A Volta da Raposa escrita por Claen


Capítulo 28
Consequências




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No dia seguinte, Diego ainda não conseguia mover o braço como gostaria. O ferimento já não sangrava, mas a dor continuava incomodando. Embora ele fosse capaz de manejar a espada muito bem também com a mão esquerda, ainda não tinha condição alguma de vestir o manto negro de Zorro e enfrentar qualquer um em duelo, principalmente Monastário. Só o faria se fosse extremamente necessário.

Como havia prometido a Don Miguel, decidiu ir cedo até o quartel para ver como os prisioneiros estavam sendo tratados. Mesmo que não pudesse tira-los de lá, veria o que poderia fazer para evitar os desmandos do Capitão.

Achou prudente não ir cavalgando e pediu a Bernardo que o acompanhasse conduzindo a carruagem, assim não precisaria se esforçar tanto, mas quando chegaram à cidade, o alvoroço de pessoas em frente ao quartel, que já estava se tornando habitual, se repetia naquela manhã. 

— E agora? O que foi dessa vez? – perguntou-se Diego, preocupado de verdade, porque havia muita gente na praça, mais do que nos outros dias. Ele sequer conseguia ver o que estava acontecendo em frente ao quartel. Parecia que uma espécie de palanque tinha sido montado e ele pôde ver várias pessoas sobre ele. Algumas, com certeza, eram soldados, porque ele reconheceu os uniformes.

Curiosos, Diego e Bernardo desceram da carruagem e se embrenharam no meio da multidão para tentar chegar mais perto. Quando finalmente conseguiram vencer a maré de gente, eles não estavam preparados para a cena chocante que presenciariam.

Havia realmente um palanque e soldados sobre ele, assim como vários pilares de madeira com correntes grossas que prendiam os seis prisioneiros de costas para o povo. Eles seriam chicoteados em frente a todos por ordens do Capitão.

— Isso é um aviso a todos vocês! – falou Monastário bem alto para que todos pudessem ouvir – Eu os adverti que quem não pagasse seus impostos ou se metesse com o fora da lei, Zorro, seria chicoteado em praça pública. Vocês sabem que eu sou um homem de palavra e estes prisioneiros, além de não pagarem seus impostos, tentaram fugir ontem à noite com a ajuda do mascarado. Não me surpreenderia se eles fossem os cúmplices que o ajudaram a atentar contra a vida de nosso estimado governador. Como punição, cada um desses seis homens receberá 10 chibatadas, que correspondem a quantidade de prisioneiros que escapou. A Srta. Robles só não receberá a mesma punição, porque não tentou fugir também, mas tenho certeza de que só não o fez, porque não teve a oportunidade, portanto, ficará aqui acorrentada com eles e será obrigada a assistir.

Diego não acreditava na barbárie que estava presenciado, assim como toda a população. Ele assistiu às quatro primeiras chibatadas e viu como Lupita pedia clemência pelos homens enquanto era obrigada por Monastário a observar tudo, mesmo tentando virar o rosto e fechar os olhos. O rapaz tentou se controlar, mas não conseguia continuar assistindo a tudo aquilo calado, nem ver as famílias dos prisioneiros chorando e implorando para que o Capitão parasse com tudo aquilo. Era nítido que os próprios soldados estavam desconfortáveis com a situação, principalmente o Sargento Garcia, que já cobria os olhos com as mãos como uma criança que não que ver algo.

— Pare com essa barbaridade, Capitão Monastário! – ordenou Diego enquanto se aproximava do Capitão, que segurava Lupita com força.

Ao ouvirem a voz de Diego, com tanta autoridade, os seis soldados pararam com a punição, e até ficaram aliviados com a intromissão do rapaz.

— Ora, ora, De La Vega. Nunca imaginei que o veria por aqui. Achei que não teria estômago para presenciar um chicoteamento.

— Ninguém tem estômago para tal coisa, apenas pessoas sem coração! Pare com isso, por favor, Capitão. – pediu ele, agora em um tom mais baixo, apenas para que Monastário o escutasse.

— Sinto muito, Don Diego. Eu prometi que eles seriam punidos e não posso voltar atrás, ou então perderia o respeito da população! – respondeu calmamente.

— Não diga isso, Capitão, garanto que todos nós sabemos que o senhor é um homem de palavra. Eu lhe imploro para que os perdoe. Não vê que eles não aguentarão? – replicou Diego.

— Sim, Capitão, tenha misericórdia. – suplicou Lupita aos prantos ao ver os homens acorrentados quase desfalecidos e com as costas cobertas de sangue - O senhor Valverde já tem uma idade avançada e está muito mal, se continuar ele não vai resistir...

— O senhor prefere ter o sangue de inocentes em suas mãos, ou ser conhecido por sua piedade em perdoar aqueles que o afrontaram? – perguntou Diego, apelando para o ego do Capitão.

Ao ouvir isso, Monastário começou a pensar no assunto. Apesar de ainda estar com seu plano em andamento, não seria nada mal, que o mundo soubesse de sua compaixão por seus inimigos. Diego tinha conseguido acertar no ponto exato.

— Parece que o senhor me convenceu, Don Diego. Vou cancelar a punição, mas eles não serão atendidos pelo médico.

— Bom, acho que isso é melhor do que nada, Capitão. Obrigado. – agradeceu já mais aliviado.

— Caros cidadãos de Los Angeles, nosso estimado Don Diego de La Vega, me convenceu a desistir dessa punição. - assim que disse isso apertou propositalmente o ombro ferido de Diego com força fazendo-o sentir muita dor. Ele tentou disfarçar como pôde, mas Lupita percebeu que algo não estava certo. Monastário sorriu discretamente ao ver que tinha conseguido fazer o que queria e continuou com seu discurso solene.

— Apesar de ser um homem rígido, também sou misericordioso, então lembrem-se: não quebrem as regras, por que Don Diego não estará aqui para sempre para defende-los. Guardas, podem levar os prisioneiros de volta às suas celas e lhes deem água e sabão para se lavarem.

Os soldados obedeceram, e um a um, os prisioneiros começaram a ser desacorrentados. Apesar de ainda estar abalada, a população começou a se retirar um pouco mais tranquila, mas o medo de ainda poder ser vítima dos desmandos do Capitão os assombrava, principalmente por não terem nenhuma notícia do Zorro desde a tentativa de fuga há duas noites. Todos estranharam o fato de ele não ter aparecido para de fender os prisioneiros. Se ele estivesse bem, jamais teria deixado aquilo acontecer.

— Agora vamos, Srta. Robles. De volta à sua cela. – ordenou Monastário.

— Eu posso ajudar os prisioneiros? – pediu a moça.

— Se assim deseja.

— Obrigada, Capitão. – agradeceu Lupita, mas quando olhou novamente para Diego, confirmou que tinha algo de errado com seu amigo. – Diego, você está bem? Você está sangrando!

Diego não tinha se dado conta de que o apertão de Monastário tinha sido tão forte para reabrir seu ferimento. Ele vestia um casaco azul claro que já mostrava uma mancha vermelha escura. Assim que percebeu, Bernardo correu em sua direção.

— É verdade, De La Vega, está sangrando. – também observou Monastário cinicamente - Não creio que o tenha machucado, ou será que machuquei?

— Ah... Isso foi um acidente que sofri. – precisou usar a desculpa que tinha dado a Don Miguel no dia anterior – Meu cavalo se assustou com uma cobra e me derrubou. Acabei me machucando com o tombo. Fico até com vergonha de contar isso, afinal, eu já não sei esgrimir, nem lutar, e a única coisa em que pensei saber fazer bem, que é cavalgar, parece que também não sou grande coisa. Mas eu estou bem, acho que o senhor não tem noção de sua própria força, Capitão, e acidentalmente reabriu meu ferimento.

— Perdoe-me, Don Diego, parece que não tenho mesmo. Mas essa é uma grande coincidência! Sabia que antes de ontem, o Sargento Garcia acertou o Zorro exatamente no mesmo lugar?

— Eu fiquei sabendo do feito do Sargento, mas não sabia que tinha sido no mesmo lugar. É uma grande coincidência mesmo! Aliás, onde ele está? Eu preciso parabeniza-lo por isso! – tentou desconversar.

— Deve estar na praça. Agora se me der licença, eu preciso voltar para o quartel. Vamos, Srta. Robles. – chamou ele, puxando pelas algemas que prendiam suas mãos.

Num movimento rápido, ela conseguiu se desvencilhar de Monastário por alguns instantes e correu para abraçar Diego.

— Obrigada. – disse em seu ouvido.

— Não se preocupe, vamos tira-los daí. – respondeu da mesma forma, e foi só o que conseguiram dizer até Monastário puxa-la novamente e a levar de volta para dentro do quartel.

Diego ficou observando em silêncio enquanto o Capitão e seus guardas conduziam Lupita e os outros prisioneiros de volta para suas celas. Os homens estavam em situação lastimável e Diego nunca tinha sentido tanta culpa, quanto aquela que sentia naquele momento. Assim que eles se afastaram, Bernardo se aproximou preocupado com a mancha de sangue que começava a se espalhar pelo casaco de Diego.

— Não se preocupe comigo, Bernardo, eu estou bem. Preocupe-se com aqueles que estão presos, porque esses sim, estão correndo perigo.

Bernardo apontou na direção da casa do Dr. Ernesto, o médico do povoado, com a intenção de que Diego fosse vê-lo, mas ele se recusou.

— Não posso ir até lá, Bernardo. Qualquer médico que se prese, saberia que meu ferimento foi causado por uma bala, não por uma queda de cavalo e isso logo estaria na boca do povo. Não posso me arriscar mais do que já me arrisquei. O Capitão sabe muito bem o que fez e é melhor voltarmos para casa.

O criado concordou e os dois seguiram em direção à carruagem, mas logo avistaram o Sargento Garcia. Seria melhor não tê-lo encontrado naquele momento, mas não havia como disfarçar que não o haviam visto e tiveram que ir cumprimenta-lo.

Buenos días, Don Diego! – cumprimentou o sargento sorridente, até ver o sangue na roupa de Diego. – O senhor está bem, Don Diego? Está machucado?

Buenos días, Sargento! Ah, isso aqui? – disse apontando para ombro – Isso não foi nada. O senhor acredita que caí do cavalo ontem? Logo eu, que achava ser um bom cavaleiro!

— Tenha mais cuidado, Don Diego. Essas terras não são fáceis para cavalheiros refinados como o senhor, são para homens duros. – aconselhou preocupado com o amigo.

— Pode ter certeza de que eu terei. Mas me diga Sargento, é verdade que o senhor acertou aquele bandido do Zorro e quase o capturou?

— Sim, Don Diego! Eu apontei meu mosquete e falei “dessa vez você não me escapa!” e atirei! Acertei mais ou menos, mais ou menos aí onde o senhor se machucou, mas o senhor sabe como ele é rápido... ainda não foi dessa vez que conseguimos pegá-lo.

— Engraçado, ouvi dizer que tinha sido meio que um acidente... – atiçou Diego, sabendo que Garcia estava modificando um pouco a história.

— Não, Don Diego, isso foi muito bem planejado por mim!

— Entendo... Se é assim, então meus parabéns Sargento. Na próxima o senhor acertará direto no coração e receberá a recompensa!

Ao ouvir essas palavras o sargento ficou pensativo.

— Prefiro só captura-lo mesmo. Não gosto de matar pessoas, nem mesmo o Zorro... Apesar de ele ser um fora da lei, não acho que precisamos tirar sua vida, afinal, o cartaz da recompensa diz vivo ou morto. Acho que vivo a recompensa é igual, não é mesmo, Don Diego?

— Muito sábio de sua parte, Sargento! – concordou Diego com um sorriso aberto confirmando o que sempre soube, que o sargento atrapalhado tinha um bom coração. – Agora eu preciso ir sargento, assim que eu estiver melhor, convido o senhor para tomarmos uma caneca de vinho na taverna, para quem sabe, estarmos comemorando a captura do Zorro!

— Muito obrigado, Don Diego. Ficarei esperando. Até breve! Até breve, pequenino! – e se despediu acenando, enquanto seguia rumo ao quartel.

Diego e Bernardo retomaram seu caminho de volta a carruagem, mas foram interrompidos mais uma vez, mas agora a surpresa foi realmente boa.

— Diego! – O rapaz ouviu uma voz conhecida o chamar pelas costas e se virou.


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