Crush do busão escrita por Akemihime


Capítulo 1
Parte 1


Notas iniciais do capítulo

História dividida em duas partes.



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@loverboylance postou:

“Crush do busão: uma história de vida”

Gente, eu preciso contar uma história aqui, porque simplesmente não dá mais pra ignorar os eventos que a minha vida tomaram quando eu conheci o meu crush do ônibus 156.

Todo mundo tem um crush de ônibus, certo?

Mas essa história que vou contar é completamente diferente de tudo o que já vivi antes e do que vocês já devem ter vivido também.

Então vamos lá!

Tudo começou naquela manhã da primeira segunda-feira de fevereiro. Era o primeiro dia de aula do ano e eu me sentia completamente pronto e confiante. Depois de três anos na faculdade, eu quase podia sentir o cheirinho de diploma no ar, então estava mais do que decidido a dar tudo de mim naquele dia e nos próximos que se seguiriam.

Nada iria interromper o meu foco.

Ao menos era o que eu achava ou esperava.

A minha rotina era simples: ir para a faculdade de manhã e trabalhar o resto do dia.

Então foi com essa determinação de começar bem o ano letivo que subi no ônibus que sempre pegava para a aula.

Ser pobre é uma coisa engraçada, não é? Faz a gente se apegar até em coisas simples, e eu confesso que as férias me deixaram até com saudades daquele ônibus 156 que pegava toda manhã para ir para a aula.

Passar pela catraca do ônibus com uma mochila grande nas costas era algo chato, mas com o passar dos anos eu já tinha pegado o jeito, o problema mesmo que me surpreendeu e mudou a minha vida veio logo depois: quando fui andando pelo ônibus e avistava um lugar lá no fundo para sentar, um dos poucos que ainda restavam. Nessa hora fiquei aliviado, porque vocês sabem como é ônibus de manhã, né?

Pois então, fui andando com passos confiantes, ouvindo thank u, next da Ariana Grande (que chegava novamente ao refrão e me deixava bem empolgado), mas infelizmente nessa hora eu não contava com a sacanagem que o motorista ia fazer.

Motorista de ônibus é um cara bem filho da puta, não é? Ele não tá nem ligando se você já sentou ou não em algum lugar, se você tá passando pela catraca ainda ou se tá tirando dinheiro do bolso pra pagar. Quando ele consegue colocar toda a manada pra dentro do ônibus, ele dá aquela risadinha sacana e afunda o pé no acelerador.

E com isso, eu, todo belo, cheiroso (sempre tomo banho antes de sair!) e muito pleno, acabei sentindo aquela arrancada do ônibus com toda a força. E aí o pior – ou melhor, agora eu vejo – aconteceu: meu fone de ouvido voou das minhas orelhas, meu corpo foi pra frente e depois eu impulsionei com força pra trás e no fim quando vi o estrago estava feito!

Caí com tudo no colo de alguém!

Não só um simples alguém. Um cara de cabelo escuro estilo mullet e bem, bem gato.

E cheiroso. Que perfume era aquele?

E mesmo surpreso de ter caído no colo dele, é claro que eu reparei nessas coisas. Quem não repara?

Provavelmente eu devo ter ficado muito tempo parado em cima dele, encarando-o feito o perfeito idiota que sou, pois aquela carinha linda fez uma expressão irritada.

E eis aqui a primeira coisa que meu crush do busão disse para mim:

— Sai logo de cima de mim, folgado!

É isto.

Na hora foi como se eu tivesse sido acordado pelas palavras dele, e por mais que tivesse achado o cara muito lindo, eu não ia deixar barato com a sua grosseria.

Eu não sou obrigado, afinal.

— Se você não tivesse feito essa cara de quem tá gostando, talvez eu tivesse saído no primeiro segundo!

E assim levantei, sorrindo e deixando-o sentado olhando furioso para mim. O rosto dele parecia mais vermelho que o meu na hora, se era por constrangimento ou por raiva, eu já não sabia dizer.

Depois disso fui me sentar lá no fundo do busão, pois pra minha sorte, ainda tinha aquele banco desocupado. E então, passei o resto do trajeto até a faculdade dividindo o olhar entre a janela e o cara de mullet que estava sentado mais na frente.

A verdade é que ele tinha me deixado irritado com o jeito que tinha falado, mas o cretino era bonito!

E isso bastou para eu pensar que ele talvez fosse o meu crush do busão. Não que eu tivesse esperanças de encontrar com ele depois, pois sabem como é um crush do busão, não é? Grandes chances de durar só aquele trajeto daquele dia e pronto, nunca mais se vê ou ouve falar dele.

Ah, como eu estava enganado!

A segunda vez que encontrei o meu crush não foi no ônibus e pode ter certeza: a situação foi mil vezes pior e mais humilhante.

Eu não sou o tipo de pessoa que sai passando vergonha todos os dias da minha vida, mas é incrível como que todas as vezes que me deparei com o crush do busão, eu estava de alguma forma acabando com a minha dignidade.

Dessa vez eu estava perto do ponto de ônibus que eu pegava do trabalho para casa. O trabalho que, por sinal, era próximo do campus da faculdade, o que era perfeito pra mim.

Pois bem, era tarde da noite e eu que fiquei encarregado de fechar a loja. Onde trabalho? Em uma loja da Starbucks. O emprego tem um horário flexível e me permite estudar de manhã. Como eu disse, perfeito.

Assim que tranquei a loja e estava indo para o meu ponto, bem distraído pensando no crush do busão – que nunca mais tinha visto depois de semanas, mas tinha me voltado à mente após ouvir uma cliente comentando com a amiga que o irmão do namorado tinha um cabelo mullet (eu não costumo ouvir conversas alheias, só essa, juro!) – eu acabei sendo surpreendido com um assalto.

O sujeito estava com o rosto escondido por uma máscara preta e apontava um revólver na minha direção.

Nessas horas a gente não pensa, né? Só segue o que o ladrão diz e dá as coisas o mais rápido o possível.

Cinco minutos depois do ladrão desaparecer correndo com todos os meus pertences – eu fiquei bem, por sinal – caiu a minha ficha que ele tinha levado a minha carteira e todos os meus documentos.

Dinheiro a gente se vira e dá um jeito de correr atrás do prejuízo pegando umas horas extras no trabalho (até porque, eu nem tinha muito dinheiro comigo naquele dia), mas os documentos…

Pensar no trabalho que me daria para correr atrás de tudo depois e conseguir novos documentos me deu vontade de chorar.

Então, como todo ser humano normal, parei e pensei: o ladrão não se interessa pelos documentos, não é? Ele só quer saber do dinheiro e depois joga a carteira com o resto em algum canto.

Aí veio a minha brilhante ideia de sair procurando, no meio da noite, uma carteira azul perdida por aí.

E refazendo os passos de onde o ladrão tinha vindo, com a atenção redobrada dessa vez, pois agora sem dinheiro, eu não queria correr o risco de levar porrada, acabei parando em um container de lixo no início uma rua sem saída.

É, meus amigos, eu fiz exatamente o que vocês estão pensando que fiz.

Arregacei as mangas, respirei fundo e entrei no container de lixo, deixando lá toda a minha dignidade.

Não vou descrever aqui o quão nojento foi ter feito isso. Só basta vocês saberem que não, eu não achei meus documentos pós assalto ali dentro. O que deveria ser lógico, considerando que estava à noite e muito escuro.

Quando estava desistindo e pronto para sair do container de lixo, quem eu encontro olhando para mim do lado de fora?

Sim, justamente ele, o crush do busão 156!

Fiquei tão surpreso e ele também, que ficamos uns bons segundos em silêncio bem assim, com um encarando o outro.

Eu não sabia nem como ele tinha aparecido ali, justamente ali e justamente naquele momento!

Por que a segunda vez que encontro esse crush eu tenho que passar uma vergonha ainda maior que a primeira?

E novamente, foi ele quem falou primeiro, daquela forma muito educada, assim como fez quando caí no seu colo no ônibus.

— Você é idiota?

Confesso que eu ainda demorei pra responder.

Pisquei umas duas vezes, confuso.

— O que?

— Você é algum idiota com fascínio por lixo dos outros ou é só um mendigo desesperado procurando comida?

Eu suspirei, tentando ter paciência. Mas como quem me conhece sabe bem, paciência não é o meu forte com pessoas ignorantes.

Como eu já disse antes: não sou obrigado!

— Cara, você gosta de ser irritante assim ou é só demência mesmo? — Retruquei, me levantando do lixo com o peito estufado, fingindo ainda possuir alguma dignidade.

— Como é que é? — Ele se aproximou mais de mim e eu tentei manter a postura firme, mas como esse homem cheirava bem!

Eu tinha que descobrir que tipo de perfume ele usava.

Mas infelizmente ele se arrependeu de ter se aproximado, provavelmente porque, enquanto eu pensava no seu cheiro, ele deve ter sentido o meu, que certamente não estava às mil maravilhas depois de sair de um container de lixo.

— Quer saber? Que se foda — O cara de mullet disse, colocando a mão no nariz e se distanciando — Só aparece idiota perto de mim…

— Ah é? Pois um idiota atrai os outros! — Eu falei sem pensar, enquanto o meu crush sorria, me lançando um olhar como se eu fosse um louco – meu deus, que sorriso era aquele? – e se virava de costas, dobrando a esquina, desaparecendo da minha vista.

Aquela não foi uma das coisas mais inteligentes que eu disse naquele dia, confesso. Mas acho que depois de tudo o que tinha acontecido, a minha cabeça já não funcionava muito bem mesmo.

Principalmente depois de ver o sorriso que aquele cara tinha aberto.

Ele conseguia ser ainda mais gato daquele jeito, mas o seu temperamento era simplesmente o mais irritante o possível.

Como podia?

Bem que minha madre costumava me dizer: o diabo é tentador. Ela não estava errada.

Mas por mais tentador que fosse esse diabo, ele conseguia ser indescritivelmente irritante. Eu não sabia se a implicância dele era só comigo ou se seu mau humor era constante com todos ao seu redor.

Se fosse, coitada de sua família.

O fato é que depois desse encontro nada agradável, fico feliz em dizer que os próximos aconteceram sem que eu tivesse que me humilhar – ainda mais.

E todos voltaram a ocorrer dentro do famoso ônibus 156, por sinal. No mesmo horário que eu pegava pela manhã todos os dias para ir para a aula.

Nem todos os dias de semana o meu crush aparecia no ônibus, apesar disso. Não parecia haver um padrão. Só pude ver que ao menos duas ou três vezes por semana lá estava ele quando eu entrava, sentado em um banco no meio do ônibus, com fone de ouvido e olhando para a janela.

Às vezes trocávamos uns olhares e tudo o que ele fazia era revirar os olhos ou suspirar aborrecido. Eu não ficava para trás, mostrava a língua ou as vezes fazia questão de mandar um beijo só para ser provocativo mesmo.

Mas demoramos a voltar a trocar palavras.

Eu sempre sentava em alguns bancos mais atrás, observando aquele ser humano de cabelo mullet, pensando em como ele conseguia ser mais atraente a cada dia que se passava.

Até que um dia, numa sexta-feira, subi no ônibus já com aquela empolgação que tinha sempre que o fim de semana se aproximava, sentei em meu lugar de sempre até esquecendo de trocar um olhar com o crush como costumava fazer, visto que eu estava ocupado trocando mensagens com um amigo meu (@chefhunk). Afinal, sextou, não é? Eu precisava me divertir um pouco depois do expediente, nem só de estudos e trabalho vive uma pessoa.

— Isso é seu, não é? — A voz do crush então de repente inundou meus ouvidos e eu olhei para cima quase deixando o celular cair.

Ele estava parado à minha frente, se apoiando no banco para não cair com o movimento do ônibus.

Meu olhar desceu para sua mão erguida em minha direção, segurando uma carteira bem familiar na cor azul.

Ao ver meu olhar, ele praticamente jogou a carteira para cima de mim.

Me atrapalhei um pouco para pegar, surpreso demais por não ter só o meu crush falando comigo de modo normal (ao invés de só me xingar, como sempre fazia), como também por estar me entregando justamente a minha carteira que tinha sido levada pelo bandido no outro dia.

— É sim... — Balbuciei, ainda surpreso, abrindo a carteira e encontrando minha identidade e demais documentos lá. O dinheiro, obviamente, havia sumido.

Eu ergui a minha cabeça, pronto para agradecê-lo, porque, veja bem, eu sou um cara educado. Mesmo que o meu crush seja um babaca que não saiba fazer nada além de me deixar irritado, eu realmente devia uma à ele.

Mas quando abri a boca para falar algum “obrigado” ou no mínimo um “valeu”, ele foi mais rápido, em toda a sua sutileza de cavalo, com o coice preparado na minha direção.

— Devia prestar mais atenção por onde anda, se bem que vindo de um retardado como você, nem me surpreende de ter achado isso jogado no chão…

Como ele conseguia ser insuportavelmente lindo e babaca ao mesmo tempo, isso era um eterno mistério para mim.

— Eu sou retardado? Cara, se eu sou retardado, você é…

— Sou…? — Ele perguntou, vendo que eu demorava a responder.

Por que minha mente ficava em branco sempre que eu começava a discutir com ele? Ou quando começava a discutir com qualquer pessoa? Talvez eu não seja a melhor pessoa para discutir com alguém mesmo no fim das contas…

— É mais retardado que eu! — Finalizei, me sentindo o herói enquanto ele ria debochado.

— Você é ridículo — Ele pareceu murmurar mais para si mesmo do que pra mim e isso me irritou ainda mais — Mas quer saber? Eu só queria entregar isso mesmo. Ainda por cima é ingrato.

Era só o que faltava ter que ouvir aquilo. Ah Deus, por que faz eu ter crush em homens tão arrogantes assim?

O que foi que eu fiz?

Mas é óbvio que eu não me aguentava calado também sempre que começavamos a discutir assim.

— O que? Olha, eu estava pronto para agradecer do fundo do meu coração e da minha alma e…

— Hm… — Ele cruzou os braços, me interrompendo — Eu não ouvi nenhum agradecimento, então duvido que tinha essa intenção.

Eu estava pronto para retrucar, mas outra voz nos interrompeu, enquanto o ônibus parava em mais um ponto.

— Vocês, se não pararem de brigar, vou expulsar os dois daqui! — A voz em questão veio lá da frente do ônibus e eu quis morrer de vergonha quando vi que se tratava do motorista.

Nem percebi que estávamos discutindo esse tempo todo de forma alta, nada discreta.

Olha, eu juro para vocês que eu nunca fui de fazer barraco na frente dos outros! Bem, não tanto barraco assim...

O fato é que depois do motorista dizer aquilo, vários outros passageiros começaram a apoiá-lo, mandando tanto eu quanto meu crush calarmos a boca.

E vocês aí pensando que minha última vergonha seria no container de lixo!

Mas eu não era alguém que abaixava a cabeça fácil, estava prestes a retrucar até mesmo o motorista, e se o trocador falasse alguma coisa, ia sobrar para ele também! No entanto, pela primeira vez o meu crush pareceu ainda mais constrangido que eu.

— Tudo bem, foi mal… — Ele resmungou para o motorista, desviando o rosto de mim e voltando a se sentar lá na frente onde costumava ficar.

Mas eu pude ver bem o vermelho em suas bochechas. Ele estava coradinho!

Maldito seja meu coração que deu um salto a ver aquilo. Era como se parte de mim quisesse bater naquele sujeito e a outra parte quisesse enchê-lo de beijos!

Eu tinha sérios problemas.

Mas de qualquer forma, a irritação ainda tinha ficado presente em mim em relação ao crush.

O fim de semana fez o mau humor ser momentaneamente esquecido, mas na segunda-feira seguinte tudo pareceu voltar em peso, sendo agravado pelo fato de eu já ter acordado extremamente atrasado para um dia importante de prova na faculdade.

Eu aposto que todos aqui que estão na classe média-baixa já tiveram, algum dia na vida, que se humilhar correndo desesperados atrás de um ônibus, simplesmente porque estavam atrasados demais e não existia a menor possibilidade de poder esperar pelo ônibus seguinte no ponto.

Por sorte naquele dia consegui subir no tão conhecido ônibus da nossa história. Estava sem fôlego, com o corpo todo suado da pequena e desesperada corrida, e para piorar tinha saído de casa sem nem ao menos tomar café da manhã, visto que não ia ter tempo para isso.

Então, assim que passei na roleta, olhei para o meu crush sentado no lugar de sempre dele, com o rosto virado para a janela, e a irritação subiu ainda mais.

— E você é bom nem vir com esse ar debochado pro meu lado hoje que eu não tô com paciência! — Fui logo soltando as palavras, sem nem pensar, apontando o dedo para ele.

O meu crush do busão se virou para mim e a minha irritação imediatamente sumiu, sendo substituída pela surpresa.

O olho esquerdo dele estava roxo e inchado.

— Vai se foder.

Foi o que ele respondeu, se virando novamente para a janela.

Eu engoli em seco e olhei para o assento ao seu lado. Estava vago.

Então sem pensar muito, sentei bem ali, colocando a minha mochila no chão e me virando para o meu crush.

— Cara… você tá bem? — Eu me arrisquei a perguntar, ainda surpreso, erguendo a mão para colocar no ombro dele, mas parando no meio do caminho. Melhor não.

Ele deu de ombros, sem se virar para mim, não respondendo a pergunta.

— Sabe, se você quiser… pode conversar. — Eu tentei ainda. Confesso que estava arrependido de já ter chegado todo agressivo daquele jeito — Eu não sou tão cuzão assim como parece, é sério.

A verdade é que meu coração também estava apertado vendo-o daquele jeito.

Sabe, eu gostava de provocar o meu crush, principalmente porque ele na maior parte do tempo era um babaca, mas vê-lo todo machucado acabou comigo. Algo sério podia ter acontecido e talvez ele não fosse tão babaca assim, no fim das contas. Até porque, eu fiz questão de me lembrar, apesar de toda a nossa briga, ele também tinha me devolvido a minha carteira.

Ele deu uma risada fraca com o meu comentário e foi aí que notei que seu lábio inferior também estava um pouco ferido, como se ele tivesse levado um soco ali.

— Você foi assaltado ou algo assim? — Perguntei a primeira coisa que me passou pela cabeça, sem conseguir me segurar.

— Bem que eu queria que fosse fácil assim — Ele finalmente falou, se virando para mim dessa vez e me encarando de modo sério — Por que se importa de qualquer forma? Eu te chamo de idiota o tempo todo.

— É como eu disse quando nos encontramos antes no container de lixo — Eu dei de ombros — Um idiota atrai o outro.

E lá estava eu, me chamando de idiota de novo de modo gratuito. Por que estar apaixonado faz de nós seres humanos pessoas tão burras?

E sim, percebam que eu disse “apaixonado”, não tendo um crush. Mas quem eu quero enganar, não é mesmo? Depois de tantos encontros, desastres e vergonhas, eu já não sentia só um leve e simples crush por aquele cara de mullet.

O buraco era mais embaixo e eu estava fodido.

Mas tudo o que me importava na hora era só ajudar ele de alguma forma.

— Eu estou bem — Ele respondeu, colocando a mão no cabelo preto, meio sem jeito — Ou vou ficar, de qualquer forma. Não foi nada demais.

Todo mundo é capaz de sentir quando o assunto é pessoal demais para a pessoa simplesmente começar a falar em um ônibus lotado. E eu senti isso, então só suspirei, decidindo não insistir muito dessa vez.

Eu já estava sendo inconveniente o suficiente e quebrando toda a nossa barreira de discussão e rivalidade ao me sentar ali e genuinamente me preocupar com ele. Eu nem sabia o seu nome, aliás! Até onde estava traçado a nossa relação, ainda éramos completos estranhos um para o outro.

Eu comecei a me erguer, pronto para me levantar e sentar mais atrás, se é que ainda tinha um lugar vago agora. Mas então, quando estava prestes a me afastar, senti a mão dele segurando meu pulso.

Me virei, surpreso, arqueando a sobrancelha.

— Não precisa se levantar — Ele murmurou com a cabeça baixa e eu não tive dúvidas de que estava constrangido por falar aquilo — e… obrigado por se preocupar.

Eu geralmente não sou uma pessoa sacana sabe, ainda mais levando-se em conta que estava completamente caído por aquele cara, mas as palavras que escaparam dos meus lábios foram praticamente involuntárias naquela hora.

— Como é? Eu não escutei direito… — Esbocei um sorriso, claramente provocando ele. Confesso: eu queria ouvir o meu crush me agradecendo e sendo gentil comigo de novo.

Aquela foi a primeira vez, em todos os nossos encontros desastrosos, em que ele não foi um idiota completo, eu nem estava acreditando no milagre.

E embora eu temesse que o meu crush fosse voltar a reclamar ou querer discutir de novo, dessa vez tudo o que ele fez foi sorrir junto comigo.

Um sorriso sem qualquer tipo de deboche!

E meu Deus, aquele sorriso era ainda mais lindo.

— Não abusa — Foi tudo o que ele disse, soltando o meu pulso assim que eu desisti de levantar, me acomodando direito ao seu lado.

Eu sorri novamente.

O resto do trajeto nesse dia foi feito em silêncio. Ele desceu um ponto antes de mim, se limitando apenas a se despedir de maneira mais tímida, e eu me perguntava o que diabos tinha acontecido com aquele cara de mullet tão arrogante que tinha conhecido meses atrás.

Não que nós não fôssemos discutir nunca mais. Eu estava certo de que se fosse vê-lo de novo mais vezes naquele ônibus, certamente ainda trocaríamos algumas farpas, era como se estivesse em nosso DNA, entendem?

Mas apesar das discussões e da minha preocupação ao ver o rosto do meu crush, depois daquele dia eu passei a gostar ainda mais dele.

E nós de fato continuamos a nos encontrar no ônibus 156 de manhã, embora depois daquela vez, eu não tivesse o tinha visto com tanta frequência mais como costumava ver.

Eu podia sentir que tinha algo acontecendo, mas ainda não éramos próximos o suficiente para eu me arriscar e perguntar assim, ainda mais considerando que ele parecia ser realmente reservado quanto à sua vida.

O que importa é que a convivência entre nós ficou um pouco mais tolerável então. Não conversávamos sempre, mas quando eu entrava no ônibus e se ele estivesse lá com um lugar vago ao seu lado, eu me sentava.

Às vezes discutíamos por assuntos mais ridículos possíveis, já outras vezes, quando eu não conseguia me sentar perto dele, sorríamos e nos cumprimentávamos de longe de modo discreto. Nada demais, mas que já fazia meu estúpido coração ficar satisfeito.

Mas como eu disse, nada dura para sempre. E não demorou muito para que eu notasse seu sumiço ainda mais comum naquele ônibus.

Fazia semanas que não nos víamos, até que em uma quarta-feira eu entrei no ônibus completamente sem esperança, mas ainda vasculhando os bancos, como sempre costumava fazer, à procura dele.

E para minha surpresa, lá estava o cara de mullet, com sua jaqueta vermelha, encarando a janela como se nunca tivesse saído dali.

Meu coração se agitou imediatamente e eu tentei me mover em sua direção, mas ele não pareceu nem ao menos notar.

O ônibus neste dia em particular estava cheio e eu sabia que não teria opção a não ser ficar em pé aonde pudesse, então desisti de tentar ir para o seu lado e suspirei, frustrado.

Peguei meu celular, olhando as horas, e um pensamento passou pela minha cabeça.

Dessa vez eu não resisti. Eu não sabia se teria outra chance ou não, se o veria de novo ou não. Todo encontro nosso poderia ser muito bem o último, já que – apesar de tudo – não éramos próximos e eu nem ao menos sabia o nome dele!

Então, com o celular em mãos, eu o ergui discretamente e me posicionei estrategicamente em sua diagonal. Foi a única vez que agradeci por estar em pé em um ônibus, graças a isso consegui uma posição privilegiada, com um bom ângulo para a câmera apontada para o crush. E mais que rapidamente tirei não só uma, mas várias fotos dele.

Felizmente ele se desencostou da janela e parecia mais distraído do que antes, provavelmente conversando com outra pessoa no celular, já que não parava de digitar, apesar de eu não conseguir ver direito de onde estava.

Por fim decidi me aproximar um pouco mais com o espaço limitado que tinha. Queria tirar a última foto de um ângulo ainda melhor, mas foi aí que o meu crush ergueu a cabeça em minha direção. Eu abaixei rapidamente o celular e fiz minha melhor cara de paisagem, como se nada estivesse acontecendo. Mas ele não parecia interessado em mim dessa vez, olhando para um ponto além e depois sorrindo.

Maldito sorriso lindo!

— Shiro, aqui!

Eu juro que me esforcei muito para não me virar bem rápido para trás, mas nem precisei, só senti um homem se movendo atrás de mim, pedindo licença para passar.

Eu me afastei um pouco e ele olhou para o meu rosto, sorrindo amigavelmente.

Naquele momento eu soube.

Esse cara tinha me visto fotografar o meu crush.

E sim, dessa vez eu fiquei constrangido e nem consegui esconder, sentindo as minhas bochechas ficarem até quentes de tão vermelhas.

Para a minha sorte, somente o amigo (era amigo?) pareceu perceber e eu só podia torcer para a minha sorte continuar e ele não comentar nada com o meu crush.

Ele continuou com um sorriso amigável no rosto e então começou a conversar com o meu crush, perguntando como ele estava, como se nada tivesse acontecido.

Eu juro que nessa hora respirei aliviado.

Corri o risco de ser pego pelo crush? Sim.

Me arrependi? Com certeza não.

E, vendo as fotos que tinha tirado, eu sorri. Com certeza também faria de novo se pudesse.

Mas infelizmente a chance de tirar novas fotos nunca veio.

Sabe aquele papo de aproveitar antes que a oportunidade passe e eu nunca mais encontre com o crush? Pois bem, aquela de fato foi a última vez que o vi.

Já se passou um mês inteiro e toda vez, desde a última que nos vimos, eu entro no ônibus 156 com a esperança de vê-lo, nunca o encontrando.

É por isso, depois de toda essa longa história de vida que foi o meu crush pelo cara do mullet, que venho aqui pedir a ajuda de todos vocês da internet! Eu preciso encontrar ele, eu preciso saber o seu nome, onde ele vive, o que faz da vida e como eu faço para vê-lo de novo!

Não posso esquecer o maior crush do busão que já tive na vida!

Compartilhem essa postagem, perguntem até para os vizinhos se conhecem um cara de mullet com um amigo (?) chamado Shiro!

(para ajudar, aqui abaixo estão as fotos que tirei dele, como podem observar, o cara é realmente gato!)

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#crushdobusão #caradomullet #cadêvocê #ajudagente! #crush

598 notas - Ago, d27, 2018

 

Lance olhou novamente para o Tumblr aberto em sua enorme postagem que tinha feito no dia anterior.

Ele sorriu então.

A postagem já tinha conseguido um bom número de compartilhamentos e curtidas.

Mensagens também com pessoas empolgadas com sua história apareciam às vezes, algumas dizendo como ele precisava encontrar seu crush urgentemente, outra falando que aquilo tinha muita cara de destino mesmo e que bastava ter paciência que logo tudo se ajeitaria.

Lance só esperava que aquelas pessoas tivessem razão, afinal ele sentia que aquela não era uma história comum. Encontrar tantas vezes com aquela pessoa e em várias situações diferentes era no mínimo curioso.

Não que ele acreditasse exatamente em pessoas destinadas umas às outras, mas se por acaso isso acontecesse, Lance só podia torcer para que aqueles seus encontros com o crush do busão fossem coisa do destino tentando os unir.

Agora só restava esperar para ver o que o destino ia fazer dessa vez.


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