aliviar a súbita melancolia. A campeã mordeu a isca, lançando um olhar brincalhão para sua amiga.

— Quem foi a primeira?

— Minha mãe. — Calista soltou um bufo de impaciência. — É sério, vocês duas. Até parece que acham que eu saio por aí procurando problemas.

— Talvez não, mas os problemas definitivamente saem por aí procurando você.

— Tem razão. Afinal, você me encontrou, não foi?

— Engraçadinha. Já pensou em tentar a sorte como comediante?

— Ok, ok, vou parar. — Calista cedeu, rindo. — Vou sentir falta disso, sabia? Ultimamente, parece que venho mantendo cada vez mais segredos. Não posso ser eu mesma com ninguém a não ser você. Bem, e Angel.

— Sabe que eu vou estar somente a uma ligação de distância. — A loira a lembrou gentilmente. — Sempre que você precisar.

— Obrigada. Isso vale para você também.

— Não vai estar ocupada demais investigando os rumores sobre seu pai?

— Eu nunca estou ocupada demais para uma boa amiga, Cynth. Especialmente se a amiga em questão for você.

— Obrigada, Caly.

— Engraçado ... — Calista se interrompeu pensativamente, tomando um gole de seu café. — É a primeira vez que você me chama assim. Por que a mudança repentina?

— Pareceu certo, só isso.

— Eu prefiro quando você me chama de Cal. É diferente. Acho que combina mais, de certa forma. Como se fosse ... Sei lá, um segredo só nosso ou algo do tipo.

— Está bem. — A loira abriu um breve porém caloroso sorriso. — Preciso ir agora, Cal.

— É, eu também. Voos no mesmo horário, com destinos diferentes. Isso é mesmo muito a nossa cara.

As duas amigas se dirigiram para os portões de embarque onde, para surpresa da jovem kantoniana, Cynthia se despediu com um abraço.

No avião, com Arya enrodilhada em seu colo e seus próprios pensamentos por companhia, a jovem morena encarou o pedaço de papel que descansava na palma de sua mão direita. Era apenas uma fina tira de papel já marcada por dobras na qual estavam escritas três palavras: Ginásio de Viridian.

— É para lá que vamos primeiro. — Calista comentou baixinho para Arya, que se aninhou em seus braços em resposta. — E, já que é um ginásio do tipo Solo ... Quem sabe não damos a você a chance de ter sua primeira batalha de verdade? O que acha, Arya?

A Brionne abriu um largo sorriso, assentindo animadamente várias vezes, o que fez sua treinadora rir.

— Está bem, já entendi. — A jovem kantoniana disse, correndo uma das mãos pelas costas de sua pokemon, esfregando gentilmente como sabia que ela gostava. — Vamos ter essa batalha de ginásio. Eu prometo.

O voo da morena pousou na cidade de Celadon, a maior da região de Kanto. A partir dali, seu plano era voar com IceFire diretamente para a cidade de Viridian e começar a investigar, mas Calista não teve tempo para isso.

Quase imediatamente após deixar o aeroporto a jovem deparou-se com um membro da Equipe Rocket intimidando uma garotinha. Seu sangue ferveu de raiva e a irmã de Ash foi até eles a passos largos, se interpondo entre o criminoso e a criança. A menina imediatamente agarrou seu braço, escondendo-se atrás da jovem morena.

— Ei, você. — A Rainha de Kalos rosnou. — Deixe a menina em paz.

— É melhor você ficar fora disso, belezura. — O homem disse rudemente. — Não quero ser obrigado a arruinar esse rostinho lindo.

— Vai valer a pena só para acabar com você, seu monte de lixo desprezível!

— Ora, ora, ora. — O membro da Equipe Rocket abriu um sorriso lascivo. — Linda e durona. Gostei de você.

Calista estreitou os olhos, pegando uma pokebola em cada mão. De uma delas a jovem libertou Mirabelle.

— Saia daqui, está bem, docinho? — A morena disse para a menina, que ainda se mantinha escondida às suas costas. — Vá com a minha parceira, ela vai cuidar de você. Agora, Mira!

— Ora, sua vadia! Me fez perder o meu prêmio! — O homem rosnou. — Vou lhe ensinar uma lição. Vai, Raticate!

Calista graciosamente jogou para o alto a pokebola que ainda tinha na mão livre. Kyle rosnou desafiadoramente para o adversário ao assumir a batalha e saltou sobre seu oponente, descrevendo uma cambalhota em pleno ar, o que lhe permitiu desviar facilmente de um ataque Hyper Presa.

— Agora, Kyle, Esfera de Aura!

O ataque Esfera de Aura atingiu o inimigo pelas costas e imediatamente o derrotou. Calista ergueu uma sobrancelha, sorrindo ironicamente.

— Como pode ver, beleza não é tudo o que eu tenho. Vejamos ... Será que devo acabar com você agora?

O homem imediatamente colocou seu Raticate de volta na pokebola, girou nos calcanhares e saiu correndo o mais rápido que pôde. Calista deu uma risadinha.

— Fácil demais. — A jovem zombou. — Kyle, pode por favor me ajudar a achar a Mira?

O Lucario sorriu e balançou a cabeça, apontando para um beco próximo. Segundos depois Mirabelle saiu das sombras, trazendo consigo a menina que resgatara. A criança imediatamente correu ao encontro de Calista.

— Uau! — Exclamou, seus olhos brilhando de empolgação apesar das marcas de lágrimas em seu rosto. — Você é muito forte! Talvez mais do que o meu tio!

— Obrigada. — A irmã de Ash sorriu. — E onde está seu tio, pequena? Aposto que ele está procurando por você.

— Eu não sei. — A menina respondeu, dando de ombros. Era pequena, aparentando não ter mais do que sete anos, mas sua atitude a fazia parecer mais velha. — Mamãe estava sendo malvada, então eu fugi, vi os aviões e quis dar uma olhada. Daí aquele homem mau apareceu ... E ... E ... Espere! Será que ele vai voltar?

— Duvido muito. — Calista declarou. — Em todo caso, se aquele lixo voltar, Kyle e eu daremos um jeito nele.

— Obrigada! — A menina exclamou, abrindo um sorriso enorme. — Muito, muito obrigada!

— De nada. Agora o que me diz de irmos procurar sua família? Alguma ideia de onde eles podem estar?

— Na Loja de Departamentos, eu acho. Minha mãe disse que precisava de algumas coisas.

— Certo, então vamos procurar por lá primeiro. Talvez ainda não tenham saído.

A menina assentiu, caminhando em silêncio ao lado de Calista por alguns segundos.

— Você é a campeã de Kalos, não é? — A criança inquiriu enfim.

— Eu?! Não. Por que acha que eu sou uma campeã?

— Porque vi quando você desceu do avião, e aquele era o voo de Kalos. — A menina respondeu. — Além do mais, meu tio disse que a campeã de Kalos é uma mulher linda e uma treinadora super forte. Que nem você!

— Ora, ora, você é uma garota bem esperta, não é? — A menina sorriu com orgulho ao ouvir o elogio. — Sinto desapontá-la, mas não sou a campeã de Kalos.

— Não é?!

— Não. — Calista riu ante a óbvia surpresa de sua nova amiga. — Mas quer saber? Eu a conheço. O nome dela é Diantha, e ela é exatamente como seu tio descreveu.

— Vocês já batalharam?

— Na verdade, sim. Uma vez.

— Aposto que você venceu.

— Obrigada. — Calista disse com uma risadinha. — A propósito, meu nome é Calista. Caly, se preferir.

— O meu é Emilly. — A menina respondeu, parando e estendendo uma das mãos. — É um prazer conhecê-la.

Algo naquele gesto pareceu muito familiar, embora a jovem morena não conseguisse identificar exatamente o que era. Antes que pudesse responder, avistou um familiar homem ruivo entre a multidão. Segundos depois um Dragonite apareceu à sua frente. Emilly soltou um gritinho de susto.

— Está tudo bem, querida. — Calista assegurou, dando um tapinha carinhoso no ombro do Pokemon Dragão. — Não precisa ter medo do Dragonite. Ele é só um dragão bobão.

— E é exatamente por isso que você gosta dele, não é?

A morena ergueu os olhos e sorriu, brincalhona, cumprimentando seu ex professor. Lance também sorriu, satisfeito em ver sua antiga aluna.

— Tio Lance!

Calista foi pega de surpresa tanto pelo grito de alegria quanto pela forma como Emilly se jogou nos braços do campeão da Liga Índigo.

— Ah, aí está você! — O ruivo exclamou, abraçando a sobrinha com força. — Por onde andou, sua pestinha? Estava fugindo da sua mãe de novo?

A garota assentiu, sua testa se franzindo e dando-lhe um ar grave que acentuou ainda mais sua semelhança com Lance.

— Ela é má, tio.

— Tão má quanto um Gyarados furioso. — Lance concordou. — Mas ainda é sua mãe. Ela está morrendo de preocupação, sabia?

— Não sou mais uma criancinha. — Emilly bufou com impaciência, revirando seus olhos azuis. — Ela não precisa se preocupar.

— Diga isso para aquele cara da Equipe Rocket, espertinha. — A morena interferiu, lançando um olhar expressivo para seu ex professor.

— Equipe Rocket? — Lance repetiu, a expressão em seu rosto escurecendo como o céu antes de uma tempestade.

— Sim, ele tinha um R bordado na camisa. — Emilly contou. — Mas a Caly é forte demais, e o colocou pra correr! Aposto que ela é até mais forte do que você, tio.

— É mesmo?

Apesar do tom sério, os olhos castanhos de Lance brilhavam e os cantos de seus lábios se ergueram em um sorriso malicioso.

— Aham. — A garotinha assentiu com convicção. — O Rocket saiu correndo depois que a Caly o derrotou. Ele chorou que nem um bebezinho. E sabe o que mais, tio? A Caly me contou que venceu a campeã de Kalos também. Ela é incrível!

— Emilly. — Calista repreendeu suavemente, suas bochechas ficando vermelhas. — Por favor, não exagere. Sou só uma treinadora comum.

— Não acredite nessa bobagem, Emilly. — Lance disse. — Calista só está sendo modesta. Ela é mais do que incrível. Pelo que eu soube, nossa Caly é La Reigne de Kalos.

— La ... Raig ... — Emilly se interrompeu, sua testa se franzindo em confusão ante a palavra estrangeira. — O que?

— É kalosiano. — Calista explicou gentilmente. — Significa "Rainha de Kalos".

— Rainha?! — A sobrinha de Lance praticamente dava pulinhos de empolgação. — Uma rainha de verdade? E você mora em um castelo?

Lance soltou uma sonora gargalhada ante tamanha curiosidade, mas não houve oportunidade de dizer mais nada, pois uma voz feminina soou chamando o nome de Emilly.

Como imaginara, Calista viu uma mulher alta e atlética, com longos cabelos azuis presos em um rabo de cavalo alto se aproximar a passos largos. Seus olhos azuis eram frios como gelo e sua expressão era de total desagrado.

— Emilly! — A mestra de dragões estava obviamente furiosa. — Emilly, quantas vezes preciso lhe dizer para não fazer mais isso?

A garotinha escondeu as mãos atrás das costas, baixando a cabeça e fazendo uma expressão de arrependimento.

— Me desculpe, mamãe.

— Depois resolvemos isso. — Clair declarou rispidamente. — Onde você a encontrou dessa vez, Lance?

— Ela é que me encontrou, prima. — O ruivo respondeu. — Ou melhor, elas me encontraram.

Só então Clair pareceu reparar em Calista. A reação foi imediata: sua postura relaxou, seus olhos brilharam de prazer e seus lábios se abriram em um largo sorriso.

— Calista! — A líder de ginásio exclamou, visivelmente deliciada em ver a jovem. — Minha nossa, nem consigo acreditar! Você era uma menina da última vez que nos vimos. Quando foi que ficou tão bonita?

— Em algum ponto no final da adolescência. — A morena brincou. — É bom te ver de novo, Clair.

— Igualmente. E muito obrigada por encontrar a minha filha. Espero que ela não tenha lhe dado muito trabalho.

— Nem um pouco. Para ser honesta, adorei conhecê-la. — Calista respondeu. — Mas eu tomaria cuidado se fosse você. Os Rocket parecem estar de volta.

— Aqueles fora da lei patéticos? — Clair inquiriu, bufando de indignação. — Podemos cuidar deles, exatamente como da última vez.

— Dois de nós, pelo menos. — Lance a lembrou. — Emilly, é melhor você e sua mãe voltarem para casa.

— Não! Eu quero ficar com você, tio Lance!

— Emilly, não seja egoísta. Seu tio precisa trabalhar.

— Mas mamãe ...

— Nada de "mas", mocinha.

— Está tudo bem, Clair. — O ruivo interferiu. — Eu fico com essa pestinha e vocês duas cuidam dos Rockets.

— Tem certeza, Lancey?

— Tenho. Boa sorte, priminha. E tenha cuidado.

Clair meramente assentiu e se pôs a andar, sem desperdiçar nem mesmo um segundo. Depois de uma breve hesitação, Calista a seguiu.

— Sério? — A mulher de cabelos azuis disse ironicamente. — Não precisa vir comigo, Caly. Eu posso cuidar disso sozinha.

— Eu sei que pode. — Foi a resposta. — Mas não vou deixar que enfrente a Equipe Rocket sozinha, por mais idiotas que eles sejam.

— Você não mudou nada, Chiisai.

— Espero que esteja enganada quanto a isso. — Calista rebateu. — Meus parabéns, a propósito. Eu não sabia que você tinha se casado.

— É uma longa história.

— Algo que eu deva saber?

— Nada, exceto que já faz muito tempo e Emilly foi a única coisa certa em toda essa bagunça. — A expressão de Clair era de amargura. — E é claro que, como todo o resto da família, ela prefere Lance.

— Ela ainda não entendeu você, só isso. — A morena respondeu carinhosamente. — Dura como um Steelix por fora, doce como um Spritzee por dentro. Mas aposto que você é uma boa mãe, Clair.

— Espero que sim.

As duas caminharam em silêncio depois disso. O local ao qual as duas mulheres se dirigiram era o mesmo onde haviam enfrentado a Equipe Rocket nove anos atrás: a casa de jogos de Celadon. Foi como voltar no tempo: o mesmo pôster, a mesma passagem secreta.

— A Equipe Rocket nunca aprende. — Calista zombou, parada no topo da escadaria que conduzia ao esconderijo secreto. — Pronta para acabar com eles, Aoiryu?

Clair pareceu surpresa pelo fato de a jovem ainda lembrar daquele apelido, que significava "dragão azul", mas assentiu. As duas mulheres desceram juntas para o já conhecido porão da casa de jogos de Celadon.

— Não deve ser um grande desafio. — A irmã de Ash declarou. — Mal precisamos de vinte minutos para limpar esse lugar da última vez.

— Eu me lembro. — Clair respondeu. — Mas isso já faz muito tempo.

De fato, a prima de Lance estava certa. A base secreta no porão havia sido incrementada com armadilhas. Mal terminaram de descer a escada quando um feixe de luz passou incrivelmente perto do ombro de Calista, perto o bastante para que a jovem sentisse o calor.

— Lasers! — Clair exclamou. — Abaixe, rápido!

— Volte para a escada, Clair.

A líder de ginásio obedeceu, seguida de perto por Calista. As duas pararam por um momento, encarando o corredor à sua frente.

— Como vamos passar? — Clair inquiriu. — Se não podemos ver os lasers ...

— Eu tenho uma ideia.

A jovem pegou uma pokebola em seu bolso. O dispositivo continha Paul, o Electivire.

— Nos ajude aqui, grandão. — Calista disse. — Use Relâmpago e frite os circuitos de segurança.

Clair assentiu para sua amiga e também pegou uma pokebola, escolhendo sua fiel Dragonair.

— Ajude. — A líder de ginásio ordenou. — Use Relâmpago também.

Faíscas de eletricidade serpentearam como cobras pelo chão, encontrando pontos vulneráveis e penetrando nas paredes, produzindo pequenas explosões por onde passavam.

— Muito bem! — Calista sorriu. — Você foi perfeito, grandão. Agora retorne.

— Você também, Dragonair.

Paul sorriu com orgulho, erguendo o polegar esquerdo em sinal de positivo enquanto era chamado de volta para sua pokébola.

— Espere. — A jovem morena disse, já escolhendo outra pokebola, estendendo o braço livre para impedir que Clair desse um passo à frente. — Precisamos ter certeza antes de avançar.

— Como ter certeza de algo que não podemos ver?

— Conheço alguém que pode. — Foi a reposta, enquanto Calista tirava Kyle da pokebola. — Kyle, use sua aura para pressentir as armadilhas.

O Lucario assentiu e tomou a dianteira, guiando as duas mulheres em segurança pelo labirinto de corredores.

— Não está achando isso estranho?

— O que, Clair?

— Estamos aqui embaixo há cerca de quinze minutos, e ainda não encontramos nenhum Rocket.

— Talvez tenham abandonado essa base.

— Se realmente o fizeram, por que se preocuparam em atualizar a segurança?

— Tem razão. — Calista bateu no queixo de leve com o indicador da mão direita, num gesto pensativo. — O que será que eles estão tramando?

— Tenho a impressão de que será algo de que não vamos gostar.

— E eu tenho a impressão de que você está certa.

De fato, as duas não demorariam a descobrir a resposta. Kyle as guiou até um longo corredor que terminava em uma sólida porta de aço. Não haviam ramificações ali, nem mesmo dutos de ar. Completamente sem saída.

— Tem certeza, Kyle? — Calista inquiriu. — Não tem nada aqui. Além do mais, aposto que essa porta está trancada.

O Lucario estendeu uma das mãos, que foi envolvida por uma luz azul iridescente. Momentos depois a porta se abriu com um suave clique.

— Impressionante. — Clair comentou. — Você treinou um Lucario e tanto, Caly.

— Obrigada, Clair. — A irmã de Ash sorriu. — Kyle tem controlado sua aura cada vez melhor.

Kyle deu de ombros e tentou fingir indiferença, mas um sorriso orgulhoso brincava em seus lábios.

— Vamos ver o que tem lá dentro. — A morena disse jocosamente. — Já que alguém está tão certo de que vai valer a pena.

O Lucario revirou os olhos e empurrou a porta, que se abriu para revelar uma enorme sala circular completamente às escuras. No centro do cômodo havia uma mesa de madeira escura cercada por uma dúzia de cadeiras.

— Parece uma sala de reuniões. — Clair comentou. — Nada mal, vocês dois. Talvez tenha mesmo alguma coisa por aqui.

— É o que vamos ver. Kyle?

O Lucario assentiu e fechou os olhos. Momentos depois seu corpo foi envolvido pela luz azul iridescente da aura. Ele voltou a abri-los segundos depois e apontou para um ponto na parede.

— Deixe isso com a gente, Caly. — Clair disse. — Dragonair, use Cauda de Ferro.

O Pokemon Dragão assentiu, acertando com a cauda o ponto indicado por Kyle. Um buraco se abriu na parede, revelando uma estrutura de metal já começando a enferrujar.

— Parece que há outra sala atrás da parede. — Calista exclamou, surpresa. — Me deem cobertura, vocês dois. Kyle, vamos dar uma olhada nisso.

A líder de ginásio assentiu enquanto Calista e seu pokemon penetravam na abertura na parede. Mal virou as costas, a morena ouviu um zunido agudo e uma pancada seca.

— Velocidade Extrema, Kyle. — A irmã de Ash ordenou. — Vá ajudar. Estou logo atrás.

O Lucario desapareceu em um piscar de olhos, seguido por sua treinadora. Calista encontrou Dragonair caído inconsciente no chão e Clair apoiada contra a parede, respirando com dificuldade. Todo o corpo da líder de ginásio tremia e ela mal se mantinha de pé. 

— Clair! — A jovem exclamou, alarmada. — Clair, o que aconteceu?

— Saia daqui. — As palavras da especialista em pokemon tipo Dragão saíram arrastadas, sua língua se atrapalhando ao tentar formar os sons. — Rápido, Caly. Saia.

— Não sem você. Me dê a pokebola do Dragonair, vou tirar vocês dois daqui.

Clair não discutiu, porém sua mão tremia tanto que ela mal conseguia segurar a pokebola. Calista colocou Dragonair de volta no dispositivo e passou um braço pela cintura de sua amiga a tempo de impedir que caísse.

— Kyle, tire-a daqui. — A irmã de Ash ordenou. — Mantenha-a em segurança, está bem?

O Lucario assentiu, pegando Clair no colo e desaparecendo num piscar de olhos ao usar Velocidade Extrema mais uma vez. Bem a tempo, pois logo em seguida as luzes da enorme sala circular se acenderam e um homem entrou. Ele era alto, corpulento e elegante, usando um terno clássico de cor preta. Usava também óculos escuros, mesmo ali naquele esconderijo subterrâneo.

— Acha mesmo que isso vai adiantar? — A voz do desconhecido era profunda e rouca, estranhamente aveludada e agradável. Familiar, também, embora de uma forma estranha. — Sua amiga não vai sair daqui.

— Veremos.

— Muito corajoso da sua parte. — O homem declarou. — Mas ainda assim inútil.

Com um sorriso gélido o desconhecido ergueu a mão direita e estalou os dedos. Outros membros da Equipe Rocket imediatamente entraram na sala e se espalharam ao redor do cômodo, cercando Calista completamente. Dois deles avançaram e seguraram a morena pelos braços, imobilizando-a.

A jovem, ágil como ela só, usou os corpos dos adversários como apoio para tomar impulso, erguendo o próprio corpo num rápido movimento pendular para acertar ambos primeiro com poderosos chutes, depois com cotoveladas que os fizeram se dobrar de dor.

Outros dois homens avançaram para contê-la, mas o misterioso homem de terno os deteve com um gesto de mão.

— Afastem-se. — Ordenou, seus lábios se erguendo em um sorriso frio como gelo. — Muito bem, minha jovem, admito que a subestimei. Não cometerei o mesmo erro dessa vez. Considere-se com sorte, pois está prestes a ser eliminada pelo líder da Equipe Rocket.

Calista arquejou de surpresa. É claro que conhecia a reputação de Giovanni, o cruel líder da Equipe Rocket, mas jamais o vira em pessoa. Fora Lance quem o derrotara anos atrás e o campeão fizera questão de manter sua jovem aluna o mais longe possível daquela batalha.

— Pois bem. — A morena rebateu, se forçando a parecer mais confiante do que realmente se sentia. — Vejo que você não é o covarde que parece ser. Venha me enfrentar então, líder Rocket.

A jovem estendeu uma das mãos para as pokebolas engenhosamente engastadas em seu cinturão, escolhendo Aphrodite para começar a luta.

Com outro de seus meio sorrisos cruéis, Giovanni também enviou seu primeiro pokemon. Calista ergueu uma sobrancelha ao ver que a primeira escolha de seu oponente fora um Persian. A jovem e sua Milotic trocaram um olhar divertido. Aquela batalha seria fácil demais.

— Vamos lá, Aphrodite, use Pulso d'Água!

— Intercepte com Golpe Cortante.

O gato pokemon deu um salto fenomenal, cortando o poderoso jato de água com suas garras. Calista rosnou baixinho de pura frustração.

— Não desista. — A morena ordenou. — Pegue-o com seu Raio de Gelo!

— Evasiva e depois use Dia do Pagamento.

Persian saltou, usando o próprio Raio de Gelo disparado pela adversária para tomar impulso antes de girar no ar e atingi-la com uma poderosa rajada de moedas douradas jogadas em alta velocidade, o que fez Aphrodite gritar de dor.

— Agora, Relâmpago. — O líder da Equipe Rocket ordenou. — Acabe com ela!

— Defenda-se com Tremor.

Como na batalha contra Iris, os tremores causados pelo ataque tipo Solo dispersaram a onda elétrica enviada por Persian. A jovem kantoniana cruzou os braços e sorriu em desafio.

— Não sou só um rostinho bonito. — A morena declarou. — Portanto, não espere vencer assim tão fácil. Acabe com isso com Hydro Bomba, Aphrodite.

A Milotic serpenteou graciosamente, obedecendo à ordem. Persian saltou para fora de alcance apenas para ser atingido pela cauda em forma de leque da adversária e derrubado ao chão. O gato se debateu, mordendo e arranhando, mas não foi páreo para a força dos músculos da adversária.

Com uma batida final da cauda poderosa de Aphrodite, Persian foi lançado para o alto e arremessado contra a parede. O gato pokemon, porém, se colocou imediatamente de pé e voltou à luta, saltando sobre a adversária para usar Golpe Cortante mais uma vez.

— Não deixe, garota! Raio de Gelo e Pulso d'Água em sequência. Agora!

A Milotic usou o Raio de Gelo em vários disparos curtos em sequência, transformando-o em uma legítima chuva de adagas de gelo, em seguida usou Pulso d'Água na direção do teto, sendo envolvida por espirais de água cristalina. Gelo e água se misturaram criando um vórtice ao redor da pokemon, o que serviu para bloquear o ataque adversário e ao mesmo tempo contra-atacar efetivamente.

— Já chega. — Giovanni rosnou. — Pegue-a, Persian!

O gato saltou não na direção de Aphrodite, mas na de Calista. A jovem, sem tempo de fazer qualquer outra coisa, ergueu os braços para defender seu rosto. O ataque, porém, jamais aconteceu.

A morena deixou os braços caírem ao lado de seu corpo e olhou em volta para ver Persian parado a seus pés, encarando-a com curiosidade e surpresa. O gato se aproximou lentamente, arqueando a coluna e ronronando alto enquanto se esfregava contra as pernas da morena.

— Mas o que ...?!

O gato pokemon sentou-se aos pés da jovem, envolvendo-lhe o tornozelo direito com a cauda, esfregando a cabeça peluda contra suas pernas.

— Esse gesto ... Meowy, é você?!

Persian ronronou ainda mais alto e anuiu, parecendo satisfeito. Calista o apelidara daquela forma quando ainda era bebê, e mesmo depois de crescida a morena continuara a chamá-lo por aquele apelido.

— Impossível! — O líder da Equipe Rocket declarou, atônito, sem conseguir acreditar na cena diante de seus olhos. — As buscas ... Você estava morta!

— De que diabos você está falando?! — Calista rosnou. — Cale a boca e lute, seu maldito covarde!

— Não. — Giovanni respondeu. — Não contra você.

— Você é louco!

— Ora, vamos, Calista. — O líder da Equipe Rocket deu um passo à frente e tirou os óculos escuros em um único movimento elegante. — Isso não é jeito de falar com o seu pai.

— Meu pai está morto!

— Mentiram para nós dois, filha. — Giovanni declarou. — Olhe para mim. Ou será que mudei tanto assim, minha princesa?

O apelido fez Calista congelar e olhar Giovanni nos olhos pela primeira vez. Olhos castanhos tão escuros que chegavam a ser negros. Olhos muitíssimo familiares.

— Não ... — A voz da jovem kantoniana mal era um sussurro. — Não pode ser. É você mesmo?!

Calista não ouviu a resposta através do ruído do sangue que trovejava em seus ouvidos. Sua visão começou a ficar borrada, entrando e saindo rapidamente de foco. Tarde demais, a jovem percebeu que estava hiperventilando. Momentos depois a escuridão tomou conta e Calista caiu inconsciente.

Giovanni se adiantou rapidamente, segurando a jovem antes que se ferisse ao cair no chão. Ficou surpreso com o fato de que tê-la nos braços ainda parecia tão natural quando parecera dezessete anos atrás.

Aphrodite, a Milotic, emitiu um sibilo zangado, porém Persian interferiu e rapidamente acalmou a pokemon tipo Água. Giovanni chamou de volta seus subordinados, que haviam deixado a sala durante o breve combate, e imediatamente se dirigiu a James.

— Leve esta jovem ao centro pokemon. Fique com ela até que acorde e depois se reporte a mim. Entendido?

— Sim, senhor.

Aphrodite, porém, não permitiu que o integrante da Equipe Rocket sequer tocasse em sua treinadora. Sem esperar reação daqueles que a cercavam, a Milotic passou seu pescoço esguio sob o braço direito da jovem morena, sustentando-a com o próprio corpo.

Mais uma vez Persian, ou Meowy, como Calista o apelidara, interferiu. Por algum motivo Aphrodite parecia ter desenvolvido uma simpatia imediata pelo gato pokemon, e depois de alguns segundos permitiu que o homem de cabelos azuis se aproximasse e pegasse Calista no colo.

Uma vez do lado de fora, a jovem morena entreabriu os olhos e gemeu de dor por causa da luz intensa do sol.

— Feche os olhos. — James ordenou em voz baixa.

— Não. — Calista respondeu em um fio de voz. — Me solte.

— Não. — O homem de cabelos azuis rebateu. — Melhore primeiro, depois pense em dar ordens.

A morena abriu a boca para protestar, porém Aphrodite, que serpenteava graciosamente ao lado dos dois treinadores, curvou-se e tocou-lhe a testa com o focinho. A jovem kantoniana suspirou e voltou a fechar os olhos, exausta demais para continuar a resistir.

Calista só acordou novamente cerca de uma hora depois, em um quarto no centro pokemon. A surpresa e o estresse da batalha contra Giovanni haviam cobrado seu preço.

Ao vê-la abrir os olhos Aphrodite, que se enrodilhara ao lado de sua treinadora e descansara a enorme cabeça em seu peito, zumbiu de alegria.

— Oi, menina.

A Milotic sorriu e esfregou o rosto contra o de sua treinadora num gesto afetuoso. Calista a acariciou, desfrutando da sensação agradável de suas escamas geladas.

— Chiisairyu!

A familiar voz masculina fez Calista pular de susto. A jovem olhou em volta e encontrou Lance, que a fitava com preocupação.

— Master Lance?!

— Até que enfim! — O ruivo exclamou. — Você está bem?

Calista assentiu, sentando-se devagar com ajuda do apoio de Aphrodite e massageando as têmporas que latejavam.

— O que ...? — Sua voz estava rouca e fraca. — O que aconteceu? Como você chegou aqui?

— Você não se lembra? — Lance pareceu surpreso. — Seu amigo Jameson me procurou. Ele não me deu detalhes, só disse que você e Clair haviam se ferido.

— Clair! — Calista exclamou, alarmada com a súbita onda de lembranças que a invadiu. — Eu quase esqueci! Como ela está? E Kyle? Emilly?

— Relaxe, elas estão bem. Clair só não se lembra de nada. — O campeão da Liga Índigo asseverou tranquilizadoramente. — Seu Lucario está com elas. Mas o mais importante é: o que diabos aconteceu com vocês, Caly?

— Uma armadilha. Os Rockets nos pegaram de surpresa.

— Eu sei. Os desgraçados usaram tranquilizantes. — O ruivo rosnou. — Mas o que eles queriam, afinal? E como você conseguiu sair de lá?

— Eu ... — A jovem hesitou, dividida entre a verdade e a lealdade. Por fim, tomou sua decisão. — Eu não sei, Lance. De verdade. Não me lembro de nada.

— Tudo bem. — Lance sorriu e estendeu uma das mãos para bagunçar os cabelos negros de sua ex aluna. — O mais importante é que vocês duas estão seguras. Descanse, está bem? O que quer que tenha acontecido, cobrou um preço bem alto.

— Eu estou bem. — Calista protestou. — A Equipe Rocket ...

— Eu vou atrás deles. — Lance assegurou. — Mas primeiro me responda: é verdade que Giovanni estava lá?

Calista assentiu, lembrando da luta com o homem de óculos escuros. Flashes daquele meio sorriso diabólico lhe passaram pela mente, mas de alguma forma a lembrança lhe pareceu incompleta.

— Aquele desgraçado! — O campeão da Liga Índigo quase rugiu de raiva. — Descanse, Chiisai. Eu vou atrás dele e vou fazê-lo pagar, juro a você.

Lance saiu abruptamente, deixando Calista sozinha com Aphrodite, que mais uma vez deitou a cabeça em seu peito. A jovem acariciou-a distraidamente, permitindo-se fechar os olhos e ficar à deriva por algum tempo, perdida nos próprios pensamentos.

Enquanto flutuava naquele limbo, a memória retornou. A peça que faltava, que lhe trouxera a sensação de incompletude quando Lance mencionara Giovanni.

Por trás das pálpebras fechadas a morena reviu o momento em que o líder da Equipe Rocket tirara os óculos escuros, encarando-a com óbvia surpresa, branco como alguém diante de um fantasma. Reviu também o momento em que, após desmaiar, recobrara por um instante a consciência. Giovanni lhe sussurrara algo, palavras que estivera alheia demais para entender. Naquele momento de calmaria, porém, elas lhe voltaram claras como cristal.

Minha princesa. Giovanni havia dito. Finalmente nos encontramos de novo.

A morena se virou, escondeu o rosto no travesseiro e desabou em pranto, chorando como se ainda fosse uma garotinha. Chorou até ficar exausta e cair novamente no sono.

O som de passos a despertou. Calista forçou suas pálpebras pesadas a se abrirem, o que não fez muita diferença. Já era noite alta e não havia luar. O quarto estava um breu quase total.

— Master Lance?

— Não, Calista. — A voz masculina extremamente familiar soou na escuridão, gentil apesar de tudo. — Sou eu.

A morena forçou seu corpo relutante a lhe obedecer, sentando-se lentamente na cama ao mesmo tempo em que o homem misterioso acendia a luz.

— Você! — A jovem kantoniana rosnou. — O que está fazendo aqui?

Aphrodite, acordada pelo tom ríspido de sua treinadora, ergueu a cabeça sonolentamente. Ao ver Giovanni, rosnou alto. Ou pelo menos tão próximo de um rosnado quanto uma Milotic poderia emitir.

— Calma, garota. — Calista disse,  acariciando carinhosamente o pescoço delgado de sua pokemon. — Eu cuido disso.

A Milotic hesitou, fitando o intruso com um olhar fulminante, mas enfim assentiu devagar.

— Como pode ver ... — Calista  disse  rispidamente. — Você não é bem vindo aqui. Vá embora antes que eu chame a polícia.

— Calma, minha filha. — Giovanni disse calmamente. — Preciso falar com você, e isso é tudo. Eu juro.

Calista o encarou com raiva, suas mãos cerrando-se em punhos apertados. Lágrimas escaparam de seus olhos, correndo livres por suas bochechas. Giovanni estendeu uma das mãos para enxugá-las, mas a jovem o rechaçou com um forte tapa.

— Fique longe de mim! — A irmã de Ash ordenou, sua voz tremendo tamanho era seu esforço para não cair de vez no choro. — Fique longe, estou mandando!

— Ora, vamos, princesa ...

— Não me chame assim! — Calista rosnou, se pondo de pé para socar os ombros de seu pai com a pouca força que o cansaço lhe permitiu reunir. — Nunca mais! Você não tem mais esse direito! Por que você nunca voltou? Me abandonou com a mamãe, e ela fez da minha vida um inferno! A culpa foi toda sua! Sua, entendeu? Foi tudo culpa sua!

— Já chega. — Giovanni declarou, segurando sua filha pelos pulsos. — Não se exalte, você precisa descansar. Apenas fique deitada e me escute. Serei breve, eu garanto.

— Não quero ouvir nada de você.

— Sim, você quer. — O líder da Equipe Rocket rebateu calmamente. — Quer tanto que passou todos esses anos procurando por uma resposta.

— Eu a obtive assim que o vi nesse uniforme.

— Você pensa que sim. — As mãos fortes de Giovanni soltaram os pulsos de Calista apenas para segurá-la pelos ombros momentos depois, forçando-a a voltar para  a cama. A  jovem sentou-se e continuou a encará-lo com um olhar de desafio. — Mas a verdade é que você não sabe de nada.

O tom de impaciência na voz de seu pai foi o que fez a morena decidir ouvi-lo. Liam Ketchum costumava ser um homem calmo e gentil, especialmente com sua filha, e Calista se lembrava bem das poucas vezes em que o ouvira usar aquele tom de voz. Significava que o que tinha a dizer era realmente importante.

— Está bem. — A morena cedeu de má vontade. — Lhe darei cinco minutos. Se não me der uma boa explicação e não sair daqui até então, juro que vou gritar por ajuda. A Oficial Jenny vai adorar saber que você está aqui.

— Para começar, minha menina, não faça uma ameaça que não pode cumprir.

— Quem lhe disse que não cumprirei?

— Eu disse. Sou seu pai, Calista. Você não me delataria, não importa o preço que pagasse por isso. — Giovanni declarou, sua voz cheia de convicção. — Há muito que quero lhe dizer, e muito pouco tempo. Mas, para começar, quero que saiba que eu não a abandonei. Sua mãe me fez acreditar que você estava morta.

— Morta?! — A jovem  repetiu, incrédula. — Isso é ridículo! Espera que eu acredite nessa bobagem?!

— Não importa em que você acredita. — Giovanni rebateu secamente. — Essa é a verdade. Sua mãe me fez acreditar que você havia se afogado.

— E é claro que você nunca pensou em procurar por mim. — Calista rosnou. — Nunca se preocupou em ter certeza da verdade.

— Está enganada. Eu a procurei por mais de um ano. Mesmo depois que sua mãe foi embora.

— Procurou?!

— É claro que sim. — Foi a resposta. — Ainda temos muito o que conversar, minha filha, mas infelizmente preciso ir agora.

— Você vai voltar?

— Não, isso seria arriscado. — Foi a resposta, enquanto Giovanni pegava a mão esquerda de sua filha e deslizava algo em seu dedo anelar. — Então quero que fique com isto.

O "isto" era um magnífico anel de prata. Na joia estava engastada uma belíssima opala, que brilhava refletindo uma miríade de cores.

— Este anel é meu símbolo pessoal. — O líder da Equipe Rocket explicou. — Irá garantir que me encontre aonde quer que eu esteja, e que nenhum de meus homens lhe fará mal. Jamais o tire. 

— Espere. Eu nunca concordei em fazer parte disso.

— E nem precisa. Só quero que considere isso. Junte-se a nós ... A mim. — Giovanni se permitiu abrandar, acariciando de leve os cabelos negros de sua filha. — Sua mãe nos roubou muito tempo, Calista. Agora, a decisão é somente sua. Pense bem.

— Pensarei. — A morena garantiu. — Prometo.

— Excelente. — O líder da Equipe Rocket abriu um raro sorriso sincero. — Preciso ir agora. Boa noite, princesa.

— Boa noite ... Pai.

Depois disso Giovanni saiu tão silenciosamente quanto havia entrado, deixando sua filha finalmente a sós.

Sozinha na escuridão, a morena ficou acordada o resto da noite. Parte de si estava feliz por reencontrar seu pai, outra parte tinha nojo daquilo em que ele havia se tornado. Dehlia tinha razão. Estivera certa o tempo todo. Agora que havia encontrado seu pai, Calista desejava que aquilo nunca tivesse acontecido.


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